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As peculiaridades do contrato de cartão de crédito

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Agenda 12/12/2014 às 13:28

6. Partes

6.1. Titular do Cartão de Crédito

São pessoas físicas ou jurídicas a quem a emissora fornece os cartões para adquirir produtos ou prestações de serviços. Quando o cartão for de pessoa jurídica, deve conter também o nome de uma pessoa física identificada e nomeada para ser a responsável por sua utilização.

6.2. Estabelecimento Comercial Filiado

É o fornecedor ou vendedor de bens e serviços que se obriga a não recusar, honrar um cartão de crédito e a conceder o mesmo preço ao portador do cartão que oferece aos consumidores que adquirem à vista.

6.3. Emissora do Cartão de Crédito

Os cartões podem ser emitidos por administradoras de cartão de crédito, por empresas industriais e comerciais ou por instituições financeiras.

6.3.1. Empresas Administradoras

Empresa administradora é a responsável pela emissão do cartão, funcionando como intermediária entre o titular e o fornecedor de bens e serviços. As regras do funcionamento do cartão de crédito são elaboradas e impostas por ela, em contrato de adesão específico para esse tipo contratual. Assim, é a empresa administradora que: “Realiza o empreendimento, seleciona os titulares do cartão, credencia sociedades mercantis, comerciantes e prestadores de serviços, que serão fornecedores dos bens, dominando economicamente todas as posições9”.

É necessário um contrato entre a administradora e o estabelecimento, e quanto mais estabelecimentos filiados, melhor, pois traz lucro para a administradora.

Portanto, é ela que estabelece regras contratuais de todas as relações jurídicas envolvidas. Porém, com a invasão de cartões emitidos por bancos e as administradoras percebendo que poderiam perder mercado, passaram a se associar com os bancos de duas formas.

A primeira deve conter no contrato uma cláusula que outorga poderes à administradora para que adquira empréstimos com os bancos, “cláusula-mandato”. A segunda é uma associação entre a administradora e o banco. Como exemplo temos o “Ourocard”, união da Visa com o banco do Brasil, onde os titulares, clientes do banco, usufruam, de sua rede de fornecedores credenciados e o crédito é concedido diretamente pelo banco.

Assim, ela se caracteriza pela interligação entre os agentes econômicos que necessitam de recursos e os agentes que dispõem, exercendo essas atividades de forma habitual e profissional.

6.3.2. Instituições Financeiras

Estas podem emitir seus próprios cartões ou associar-se às administradoras. Quando optam por emiti-los, devem gerenciar todo o sistema e pedir autorização para trabalhar nesse setor de mercado para o Conselho Monetário Nacional, além de estarem sujeitos à fiscalização do Banco Central do Brasil, conforme o art. 10, IX e X da Lei n. 4.595, de 31 de dezembro de 1964.

O banco, quando não emite o cartão, não está sujeito à autorização do referido Conselho, uma vez que tal exigência é dispensada quando a atividade é desenvolvida por instituição não financeira, no caso, a administradora do cartão.

Nessa última hipótese, o banco funciona como concessor de crédito para o usuário, devendo pagar ao fornecedor os gastos feitos pelo titular.

6.3.3. Empresas Industriais e Comerciais

O cartão de crédito foi desenvolvido a partir de cartões emitidos por fornecedores de produtos para clientes preferenciais, nas cadeias de hotéis na Europa e postos de gasolina nos Estados Unidos, os cartões chamados de cartões de credenciamento ou de “bom pagador”.

Eles concedem créditos a seus usuários para que efetuem pagamentos das mercadorias ou de serviços prestados pela emissora que é também um estabelecimento comercial.

Esses cartões desenvolveram-se tanto, que podem possuir alguns benefícios bancários, como abertura de um crédito bancário. Exemplo desses cartões são os emitidos pela Riachuelo, C&A e Carrefour.


7. Relações Jurídicas

7.1. Emissora e Estabelecimentos Filiados

A relação entre a emissora e o estabelecimento que fornece produtos ou serviços é estabelecida por um contrato de filiação típico e de adesão. Ele traz obrigações para ambas às partes.

Ao contrário das relações típicas de consumo entre titular e a emissora e o titular e os estabelecimentos, a relação entre a emissora e os estabelecimentos filiados possuem um caráter comercial.

Muitos consumidores são impedidos de comprarem produtos ou serviços pelo preço à vista, ou até mesmo participarem de promoções quando pretendem efetuar o pagamento com cartão de crédito.

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Podem os consumidores exigir que sejam seus direitos atendidos pelos fornecedores como dispõe a Lei Delegada 4/62, Portaria Sunab 34/91 e Lei 8.078/90, que vedam a duplicidade de preço para a mesma mercadoria vendida à vista, assegurando ao consumidor o direito de comprar o produto ou beneficiar-se pelo menor dos preços.

Essa prática é abusiva e a propaganda é enganosa e o consumidor tem a possibilidade de denunciar o estabelecimento à administradora.

O fornecedor se compromete a aceitar o cartão do titular como meio de pagamento de bens e serviços sem aumento das despesas, ou seja, pelo mesmo preço pago, em espécie por qualquer outro comprador, como ensina Nelson Abrão10.

Reynaldo Ribeiro Diauto11, tem o mesmo entendimento, ao citar decisão do Ilustre Sacha Calmon Navarro Coelho, quando era Juiz Federal da 12ª vara, que indeferiu e extinguiu um mandato de segurança, impetrado pelo Clube dos Diretores Lojistas:

“Se os comerciantes se sentem prejudicados pelo fato de somente poderem vir a ser ressarcidos pelas administradoras dos cartões de crédito em aproximadamente trinta dias após a venda, e por isso, não querem suportar tal “prejuízo”, então, como bem ponderado pelo douto magistrado retro citado, que alterem o visual do pórtico dos seus estabelecimentos, e, ao invés de estamparem os coloridos logotipos das administradoras de cartões de crédito, que afixem os dizeres: “não aceitamos cartões de crédito”, ou então, que melhor se entendam com aquelas empresas. Querer simplesmente repassar para o comprador o custo do aproveitamento de clientela alheia; data vênia dos que entendem o contrário, parece-nos algo antiético, imoral e, sobretudo, antijurídico, traduzindo-se em conduta que deve ser rechaçada pelo Poder Judiciário”.

No momento da compra, o fornecedor se obriga a verificar a autenticidade da assinatura posta na fatura pelo consumidor, conferindo-a com o cartão de crédito e outro documento de identificação. Assinada a nota da venda, cabe ao fornecedor dar quitação da obrigação para o usuário. Assim, aquele não poderá cobrar novamente do titular o valor da sua compra. É essa nota assinada que habilita o fornecedor a exercer seu direito perante a administradora para receber o crédito.

Cabe também a ele verificar a validade do cartão e o limite de crédito disponível para o consumidor, não podendo aceitar a compra quando o referido crédito for ultrapassado. Quando da verificação da validade do cartão, deve o fornecedor também se certificar que o mesmo não foi bloqueado por furto, roubo, extravio ou se consta na lista de cartões cancelados ou suspensos.

E, por fim, cabe ao fornecedor pagar a administradora uma remuneração que recai sobre o montante de vendas feitas pelos consumidores em seu estabelecimento comercial. Essa comissão objetiva compensar os riscos que corre a emissora quanto ao não pagamento das despesas feitas pelo titular.

Quanto à emissora, esta deve disponibilizar informações atualizadas sobre os cartões que estão disponíveis para compra dos usuários, a lista dos cartões suspensos e cancelados e aqueles que foram tidos como furtados, extraviados ou roubados, isso, com o intuito de tornar o serviço eficiente e evitar fraudes.

Cabe também à administradora realizar publicidade para os usuários, divulgando os estabelecimentos cadastrados em que os mesmos podem fazer suas compras.

A administradora também compromete a efetuar o pagamento de todos os produtos e serviços adquiridos pelos titulares dos cartões, arcando com os riscos do não pagamento e da insolvência do comprador. Assim, se o usuário não efetuar o pagamento no vencimento da fatura, o fornecedor não deixa de receber pela venda ou prestação de serviço feita. A emissora deverá, dessa forma, buscar a satisfação do crédito junto ao usuário.

Normalmente nos contratos de filiação celebrados entre os estabelecimentos e a administradora há uma cláusula expressa determinando que as questões referentes à qualidade, quantidade ou vícios da coisa vendida serão resolvidas diretamente entre o fornecedor e titular do cartão.

É vantajoso para os estabelecimentos porque atraem consumidores que realizam seus pagamentos através dos cartões de crédito, tendo a certeza do recebimento do preço, e, também, é para a emissora, pelo recebimento da taxa de administração, normalmente de três a dez por cento, para cada operação realizada.

7.2. Titular e Estabelecimento Comercial

A relação existente entre o titular e o fornecedor, em uma rápida análise, seria um contrato típico de compra e venda ou de prestação de serviços, ou seja, um contrato típico de consumo regido pelo Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor.

No tocante às obrigações existentes entre titular e fornecedor, este cede o crédito que tem para com o portador do cartão à emissora, em troca da promessa que este lhe faz de pagar os débitos daquele.

A relação existente entre usuário e fornecedor se extingue no momento da assinatura da fatura e a entrega da mercadoria ou da prestação de serviço.

O estabelecimento responde para com o adquirente por quaisquer vícios de qualidade por insegurança ou por inadequação ou quantidade nos produtos ou serviços adquiridos pelo titular, tanto que o usuário pode ajuizar contra o vendedor.

Da mesma forma, quando há uso indevido do cartão, como por exemplo, a aceitação de um cuja validade já venceu ou a utilização acima do limite disponível, a administradora não pagará ao estabelecimento tal quantia, devendo o mesmo buscar sua satisfação junto ao usuário.

Entretanto, há uma posição minoritária na doutrina que defende a idéia do sistema contratual de cartão de crédito tratar-se de uma operação a prazo. Esse tipo de interpretação reflete diretamente na responsabilidade da administradora e do Banco ou instituição financeira.

Porém, tal entendimento não está em consonância com o sistema contratual do cartão de crédito, que é um típico contrato de compra e venda ou prestação de serviços, tanto que, no caso ocorra a inadimplência da emissora para com o estabelecimento, este deve persegui-la, não lhe sendo facultado voltar-se contra o titular, uma vez que o vínculo existente entre ambos encerra-se no momento da assinatura da fatura.

7.3. Titular e Emissora

A relação entre o emissora e o titular do cartão ocorre através da formalização de um contrato de adesão. Porém, antes desse contrato, as informações fornecidas pelo pretenso titular, devem ser aceitas pela emissora, só então o contrato será pactuado entre as partes.

Como se trata de relação de consumo, Caio Mário da Silva Pereira esclarece esse tipo de contrato, acolhendo o art. 54. do Código de Defesa do Consumidor:

“Os contratos de adesão vêm hoje previstos, no tocante a seu conteúdo e regras de interpretação no Código de Proteção e Defesa do Consumidor, que ficou assim redigido: ‘Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo”.12

Nesse contrato também ocorre uma abertura de crédito, até um certo limite a favor do titular, concedida pela emissora, possibilitando que ele use o cartão para adquirir produtos e serviços nos estabelecimentos credenciados. O titular, não paga diretamente ao estabelecimento, ele assina uma nota que dá direito ao estabelecimento cobrar da emissora o valor devido, isso, em decorrência ao contrato celebrado entre o estabelecimento e a emissora. O titular efetua o pagamento à emissora, numa data convencionada entre a emissora e o titular.

Nelson Abrão13 entende que dessa relação o titular não pode se opor a que a emissora pague o estabelecimento e ele não pode se recusar a reembolsar a emissora alegando as exceções que teria contra o estabelecimento.

Na relação existente entre emissora e titular, esse deve àquele uma anuidade referente às despesas administrativas do sistema, variando o valor de acordo com a modalidade do cartão de crédito. Tanto essa referida taxa quanto os deveres e direitos das partes são determinados em contrato de adesão assinado por elas.

Assim, essa relação além do contrato de adesão é também considerado contrato de prestação de serviços por causa da taxa retro referida. Pode também pagar uma outra taxa de administração, quando a emissora adquire em nome do titular, empréstimos junto a instituições financeiras nos casos e financiamento. A doutrina considera tanto um contrato de prestação de serviços que se justifica pela cobrança de ISS da emissora.

Portanto, não há divergência no que tange as responsabilidades do titular e da emissora do cartão de crédito.

7.4. Instituições Financeiras

Nos cartões bancários também há essa quarta figura nas relações entre as partes do sistema contratual do cartão, funcionando como fornecedora de crédito ao usuário. Sua origem é a cláusula-mandato outorgada pelo consumidor para a administradora para que essa contrate, em nome daquele, concessão de crédito bancário.

Dessa forma, os bancos possibilitam que o consumidor saque em moeda corrente dentro do limite disponível para tanto em seu cartão, além de parcelar seus débitos, constituindo, assim, o chamado crédito rotativo. Essa referida cláusula-mandato permite que a administradora emita títulos de crédito em nome do consumidor, a favor do banco.

Portanto, assim que o titular realiza despesa com o cartão de crédito, a emissora terá o valor pago imediatamente pelo banco, que passará a ser o novo credor do consumidor.

Sobre o autor
Daniel Duarte Costa de Avelar

Pós graduado e mestrando em Direito Empresarial pelas Faculdades Milton Campos. Graduado em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos. Advogado em Belo Horizonte/MG.

Informações sobre o texto

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