Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Processo penal de emergência: O emprego da prisão preventiva como método para obtenção de delações premiadas na Operação Lava Jato

Exibindo página 3 de 3
Agenda 17/08/2018 às 12:35

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O emprego da prisão preventiva como forma de obter a delação premiada acaba configurando uma medida emergencial, posto que viola o sistema garantista penal. É importante, por assim dizer, que a prisão preventiva não pode ser usada como forma de cerceamento de defesa, é necessário que se respeitem os princípios axiológicos do processo penal, verificando-se os pressupostos e notadamente o fundamento da prisão preventiva com base no fumus comissi delicti e o periculum libertatis. Ressalte-se que o magistrado ao fundamentar a sua decisão deve decidir de forma justa e adequada, guiando-se pelos valores e princípios da constituição e principalmente pelos métodos de interpretação, de modo a evitar meras impressões. Caso o magistrado não atenda esses métodos, dará margem ao ativismo judicial.

Saliente-se que diante da lentidão e ineficácia do sistema judiciário em combater a criminalidade organizada, o judiciário cada vez mais tem dado preferência as medidas emergenciais, mais notadamente a delação premiada ao invés de adotar medidas que não violem o sistema acusatório criminal. Além disso, muito tem se discutido de que o emprego da delação premiada acaba ocasionando violação ao princípio da presunção de inocência, direito ao silêncio e o compromisso de dizer a verdade.

Efetivamente, a Carta Magna de 1988 considera ilegítima a violação desses princípios e alguns doutrinadores vislumbram que o emprego da prisão preventiva como forma de obter a delação premiada, acaba tendo contornos de verdadeira pena antecipada, violando o devido processo legal.  A prisão preventiva deve ser utilizada para garantir o eficaz funcionamento da persecução penal e não para fins diversos sob pena de violar os direitos fundamentais. Deste modo, não configura legítimo o fundamento de que a garantia da ordem pública é por si só, suficiente para a decretação da prisão preventiva; faz-se necessária a verificação de outras circunstâncias.

Diante disso, note-se que os poderes públicos atendendo o clamor social se veem compelidos a dar uma resposta efetiva, criando leis mais duras e eficientes, que advêm da política expansionista. Nessa toada, as garantias processuais penais acabam sendo colocadas em xeque como forma de combater, de qualquer modo, a organização criminosa. Por fim, diante dessas considerações, o emprego da prisão preventiva para obter a confissão do investigado não é revestido de legalidade, mas tão somente adotado como prática inquisitiva.


REFERÊNCIAS

ADALBERTO, José Aranha. Da Prova no Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

ALBAN, Rafaela. Sebástian, Mello. Limites da renúncia a direitos nos acordos de delação premiada. In: RIBEIRO, Luiz Gustavo Gonçalves; TARREGA, Maria Cristina Vidotte Blanco. (Org.). Novas perspectivas do direito: diálogos ou disjunções entre o direito público e o direito privado. 1ed. Florianópolis: CONPEDI, 2017, v. único, p. 346-364.

ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica: A teoria do discurso racional como teoria da justificação jurídica. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005.

AMARAL, Augusto Jobim e Gloeckner, Ricardo Jacobsen. Delação nos sistemas punitivos contemdeporâneos. São Paulo: IBCCRIM, ano 17, n. 128. 2017.

ARRUDA, Rejane Alves de. Org. Ricardo Souza Pereira. Organização Criminosa – comentário à lei 12.850/13, de 05 de agosto de 2013. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2013.

BITTAR, Walter Barbosa. Delação Premiada (Direito Estrangeiro Doutrina e Jurisprudência). 2ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

BRASIL. Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/DecretoLei/Del2848.htm>. Acesso em: 02 de agosto de 2017.

______. Constituição Federal, de 05 de outubro de 1988. Presidência da República. Disponível em: <www.presidencia.gov.br>. Acesso em: 18 de agosto de 2017

______. Lei nº. 9.034, de 3 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 4 mai. 1995. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9034.htm. Acesso em: 18 de setembro de 2017.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

______. Superior Tribunal de Justiça.  Habeas Corpus/nº 162451. Paciente: Maria Cristina Almeida Batista. Relator: Haroldo Rodrigues. Brasília, 15 de junho de 2010. Disponvíel em: < http://dj.stj.jus.br > Acesso em: 15 de novembro de 2017

______. Tribunal Regional Federal da 4ª região. Despacho nº 502425172.2015.4.04.7000. Acusado: Marcelo Bahia Odebrecht. Órgão julgador: 13ª Vara Federal de Curitiba. Juiz: Sérgio Fernando mouro, Paraná, de 15 de junho de 2015. Disponível em <www.trf4.jus.br>. Acesso em: 19 de setembro de 2017.

______. Tribunal Regional Federal da 4ª região. Despacho/decisão nº 0501024-41.2017.4.02.5101. Acusado: Eike Batista. Órgão julgador: 13ª Vara Federal de Curitiba. Juiz: Marcelo da Costa Bretas, Rio de Janeiro, 13 de janeiro de 2017. Disponível em <www.trf2.jus.br>. Acesso em: 09 de outubro de 2017.

______. Supremo Tribunal Federal. Decisão/ Pet 6.049. Acusado: Marcelo Bahia Odebrecht. Requerente: Ministério Público Federal. Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Brasília, 2016. Disponível em: <www.stf.jus.br > Acesso em: 15 de outubro de 2017.

______.Código de Processo Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm>. Acesso em: 18 de setembro de 2017

BRASILEIRO, Renato. Legislação criminal especial comentada. 2ª. ed. Salvador: Juspodivm, 2014

CAPPELLETTI, Mauro. Juízes legisladores? trad. por Carlos Alberto Álvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1993.

CHOUKR, Fauzi Hassan. Processo Penal de Emergência. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002.

CUNHA. Rogério Sanches/PINTO. Ronaldo Batista. Crime organizado – comentários à nova lei de crime organizado. 1ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2013.

DE CARLI, Carla Veríssimo. Delação premiada no Brasil: do quê exatamente estamos falando? In Boletim IBCCRIM. São Paulo: IBCCRIM, ano 17, n.204, p.16-18, nov, 2009.

DUTRA, Marcos Paulo. Colaboração (Delação) Premiada. 2ª ed. São Paulo: JUSPODVIM. 2017

DWORKIN, Ronald. O impérito do Direito (Trad. De Jefferson Ruiz Camargo). 2ª. ed. São Paulo: Martins. 1999

FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional. 5ª.ed. Rev atual e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos tribunais, 2007

FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal, São Paulo: Revista dos tribunais, 2002.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século: Dicionário da Língua Portuguesa. 3ª. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.

FRANCO, Alberto Silva. Crimes Hediondos: notas sobre a Lei 8.072/90. 3ª ed. revista e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.

GOMES, Luiz Flávio e CERVINI, Raúl. Crime Organizado: enfoques criminológico, jurídico e político-criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

GOMES, Luiz Flávio. Corrupção Política e Delação Premiada. Revista Síntese de Direito Penal e Processual Penal, 2005

______. Justiça Colaborativa e Delação Premiada. 2010. Disponível em: < http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/2108608/justica-colaborativa-e-delacao-premiada > Acesso em 10 novembro de 2017.

GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método I: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. 11ª. ed. Petrópolis: Vozes, 2011

JESUS, Damásio de. O prêmio à delação premiada nos crimes hediondos. Boletim IBCCRIM, n.5, 1993

LIMA, Márcio Barra. A colaboração premiada como instrumento constitucionalmente legítimo de auxílio à atividade estatal de persecução criminal. In: CALABRICH, Bruno; FISCHER, Douglas; PELELLA, Eduardo (Org.). Garantismo penal integral. Salvador: Juspodivm, 2010, p. 278.

LOPES JR., Aury. Direito processual penal. 11ª. ed. São Paulo: Saraiva 2014

LUISI, Luiz. Prefácio. In: PIERANGELLI, José Henrique. Códigos Penais do Brasil: Evolução Histórica. São Paulo: 2001.

MACHADO, J.E. Processo Penal de Emergência e Delação Premiada: A involução trazida pelo fenômeno emergencial ao Processo Penal Brasileiro e a adoção da delação premiada nesse contexto. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2012. Disponível em: <www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/67375/000871967.pdf?sequence=1>. Acesso em: 23 de outubro de 2017.

MASSON, Cleber e MARÇAL, Vinícius. Crime Organizado. 3ª ed. São Paulo: Método, 2017.

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 20ª. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado: Aspectos gerais e mecanismos legais. 6ª. ed. São Paulo: Atlas, 2016

MESSA, Ana Flávia e CARNEIRO, José Reinaldo Guimarães. Crime Organizado. São Paulo: Saraiva, 2012

MITTERMAYER. Tratado da Prova em matéria Criminal. Tradução de Hebert Wuntzel Heinrich. 3ª. ed. Campinhas. Bookseller, 1999.

MORAIS, Alexandre. A teoria dos jogos aplicada ao processo penal. 2ª. ed. Empório do direito, 2015

NUNES, Leandro Bastos. Análise da legalidade da prisão preventiva à luz da vedação da proteção deficiente. Publicado em 01/2017. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/55513/analise-da-legalidade-da-prisao-preventiva-a-luz-da-vedacao-da-protecao-deficiente. Acesso em: 13 novembro de 2017>.

______. A Colaboração Premiada e o Acordo de Leniência na Operação Lava Jato. Publicado em 01/2017. Disponível em: <https://pt.linkedin.com/pulse/dela%C3%A7%C3%A3o-premiada-e-o-acordo-de-leni%C3%AAncia-na-lava-jato-bastos-nunes>. Acesso em: 20 de outubro de 2017.

OLIVEIRA, Cristiano. Processo Penal de Emergência http://www.biblioteca.pucminas.br/teses/Direito_FerreiraCO_1.pdf

PACELLI, Eugênio. Curso de processo penal. 18ª. ed. São Paulo: Atlas, 2014.

PEREIRA, Francisco Valdez. Valor Probatório da Colaboração Processual (delação premiada). Revista Brasileira de Ciências Criminais. P. 175-201. Ano 17, n.77, março abril de 2009.

RAVAZZANO, Fernanda. Pacote anticorrupcao – Prisão para recuperação do dinheiro. Disponível em: <http://canalcienciascriminais.com.br/pacote-anticorrupcao-prisao-para-delacao-e-prisao-para-recuperacao-do-dinheiro/>. Acesso em: 12 de novembro de 2017

ROXIN, Claus. Autoría y domínio del hecho en derecho penal. Madrid/Barcelona: Marcial Pons, 2000. Tradução de Joaquín Cuello Contreras e José Luis Serrano Gonzáles de Murillo.

SAGUINÉ, Odone. Efeitos perversos da prisão cautelar.  Revista Brasileira de Ciências Criminais. - Ano 18, n. 86, set./out. 2010.

______. A inconstitucionalidade do clamor público como fundamento da prisão preventiva. Revista de estudos criminais, Porto Alegre: nº 10, 2003

SILVA, Eduardo Araújo da. Crime Organizado: Procedimento Probatório. São Paulo: Atlas. 2003

STRECK, Lênio Luiz. Diferença (ontológica) Entre texto e Norma: afastando o fantasma do relativismo. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Lisboa, v. XLVI

______. O direito de obter respostas constitucionalmente adequadas em tempos de crise do direito: a necessária concretização dos direitos humanos. Disponível em: http://periodicos.ufpa.br/index.php/hendu/article/viewFile/374/601. Acesso em: 15 de nov. de 2017.

______. O que é isto: decisão conforme minha consciência? 4ª. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013. 

______. Entrevista Lênio Streck. Revista CAASP. Dezembro de 2016, ano 5, p. 9

VALDEZ, Francisco. O valor probatório da delação premiada. Revista IBCCRIM. Abril de 2009, ano 17, p. 186

ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Crime organizado: uma categoria frustrada. Discursos sediciosos: crime, direito e sociedade, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p. 45-67, jan/jun. 1996.

Sobre a autora
Ioni Carine Cavalcante Sá

Advogada. Pós-graduanda em Direito Processual Penal e Direito Imobiliário. Defensora Dativa da OAB/BA. Integrante do Grupo de Estudos - Sistema Penal e Necropolítica - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SÁ, Ioni Carine Cavalcante. Processo penal de emergência: O emprego da prisão preventiva como método para obtenção de delações premiadas na Operação Lava Jato. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5525, 17 ago. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68322. Acesso em: 23 dez. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!