1.4 Círculo hermenêutico da jurisdição
É nesse contexto que se desenvolve a tese de Hermes Zaneti, para quem o atual modelo deve superar o paradigma legalista, uma vez que “é característica do processo volatilizar a certeza do direito material”. Ou seja, “o direito discutido no processo é sempre incerto, é sempre ‘problemático’”, não podendo ser considerado como uma verdade imutável. Isso porque “entre processo e direito material ocorre uma relação circular” — um círculo hermenêutico.71
Na definição de Eduardo Cambi, o “círculo hermenêutico é um método interpretativo que significa que não se pode compreender o todo sem as partes, e vice-versa, pois a parte é tão determinada pelo todo como o todo pelas partes”,72 sendo que essa compreensão deve ser feita em um contexto já pré-concebido. O círculo hermenêutico conecta, em um intercâmbio, fatos e normas em um mesmo processo interpretativo, pois “a norma abstrata e indeterminada somente será definida pela realidade factual, e, a realidade factual, pela norma nos seus sinais característicos relevantes”.73
Verifica-se aqui a importância dos influxos do giro linguístico no Direito. Realmente, “a interpretação é uma operação de caráter linguístico, realizada em um contexto histórico-social”. Essa interpretação, pois:
[...] Está condicionada pelo contexto, conquanto se efetua em condições sociais historicamente caracterizadas, as quais determinam usos linguísticos, decisivamente operantes na atribuição do significado. A mediação semântica, realizada pelo intérprete, na atribuição do significado, não depende da descoberta de “vontades” pré-determinadas. Tais vontades somente podem ser levadas em consideração em um processo de interpretação, limitado pelo espaço linguístico dos conceitos ou das palavras, suscetíveis de alteração do próprio contexto.74
É a partir desse processo hermenêutico que é possível ao juiz exercer a jurisdição, com base no novo conceito desta. Como esclarece o autor:
Em outras palavras, como um texto normativo é suscetível de comportar vários significados (plurisignificatividade), o juiz, ao interpretá-lo ou determinar o significado objetivo deste texto, no contexto dos fatos constantes no caso concreto, exerce uma liberdade de opção ou, em termos pragmáticos, opera uma decisão, construindo e aplicando a norma particular (“regra de decisão”). O produto da interpretação é a norma jurídica. Para chegar a ela, o juiz parte de um problema que foi colocado pelas partes, no processo judicial, mas que também encontra, no julgador, uma “pré-compreensão”, tanto da realidade existencial quanto do texto a ser interpretado. É este pensar conjuntamente a realidade e o texto, propondo-se a precisar o sentido da “norma-produto” (“regra de decisão”), que constitui o círculo hermenêutico.75
No mesmo sentido Luiz Guilherme Marinoni pontua que:
Atualmente, para a aplicação da lei, diante do pluralismo que caracteriza a sociedade contemporânea [e constante transformação dos fatos sociais], é imprescindível compreender o caso concreto. É preciso, antes de aplicar a lei, atribuir sentido e valor ao litígio. Ou seja, a jurisdição não mais se limita a tornar a lei — abstrata e genérica — particular quando da resolução do caso concreto, pois necessariamente deve atribuir sentido ao caso concreto para interpretar a lei e solucionar o litígio, exatamente por ser indiscutível que a sociedade e os casos concretos não podem ser regulados sem se considerarem suas especificidades.
A necessidade de compreender o caso litigioso, interpretar a lei e controlar a constitucionalidade a partir dos direitos fundamentais não permite que se diga que a jurisdição continua a ter a função de atuar a vontade da lei.76
Disso resulta que a lei (direito material), como resultado da atividade legislativa, não é por si só expressão de justiça, isto é, da ratio essendi dos direitos fundamentais. A norma é abstrata, sem vontade constante e dependente do caso concreto, o que demanda uma complexa tarefa hermenêutica “para deixar de ser um enunciado vazio, capaz de múltiplas e contraditórias alternativas de solução”.77 Assim, “a função dos intérpretes em geral e do Poder Judiciário, em especial, não é, tão-somente, descrever significados, mas reconstruir sentidos, para aplicar o ordenamento jurídico ao caso concreto”.78
Nesses termos, como a norma do caso concreto passa pela certificação do Poder Judiciário, “o processo serve ao direito material, mas para que lhe sirva é necessário que seja servido por ele”.79 Entretanto, o fato de o processo ser instrumental não o torna servil ao direito material, pois entre eles existe um nexo de finalidade, considerando que “o processo lida com a aplicação do direito, com a busca da justiça e não só com a lei, espécie de ‘justiça’ previamente estabelecida pelo legislador para casos-tipo”.80
Em outras palavras, toda vez que um direito é posto em juízo, transforma-se em expectativa, ideia inicialmente trabalhada por James Goldschmidt. Esta é maior ou menor, a depender do tipo de norma afirmada, se regra ou princípio, o que torna diferente a intensidade do ônus argumentativo. Desta forma, “é no discurso judicial com a participação das partes e do julgador, com a sua colaboração (pretensão de correção) na interpretação dialógica, que se dá o sentido e significado, ora de regra, ora de princípio, ao dispositivo afirmado”. Portanto, é na conjunção dos três sujeitos processuais que se tem “um sentido reconstruído de interpretação”.81 Zaneti aponta que:
Com isso, o papel do juiz aumenta de responsabilidade e poder, pois deverá atuar para a densificação desses princípios e cláusulas, rompendo com a estrutura estanque da divisão de poderes anteriormente pensada. O aspecto virtuoso está justamente na potencial adaptação desses novos diplomas e institutos jurídicos à realidade concreta do direito, uma adaptação garantista na realização dos objetivos constitucionais.82
A tarefa atribuída ao juiz intérprete, que, inclusive, precisa lidar com o conteúdo moral das normas, deve levar em conta que nenhum magistrado, como ser humano e integrante de uma sociedade, é neutro, por possuir sua pré-compreensão ou “arraigadas concepções morais, filosóficas, religiosas ou políticas”. Desta feita, no Estado Democrático de Direito, o juiz deve ter um autoconhecimento e uma autocrítica.
Demais disso, nessas condições o juiz passa a ser um sujeito empírico, que analisa sua relação consigo, não mais relacionando mecanicamente o sujeito e o objeto, e decide a partir dos instrumentos científicos de que se serve, da comunidade que integra e da sociedade de que é membro. Eduardo Cambi leciona que:
A ciência jurídica reflexiva parte do pressuposto de que o sujeito e o objeto são, mutuamente, construídos. A verdade não está no objeto — na lei — a ser revelada pelo Judiciário. A ciência jurídica reflexiva permite: i) verificar que o direito é um fenômeno cultural, não sendo possível aplicá-lo com neutralidade, devendo seus operadores, diante da existência de mais de uma opção de valor, tomar posições e estarem conscientes da opção tomada; ii) construir novas práticas transformadoras dos aplicadores do direito; iii) aprofundar o conhecimento dos sujeitos processuais e de todos os partícipes do processo de concretização das normas jurídicas, buscando saber qual o papel social que podem desempenhar em um dado momento histórico; iv) ampliar a capacidade do direito, como instrumento de poder, de produzir conhecimento válido e socialmente legítimo.83
Com isso, conforme lições de Marinoni, “o processo deixou de ser um instrumento voltado à atuação da lei para passar a ser um instrumento preocupado com a proteção dos direitos”, pois “o juiz, no Estado constitucional, além de atribuir significado ao caso concreto, compreende a lei na dimensão dos direitos fundamentais”. Sendo assim, considerando o poder estatal de dar proteção aos direitos, não se pode ignorar a dimensão de legitimidade democrática. E, “a legitimidade do exercício do poder, nas democracias, se dá através da abertura à participação”.84
Realmente, diante do conceito diverso de jurisdição no Estado constitucional, o processo “tem de ser estruturado não apenas consoante as necessidades de direito material, mas também dando ao juiz e à parte a oportunidade de se ajustarem às particularidades do caso concreto”. Por isso, “o processo, atualmente, é o próprio procedimento. Mas não apenas, como quer Fazzalari, o procedimento realizado em contraditório — até porque essa exigência é óbvia e inegável —, mas igualmente o procedimento idôneo às tutelas prometidas pelo direito material e à proteção do caso concreto”.85
1.5 Relevância da argumentação jurídica no processo
Em vista dos apontamentos anteriores, ressalta-se que a correção da decisão é determinada pela razão, “a qual, por se tratar de uma correção normativa, deve ser a razão prática”. E, por envolver o processo judicial um discurso racional, a pretensão de correção somente se torna possível pela “argumentação jurídica”. Isso porque a “conexão entre o direito e a razão é um problema que envolve fundamentação judicial dos direitos fundamentais e tal questão, embora não leve à obtenção de decisões com conteúdos determinados, abre espaço para a ponderação como forma de aplicação dos direitos fundamentais”.86
A preocupação que surge, nesse ponto, é que os princípios presentes nas Constituições contemporâneas, como normas a serem interpretadas no caso concreto, albergam valores e possuem conteúdos morais. Por isso, “há de se construir uma adequada metodologia para as decisões judiciais, calcada na racionalidade prática, preocupada em inibir subjetivismo e injustiças”. É possível, entretanto, o controle da legitimidade dessa nova ideia de jurisdição a partir de uma “motivação objetiva, clara e transparente”.87
Portanto, resta clara a importância da teoria da argumentação jurídica para a consolidação do modelo de processo jurisdicional democrático, pois a “função argumentativa está assentada na dialética”, como a arte do diálogo, “voltada a sopesar argumentos, confrontar opiniões e decidir com equilíbrio”.88
Ademais, a busca pela verdade do processo, considerada caso a caso e como valor a ser alcançado, “está ligada à ideia de motivação judicial como forma de controle das decisões emanadas do Poder Judiciário”.89 Cambi aduz que:
Assim, deve-se privilegiar a concepção pragmática da verdade, considerando-a como um produto do discurso jurídico, produzido intersubjetivamente. É obtida no decurso do conflito entre vários discursos, em um auditório de participantes competentes e razoáveis. A obtenção dessa verdade tem componentes subjetivos e objetivos, sendo obtida no curso do processo onde se assegura, às partes, plenas condições de participação (garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa), para poderem deduzir os melhores argumentos para convencer o órgão judicial de que têm razão e merecem a tutela jurisdicional. Compete, ao final, aos juízes dizer quais são os melhores argumentos para decidir quem deve obter a tutela jurisdicional.90
Para se evitar, porém, um “processo interminável de argumentação, com a impossibilidade de se obter uma ‘única decisão correta’, é necessário traçar uma linha-limite, não ideal”. Dessa forma, faz-se necessário adotar um conceito pragmático de argumento, no sentido de se descobrir qual o papel “que ele desempenha no interior de um jogo de argumentação, vale dizer, saber até que ponto pode contribuir para solucionar o problema da aceitabilidade ou não aceitabilidade de uma pretensão de validade controversa”.91 Nesse sentido:
A motivação adequada e efetiva é aquela que contém justificações suficientes sobre as questões de fato e de direito, sendo, por isto, fundadas em “bons argumentos”. Estes devem ser considerados “bons” não somente para o juiz que profere a decisão, mas também por todos aqueles que possam valorar, posteriormente, as razões que formaram o convencimento judicial. [...] Dessa forma, pode-se afirmar que os argumentos são a expressão pública da reflexão.
O processo judicial é um espaço polifônico, no qual diversas vozes se entrechocam e onde emergem vários pontos de vista sobre as questões em litígio. [...] Compete ao juiz organizar tais “falas” e transmitir, no momento da decisão, um discurso aceitável, capaz de se amparar nas “palavras da lei”.92
Pode-se afirmar, mais, que o juiz, ao se utilizar da teoria da argumentação jurídica para decidir, deve se responsabilizar por um discurso aceitável que encontre amparo na Constituição, que é o verdadeiro norte que se tem no atual paradigma.
Essa teoria tem ligação direta com o dever de motivação judicial, já inserto na própria Constituição Federal. Como já se demonstrou que o “Direito é uma obra hermenêutica, a ser constantemente interpretado e reinterpretado”,93 é preciso que os juízes motivem, adequadamente, as decisões, para que aquele não se transforme em um instrumento arbitrário.
Além disso, a motivação garante que os interessados “tenham a real dimensão do sentido atribuído, pelo Judiciário, aos direitos discutidos no processo judicial”, possibilitando a impugnação da decisão por meio de recursos, bem como o controle democrático do exercício do poder.94 Nas palavras de Eduardo Cambi:
[...] não é qualquer decisão que deve ser aceita socialmente como forma de exercício do poder. Deve-se, pois, buscar a legitimação social da decisão judicial, não podendo o juiz se esconder atrás da suposta neutralidade da norma. Concretizar os direitos fundamentais não é o mesmo que transformar juízes em legisladores. Por isto, para além de princípios, e regras, deve haver uma teoria da argumentação jurídica, na qual seja possível buscar uma decisão racionalmente fundamentada.95
No processo jurisdicional democrático, pois, “é a justificação racional da decisão interpretativa que assegura que a interpretação não foi arbitrária”. Essa garantia de “correção” da decisão, no sentido de ser uma decisão aceitável racionalmente e apoiada em um discurso jurídico, por meio de uma “fundamentação que se desenrola argumentativamente”, torna-se uma “precondição da própria legitimidade do exercício do poder”.96
A teoria da argumentação jurídica, pela qual se fundamentam as regras do discurso, é vista como uma “teoria processual de correção prática”, pois uma norma será tida como correta e válida se for resultado de um procedimento em que se realiza um discurso prático racional.97
Portanto, concebendo-se que o Direito não se resume às leis positivadas, mas que engloba também a norma do caso concreto, tem-se que o “direito vivente” compreende os momentos do texto e do ato, pois a norma derivada “da aplicação das regras gerais e abstratas a casos reais” se dá mediante a hermenêutica jurídica, pela qual o juiz obtém a norma adequada ao caso concreto. Desta feita, é a argumentação jurídica que se realiza da interpretação do ordenamento jurídico como um todo, a fim de se efetivar direitos, e não as normas em si consideradas, que produz o chamado direito vivente.98
Em suma, importante transcrever os dizeres de Eduardo Cambi sobre argumentação e motivação no processo judicial:
A teoria do discurso jurídico não é uma máquina capaz de produzir respostas exatas e objetivas ou de atribuir pesos definitivos aos direitos, mas apenas mostra que são possíveis deduzir argumentos racionais sobre os direitos. Aliás, quando se argumenta, se o faz para alguém; por isso, quem argumenta dialoga. Assim, a argumentação jurídica está condicionada ao auditório, ao qual se dirige o diálogo. Logo, a argumentação a que se dirige o diálogo depende da época e do lugar, dos níveis e dos ambientes de compreensão, porque envolve a comunicação e a compreensão da mensagem. Portanto, não se argumenta em definitivo, posto que não há soluções infalíveis para problemas práticos.
O discurso racional, ao incluir a questão da tutela dos direitos fundamentais, torna possível estabelecer critérios objetivos para a aproximação entre o direito e a moral. Os juízes devem levar a sério a Constituição, não permitindo que os direitos fundamentais se tornem promessas constitucionais não cumpridas.99
Assim, a Constituição, apesar de não poder transformar todos os direitos em realidade de forma imediata, vincula “os juízes, que devem fundamentar suas decisões em standards jurídicos objetivos, sem que, destarte, ajam arbitrariamente ou possam vir a se colocar no lugar dos legisladores”.100
É fato que esse novo conceito de aplicação do direito material causa uma “erosão do Direito positivo”, que é ultrapassado pelos juízes e pelas partes. Isso pode, caso não utilizado com razoabilidade, se tornar “uma arma perigosa a serviço do arbítrio”. Não se pode, porém, encarar essa evolução como um abandono do Direito codificado, relegando-se a lei a segundo plano, pois esta continua a ter uma aplicação forte em grande parte dos casos. Nesse sentido, a nova realidade retrata-se no abandono de falsas certezas com relação a todo o direito, inclusive ao processo civil, e com isso uma mudança de mentalidade e uma visão dotada de coerência jurídica.101 Conforme elucidativo entendimento de Zaneti:
Para acompanhar a natureza das coisas, o jurista precisa reeducar sua forma de pensar, reformar seu pensamento, adequando-o ao modelo do estado Constitucional Democrático Pluralista de Direito que foi implantado em 1988, cerrando um círculo evolutivo de democratização crescente do direito brasileiro, começado pelo sistema positivado na Constituição (a chamada constitucionalização do direito), já bastante reconhecida no direito civil, no direito penal, no direito processual penal, mas não bem aplicada ao processo civil, em toda a sua potencialidade.
No processo, como se observou, o jurista vê tendencialmente um direito processual constitucional e um direito processual infraconstitucional, identificando-se o chamado “paradoxo metodológico”.
As características desse círculo evolutivo já foram descritas: a formação de um processo constitucional como método de controle judicial do poder e garantia de participação das partes na formação dos atos decisórios (módulo processual); a necessária aplicação, a esse quadro, de uma racionalidade prática procedimental, única capaz de traduzir em espaços democráticos de participação os mecanismos predispostos pela Constituição; a falência da departamentalização dos poderes e o reconhecimento da função política do Poder Judiciário como uma necessidade nos Estados constitucionais; a circularidade dos planos do direito, implicando uma relação biunívoca entre o direito material e o direito processual, com a constante abertura ao “problema” pelo direito (tópica).102
Como conclui Hermes Zaneti Júnior, o que ainda falta no direito processual é superar a ideologia do Código de Processo Civil de 1973, que fez do processo um instrumento puramente técnico. Precisa, assim, ter uma filosofia que não seja a de um discurso abstrato, mas “a filosofia do ‘pensar certo’ (contextualizar, problematizar, agir)”, pois processo não é pura técnica, e nem técnica é um fim em si mesmo.103 O processo como técnica deve ser visto como caminho, colocado à disposição da sociedade para se atingir o bem-estar e a paz social.
Nesses termos, no constitucionalismo contemporâneo, em que se tem “a ascensão dos valores, o reconhecimento da normatividade dos princípios e a essencialidade dos direitos fundamentais”, além da consolidação de uma “nova hermenêutica”, o processo deixa de ser visto “como fenômeno técnico, voltado para atender aos anseios do mercado e vinculado à proposição liberal”, para se tornar um instrumento democrático na medida em que pode “auxiliar na formação de uma sociedade democrática e inclusiva”.104
Marinoni conclui seu pensamento afirmando que o processo é procedimento e, dessa forma, pode ser visto como instrumento, mas no sentido de “módulo legal ou conduto com o qual se pretende alcançar um fim, legitimar uma atividade e viabilizar uma atuação”, ou seja, “é o instrumento através do qual a jurisdição tutela os direitos na dimensão da Constituição”.105 Define, pois, que o processo:
É o módulo legal que legitima a atividade jurisdicional e, atrelado à participação, colabora para a legitimidade da decisão. É a via que garante o acesso de todos ao Poder Judiciário e, além disto, é o conduto para a participação popular no poder e na reivindicação da concretização e da proteção dos direitos fundamentais. Por tudo isso o procedimento tem de ser, em si mesmo, legítimo, isto é, capaz de atender às situações substanciais carentes de tutela e estar de pleno acordo, em seus cortes quanto à discussão do direito material, com os direitos fundamentais materiais.106
Sinteticamente, nesse processo constitucionalizado e democrático, desenvolvido no âmbito de um sistema dialético, que garante uma “racionalidade procedimental” discursiva e argumentativamente construída em contraditório, prioriza-se, de um lado, o direito das partes de participarem da construção da decisão jurisdicional e, de outro lado, o dever do magistrado de fundamentar essas decisões, demonstrando racionalmente que as alegações das partes foram consideradas e, com isso, possibilitar o controle da sociedade e legitimar sua atuação.