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Processo penal de emergência: O emprego da prisão preventiva como método para obtenção de delações premiadas na Operação Lava Jato

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17/08/2018 às 12:35
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O emprego da prisão preventiva para obter a confissão do investigado não é revestido de legalidade, mas tão somente adotado como prática inquisitiva.

RESUMO: Trata o presente estudo do uso desenfreado da delação premiada na Operação Lava Jato, que visa a assegurar a recuperação de bens e valores da administração pública. Frise-se que o instituto da delação premiada, influenciado pela cultura emergencial, acabou sendo, muitas vezes, condicionado à prisão preventiva na aludida operação. Tem-se como hipótese central o pensamento no sentido de alguns dos fundamentos e requisitos utilizados pelos magistrados ao decretarem prisões preventivas dos investigados na aludida operação com o fito de impulsionar o instituto da delação premiada, violaram os ditames constitucionais e os pilares axiológicos do processo penal. Para a concretização da pesquisa foram utilizados os métodos argumentativos e diáletico, recorrendo-se, no campo das técnicas, teses de mestrado, artigos científicos, além de análise de decisões judiciais. Concluiu-se que, de fato, algumas das prisões preventivas decretadas no curso da aludida operação não obedeceram aos métodos de interpretação, ensejando de tal forma o arbítrio e o ativismo judicial, além de ferir os direitos e garantias fundamentais do acusado.

Palavras-Chave: Delação Premiada. Processo Penal. Prisão Preventiva. Cultura Emergencial. Ativismo judicial


1 INTRODUÇÃO

A delação premiada tem sido utilizada de forma frequente na Operação Lava Jato. Trata-se de um instituto, no qual um autor denuncia à autoridade competente outros corréus, a fim de melhorar sua condição no processo e também auxiliar no desvendamento do crime. No entanto, este instituto tem sido alvo de diversas críticas por parte da doutrina e da jurisprudência, posto que seu uso indiscriminado na aludida operação acaba sendo condicionado, muitas vezes, à prisão preventiva.

O estudo versa, portanto, sobre o uso reiterado da prisão preventiva para impulsionar delações premiadas dos investigados na Operação Lava Jato. Nesse passo, o que se intenta analisar é se a obtenção da delação premiada quando o investigado está em cárcere atende ou não às exigências do garantismo penal. Ressalte-se que, para a realização da pesquisa foi feita uma revisão bibliográfica e jurisprudencial, logo se utilizou de obras, artigos científicos, revistas jurídicas, além de análise de decisões judiciais

Assim, objetivando-se organizar este trabalho em conformidade com o objetivo proposto, dividir-se-á a sua estrutura, a fim de melhor expor os principais aspectos que compõem o tema. Inicialmente, para o desenvolvimento do tema, é necessário discorrer sobre o panorama do instituto da delação premiada, seu conceito, breve histórico e seu valor probatório. Em seguida, será abordado acerca dos requisitos da delação premiada na Lei de Crimes Organizados. É necessário, ainda, o estudo das principais correntes doutrinárias a respeito do instituto da delação premiada, destacando a lição de Fauzi Chouckr que diferencia a emergência na seara penal da seara constitucional, os estudos de Luigi Ferrajoli e Eugenio Raúl Zaffaroni, no qual enfatizam que o instituto da delação premiada é influenciado pela cultura emergencial.

Finalmente, almejando a plena assimilação do problema, analisam-se as decisões que decretaram as prisões de alguns dos investigados na sobredita operação, na qual demonstram que o Estado, muitas vezes, procura buscar a eficiência e o êxito da persecução penal em prejuízo dos direitos e garantias fundamentais. Será verificado nesse capítulo que alguns dos fundamentos utilizados para decretar a prisão preventiva dos acusados, Marcelo Odebrecht e Eike Batista, na Operação Lava Jato entraram em desarmonia com o direito fundamental da presunção de inocência previsto no art.5º, inciso LVII da Carta Magna. Nessa mesma oportunidade, será abordado acerca dos métodos de interpretação, que melhor se adeque a um processo jurisdicional democrático de modo a evitar decisões judiciais de posturas arbitrárias.


2 O INSTITUTO DA DELAÇÃO PREMIADA

Neste capítulo, irá ser abordado primeiramente acerca do conceito da delação premiada e suas distinções conceituais, demonstrando que esse instituto tem como fito suprir a deficiência do Estado em combater o crime organizado. Logo após, será demonstrado a sua evolução histórica e, por fim, o seu valor probatório, consistindo no meio de prova fundado nas declarações do delator.

2.1 Conceito e distinções conceituais

A delação premiada é tida como instituto novo no contexto do ordenamento jurídico nacional, tratando-se de uma fonte de prova no processo penal brasileiro. Saliente-se que a expressão delação é oriunda do latim delatione e significa “denunciar, revelar (crime ou delito); acusar como autor de crime ou delito, deixar perceber; denunciar como culpado; denunciar-se como culpado, acusar-se” (FERREIRA, 1999, p.617). Marcos Paulo Dutra Santos (2017, p.99) afirma que a delação premiada é um plus em relação confissão, pois, àquela traz informações além de admitir o fato delituoso.

É de bom alvitre mencionar que o instituto da delação premiada não se confunde com a colaboração premiada, posto que nesta não há uma delação. A colaboração premiada é mais ampla, no momento em que o colaborador na investigação assume a culpa sem incriminar o outro, existindo assim, a figura do colaborador. A partir do instante que o investigado admite a sua culpa e incrimina o terceiro, estar-se-á diante da delação premiada (GOMES, 2010, p.45).

Nesse diapasão, cumpre destacar que, na delação premiada, busca-se identificar os membros da organização criminosa, para que possibilite a cessação da atividade ilícita. Já na colaboração premiada, a finalidade é a indicação onde a vítima pode ser encontrada como afirma, o Procurador da República, Leandro Bastos Nunes (2017). Alguns doutrinadores, como Rejane Alves de Arruda e Gustavo de Meringhi (2013, p.73), aduzem que delação e colaboração podem ser sinônimos para fins didáticos.

Luiz Flávio Gomes (2005, p.18) leciona acerca da eticidade que envolve os institutos supramencionados. O autor aduz que, na colaboração premiada, não há questionamento ético e quanto ao instituto da delação, este pode implicar na traição. Nessa linha lógica, Augusto Jobim de Amaral e Ricardo Jacobsen (2017, p.7) reconhecem que a premiação da delação premiada é simplesmente querer transmitir valores negativos. Enfatizam que esse instituto configura como uma chantagem meramente institucionalizada.

Segundo Walter Barbosa Bittar (2011, p.1), o sobredito instituto pode ter dois significados nas ciências penais. No primeiro momento, a delação, no sentido de denunciar, significa o conhecimento por parte da autoridade policial acerca do fato delituoso, assim o delator não teria nenhuma relação com o fato criminoso. Do outro vértice, tem o significado de revelar, no dado instante em que o acusado admite a sua responsabilidade por um ou mais delitos, acompanhada da ajuda dos investigadores para o conhecimento do mundo criminal a que pertencia.

Frise-se que a doutrina e a jurisprudência reconhecem a confissão do delator como prova legítima desde que submetida ao princípio do contraditório e a ampla defesa e tenha suporte em outras provas. Este instituto caracteriza-se de forma contratual, de modo que elenca obrigações de cada parte: de um lado o Parquet, no qual oferece uma penalização mais branda pela colaboração do acusado, do outro lado o acusado, o qual fica obrigado a falar a verdade e a renunciar o seu direito ao silêncio e auto-incriminação.

No que tange à natureza do supracitado instituto, Marcelo Batlouni Mendroni (2016, p.151) aduz que decorre da aplicação do princípio do consenso, no qual consiste que as partes entrem em consenso a respeito da situação jurídica do acusado. O autor leciona, ainda, que consiste em uma forma de “barganha’’, uma vez que os agentes públicos ficam por lei autorizados a realizarem acordos com os suspeitos.

2.2 Breve histórico

O instituto da delação premiada, embora seja um novel legislativo, encontra previsão no Livro Quinto, Título CXVI, das Ordenações Filipinas, na qual, oferecia vantagens penais àqueles que cometiam delitos, por meio de informações prestadas às autoridades penais com escopo de levar a prisão de outrem (BARRA, 2010, p.272). Assim, conforme destacam Ana Flávia e José Reinaldo (2012, p.160), caso o indíviduo indicasse o culpado, àquele receberia o perdão e um autêntico prêmio.

O legislador nacional teve como inspiração a legislação premial italiana, tendo em vista que, desde a década de 70 e principalmente no final da década de 80, a Itália versou sobre a possibilidade de concessão de vantagens para os acusados que forneciam informações às autoridades competentes, confessando a autoria do fato criminoso, bem como indicando coautores e propiciando provas desconhecidas. Frise-se que o método utilizado nessa época era de tortura para que assim obtesse a verdade do investigado, sendo tal ato, visto como uma espécie de jogo (BARRA, 2010, p.272).

Nessa linha lógica, frise-se que o instituto da delação premiada teve origem no direito brasileiro no art. 7º, da Lei n.8.072/90 – Lei de Crimes Hediondos, oportunidade na qual o legislador determinou a inserção do §4º ao art. 159 do Código Penal. Conforme lição de Damásio de Jesus (1993), a colaboração premiada não era muito utilizada e tratava-se de um instrumento falido, posto que, não havia regras que visavam à proteção do réu colaborador. Diante disso, foram adotados métodos a fim de estimular a cooperação dos investigados em delatar os seus companheiros.

Nessa toada, saliente-se que houve a difusão do supramencionado instituto em diversas legislações, tendo sido modificado ao longo dos anos como forma de combater de forma eficiente diversos crimes, mais notadamente o crime organizado. Eduardo Araújo (2003, p.48) aduz que essa modificação das ferramentas de colheita de provas é de acordo com o avanço da tecnologia e com o comportamento assumido pelas organizações criminosas.

Consoante aduz Marcelo Batlouni Mendroni (2016, p.153), há leis variadas que dispõem acerca da aplicação do instituto da delação premiada: A Lei nº 12.850/13 (dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal), a Lei nº 9.034/95 (dispõe sobre a utilização dos meios operacionais para a prevenção e represão de ações praticadas por organizações criminosas), a Lei nº 9.613/98 (dispõe sobre os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores), a Lei nº 9.807/99 (estabelece normas para a organização e a manutenção de programas especiais de proteção as vitímas e testemunhas ameaçadas), a Lei nº 8.072/90 (dispõe sobre crimes hediondos), a Lei nº 8.137/90 (define crimes contra a ordem tributária e contra as relações de consumo), a Lei nº 7.492/86 e por fim a Lei nº 9.269/96 (extorsão mediante sequestro).

Nessa toada, frise-se que estas leis possuem distinções para que o investigado receba os benefícios do aludido instituto. No entanto, essas leis possuem requisitos em comum: a efetividade da colaboração, participação do delator na prática da infração, colaboração voluntária. Assim, tendo em vista essa evolução legislativa, cumpre mencionar que o legislador está se preocupando cada vez mais em combater a criminalidade, em especial o crime organizado. Esse instituto da delação premiada assegura o interesse das partes e da persecução penal de forma simultânea, de modo que a acusação receba informações que vão além da admissão do fato delituoso.

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2.3 O valor probatório da Delação Premiada

 O instrumento da delação premiada, como forma de obter a confissão espontânea do acusado, configura uma fonte de prova no processo penal brasileiro. Esse meio de prova fundado nas declarações do co-imputado para garantir a efetividade da persecução penal é considerado pela doutrina e jurisprudência uma prova legítima (VALDEZ, 2009, p.176).

A declaração dos co-imputados na fase preliminar deve ser analisada no âmbito de sua valoração, fator preponderante para a decisão. Nessa senda, cabe elucidar acerca do princípio da unidade da prova, a fim de compreender a sua importância no direito processual penal, tem-se que o aludido princípio expõe que uma vez produzida a prova, esta passa integrar todo o processo, pouco importando quem a produziu. A aplicação do princípio da unidade da prova tem a função de formar a convicção do juiz, na qual aprecia-se indícios, contra indícios e elementosde provas.

Segundo Marcelo Batlouni Mendroni (2016, p.152) ''a delação não pode ser considerada um acordo, visto que, envolve uma decisão judicial, ou seja, por uma ''terceira parte'', que não participa da negociação''. A situação da revelação das informações existe entre o acusado e o promotor de justiça e, com a expressa anuência deste, sendo assim, a decisão final caberá ao juiz, por conceder ou não algum benefício como troca. Nesse trilho, é necessário pontuar que as provas da acusação devem ser capazes de superar a presunção de inocência do acusado, premissa que demonstra que o órgão estatal deve se ater à dignidade do cidadão, respeitando a liberdade e a segurança (VALDEZ, 2009, p.186). 

Para que esta prova seja disciplinada no processo penal, torna-se necessário que seja induvidosa e segura. Caso esta prova não seja legítima, o acusado deverá ser absolvido. Assim, a prova da culpabillidade deve ser qualificada de forma que nenhuma condenação será proferida se a prova for insegura e duvidosa, respeitando assim o principio da presunção de inocência conhecido como princípio-garantia. Daí se extrai a ideia de que não pode imputar responsabilidade penal à alguem com base apenas na delação premiada. (VALDEZ, 2009, p. 186). Augusto Jobim de Amaral e Ricardo Jacobsen (2017, p.6) afirmam que o instituto da delação premiada possui um enorme custo de enunciação. O que se quer dizer acerca deste custo é que a confissão do delator acaba reforçando a relação de submissão ao poder punitivo.

Observa-se que o art. 5, inciso 16 da Lei nº 12.850/2013 considera a confissão do delator como meio de obtenção de prova. Entretanto, saliente-se que a condenação baseada apenas em afirmação do delator é insuficiente para a condenação, violando o princípio da presunção de inocência previsto expressamente no artigo 5º, inciso LVII, da CF/88. Por esse aspecto, revela-se notório mencionar que caso a condenação do delatado apenas se baseie em declarações do colaborador, deverá àquele ser absolvido diante da ausência de provas irrefutáveis da autoria do delito.

Neste passo, revela-se imperioso ressaltar que alguns autores como Adalberto José Aranha (2003, p.133) toleram a delação premiada como meio de prova se estiver em harmonia com o contexto probatório. Em sentido contrário, Mittermayer (1996, p.195), aduz que os delatores, buscam benefícios e incriminam inocentes. Assim, elucida:

tem-se visto criminosos que, desesperados por conhecerem que não podem escapar à pena, se esforçam em arrastar outros cidadões para o abismo em que caem; outros denunciam cúmplices, alias, inocentes, só para afastar a suspeita dos que realmente tomaram parte no delito, ou para tornar o processo mais complicado, ou porque esperam obter tratamento menos gravosos, comprometendo pessoas em altas posições.

O juiz ao homologar o acordo de delação premiada, deverá atentar-se ao fato de que a delação é uma ''traição'', tendo em vista que, o delator poderá discorrer sobre fatos inverídicos para que assim consiga obter vantagens. Assim, o juiz deve verificar se há existência de vícios, sejam de consentimento ou coação, caso existam, deverá tornar nulo o aludido acordo. Nessa vertente, Eduardo Araújo da Silva (2003, p.145) aponta que o juiz, na valoração do instituto como prova levará em conta a combinação dos fatores de que o acusado não possui compromisso com a verdade e, ocupa a situação de beneficiário processual para alcançar benefícios processuais.

Nessa toada, cumpre frisar que as delações premiadas que são falsas ocorrem em pouquíssimos casos, posto que, caso o delator apresente uma versão falsa ou mentirosa poderá praticar outros crimes, como por exemplo, a Denunciação caluniosa, prevista no art. 339 do Código penal e a calúnia prevista no artigo 338 do mesmo Código. Inclusive, pode ocorrer o próprio afastamento do benefício e o agravamento da pena do delator pela reprovabilidade da conduta, bem como a sua periculosidade.

A delação premiada utilizada como prova será submetida aos princípios do contraditório e da ampla defesa, a exemplo disso temos o interrogatório judicial, que permite a formulação de quesitos pelos advogados dos coacusados (MESSA; CARNEIRO, 2012, p.215). Estes princípios poderão ser vislumbrados tanto na frase pré-processual quanto no curso do processo, oportunidade, na qual, o delatado terá a oportunidade de contradizer as informações que são trazidas pelo delator, ou seja, trata-se de um método de comprovação da verdade. Atesta-se esta maneira de pensar com a leitura do excerto doravante transcrito do habeas corpus n°. 162451 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) da 6ª Turma:

Embora o interrogatório mantenha seu escopo eminentemente como meio de defesa, quando envolve a acusação ou participação de outro denunciado, cria a possibilidade à defesa do litisconsorte passivo realizar reperguntas, assegurando a ampla defesa e a participação ativa do acusado no interrogatório dos corréus. 2. Não há que se confundir, nessa situação, o corréu com testemunha

A nova redação do art. 188 do CPP, dada pela Lei 10.792/2003, admitiu que as partes poderão formular perguntas ao interrogando, após o interrogatório judicial, respeitando assim o princípio do contraditório. Nessa toada, frise-se que antes desta inovação, a delação premiada era reduzida a termo e sequer era respeitado o princípio do contraditório, posto que, tratava-se de uma documentação da realização de um ato unilateral. Conforme leciona Antonio Scarance Fernandes (2007, p.295):

quando, nas constituições, se assegura a ampla defesa, entende-se que, para observância desse comando, deve a proteção derivada da cláusula constitucional abranger o direito à defesa técnica durante todo o processo e o direito à autodefesa. Colocam-se ambos em posição de diversidade e complementaridade. A defesa técnica, para ser ampla como exige o texto constitucional, apresenta-se ao processo como defesa necessária, indeclinável, plena e efetiva.

 Cumpre ressaltar que o colaborador numa ação penal promovida contra o delatado, ocupa a posição processual de testemunha, que deverá prestar compromisso com a verdade. Caso o colaborador, esteja na qualidade de comparsa, àquele deverá ser possuidor da garantia da não autoincriminação. Nesta última hipótese, a Suprema Corte, no voto do arestro do Habeas Corpus de n. 84.517-7 SP, tendo como relator o Ministro Sepúlveda, pacificou o entendimento de que a delação premiada do do co-réu é inadmissível para lastrear a condenação do delatado.

Registre-se que, caso o acusado renuncie o seu direito ao silêncio para obter os benefícios advindos do supramencionado instituto, estaria violando o devido processo legal. O art.4º, § 14 da Lei de Crimes Organizados (LCO) dispõe que: “Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade’’. Nesta renúncia ao princípio da autoincriminação, o delator deve ter supervisão de seu patrono conforme reza o artigo 4º, § 15 da LCO e pode exercer o direito de retratação (VALDEZ, 2009).

Assim, ao renunciar o direito ao silêncio, o delator irá depor judicialmente, oportunidade em que deverá confirmar suas declarações para receber as benesses da delação premiada. Nesse derradeiro, o delator deve responder as perguntas que lhe são direcionadas, tendo em vista que renunciou o seu direito de permanecer calado, no entanto, não poderá estar em compromisso de dizer a verdade, posto que, possui interesse no processo.

Caso o delator recuse a responder as perguntas feitas pela defesa, o magistrado irá analisar se os quesitos possuem relação com o objeto de apuração. Constatado que há esta relação, àquele concluirá que deverá retirar os efeitos advindos da delação premiada e ao respectivo prêmio do delator. Nessa toada, caso o juiz verifique que o delatado não responde a todas as perguntas formuladas pela defesa, maior será a possibilidade de produzir provas para conferir eficácia probatória da delação premiada (VALDEZ, 2009).

Desta sorte, torna-se imperioso ressaltar que conforme dispõe o artigo 155 do Código de Processo Penal, há a admissão do sistema da persuasão racional na apreciação de prova pelo magistrado. Assim, a convicção do juiz dar-se-á pelo contexto probatório, que deverá ser observado o princípio do contraditório e da ampla defesa. É de ser registrado que, o delatado no procedimento administrativo submete-se ao contraditório diferido, posto que, neste aludido procedimento, o delatado pode tomar conhecimentos acerca das informações que foram prestados pelo delator. Com isso, poderá empreender esforços para ocultar provas, intimidar testemunhas e inclusive destruir vestígios (VALDEZ, 2009).

De acordo com o até aqui trazido, permite-se sustentar que a colaboração premiada não pode ser considerada como prova absoluta, ou seja, não pode caracterizar uma inversão do ônus da prova até porque implicaria formar uma presunção de culpabilidade. Assim, o magistrado deve apreciar o seu convencimento acerca da credibilidade da declaração do delator e não poderá limitar-se aos aspectos internos da delação, devendo, portanto, a confissão deve ter suporte em circunstâncias, fatos ou dados externos seguros.

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Sobre a autora
Ioni Carine Cavalcante Sá

Advogada. Pós-graduanda em Direito Processual Penal e Direito Imobiliário. Defensora Dativa da OAB/BA. Integrante do Grupo de Estudos - Sistema Penal e Necropolítica - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SÁ, Ioni Carine Cavalcante. Processo penal de emergência: O emprego da prisão preventiva como método para obtenção de delações premiadas na Operação Lava Jato. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5525, 17 ago. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68322. Acesso em: 22 dez. 2024.

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