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Deferência do Legislativo a grupos organizados: o papel do sindicato dos trabalhadores.

Análise à luz das teorias de Pateman e Mayhew.

Deferência do Legislativo a grupos organizados: o papel do sindicato dos trabalhadores. Análise à luz das teorias de Pateman e Mayhew.

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Examinam-se teorias da democracia, representação política, organização e funcionamento parlamentar para investigar o seguinte: Como ser ouvido pelo Legislativo e como ampliar a participação popular na democracia de forma que perdure após as eleições?

Introdução:

“Qual o lugar da participação numa teoria da democracia moderna e viável?” (PATEMAN, 1992, p. 9). São muitas as teorias acerca da democracia, representação política, organização e funcionamento parlamentar, tendo como cerne a explicação dos movimentos no Parlamento, a estabilidade no poder, os tipos de representatividade, dentre outras. Porém, como questionado por Pateman (1992), qual o papel da população nesse movimento democrático? Como ser ouvido, como ampliar a participação de forma que perdure após a manifestação eleitoral nas urnas? A busca por essa resposta deve passar, necessariamente, pela análise do que motiva o Parlamento no processo de tomada de posição e sobre o tipo de participante que, geralmente, obtém algum êxito em ser ouvido no Legislativo. Nesse aspecto, segundo Mayhew (1974), os grupos organizados teriam maior deferência dos Congressistas. Quanto mais coeso e mobilizado, melhores seriam as chances de apoio a determinada pauta. No presente trabalho será abordado, em linhas gerais, o funcionamento sindical no Brasil à luz da Teoria de Pateman e das Conexões Eleitorais abordadas por David Mayhew (1074). Seria o Sindicato um ambiente favorável ao desenvolvimento do processo participativo democrático, nos termos defendidos por Pateman e, ao mesmo tempo, uma ferramenta viável de pressão popular frente ao Congresso Nacional?


Teoria de Pateman:

Baseado nas teorias clássicas de Rousseau, Stuart Mill e Cole, Pateman amplia a visão acerca da participação, na busca por responder qual o papel do povo na democracia. Segundo Pateman, Rousseau é o teórico da participação individual que defende a função educativa da participação, a qual gera ao individuo um sentimento de pertencimento à comunidade, facilitando a aceitação do cumprimento de regras. Stuart Mill, na visão de Pateman, apesar de defender a participação a nível local, com formas cooperadas para substituição da relação de hierarquia e poder nas indústrias, retrocede quanto à ideia de participação efetiva das massas, uma vez que limita ao campo da discussão política e ao voto plural, no qual os mais instruídos teriam peso maior. Pateman defende que Cole avança ao defender o efeito educativo da participação. Para Cole a sociedade é vista como um complexo de associações e, a nível local o indivíduo aprende a democracia.

Pateman faz críticas aos teóricos contemporâneos, pois segundo a autora desprezaram a relevância dos teóricos clássicos para o papel da participação em uma democracia viável.

Na teoria participativa o argumento é de que, com efeito, aprendemos a participar, participando, e o sentimento de eficácia tem mais probabilidade de se desenvolver em um ambiente participativo. Além disso, a experiência em uma estrutura de autoridade participativa poderia ser efetiva na diminuição da tendência para atitudes não democráticas por parte do indivíduo, como a apatia política.

Segundo Pateman (1992, p. 142), o baixo nível de demanda por participação em níveis mais altos no local de trabalho poderia ser explicado, pelo menos em parte, como um efeito do processo de socialização. A falta de estímulo para que o indivíduo participe no interior do local do trabalho, poderia conduzir a ideia de que a participação nos níveis mais altos seria inatingível para muitos trabalhadores. Desta forma, seria eficaz a participação se iniciar a nível local.

Somente se o indivíduo tiver a oportunidade de participar de modo direto no processo de decisão e na escolha dos representantes nas áreas alternativas é que ele pode esperar ter qualquer controle real sobre o curso de sua vida ou sobre o desenvolvimento do ambiente em que ele vive. (PATEMAN, 1992, p. 145-146)

Na conclusão de Pateman, para que exista uma forma de governo democrática é imprescindível à existência de uma sociedade participativa, ou seja, uma sociedade na qual todos os sistemas políticos tenham sido democratizados e a socialização possa ocorrer em todas as áreas.

Função educativa da participação de Pateman e a função educativa dos Sindicatos:

Segundo depreende-se da obra de Pateman (1992), uma das funções da participação é seu efeito educativo, em sentido amplo, preparando o indivíduo para compreender questões nacionais, a partir da análise de situações cotidianas, sobre as quais teria maior possibilidade de opinar. Sendo assim, a participação a nível local educa e prepara o indivíduo para ampliar seus horizontes, do pensar individualista para o coletivo, para o bem comum.

O sindicato também exerce esse papel, de preparar o indivíduo tanto para a formação profissional, quanto para a formação de novos líderes sindicais. Nesse sentido:

A função educacional do sindicato diz respeito à formação sindical, a qual, em sentido mais amplo, refere-se a tudo aquilo que prepare pessoalmente os trabalhadores para melhorar sua condição como grupo. [...] A falta de capacitação das lideranças sindicais prejudica uma adequada atuação coletiva. Nesse sentido é necessário preparar os filiados ao sindicato para dirigi-lo politicamente e financeiramente e para realizar negociações coletivas de trabalho vantajosas para os trabalhadores. (FIORAVANTE, 2008, p. 106 e 109)

Desta forma, a estrutura do sindicato deve ser participativa e democrática, o que irá “favorecer a aprendizagem ativa ou participativa” [...] para que os participantes “não se tornem receptores passivos ou silencioso do conhecimento” (FIORAVANTE, 2008, p. 1010).

O papel educativo do sindicato é desempenhado em seu aspecto amplo, por meio de processos participativos, e em aspecto estrito, com a realização de cursos de capacitação. No Brasil, a partir de 1975, os sindicatos passaram a se organizar para oferecer cursos supletivos e formação voltada ao próprio interesse sindical. Ou seja, à luz da teoria de Pateman, o sindicato cumpre papel educacional e participativo.

No plano estadual existem as Secretarias de Formação das CUTs Estaduais (SEF/CUT), que estabelecem Encontros Estaduais de Formação e o Plano Estadual de Formação. Em âmbito local existem as secretarias de formação dos sindicatos e os planos microrregionais/locais de formação. Ademais, a CUT possui sete escolas de formação sindical: Escola Amazônia, Escola Chico Mendes, Escola Centro Oeste, Escola Nordeste, Escola 7 de Outubro (com sede em Belo Horizonte), Escola São Paulo e Escola Sul (com sede em Florianópolis). (FIORAVANTE, 2008, p. 118)

Máxima participação de Pateman e as estruturas dos Sindicatos:

Pateman (1992), em sua obra, destaca a ideia de Cole de que é preciso ampliar o máximo de participação, partindo-se de pequenos núcleos, formados a nível local, para a consolidação da participação a nível nacional. Neste aspecto, é possível identificar que a estrutura sindical no Brasil se adéqua a esse modelo. Devido ao princípio da unicidade, não poderá haver mais de um sindicato por base territorial, a qual não poderá ser menor que a de um município. Esses vários sindicatos locais poderão filiar-se a uma Federação, reunião de sindicatos de idênticas categorias, que por sua vez se vinculará a uma Confederação, reunião de Federações de mesma categoria. Todos estes, poderão, ainda, se vincularem a uma Central Sindical, reunião de categorias diversas, de estrutura independente. Tudo funcionaria muito bem, partindo-se do pressuposto participativo de Pateman, essas células locais de trabalhadores aglutinadas para formação de um órgão de porte nacional deveriam se tornar aptas e independentes da classe patronal e do Estado para a defesa dos interesses de seus associados.

Constituição Federal: Democracia e suas ferramentas.

O texto Constitucional, em seu primeiro artigo, traz expressamente que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito. Em diversos Títulos e Capítulos da Carta Magna é possível identificar direitos, garantias e ferramentas para que a Democracia não fique apenas no plano da abstração, e, sim, formalmente aplicada e vivenciada por seus cidadãos. No Preâmbulo da Constituição – que apesar de não possuir força normativa, é dotada, segundo o STF, de relevância política, pois transparece a ideologia do constituinte – é possível identificar muitos dos requisitos que caracterizam uma democracia:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil. (BRASIL, 1988)

A Constituição Federal nos assegura direitos políticos, os quais garantem o exercício do sufrágio universal, pelo voto direto e secreto. Garante, ainda, a igualdade de todos perante a lei, direito de liberdade e expressão. Os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, segundo o texto constitucional, são independentes e harmônicos, e a fiscalização é exercida por mecanismos de freios e contrapesos.

O processo democrático pressupõe participação ativa da população e, nesse aspecto, a Constituição assegura a possibilidade de propositura de Projeto de Lei de iniciativa popular; a realização de plebiscito e referendo; liberdade de associação e filiação partidária; capacidade eleitoral passiva e ativa; orçamento participativo na esfera municipal; garantia da publicidade e transparência nos gastos orçamentários, dente outros.

A liberdade de associação profissional ou sindical é uma ferramenta democrática e, conforme expresso no inciso III, do art. 8º da Constituição Federal “ao sindicato cabe à defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas” (BRASIL, 1988).

Conforme defendido por Ferreira (2013) a defesa exercida pelos sindicatos se estende desde a negociação coletiva às ações políticas afirmativas visando à proteção do trabalhador:

Dentre as acepções existentes para a palavra defesa destaca-se a que significa a promoção de ações administrativas, políticas ou judiciais através das quais se busque obter para o trabalhador, interesses individuais homogêneos ou coletivos. Assim, além da legitimação processual conferida pela Constituição ao sindicato para a defesa de direitos já criados, o art. 8º, III e VI, também atribui a tal ente coletivo a competência para discutir, negociar e obter para o trabalhador o objeto de seus interesses individuais homogêneos ou coletivos. (FERREIRA, 2013, p. 205-206).

Origens dos Sindicatos no Brasil:

No Brasil, registros históricos revelam que, mesmo antes da independência, algum tipo de organização sobre determinado ofício já existia. Por volta do ano de 1808, com o surgimento da liberdade industrial e a criação do Banco do Brasil, movimentos sindicais surgiram. Entretanto, na Constituição do Império, de 1822, não havia dispositivos voltados para os direitos sociais do trabalhador.

A Constituição Republicana, de 1889, inspirada na norte-americana, apesar de não regulamentar direitos sociais do trabalho, permitia a liberdade de associação, fato que favoreceu o surgimento de associações com finalidades trabalhistas.

Um dos primeiros cuidados foi o de eliminar quaisquer entraves à liberdade de contratar, trazendo uma garantia fundamental às aspirações sindicais. (MELLO, 2005, p. 95)

A primeira norma oficial sobre direito sindical no Brasil, surge com a edição do Decreto Legislativo n.º 970, de 06 de janeiro de 1903, facultando aos profissionais de agricultura e indústria se organizarem em sindicatos para a defesa de seus interesses. (MELLO, 2005).

Os primeiros congressos operários realizaram-se em 1906 e 1913. Houve várias greves, e a de 1917 foi a mais significativa pela mobilização operária. Entretanto, devido a campanhas anti-sindicalistas e à repressão oficial com reflexos que se prolongariam em anos vindouro, o movimento operário teve sentido esvaziamento com a expulsão de estrangeiros de 1907 a 1921. O III Congresso Operário realizado em São Paulo em 1920 foi um evento marcado pela confusão interna e indefinição de metas. (MELLO, 2005, p. 96-97)

Na fase intitulada “República Nova”, com Getúlio Vargas, a organização sindical foi institucionalizada e direitos sociais do trabalho foram estabelecidos:

O Estado, então, elaborou uma política social baseada na ideologia da integração das classes trabalhistas e empresariais, organizando, sob a forma de categorias por ele estabelecidas, um plano chamado de enquadramento sindical, disciplinando leis com direitos específicos de cada profissão. (MELLO, 2005, p. 98)

Em linhas gerais, dessa forma se deu o surgimento do movimento pró organização sindical no Brasil, que em 1964, devido ao golpe militar, sofre uma ruptura em sua expansão institucional e, a partir de 1985, ressurge com a fase da redemocratização, a qual culminou com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, no ano de 1988.

Funções dos Sindicatos:

Sindicatos podem ser formados por trabalhadores ou empregadores. Tanto no sindicato composto por associação de trabalhadores de um determinado seguimento econômico ou trabalhista, quanto nos sindicatos patronais, de determinada atividade empresária, o objetivo é a defesa dos direitos de seus associados, sejam interesses econômicos, profissionais, sociais ou políticos. Além dessas funções, os sindicatos também cumprem papel educativo entre seus associados com a realização de palestras, reuniões, cursos e congressos, visando o fortalecimento da categoria. Os sindicatos patronais e de empregados também se organizam em movimentos, junto ao Congresso Nacional, na defesa por medidas legislativas benéficas a seus associados e, quando necessário, se opõem às meditas desfavoráveis aos interesses dos representados.

Para um desempenho satisfatório, os sindicatos devem investir na formação de seus associados, tornando-os aptos a assumir funções dirigentes na estrutura da entidade.

Relações entre os Indivíduos e as Estruturas de Autoridades no Ambiente em que interagem:

Em sindicato os indivíduos se associam, formando um grupo coeso, para a defesa de seus interesses. Mantidos financeiramente por contribuições de seus associados, os sindicatos podem representar, juridicamente, seus sindicalizados em ações de interesse coletivos e direitos individuais, são legítimos para a instauração de Dissídios Coletivos de Trabalho, no qual poderá compor acordo junto à entidade patronal e, posteriormente, homologar judicialmente o acordo formado. São responsáveis pela organização do movimento grevista. Devido à possibilidade de constantes embates divergentes do posicionamento patronal, aos dirigentes sindicais são asseguradas algumas garantias, que lhes proporcionam independência frente às estruturas de autoridade da empresa, conforme assegurado no inciso VIII, do art. 8º da Constituição Federal:

VIII - é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei. (BRASIL, 1988)


Teoria de Mayhew:

David Mayhew (1974) analisa o funcionamento Parlamentar partindo de três premissas: Primeira, os Parlamentares buscam a reeleição como objetivo maior. Segunda, o Congresso não tem Partidos Fortes e, sendo assim, o Parlamentar atua de forma individualista. Neste aspecto, cumpre destacar que o autor considera como “partidos fortes” os comparados aos partidos da Europa, de lista fechada. Um sistema de lista aberta, proporciona alto grau de autonomia, favorecendo o surgimento de partidos “fracos”. Terceira, o sistema distrital majoritário molda a atividade e a atuação parlamentar.

Quanto à adequação do cenário brasileiro à teoria de Mayhew, especificamente na Câmara dos Deputados, somente não se aplica os termos da terceira premissa, uma vez que para elegermos os Deputados Federais é adotado o sistema proporcional de lista aberta (NICOLAU, 2012. p. 60) e não o sistema distrital majoritário.

As duas primeiras premissas revelam-se aptas a explicar o funcionamento parlamentar pátrio. Como não há vedação à reeleição para o Legislativo, a busca pela manutenção do cargo é uma realidade e figura como o primeiro objetivo entre os pares. Os Partidos no Brasil não são fortes, resultado do sistema de lista aberta associado à possibilidade de livres coligações. Pela adoção desse conjunto, embora o voto seja dado ao partido, a real competição eleitoral ocorre entre as figuras dos candidatos e, aos olhos da maioria do eleitorado, o voto foi dado a determinado político e não à lista partidária. Para ser considerado eleito, o partido ou coligação do candidato deverá atingir a cláusula de barreira, ou seja, o quociente eleitoral e, individualmente, o candidato deverá obter votos suficientes para se classificar para uma cadeira dentro do partido ou coligação. Essa combinação gera ao Deputado a convicção de que foi eleito pelas próprias forças e, consequentemente, acarretará maior individualismo em sua atuação.

Segundo Mayhew (1974), o Parlamentar, buscando seu objetivo maior, amparado pela estrutura do Parlamento, se dedicará no Congresso a três atividades: publicidade, busca de crédito e tomada de posição. A publicidade envolve a criação de uma imagem favorável entre os eleitores, por meio de matérias de pouco conteúdo substancial, sem entrar em temas polêmicos. A busca por crédito visa gerar a crença de que o Parlamentar é o responsável por movimentar o Governo a fazer algo desejado pelo eleitor. Tomada de posição está ligada ao anúncio público de julgamento sobre algo de interesse do eleitor em Plenário e em pronunciamentos, por exemplo.

Em consequência às três supracitadas motivações, segundo Mayhew (1974), teremos no Parlamento: Morosidade, gerada pelo excessivo cuidado com a reeleição; Particularismo, movido por uma visão voltada para questões locais; Deferência a grupos organizados e mobilizados; e Simbolismo na atuação, ou seja, protocolos e representações voltadas para o público, o eleitor.

Conexão entre participação sindical e mobilização organizada no Congresso Nacional:

A literatura demonstra que o processo de formação das leis deve expressar a vontade do povo, neste caso representado pelos parlamentares na Câmara dos Deputados, e a vontade do Estado, representado pelo Senado Federal. (FERREIRA FILHO, 2012).

É necessário, portanto, ter sido legitimado democraticamente para o exercício da função legislativa e isso assegura qualidade na democracia, pois o Congresso Nacional deve se manter aberto ao debate, às manifestações dos cidadãos, os quais, por meio do sufrágio universal, exercem o poder de reconduzir ou não seus representantes, conforme destaca Ferejonh (2003):

Com efeito, a contestação política é condição necessária para a realização plena dos valores democráticos. O Legislativo produz leis que obrigam a todos e, portanto, cada um de nós participa da decisão de quem deve ocupar assento no Legislativo. Temos direito de monitorar debates legislativos, de informar e influir nas decisões e de exigir que legisladores se responsabilizem perante nós pelos seus atos na s próximas eleições. [...] Nesse sentido, é de esperar que a política no processo legislativo seja contenciosa, parcial e ideológica. (FEREJOHN, 2003, grifo nosso).

Apesar de o Parlamento estar aberto e atento as demandas da população, como explicado por Mayhew, os movimentos organizados tendem a lograr êxito em detrimento das manifestações espaças individuais. Isso explica o fato de um grupo desmobilizado, mesmo estando em maior número, como por exemplo “os consumidores do Brasil”, não ter a mesma representatividade, perante os parlamentares, de um grupo coeso, ainda que menor, como por exemplo a “Associação da Indústria Têxtil”.

Partido desta lógica, os trabalhadores mobilizados em Organizações Sindicais teriam maior deferência, junto aos Deputados, do que uma grande massa de trabalhadores de áreas diversas e desmobilizados.

O sindicato, segundo Fioravante (2008), é “um grupo participativo, que compartilha, de modo indireto, da responsabilidade pelo exercício do poder estatal.” (FIORAVANTE, 2008, p. 101)

Nesse sentido, podemos destacar que a Central dos Sindicatos Brasileiros – CSB, a qual concentra líderes de sindicatos de trabalhadores de todo o Brasil, é presença constante na Câmara dos Deputados quando entram em Pauta projetos que possam implicar alterações nos direitos e garantias trabalhistas. Esta atuação, dos Dirigentes Sindicais, envolve desde a entrega de manifestos nos Gabinetes, a busca por Parlamentares para divulgação da opinião dos sindicalizados, à convocação dos associados para manifestações públicas.

A defesa de reajustes salariais e de melhorias de condições de trabalho continuará sempre a integrar as ações sindicais, mas essas ações não se podem limitar a isso, pois as entidades devem perseguir, cada vez mais, renovar seu papel diante das grande transformações que se verificam na sociedade. Esse perfil desenvolve-se de forma a buscar a integração da própria cidadania na ação sindical. Alia-se à função de representação a função política, que não se confunde com uma atuação partidária, mas que se utiliza de todas as formas políticas para poder contribuir com as mudanças sociais. (LAIMER, 2003, p. 113, grifo nosso)


Conclusão:

Partindo-se do pressuposto Constitucional de que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente” (BRASIL, 1988), podemos concluir que a população deve exercer papel de destaque no cenário democrático Pátrio, com participação ativa e organizada, uma vez que a apatia política representa verdadeiro risco a um dos pilares democráticos, a participação.

Uma forma de ampliar essa participação, para além das manifestações nas urnas, à luz da teoria de Pateman, seria a formação de grupos coesos em torno de uma pauta, seja trabalhista, estudantil ou empresarial. A constituição de pequenos núcleos locais, coordenados, formaria parte de um conjunto de participação nacional. A atividade sindical se revela meio apto para este fim, pois estimula a participação a nível local e coordena seus associados para o encaminhamento de demandas aos poderes do Estado. Conforme abordado neste trabalho, o sindicato também cumpre papel educativo, no seu aspecto amplo e estrito. No sentido amplo, ensina ao trabalhador a pensar questões políticas aplicadas ao cotidiano de seu conhecimento, partindo de demandas individuas que o leva a compreender o pensar coletivo, em prol do grupo de trabalhadores a que pertence. No sentido estrito, o sindicato também cumpre seu papel educativo formal, disponibilizando cursos voltados não só para a capacitação laboral, como para a formação de novos líderes sindicais.

Por meio dos sindicatos é assegurado ao trabalhador um canal de comunicação entre empregados e empregadores, visando minimizar a relação de subordinação perante a estrutura do poder patronal. Fato também defendido por Patmana, porém, em termos mais amplos do que a relação vigente entre sindicato e empregador, pois em sua visão as estruturas de poder deveriam ser flexibilizadas ao ponto do trabalhador participar, efetivamente, da gestão da indústria.

Segundo a teoria de Mayhew, a atuação parlamentar é direcionada para a viabilização de seu maior objetivo, a reeleição. Conquistar a simpatia de grupos fortes e organizados pode assegurar, ao parlamentar, vantagem na corrida pela reeleição. De outro lado, quanto maior e coeso o grupo, melhores são as chances de aprovação da agenda legislativa de seu interesse. A união dos trabalhares em sindicatos, federações, confederações e centrais nacionais, favorece a viabilização de apoio junto ao legislativo e faz ser ouvida, no âmbito nacional, às demandas discutidas na base territorial do sindicato. Partindo-se dos pressupostos de Mayhew, tem acesso eficaz junto a seus representes no legislativo, os que se mobilizam em grupo, de forma organizada. Portanto, é a organização sindical ferramenta adequada para este fim.

O sindicato oferece um ambiente favorável ao desenvolvimento do processo participativo democrático e seu funcionamento reúne muitos dos requisitos participativos defendidos por Pateman, pois proporciona ao trabalhador a oportunidade de participar em áreas alternativas, capacitando-o a avaliar melhor a conexão entre as esferas públicas e privadas.

Da comunhão da teoria de Pateman com a de Mayhew, conclui-se que o máximo de participação é um movimento viável que impulsiona o funcionamento parlamentar, o qual, visando à reeleição, e na busca por publicidade e tomada de posição, se mostrará atento aos grupos organizados de mobilização.


Referências:

AROUCA, José Carlos. Repensando o sindicato. – São Paulo: LTr, 1988.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

FEREJOHN, John. Judicializing politics, politicizing law. HOOVER DIGEST 2003 – N.º 1. Winter Issue. Tradução: Thiago Nasser, revisão de José Eisenberg. CEDES/IUPERJ e pela ENM/AMB de 20 a 30 de junho de 2005. Disponível em: <http://www.cis.puc-rio.br/cis/cedes/banco%20artigos/Filosofia%20e%20Teoria%20do%20Direito/ferejohn.pdf >. Acesso em: 08 de junh. 2016.

FERREIRA, Dâmares. O poder normativo coletivo: a promoção da igualdade de oportunidades por meio de ações afirmativas trabalhistas. – Curitiba: Juruá, 2013.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Do processo legislativo. 7ª Ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.

FIORAVANTE, Tamira Maira. Sindicato, educação e liberdade. – São Paulo: LTr, 2008.

LAIMER, Adriano Guedes. O novo papel dos sindicatos. – São Paulo. LTr, 2003.

MAYHEW, David R. Congress: The Electoral Connection. New Haven. Yale University Press. 1974.

MELLO, Lais Corrêa de. Liberdade Sindical na Constituição Brasileira. – São Paulo: LTr, 2005.

NICOLAU, Jairo. Sistemas Eleitorais. – 6.ed. – Rio de Janeiro: Ed. FGV 2012.

COELHO, Fábio Alexandre. Processo Legislativo. 1ª Ed. – São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2007.

PATEMAN, Carole. Participação e Teoria Democrática / Carole Pateman; tradução de Luiz Paulo Rouanet. – Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1992.


Autor


Informações sobre o texto

Trabalho final da grade Instituições Políticas do curso de Pós-Graduação em Processo Legislativo do Centro de Formação da Câmara dos Deputados - CEFOR.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, Lílian Reny. Deferência do Legislativo a grupos organizados: o papel do sindicato dos trabalhadores. Análise à luz das teorias de Pateman e Mayhew.. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5606, 6 nov. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/70069. Acesso em: 24 abr. 2024.