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Assédio sexual no âmbito das relações de trabalho

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Agenda 14/08/2013 às 14:00

4 Responsabilidade civil

Ensina Nélson Godoy Bassil Dowe[20]:

“(...) a responsabilidade civil consiste na obrigação de uma pessoa indenizar o prejuízo causado a outrem quando há a pratica do ato ilícito. (...) A teoria da responsabilidade civil foi criada para alcançar as ações ou omissões contrárias ao direito, que geram para o seu autor a obrigação de reparar o dano ocasionado. Nasce, assim, a teoria da responsabilidade civil, que constitui a obrigação pelo qual o agente fica obrigado a reparar o dano causado a terceiro.”

Os elementos caracterizadores da responsabilidade civil são: conduta (ação ou omissão), nexo de causalidade entre ação/omissão, culpa do agente e dano.

Para alguém ser responsabilizado civilmente por dano moral é fundamental que algum ato tenha sido praticado ou omitido, seja pelo próprio agente ou por pessoa ou animal de que ele seja responsabilizado. Vejamos o que dispõe o Código Civil:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

O dano sofrido tem de ser efetivo, ou seja, ninguém pode ser responsabilizado civilmente sem o mesmo ter sido provado, podendo ser patrimonial (material) ou extrapatrimonial (moral). Ressalte-se também que é indispensável a prova do nexo causal entre o dano sofrido e a ação/omissão do agente.

A lei impõe em certas situações a reparação de um dano cometido sem culpa (responsabilidade objetiva), não se exigindo, portanto, a prova de culpa do agente para que seja obrigado a reparar o dano.

4.1 Responsabilidade do empregador por atos dos seus empregados

Estabelece o art. 932, III do CC:

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:

III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;

A responsabilidade do patrão ou assemelhado é proveniente do poder de direção em relação aos seus empregados, serviçais ou prepostos, sendo contemplada pela legislação qualquer situação de direção com dependência ou subordinação hierárquica.

No que tange à responsabilidade civil dos preponentes, vê-se que a relação de preposição não exige a presença de vínculo laboral típico, sendo necessário somente que o preposto seja responsável, ainda que não seja culpado. Se, por acaso, o preposto tiver agido em estado de necessidade, a licitude de seu ato exclui a culpa, mas não a responsabilidade, extensiva ao preponente.

Subsiste a responsabilidade dos patrões e comitentes pelos danos, ainda que o preposto tenha agido com abuso de suas atribuições, mesmo porque o lesado não está, via de regra, em condições de conhecer os limites das funções do empregado, sendo suficiente a aparência do cargo. Assim se pronuncia a jurisprudência:

1. O dano moral está presente quando se tem a ofensa ao patrimônio ideal do trabalhador, tais como: a honra, a liberdade, a imagem, o nome etc. Não há dúvidas de que o dano moral deve ser ressarcido .O que justifica o dano moral é o assédio moral. 2. O assédio moral é a exposição do trabalhador a situações humilhantes, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções. 3. O empregador, pela culpa na escolha e na fiscalização, torna-se responsável pelos atos de seus prepostos (Súmula nº 341, STF). A responsabilidade é objetiva do empregador”. DOE SP, PJ, TRT 2ª. Data: 01/08/2003.

DANO MORAL. ASSÉDIO SEXUAL. "A responsabilidade civil do empregador pela indenização por dano moral decorrente da prática de assédio sexual pressupõe a existência de três requisitos que devem ser observados cumulativamente: a prática de ato ilícito ou com abuso de direito (culpa/dolo); o dano (sofrimento moral) e o nexo causal entre o ato praticado pelo empregador ou por seus prepostos e o dano sofrido pelo trabalhador. Improvado o assédio sexual ante a fragilidade das provas, e tendo em vista ausência de evidências dos atos descritos na inicial." Recurso ordinário da ré a que se dá provimento, quanto a esse item da demanda( TRIBUNAL: 2ª Região ACÓRDÃO NUM: 20081102857  DECISÃO: 10 12 2008 TIPO: RO01   NUM: 01582   ANO: 2008 NÚMERO ÚNICO PROC: RO01 - 01582-2006-291-02-00-2 RECURSO ORDINÁRIO TURMA: 11ª).

ASSÉDIO SEXUAL. REQUISITOS CARACTERÍSTICOS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Na configuração do assédio sexual, faz-se imprescindível a presença de pelo menos três requisitos na configuração do instituto, tomados os parâmetros de análise supranacional a respeito da matéria: a) o comportamento físico ou verbal de constrangimento à liberdade sexual da pessoa; b) ato rechaçado pela vítima; c) que pode variar na sua severidade. A partir destes elementos, o professor e juiz Paulo Jakutis traz como linhas gerais para a definição do assédio sexual 'a conduta praticada pelo agressor, reiterada ou não, ligada ao comportamento sexual e ao universo do emprego, que não é aceita pela vítima e que é de tal sorte severa que produz, no ser humano com padrão de sensibilidade normal, uma barreira para o adequado desenvolvimento das tarefas de trabalho. Ficam excluídos, como elementos essenciais, os fatores relacionados com a hierarquia, sexo dos envolvidos, local de trabalho e não-eventualidade do comportamento indevido.' Caracterizado o instituto jurídico cumpre notar, na seara dos fatos, que as provas produzidas nos autos confirmam a conduta ilícita do preposto patronal, que no ambiente de trabalho incorreu em conduta de conotação sexual em face do Autor, que com ele se constrangeu e abalou, do que resulta a responsabilidade do empregador pelo dano que se efetivou na esfera íntima do Reclamante (TRIBUNAL: 23ª Região DECISÃO: 31 03 2009 TIPO: RO   NUM: 00977-2008-008-23-00-8NÚMERO ÚNICO PROC: RO - 00977-2008-008-23-00)

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O STF adotou posição no sentido de presunção da culpa, quando presente o poder de direção:

SÚMULA Nº 341: É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.

A responsabilidade objetiva atribuída ao empregador ou assemelhado por danos causados pelos seus empregados permite que o responsável pelo pagamento da indenização intente uma ação regressiva contra o causador do dano. É o que se denomina direito de regresso do empregador:

Art. 462 - Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositvos de lei ou de contrato coletivo.

§ 1º - Em caso de dano causado pelo empregado, o desconto será lícito, desde de que esta possibilidade tenha sido acordada ou na ocorrência de dolo do empregado.

Não se deve erguer em critério absoluto a responsabilidade do empregador quanto ao assédio praticado nas relações de trabalho por seus agentes ou prepostos. De acordo com Valentin Carrion[21], seria instituir um enorme risco à atividade empresarial e estimular uma febre de indenizações.


5 Dano moral, sua reparação e a correlação com o assédio sexual

O assédio sexual por ser uma conduta praticada por alguém que está hierarquicamente situado acima do assediado, o que acontece, via de regra, nos ambientes de trabalho, é violentamente repudiado pela sociedade em geral, pois agride a liberdade do empregado, obrigando-o a pedir demissão por não suportar a pressão psicológica exercida sobre si, acarretando ações de indenização por dano moral.

O assédio sexual constitui-se no mais abjeto ato do empregador, pois se vale de sua posição de mando, subjugando a vontade da empregada (em regra), anulando sua liberdade de escolha, causando-lhe danos psicológicos permanentes, devendo a indenização ser fixada, observando-se os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, de maneira a compensar o sofrimento causado à vítima.

As agressões sofridas pelo assediado têm um efeito devastador sobre sua auto-estima, porque, em nossa cultura, a identidade sexual exerce uma importância imensa na definição da imagem de uma pessoa na sociedade, devendo, portanto, o agressor reparar o dano moral sofrido pela vítima como forma de coibir condutas que atentem contra a dignidade e a integridade física ou moral da pessoa humana.

Com a promulgação da atual Constituição Federal em 1988, a reparação por dano moral encontrou abrigo expresso no texto da Carta Magna:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

De acordo com os ensinamentos de Rodolfo Pamplona Filho[22], “o dano moral consiste no prejuízo de direitos, cujo conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente redutível a dinheiro”, ou seja, é aquele que lesiona a esfera personalíssima da pessoa, violando, por exemplo, sua intimidade, vida privada, honra e imagem, bens jurídicos tutelados constitucionalmente.

O dano moral é um mal que atinge o ânimo psíquico, intelectual e moral da vítima. Segundo o civilista Silvio de Salvo Venosa[23], é de extrema dificuldade estabelecer a justa recompensa pelo dano sofrido, concluindo que será moral o dano que ocasiona um distúrbio anormal na vida do indivíduo, uma inconveniência de comportamento.

No âmbito trabalhista e civil, o dano moral somente se caracteriza com a ocorrência do ato ilícito, entendido como todo ato que afete a moral e o código de ética do trabalhador, prejudicando o seu lar, seu crédito, seu nome profissional, enfim, sua honorabilidade.

Na esfera trabalhista, o dano moral acontece através de atos abusivos ou acusações infundadas que, porventura, acarretem prejuízos à reputação, ao decoro e à honra do trabalhador, ferindo sua dignidade.

Como explicado em passagem anterior, existem três elementos caracterizadores da responsabilidade civil: a conduta ativa ou omissiva do agente, o resultado lesivo e o nexo causal ligando os dois primeiros. Presentes, é direito do lesado exigir uma reparação pecuniária pelo dano sofrido.

Havendo o nexo de causalidade, a vítima tem o direito de exigir em juízo as verbas decorrentes da despedida indireta ou da despedida injusta, conforme o caso, bem como a indenização pelo dano moral, devendo esta representar um valor que possibilite um conforto material e espiritual ao lesado. Para demonstrar:

DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. Para que se impute a condenação de indenização por dano moral a uma parte, imperativo se torna a comprovação do nexo causal entre o ofensor e o dano experimentado pela parte ofendida. Recurso ordinário a que se nega provimento. (TRT 23ª Reg., TP, Ac. n. 985/96, Rel. Juiz Fauze Silva, DJMT 28.6.96, p.11)

1. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. DANOS MORAIS. RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO APÓS O EMPREGADO COMUNICAR SER PORTADOR DO VÍRUS DA AIDS. Na hipótese "sub judice", a Corte de origem, por intermédio do acórdão recorrido, traz dados demonstrando o nexo de causalidade entre o ato da Empresa e o dano sofrido pelo Autor. A rescisão do contrato de trabalho sem justa causa ocorreu após a comunicação pelo Reclamante de ser portador do vírus da AIDS. Vê-se, portanto, que o ato lesivo do empregador de ordem moral ocorrido na constância do contrato de trabalho guarda pertinência com a relação de emprego. 2. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NEXO CAUSAL ENTRE O ATO DE DEMISSÃO E A DOENÇA DO AUTOR. Considerando que no quadro fático probatório delineado pelo Tribunal Regional se confirmou a comprovação de que a doença do Reclamante foi motivo da sua despedida, evidencia-se, pois, indispensável o revolvimento do conjunto probatório para se afastar o nexo causal entre a despedida e a doença do Autor. Incidência da diretriz jurisprudencial sedimentada no Enunciado nº 126 do TST. 3. Recurso de revista não conhecido (TRIBUNAL: TST   DECISÃO: 17 09 2003 PROC: RR   NUM: 499048   ANO: 1998    REGIÃO: 01   RECURSO DE REVISTA TURMA: 01 ÓRGÃO JULGADOR - PRIMEIRA TURMA).

Quando incontestável a existência do dano moral, é fundamental quantificar a indenização a ser paga pelo agente, de modo a reprimir a prática do ato lesivo e a servir de exemplo para que novas condutas não sejam perpetradas.

Há dois sistemas de reparação pecuniária: o sistema aberto, adotado pelo Brasil, em que o julgador tem liberdade para estabelecer o “quantum” devido; o sistema tarifário, adotado pelos EUA, em que há uma pré-fixação do valor da indenização.

A reparação tem uma dupla finalidade: visa a compensar o sofrimento tido pela vítima e a punir o agressor, desencorajando a prática de atos que agridam a imagem e a honra das pessoas.

Reza o art. 944 do Código Civil de 2002:

Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.

Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização.

Alguns critérios deve ter o Magistrado em mente para que possa alcançar um valor justo e razoável. Tem de ser considerada a gravidade objetiva do dano, bem como a intensidade da dor da vítima, não se olvidando o poder econômico e a personalidade do agressor.

Existem controvérsias acerca de qual prazo de prescrição deve se aplicar ao dano moral trabalhista: o previsto no art. 7º, XXIX, da CF/88 ou o estabelecido no art. 177 do CC/02. O TST firmou entendimento no sentido de que o prazo a ser aplicado é o previsto no Código Civil, mesmo se relativo a dano moral decorrente de relação de trabalho.

Sobre o autor
Paulo Jeyson Gomes Araújo

Analista Processual do Ministério Público Federal Pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho pela UNIDERP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Paulo Jeyson Gomes. Assédio sexual no âmbito das relações de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3696, 14 ago. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24329. Acesso em: 5 nov. 2024.

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