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Da incidência de IPTU sobre imóvel urbano declarado em parte como área de preservação permanente com nota non aedificandi

Da incidência de IPTU sobre imóvel urbano declarado em parte como área de preservação permanente com nota non aedificandi

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Refletimos sobre o julmagento do STJ que definiu a possibilidade de incidência do imposto predial territorial urbano em área de preservação permanente (APP).

Do Imposto Predial Territorial Urbano

Como se sabe, o imposto predial territorial urbano é espécie tributária de competência municipal com previsão expressa na Constituição Federal no artigo 156, inciso I verbis:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

I - propriedade predial e territorial urbana;

E nesse sentido, tem sua especificação delimitada no artigo 32 do Código Tributário Nacional, verbis:

Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.

§ 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:

I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;

II - abastecimento de água;

III - sistema de esgotos sanitários;

IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;

V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.

§ 2º A lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior.

Vê-se que, da dicção do ‘caput’ do artigo 33, o fato gerador do IPTU é i) a propriedade; ii) o domínio útil; iii) posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física; iv) localizado na zona urbana do Município.

Tais elementos, por si só, caracterizam os requisitos do fato gerador da exação. Ocorre que há situações em que a propriedade de imóvel é limitada eventualmente por restrições legais ou contratuais e questiona-se se nessas situações o IPTU ainda tem sua incidência.


Da incidência de IPTU sobre parcela de imóvel definido como área de preservação permanente

Sobre tal questão, o Superior Tribunal de Justiça REsp 1482184/RS definiu que o fato de o imóvel, em sua parte ou em sua totalidade, inserir-se em área de preservação permanente, não afasta a incidência do Imposto Predial e Territorial Urbano. Isso porque, segundo o julgado, remanesce a integridade do fato gerador previsto no artigo 33 do Código Tributário Nacional.

Embora seja ônus a ser suportado pelo proprietário do imóvel, tal restrição não inviabiliza a disposição e utilização do bem tal como ocorre em desapropriações.

Diante de tais fatos, conforme mencionado alhures, não há violação ao disposto no artigo 32 do Código Tributário Nacional, que trata sobre o fato gerador do tributo, isso porque, se não houver lei em sentido estrito que conceda o benefício isentivo a imóveis localizados em áreas de preservação permanente, não cabe a possibilidade do judiciário criar benefício tributário por analogia.

Até porque os elementos caracterizadores do fato gerador do IPTU remanescem, mesmo com as limitações administrativas e legais impostas sobre o bem.


Da incidência de IPTU sobre parcela de imóvel considerado área non aedificandi

No mesmo sentido o entendimento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça aplica-se, do mesmo modo, a áreas urbanas consideradas non aedificandi.

Por non aedificandi entendem-se os imóveis com limitações ou restrições de construção por força de atos administrativos, legais ou contratuais.

Ocorre que somente na hipótese de limitação geral e total sobre o bem imóvel, como se nota em situações análogas à desapropriação, é que se pode eximir o proprietário da exação tributária.

Isso porque tais limitações não afastam a propriedade do bem imóvel: a propriedade sobre o bem não é perdida, apenas ocorre a limitação para o cumprimento de determinadas funções a que o bem é limitado, como a ambiental e social.


Da comprovação do esvaziamento da propriedade em sede de Execução Fiscal

Nada impede o proprietário, ou o possuidor, sujeito passivo do Imposto Predial Territorial Urbano, de comprovar a inserção de seu imóvel em áreas de preservação permanente ou até mesmo o esvaziamento de sua propriedade por força de eventual desapropriação.

No primeiro caso, o sujeito passivo pode, eventualmente, ser beneficiário de alguma lei isentiva que altere a alíquota ou a base de cálculo para cálculo do imposto, em caso da localização do bem imóvel estar nesses espaços.

No segundo caso, a desapropriação pode ter ocorrido de forma indireta ou direta, e, eventualmente, ter havido falha do fisco na cobrança desta exação, uma vez que o proprietário ou possuidor foi destituído do poder que exercia sobre o bem, esvaziando por completo o direito de posse ou propriedade.

Em ambos os casos, o autor deverá valer-se de processos administrativos ou de defesa judicial, com uma certa ressalva nesta última hipótese.

Isso porque, caso o executado esteja sendo demandado em uma execução fiscal, se, eventualmente, lançar mão do instituto da exceção de pré-executividade para tentar fazer prova do benefício isentivo ou do esvaziamento de sua propriedade, terá frustrada sua tentativa.

É que, conforme dispõe a súmula 393 do Superior Tribunal de Justiça, não cabe em exceção de pré-executividade a dilação probatória para comprovação dos requisitos da isenção tributária, verbis:

Súmula 393/STJ: A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória.

Por fim, este é o entendimento já consolidado do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o tema, a fim de ilustrar o aqui defendido:

CDA Nulidade - Execução fiscal Municipalidade de Mogi das Cruzes IPTU dos exercícios de 2012 a 2014 - Vícios formais não verificados - Presença dos requisitos exigidos pelos art. 2º, § 5º, da Lei 6.830/80 e art. 202 do CTN - Ausência de prejuízo ao contraditório e à ampla defesa Precedentes do STJ e desta Câmara Possibilidade, ademais, de substituição até a prolação da sentença, vedada, unicamente, a alteração do sujeito passivo Súmula 392 do STJ Alegação afastada. IMPOSTO IPTU Nulidade - Afirmação de falta de notificações a respeito do procedimento administrativo e lançamento do crédito tributário Providência desnecessária - Tributo cujo lançamento ocorre de ofício, no início de cada ano, dispensando prévia instalação de procedimento administrativo respectivo e de notificação do contribuinte acerca do lançamento - Imposto que decorre da propriedade imobiliária, devido a cada exercício, não militando em favor do contribuinte a alegação de desconhecimento do lançamento e do seu dever de pagar Alegação afastada. ISENÇÃO IPTU Alegação de tratar-se de imóvel localizado em área de preservação ambiental permanente - Benefício concedido por lei municipal que não constitui direito adquirido, mas é anual e condicionado, exigindo requerimento administrativo e preenchimento de requisitos para sua fruição, conforme estabelecem os artigos 3º, 176 e 179 da Lei nº 5.000/99 - Questão debatida que não é unicamente de direito e não pode ser analisada em sede de exceção de pré-executividade, em substituição aos embargos do devedor Exceção corretamente rejeitada Decisão mantida por seus próprios fundamentos Recurso de agravo de instrumento desprovido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2158079-53.2017.8.26.0000; Relator (a): FORTES MUNIZ; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Público; Foro de Mogi das Cruzes - Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 29/08/2018; Data de Registro: 29/08/2018). (g.n.)

Portanto, como se vê, para a obtenção do benefício da isenção tributária municipal acerca do IPTU sobre imóveis localizados em áreas ambientais de preservação permanente devem ser observados os seguintes requisitos: i) lei municipal que concede a isenção; ii) localização do bem em área de preservação permanente; iii) não impedimento completo do direito de propriedade sobre o imóvel; iv) impossibilidade de sua comprovação por meio de exceção de pré-executividade.


Referências Bibliográficas:

ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 12. Ed. JusPodivm. Salvador. 2018

CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Incidência de IPTU sobre imóvel parcialmente situado em APP com nota non aedificandi. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/64b3ec1fdfacead70c3a9bd77d824306>.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Guilherme Novaes de. Da incidência de IPTU sobre imóvel urbano declarado em parte como área de preservação permanente com nota non aedificandi. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6450, 27 fev. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/88748. Acesso em: 25 abr. 2024.