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Da exceção à objeção de pré-executividade: a atualidade da defesa pontiana à luz da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça

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Abordam-se, inicialmente, alguns temas do processo de execução imprescindíveis ao entendimento da exceção de pré-executividade. Ao final, apresentam-se os reflexos das recentes alterações legislativas.

RESUMO

O presente trabalho tem por escopo abordar os principais temas acerca da exceção de pré-executividade, instituto ainda sem previsão legal, e que se consubstancia numa espécie de defesa à execução forçada, que, apesar de quatro décadas de seu primeiro uso em nosso país, ainda não resta pacificada jurisprudencial e doutrinariamente em muitos de seus aspectos. O trabalho aborda, inicialmente, alguns temas do processo de execução imprescindíveis ao entendimento do instituto objeto deste trabalho, em seguida, adentra especificamente no tema, e, ao final, apresenta os reflexos das recentes alterações legislativas no estudo do instituto. Através de pesquisa bibliográfica, analisou-se, à luz da doutrina processual civil brasileira, bem como da jurisprudência dos tribunais superiores, notadamente do STJ, temas como o acolhimento e alcance da exceção de pré-executividade, realçando-se, sobretudo, para que lado aponta doutrina e jurisprudência na tentativa de pacificação do instituto.

Palavras-chaves: Doutrina. Jurisprudência. Execução. Exceção de pré-executividade.


1 INTRODUÇÃO

O Código de Processo Civil pátrio, ao disciplinar o processo de execução, prevê apenas uma possibilidade de defesa do executado ao feito executivo, qual seja, os embargos do devedor, regulamentado por meio dos artigos 736 a 747, do CPC. Ocorre que o supradito código condiciona os embargos à garantia do juízo, ou seja, à realização da penhora ou depósito.

Todavia, o instituto objeto do presente trabalho acadêmico, criação da doutrina e jurisprudência, abre a possibilidade de defesa do devedor sem condicioná-la à prévia garantia do juízo.

Reveste-se de importância o estudo deste instituto principalmente por dois motivos: o primeiro, por ainda não haver disciplina legal expressa, várias são as manifestações da doutrina e jurisprudência com o intuito de regulamentar o instituto. Diante disso, verifica-se a ocorrência de inúmeras divergências no seu tratamento, notadamente no que tange à sua natureza jurídica, legitimidade, prazo, matérias argüíveis, e até mesmo a sua nomenclatura; o segundo, ratificando a importância do seu estudo, é a crescente utilização prática do instituto, porquanto, devido à carência de regulamentação legislativa expressa, observam-se eventuais equívocos na sua utilização, bem como no seu julgamento.

Iniciaremos o estudo tratando superficialmente da função executiva da jurisdição, com o intuito de situarmos o meio em que se manifesta o instituto objeto do presente trabalho. Ao final, abordaremos os reflexos das mais recentes novidades legislativas no estudo do tema.


2. ATIVIDADE JURISDICIONAL DE COGNIÇÃO E EXECUÇÃO

A existência de conflitos de interesse na sociedade, seja qual for o motivo de seu aparecimento, gerou a necessidade de resolvê-los. A auto-tutela, conhecida popularmente como justiça de mão própria, e a auto-composição mostraram-se ineficientes para a resolução dos conflitos.  Logo, surge o processo, a hetero-composição, como único método institucional eficaz para a solução dos conflitos.

Evoluída a sociedade, esta achou por bem atribuir ao Estado a função jurisdicional. O Estado, diante de um conflito de interesses (lide) posto a seu manto de atuação, primeiro conhece os fatos e o direito postos, depois manifesta a sua vontade; e, finalmente, se a parte vencida não se submete, espontaneamente, à vontade manifestada, age, de maneira prática e mediante força, para realizar o comando judicial.

A esse respeito, discorre com brilhantes palavras Humberto Theodoro Júnior, vejamos:

Há, pois, no processo judicial a atividade de conhecimento e a de execução, formando os dois grandes capítulos da sistemática jurídica de pacificação social, sob o império da ordem jurídica, cujo objetivo maior é a eliminação das lides ou litígios no relacionamento humano, para tornar possível a vida em sociedade.

Embora haja uma seqüência lógica entre o conhecer e o executar, nem sempre a atividade jurisdicional reclama a conjugação dos dois expedientes, de sorte que muitas vezes é bastante a declaração de certeza jurídica para eliminar um litígio. E outras tantas, a certeza em torno do direito da parte já está assegurada, por certos mecanismos, que dispensam o processo de conhecimento e permitem a utilização direta da execução forçada em juízo. (JÚNIOR, 2003, p. 03).

Destarte, no processo de conhecimento, o Estado-Juiz tende a exercer a função de cognição, conhecendo os fatos e o direito posto à sua decisão, ao passo que no processo de execução, já parte da certeza do direito do credor, atestada pelo título executivo apresentado. Nesta perspectiva utiliza-se o Estado-juiz das regras do processo de execução.

O processo de execução é o instrumento por meio do qual o credor de um direito a uma prestação inadimplida requer ao Estado que atue seu poder jurisdicional em face do devedor da prestação, invadindo o patrimônio deste, contra a sua vontade, para satisfazer o crédito daquele, invasão esta que se chama execução forçada. Ou seja, o processo de execução é o instrumento por meio do qual o Estado, atuando sua jurisdição, realiza a execução forçada.

Extraímos, do conceito acima, dois objetos distintos, quais sejam: processo de execução e execução forçada.  Esta diferenciação também é dada por Humberto Theodoro Júnior (2003, p. 07), senão vejamos as lições de um dos mais brilhantes e mais conhecidos processualistas de nosso país:

Pode-se distinguir entre processo de execução e execução forçada: o processo de execução apresenta-se como o conjunto de atos coordenados em juízo tendentes a atingir o fim da execução forçada, qual seja, a satisfação compulsória do direito do credor à custa de bens do devedor. Esse processo, tal como se dá com o de conhecimento, é, em si mesmo, uma relação jurídica continuativa de direito público, que vincula devedor, credor e Estado, na pessoa do juiz ou Tribunal. Trata-se, pois, do continente da atividade executiva em juízo.

Por execução forçada, outrossim, considera-se o conteúdo do processo de execução, que consiste na realização, material e efetiva, da vontade da lei através da função jurisdicional do Estado.

Do conceito e distinção acima, já vislumbramos o fim da execução forçada, que é a satisfação compulsória do direito do credor à custa de bens do devedor.

Localizado no segundo dos quatro livros do Código de Processo Civil pátrio, o processo de execução está regulamentado pelos artigos 566 a 795. Conforme se depreende da leitura desses dispositivos legais, o procedimento utilizado para realização do fim da execução forçada é distinto do procedimento utilizado na atividade jurisdicional cognitiva, porquanto na execução não mais nos deparamos com aquela dilação probatória encontrada no processo de conhecimento, já partimos, por vontade da lei, de uma declaração de certeza ou de acertamento da relação jurídica estabelecida entre credor e devedor, qual seja, o título executivo, o qual representa a materialidade do débito/crédito.

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Em regra, não há a necessidade de outra prova que não o próprio título, nem há audiência onde as partes apresentam suas provas, já se parte de uma certeza: existe um direito a uma prestação que esta sendo cobrado, e sem abrir, de início, a oportunidade de defesa, cita-se de logo o executado para pagar ou nomear bens a penhora, sob pena de serem penhorados bens suficientes para satisfazer o débito, caso o juiz não encontre algum problema, passível de conhecimento de ofício e o impeça de tomar a atitude citada. Só a partir da segurança do juízo (penhora ou depósito), é que é aberta a oportunidade de defesa, segundo a nossa legislação. 

Cumpre, aqui, fazer uma última observação. Dissemos, algumas linhas acima, que o processo de execução é o instrumento por meio do qual o Estado realiza a execução forçada. Contudo, em 24 de junho de 2006, data da entrada em vigor da Lei N.º 11.132 de 22 de dezembro de 2005, o processo de execução deixa de ser o único meio por onde se realiza a execução forçada, conforme veremos adiante.


3. REQUISITOS PARA REALIZAR TODA E QUALQUER EXECUÇÃO

O nosso Código de Processo Civil estabelece explicitamente a conjugação de dois requisitos necessários para realizar toda e qualquer execução, quais sejam: o título executivo, que pode ser judicial ou extrajudicial, e o inadimplemento. Outrossim, quanto ao primeiro requisito exige os atributos  da certeza, liquidez e exigibilidade.

Ressalte-se, contudo, que a execução forçada também se submete ao que podemos chamar requisitos gerais de toda ação, ou seja, aos pressupostos processuais e às condições da ação, igualmente ao que ocorre no processo de conhecimento.

 A esse respeito se manifesta Humberto Theodoro Júnior (2003, p. 29):

A relação processual há de ser validamente estabelecida e validamente conduzida até o provimento executivo final, para o que se reclamam a capacidade das partes, a regular representação nos autos por advogado, a competência do órgão judicial e o procedimento legal compatível com o tipo de pretensão deduzida em juízo, além de outros requisitos dessa natureza.

Para a execução forçada prevalecem essas mesmas condições genéricas, de todas as ações. Mas a aferição delas se torna mais fácil porque a lei só admite esse tipo de processo quando o devedor possua título executivo e a obrigação nele documentada já seja exigível (arts. 583 e 586).  (Grifos nossos)

Destarte, a execução esta subordinada a duas espécies de requisitos, que poderíamos chamar de requisitos genéricos e requisitos específicos. Os primeiros seriam os pressupostos processuais e as condições da ação, comuns a todas as ações; e os segundos, o título e o inadimplemento.

Como veremos adiante, é com base na falta ou no defeito de algum dos requisitos que se fundamenta o manejo da exceção de pré-executividade.


4. A CONTRIBUIÇÃO DE PONTES DE MIRANDA

Pontes de Miranda foi quem, no ano de 1966, abordou pela primeira vez a exceção de pré-executividade nos termos em que ela é conhecida atualmente, em célebre parecer por ele elaborado, quando contratado pela Companhia Siderúrgica Mannesmann.

À época, a supradita companhia foi alvo de vários pedidos de falência fundados em títulos executivos extrajudiciais eivados de nulidade, nulidade esta consubstanciada na assinatura falsa de um de seus sócios.

Não obtendo êxito no pedido de decretação de falência, em virtude da nulidade dos títulos reconhecida pelo Juízo da falência, os “credores” intentaram ação de execução, tomando por base os mesmos títulos executivos.

Ajuizada a ação de execução, a única forma da companhia se defender, questionando a existência válida dos títulos, seria por meio dos embargos do devedor, sendo necessário, para tanto, a garantia do juízo. Todavia, tal ato executivo, necessário para assegurar a defesa através dos embargos, prejudicaria o exercício regular das atividades da empresa executada, que devido à penhora não poderia dispor de seu patrimônio.

Em seu parecer, Pontes de Miranda ressaltou o reconhecimento pelo juízo da falência da falsidade dos títulos executivos, e, com base nisso, defendeu a desnecessidade da realização da penhora in casu para que o executado pudesse apresentar defesa, alegando, para tanto, que a falta de alguma das condições da ação executiva deveria ser conhecida de ofício pelo magistrado.


5. NOTAS  SOBRE A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE, OU SERIA OBJEÇÃO DE NÃO EXECUTORIEDADE?

O conceito do instituto em estudo sofreu transformações juntamente com o alargamento das matérias que podem ser levantadas através dele.

Conforme veremos em tópico específico acerca das matérias argüíveis por meio deste instituto, de início, o elemento comum às hipóteses de exceção de pré-executividade residia na iniciativa de conhecimento da matéria, que tocava ao juiz, originariamente, cabendo ao devedor suprir sua ocasional inércia, ou seja, só havia a possibilidade de argüir matérias de ordem pública, e por isso, conhecíveis de ofício pelo magistrado. Nesse período, constantes eram os conceitos que diziam ser o instituto uma espécie de defesa do executado, sem necessidade de garantia do juízo, na qual eram levantadas questões de ordem pública, conhecíveis de ofício pelo juiz. Esse, inclusive, é o posicionamento ainda adotado por Nelson Nery Júnior e Rosa Nery (1999, p. 1.184).

Contudo, esse não é o posicionamento que vem sendo adotado majoritariamente pela doutrina e jurisprudência, como bem alerta Araken de Assis (2002, p. 581), autor de uma das obras mais completas sobre o processo de execução.

Como se percebe, o campo de incidência se alarga, a partir desse expressivo julgado, para abranger exceções substanciais, que ao juiz é vedado conhecer de ofício [...]

 [...] Admitidas exceções substantivas, de regra vedadas ao conhecimento ex officio do órgão judiciário, desaparece o critério da iniciativa como elemento comum dessas questões. Examinando a casuística do assunto, porém, há um traço comum constante: o caráter restrito da prova admissível na exceção.

Destarte, podemos conceituar a exceção de pré-executividade como uma forma de defesa do executado ao processo de execução que é movido contra si, ainda sem previsão legal, que pode ser manejada independentemente da prévia garantia do juízo, exigindo-se a demonstração cabal do vício apontado, sem importar em aprofundamento na dilação probatória.

Afirma o professor Pablo Stolze, em obra conjunta com Rodolfo Pamplona (2004, p. 191), que ao perquirir-se qual a natureza jurídica de determinado instituto deve-se fazer uma simples pergunta: o que é isto para o direito?

Nesse diapasão, indaga-se: qual seria a natureza jurídica do instituto da exceção de pré-executividade?

Ora, pela própria definição do instituto aqui apresentada, já podemos dizer que a exceção de pré-executividade é uma espécie de defesa do executado. Ou seja, sua natureza jurídica é de defesa.

De Plácido e Silva (2001, p. 245), afirma:

Defesa. Na técnica processual, por defesa entende-se toda produção de fatos ou dedução de argumentos apresentada por uma pessoa em oposição ao pedido ou alegado por outrem, numa causa ou acusação.

Compõe-se, assim, de alegações que procuram destruir as pretensões de outrem, quando investem contra o direito, ou anular as acusações, quando são imputadas a alguém. (grifo nosso)

É unanimidade entre os doutrinadores que através da exceção de pré-executividade o devedor opõe-se ao processo que é movido contra si, ou seja, compõe-se de alegações que procuram destruir as pretensões do exeqüente.

Este, inclusive, parece ser o posicionamento de Pontes de Miranda, ao introduzir o instituto em nosso direito, por meio do Parecer n.º 95, onde afirmou: “Mesmo a respeito de execução de sentença, escrevemos: O conceito ‘embargos do executado’ não exaure o de defesa do executado”. (grifo nosso)

Mesmo os doutrinadores que não se detém na abordagem da natureza jurídica do instituto deixam transparecer a idéia aqui apresentada, senão vejamos:

Vem-se generalizando na linguagem processual o emprego da locução “exceção de pré-executividade” a propósito dos casos em que, conforme se tem admitido, o devedor (rectius: o executado) pode opor-se à execução sem necessidade de oferecer embargos [...]” (Barbosa Moreira, 1989, p. 119) (grifos nossos)

Além da adesão doutrinária, a jurisprudência também aponta nesse sentido, sendo certo que o Superior Tribunal de Justiça vem admitindo até mesmo a condenação do exeqüente em honorários de sucumbência quando a execução é extinta em virtude do acolhimento da exceção, conforme ensinamento de Geraldo Batista da Silva Júnior (2004, p. 23), o qual colaciona o seguinte julgado:

Execução – Exceção de Pré-executividade – Para ter direito aos honorários advocatícios resultantes da sucumbência, não é necessário que a defesa oposta pelo devedor em execução contra si proposta seja necessariamente articulada por via de embargos. São eles também devidos quando, em determinadas situações, como aquelas em que se discutem questões atinentes à admissibilidade do processo de execução e que se relacionam com os pressupostos processuais e condições da ação, essa mesma defesa prévia é feita via de exceção de pré-executividade nos próprios autos da ação. (Ap. s/Ver. 475.060-00/3, 7.ª Câm., j. 4/3/1997, rel. Juiz Oscar Feltrin, RT 740/351). (grifos nossos)

Esses posicionamentos, colacionados acima, clareiam, sobremaneira, o nosso entendimento. Com efeito, mesmo não tratando diretamente da natureza da exceção de pré-executividade, deixam transparecer facilmente a natureza de defesa do instituto.

Uma das questões mais controvertidas dentro do instituto ora em estudo é, sem sombra de dúvidas, a questão terminológica. Doutrinadores de renome não chegam a um consenso sobre a melhor terminologia a ser atribuída.

Das muitas nomenclaturas adotadas, três são as que mais se destacam, quais sejam: exceção de pré-executividade, objeção de pré-executividade, e, por último, objeção de não-executividade. Para uma melhor análise, estudaremos em separado os substantivos “exceção” e “objeção”, bem como seus complementos “pré-executividade” e “não executividade”.

Comecemos, portanto, analisando o substantivo “exceção”.  O Código de processo civil de 1932, vigente à época em que Pontes de Miranda criou o instituto, utilizava supradito substantivo em seu sentido amplo, para significar toda e qualquer defesa do réu. Contudo, no Código atual, a palavra “exceção” tem significado restrito, configurando apenas, rigorosamente, as de ordem processual e que dependem de provocação das partes, conforme se depreende da análise do art. 304.

A acepção adotada pelo Código de Processo, e adotada por grande parte da doutrina brasileira, que dá significado mais restrito a “exceção”, restringido-a as espécies de defesa que não podem ser conhecidas de ofício, fundamenta a alegação de imprecisão terminológica por parte de grandes doutrinadores como José Carlos Barbosa Moreira e Nelson Nery Júnior. Vejamos o que diz o primeiro acerca da utilização do termo:

Passemos ao substantivo “exceção”. Sem dúvida, cuida-se de palavra equívoca, que no correr dos anos tem sido empregada em sentidos diversos, para designar ora o gênero “defesa”, ora a espécie dotada de tal ou qual característica. A equivocidade, porém, é um mal, e tudo aconselha a que evitemos contribuir para perpetuá-la, ou pior, para agravá-la. [...]

Acontece que, das várias acepções atribuídas ao vocábulo “exceção”, uma faz jus, até por motivos históricos, à preferência dos estudiosos: a que denota a impossibilidade de conhecimento ex officio pelo juiz, com a correspondente criação, para o interessado, do ônus da alegação. [...] (Barbosa Moreira, 1989, p. 120-121)

Conquanto a falta de técnica em relação ao atual diploma processual, registre-se que a expressão “exceção” não esta de todo incorreta, pois tem sido usada historicamente com o significado de defesa, conforme atesta o supracitado Código de Processo Civil de 1939, bem como outros diplomas legais, dentre eles o Código Civil de 2002, que em vários dispositivos utiliza o termo “exceção” como sinônimo de defesa, a exemplo de seus artigos 190, 281, 294 e 837.

É com base nesse uso histórico do termo exceção, bem como pela adoção maciça da doutrina e jurisprudência deste termo, que autores do porte de Alberto Camiña Moreira (1998, p. 34) e Rita Dias Nolasco (2004, p. 193) defendem a manutenção da nomenclatura exceção de pré-executividade.

Em contraposição à “exceção”, que ventila apenas matérias que dependem de alegação das partes, a “objeção” tecnicamente significa o meio de defesa que se limita às matérias de ordem pública, e que, por isso, podem ser conhecidas de ofício pelo juiz. Com base no entendimento de que através do instituto em estudo só podem ser ventiladas matérias de ordem pública, Nelson Nery Júnior (1999, p. 1.184), sustenta a denominação objeção de pré-executividade.

Contudo, o campo de incidência deste instituto se alargou, a ponto de aceitar-se que, através dele, não apenas as matérias de ordem pública, e, portanto, conhecíveis de ofício pelo juiz, possam ser ventiladas, conforme veremos no tópico referente às matérias argüíveis em sede deste instituto, não mais sendo adequado a utilização desse termo. Nesse sentido, Rita Dias Nolasco:

Mas na verdade, além das matérias de ordem pública, através da exceção de pré-executividade também podem ser alegadas matérias que devem ser objeto de alegação da parte, desde que possam ser demonstradas de plano, sem a necessidade de dilação probatória. (Nolasco, 2004, pág. 191)

Passemos, agora, à análise dos complementos: “de pré-executividade” e “de não-executividade”.

José Carlos Barbosa Moreira (1989, p. 119) diz, com propriedade, que o substantivo abstrato “executividade”, indicando a qualidade daquilo que é executivo, refere-se aos substantivos título ou processo. Sendo assim, o prefixo “pré” os atingiria, levando a pensar em processo pré-executivo ou em título pré-executivo.

E complementa que tendo em vista que o que se alega pelo instituto é a falta de executividade do título ou do processo, ou seja, que o processo, instaurado sob vestes executivas, não preenche os requisitos indispensáveis para usar essa indumentária; ou, em outra perspectiva, que o título apresentado pelo exeqüente não constitui passaporte regular para o ingresso na via da execução, melhor seria falar em “não-executividade”.  (Barbosa Moreira, 1999, p. 120).

Sob essa perspectiva, correta a posição do ilustre doutrinador. Contudo, o termo “pré-executividade” também pode ser encarado sob outro aspecto, que não como algo antes do processo ou do título executivo; e sim, como algo que precede aos atos propriamente executivos, ou seja, aqueles que promovem a retirada do patrimônio do devedor.

Este é o posicionamento de Alberto Camiña Moreira, autor da obra mais completa sobre o tema, no que é seguido por Rita Dias Nolasco, senão vejamos:

Pré-executividade não significa, por evidente, pré-processo de execução, o que representaria atividade extrajudicial, mas sim possibilidade de defesa antes da penhora, antes do gravame, antes da constrição, antes, enfim, dos atos marcantemente executivos [...]. (Moreira,1998, p. 35)

Em síntese: em relação aos substantivos “exceção” e “objeção” vimos que o este último só se presta para aqueles que defendem a utilização do instituto apenas com base em matérias de ordem pública, conhecíveis de ofício pelo magistrado, e, portanto, inadequado para a realidade do instituto, pois não esgota todos os casos de sua utilização. Quanto ao termo “exceção” vimos a falta de precisão terminológica em relação ao atual Código de Processo Civil, posto que para este, tecnicamente, as exceções são usadas para trazer a baila matérias não conhecíveis de oficio pelo magistrado, o que corresponde, na prática, a menor parte das hipóteses de utilização do instituto, contudo, não é de todo impróprio o seu uso, posto que historicamente o termo tem sido usado como sinônimo de defesa.

Quanto aos complementos “de pré-executividade” e “de não-executividade”, ambos estão corretos, porquanto o primeiro significa aquilo que vem antes dos atos propriamente executivos; o segundo, refere-se à negação da qualidade de executivo do título ou do processo, que se apresentam sob a veste executiva.

Portanto, o problema de falta de precisão terminológica encontra-se no primeiro substantivo da expressão, o que, inclusive, não foi solucionado por Barbosa Moreira (1989, p. 119-121), o qual apenas critica o substantivo “exceção”, como vimos.

 Analisando-se a casuística do instituto, observa-se que, com a ampliação de seu âmbito de incidência, resta como ponto comum o caráter restrito da prova admissível nessa espécie de defesa, independentemente do fato de ser a matéria conhecível ex officio, ou apenas se alegada pela parte, conforme veremos no tópico específico. Destarte, devemos encontrar um substantivo que tenha significado mais genérico que “exceção” ou “objeção”, o qual poderia ser impugnação, que, segundo Plácido e Silva (2001, p. 417), significa na prática forense todo ato de repulsa, de contestação, de contradita, praticado contra atos do adversário ou parte contrária, pelos quais se procura anular ou desfazer suas alegações ou pretensões, ou impedir que promova ato processual, demonstrado ou julgado injusto.

Teríamos então, “impugnação de pré-executividade”, como sendo uma defesa antes dos atos notadamente executivos, ou seja, antes da execução forçada; ou “impugnação de não-executividade”, como repulsa ao caráter executivo que tenta se vestir o título ou o processo. Tanto esse posicionamento é acertado que a Lei. N.º 11.232 de 22 de dezembro de 2005, que modificou o Código de Processo Civil, achou por bem denominar “impugnação” a defesa à execução forçada do art. 475, I, do supracitado diploma legal.

Devido a grande adesão doutrinária e jurisprudencial ao termo “exceção de pré-executividade”, assim trataremos o instituto durante todo o trabalho.

Sobre os autores
Daniel Ferreira de Lira

Bacharel em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba. Especialista em Direito Processual Civil e Direito Tributário pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL). Mestrando em Desenvolvimento pela UEPB/UFCG. Professor das disciplinas de Direito Processual Civil e Teoria Geral do Processo do Centro de Ensino Superior Reinaldo Ramos (CESREI). Professor da Disciplina de Direito Processual Civil e Juizados Especiais da UNESC Faculdades. Professor do Lexus Cursos Jurídicos. Ex-professor do Meritus e de diversos outros cursinhos preparatórios para concursos e para o Exame da OAB. Advogado militante. Palestrante em eventos jurídicos nacionais e internacionais.

Emanuel Vieira Gonçalves

Bacharel em Direito pela UEPB, especialista em Direito Tributário pela Universidade do Sul de Santa Catarina, Especialista em Gestão Ambiental da Indústria pela UEPB, Advogado, sócio da LL&G Advocacia, empresário, Conselheiro do COPAM/PB (Conselho de Proteção Ambiental do Estado da Paraíba) e Consultor Ambiental da Federação das Indústrias dos Estado da Paraíba.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIRA, Daniel Ferreira; GONÇALVES, Emanuel Vieira. Da exceção à objeção de pré-executividade: a atualidade da defesa pontiana à luz da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3236, 11 mai. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21761. Acesso em: 22 dez. 2024.

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