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A inocuidade dos atos administrativos punitivos do Procon e a intervenção do Poder Judiciário

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Agenda 20/12/2018 às 17:24

4. A RELAÇÃO ENTRE O PODER JUDICIÁRIO E OS ATOS ADMINISTRATIVOS PUNITIVOS DO PROCON 

As penalidades aplicadas pelo PROCON são atos administrativos punitivos, que visam punir os infratores da legislação consumerista, bem como prevenir condutas análogas, atendendo, assim, o interesse público.

Em razão de previsão constitucional, estas decisões podem ser revistas pelo Poder Judiciário, desde que não interfiram no mérito administrativo (conveniência e oportunidade), ficando a intervenção neste caso a cargo da própria Administração, através de seu poder de autotutela. 

4.1 Atos administrativos punitivos do PROCON              

O ato administrativo é uma espécie do gênero ato jurídico, sendo a expressão do exercício da função executiva da Administração Pública. Segundo Hely Lopes Meirelles:

Ato administrativo é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria.[58]

Dessa forma, para caracterização do ato administrativo é necessário que a vontade emane da Administração Pública (por meio de seus agentes ou por aqueles dotados de prerrogativas públicas), com o fim de atender ao interesse público.

Os atos administrativos possuem cinco elementos formadores, que são requisitos de validade, sem os quais a sua manutenção restará juridicamente prejudicada, podendo, assim, ocasionar a sua invalidação. Hely Lopes Meirelles os classifica como competência, finalidade, forma, motivo e objeto.[59]

Os requisitos podem ser conceituados como: competência: poder legal conferido ao agente para desempenho das atribuições; finalidade: o ato administrativo deve se destinar ao interesse público; objeto: é aquilo que o ato determina; forma: é o modo de exteriorização do ato; e motivo: é a exposição da razão que justifica o ato administrativo.

A espécie de ato administrativo que permite a Administração Pública aplicar penalidades como multas, interdição de atividades, destruição de coisas, etc, classifica-se como ato administrativo punitivo. Meirelles conceitua como:

Atos administrativos punitivos são os que contêm uma sanção imposta pela Administração àqueles que infringem disposições legais, regulamentares ou ordinatórias dos bens ou serviços públicos. Visam a punir e reprimir as infrações administrativas ou a conduta irregular dos servidores ou dos particulares perante a Administração.[60]

Estes atos fazem parte do poder de polícia conferido à Administração, possibilitando-a coibir e prevenir ilícitos administrativos.

Os atos administrativos estão sujeitos a três planos lógicos distintos: existência ou perfeição, validade e eficácia.

Alexandre Mazza conceitua o plano da existência ou da perfeição como “o cumprimento do ciclo de formação do ato”; determinando que “o plano da validade envolve a conformidade com os requisitos estabelecidos pelo ordenamento jurídico para a correta prática do ato administrativo”; e leciona que “o plano da eficácia está relacionado com a aptidão do ato para produzir efeitos jurídicos”.[61]

Sendo assim, o ato perfeito é aquele que preenche todas as etapas de sua formação; o ato válido é aquele que preenche todos os requisitos legais e regulamentares; e o ato eficaz é aquele que está apto a produzir todos os efeitos jurídicos e administrativos.

Os atos administrativos podem ser ainda classificados quanto ao grau de liberdade, se dividindo em vinculados e discricionários. Alexandre Mazza classifica os atos vinculados como “aqueles praticados pela Administração sem margem alguma de liberdade, pois a lei define de antemão todos os aspectos da conduta” e os atos discricionários como aqueles “praticados pela Administração dispondo de margem de liberdade para que o agente público decida, diante do caso concreto, qual a melhor maneira de atingir o interesse público”.[62]

Assim, os atos administrativos vinculados são aqueles que a lei determina obrigatoriamente a prática do ato e seu conteúdo também está exatamente previsto em lei, enquanto os atos administrativos discricionários são aqueles que se permite uma análise subjetiva através das valoração dos fatos. 

Segundo Hely Lopes Meirelles a atividade discricionária é justificada em virtude da impossibilidade do legislador catalogar na lei todos os atos que a prática administrativa exige.[63]

Dessa forma, tendo em vista ser impossível a previsão legal do valor de multa aplicada aos infratores da legislação consumerista em cada caso concreto, cabe ao PROCON, graduar essas sanções, observando os critérios previstos na lei, caracterizando-as como atos discricionários.

Exemplificando, pode-se dizer que quando a lei prevê um limite mínimo e máximo para gradação da sanção entre R$ 1.000,00 (um mil reais) e R$ 100.000,00 (cem mil reais), a autoridade administrativa deverá analisar os fatos, do caso concreto e decidir de acordo com os critérios previstos na legislação, qual o valor adequado da multa, sendo, então, a escolha da gradação da multa, discricionária.

No entanto, de acordo com princípios constitucionais, quais sejam, da Inafastabilidade de Jurisdição e do Duplo Grau de Jurisdição, quem sentir que seu direito está sendo ameaçado ou violado, poderá recorrer ao Poder Judiciário, em primeira e segunda instâncias.

4.2 Princípios da Inafastabilidade de Jurisdição e do Duplo Grau de Jurisdição                   

Como já foi tratado anteriormente, não há que se falar em instância superior administrativa revisora das decisões administrativas das autarquias, em razão de não haver subordinação entre elas e a Administração Pública, e sim vinculação, por meio da qual a Administração apenas verifica o cumprimento das funções que lhe foram atribuídas, realizando controle finalístico.

No entanto, a Constituição Federal vigente consolidou, em seu artigo 5°, inciso XXXV, o Princípio da Inafastabilidade do Controle Jurisdicional, dispondo que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”[64]

Esse princípio, plasmado na Constituição, viabiliza ao cidadão o direito de invocar a atividade jurisdicional, por todo aquele, pessoa física ou jurídica, que o direito foi violado ou ameaçado de violação.

O legislador constitucional elencou esse princípio como um direito fundamental e será aplicável a todos, sem distinção. Nesse sentido, Pedro Lenza dissertou que “apesar de ter por destinatário principal o legislador (que ao elaborar a lei não poderá criar mecanismos que impeçam ou dificultem o acesso ao judiciário), também se direciona a todos, de modo geral.”[65]

Destarte, o Poder Judiciário pode imiscuir-se na análise da legalidade e legitimidade de um ato praticado pela Administração Pública, tendo em vista que a legislação não limita o detentor desse direito, ao contrário, o traz como direito fundamental. É possível entender também, que não há obrigatoriedade do exaurimento da instância administrativa para que o Poder Judiciário seja acionado, pois essa condição estaria limitando o acesso ao Judiciário e a expressa previsão legal constitucional.

Ao se tratar do Princípio da Inafastabilidade Jurisdicional é imprescindível tratar do Princípio do Duplo Grau de Jurisdição. A Constituição não possui previsão expressa sobre esse princípio. No entanto, com o Decreto n° 678/92 houve a incorporação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 1969, que prevê o “direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior.”[66]

Esse princípio possibilita, por via de recurso ou automaticamente, no caso de remessa necessária, que as decisões jurídicas de primeiro grau sejam revistas nas instâncias hierarquicamente superiores. Associa-se o duplo grau de jurisdição a uma possibilidade de reexame da causa, em regra, por órgão de hierarquia superior.

Para Oreste Nestor Laspro “o duplo grau deve ser conceituado como aquele sistema jurídico em que, para cada demanda, existe a possibilidade de duas decisões válidas e completas no mesmo processo, emanadas por juízes diferentes, prevalecendo a segunda em relação à primeira.”[67]

Esse sistema jurídico possibilita o reexame de apreciação de determinada causa, por outro órgão, colegiado de instância superior, efetivando a garantia de um segundo julgamento, de modo a substituir a decisão anterior.

O direito previsto nessa Convenção pode ser agregado aos direitos brasileiros em razão da previsão do parágrafo 2°, do artigo 5°, da Constituição, que prevê que “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”[68] E, neste caso, o Brasil é signatário desta Convenção.

Em decorrência disto, as garantias previstas nesta Convenção passam a integrar o rol dos direitos e garantias protegidas constitucionalmente, por expressa previsão da própria Carta Magna.

Ada Pellegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e Antonio Magalhães Gomes Filho, lecionam que as garantias previstas na Convenção Americana sobre Direitos Humanos "integram, hoje, o sistema constitucional brasileiro, tendo o mesmo nível hierárquico das normas inscritas na Lei Maior.”[69]

Sendo assim, o disposto nos tratados internacionais, que versarem sobre Direitos Humanos, em que o Brasil seja parte estarão no mesmo grau hierárquico das normas constitucionais expressas, passando a ser considerados como se estivessem expressos na Constituição e não no âmbito da legislação ordinária.

O insatisfeito com a decisão prolatada na seara administrativa poderá, então, recorrer ao Poder Judiciário, visando a reforma ou anulação da mesma, em razão do princípio da inafastabilidade jurisdicional e, ainda, poderá recorrer da decisão do juiz de primeiro grau, à instância superior, através de recurso, em razão do Princípio do Duplo Grau de Jurisdição.

Entretanto, o fato de haver uma necessidade de recorrer judicialmente das decisões administrativas pelo inconformado, é preciso lembrar que a interferência do Poder Judiciário não pode se dar de maneira absoluta, de forma que precisa-se respeitar determinados critérios, sob pena de incorrer em arbitrariedade do próprio Poder Judiciário.

4.3 Limites judiciais na revisão das decisões do PROCON

Os órgãos administrativos, como o PROCON, são investidos da necessária parcela de poder público para o desempenho de suas atribuições, conferindo a eles autoridade ao receberem, por força de lei, a competência decisória e meios necessários para impor suas medidas de gestão.

Um desses poderes, é o poder de autotutela, que possui previsão legal na Súmula 346, do Supremo Tribunal Federal, estabelecendo que “A Administração Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos”, e na Súmula 473, do Supremo Tribunal Federal, que dispõe:

A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

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O Poder Público está submetido à leis, estando sua atuação sujeita ao controle de legalidade, sendo que quando exercido pela Administração, sobre os seus próprios atos, denomina-se autotutela. Neste sentido, é a lição de José dos Santos Carvalho Filho:

A autotutela envolve dois aspectos quanto à atuação administrativa: 1) aspectos de legalidade, em relação aos quais a Administração, de ofício, procede à revisão de atos ilegais; e 2) aspectos de mérito, em que reexamina atos anteriores quanto à conveniência e oportunidade de sua manutenção ou desfazimento.[70]

Os dois aspectos envolvidos pela autotutela são a legalidade e o mérito dos atos da Administração Pública.  Ao se tratar da legalidade de seus atos, deverá ser revisto pela Administração o controle dos atos ilegais, podendo fazê-lo de ofício ou quando provocada, anulando-os.

No que tange ao aspecto do mérito de seus atos, a Administração poderá revogar atos que se mostrarem inconvenientes ou inoportunos, ou seja, após o juízo de valor sobre a conveniência e oportunidade, a Administração poderá revogar o ato.

O poder de apreciação de seus próprios atos pela Administração não afasta a possibilidade de revisão pelo Poder Judiciário, apresentando apenas distinções sobre os aspectos em que cada um poderá imiscuir-se.

Por meio da autotutela, a Administração poderá rever questões de legalidade, bem como de mérito de seus atos, podendo agir de ofício ou mediante provocação, enquanto o Poder Judiciário não poderá imiscuir-se no mérito dos atos administrativos, podendo apenas versar sobre legalidade e legitimidade e dependendo de provocação, em razão do Princípio da Inércia Processual, que dispõe que o processo se inicia quando a parte ou interessado a requerer e se devolve por impulso oficial.

Sobre esse assunto Carvalho Filho preceituou que não pode o Judiciário controlar a conduta do administrador por alegar meramente que não a entendeu razoável, dispondo que “não lhe é lícito substituir o juízo de valor do administrador pelo seu próprio, porque a isso se coloca o óbice da separação de funções, que rege as atividades estatais. Poderá, isto sim, e até mesmo deverá, controlar os aspectos relativos à legalidade da conduta.”[71]

A análise do mérito dos atos administrativos ocasionaria ofensa ao Princípio da Separação dos Poderes, plasmado no artigo 2° da Constituição Federal, de onde é possível extrair o entendimento de que, desde que os atos administrativos não estejam ilegais, estes são independentes.

Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro, não poderia haver exame dos critérios de valor utilizados pela autoridade administrativa sob pena de se penetrar no exame da discricionariedade.[72]

Sobre isso, Carvalho Filho sustenta o mesmo entendimento de que não poderá ser apreciado pelo Judiciário, o mérito administrativo, veja:

O que é vedado ao Judiciário, como corretamente têm decidido os Tribunais, é apreciar o que se denomina normalmente de mérito administrativo, vale dizer, a ele é interditado o poder de reavaliar critérios de conveniência e oportunidade dos atos, que são privativos do administrador público. Já tivemos a oportunidade de destacar que, a se admitir essa reavaliação, estar-se-ia possibilitando que o juiz exercesse também função administrativa, o que não corresponde obviamente à sua competência. Além do mais, a invasão de atribuições é vedada na Constituição em face do sistema da tripartição dos Poderes (art. 2º).[73]

Assim, é vedado ao Judiciário, quando provocado, invadir o seara do mérito administrativo, competindo verificar tão somente se há compatibilidade do ato administrativo com a lei ou com a Constituição Federal, pois o mérito administrativo compreende a conveniência e oportunidade do ato administrativo.

Ocorre que, por vezes, o Poder Executivo através do PROCON, pode tomar certas decisões que sejam adequadas ao caso observados a proporcionalidade e a razoabilidade, e ainda assim, estão sujeitas à análise do Poder Judiciário que, ao modificá-las contraria a finalidade para a qual o PROCON foi criado: defender os interesses do consumidor e, ao mesmo tempo, tornando estas decisões inócuas.

4.4 Análise de decisões do Poder Judiciário sob atos administrativos do PROCON 

É pacífico o entendimento de que a legalidade e legitimidade dos atos administrativos podem ser apreciadas pelo Poder Judiciário, sendo ressalvado que este não poderá intervir no mérito dos atos administrativos, sendo esta, função exclusiva do administrador.

Na prática, quando um ato administrativo, notadamente, o de aplicação de penalidade administrativa consistente em multa pelo PROCON, é colocado sob a apreciação do Poder Judiciário, este último observa se o valor arbitrado respeita o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade.

Sendo assim, de acordo com os entendimentos jurisprudenciais, o Judiciário verifica se a conduta se amolda aos princípios da legalidade, razoabilidade e da proporcionalidade. Quanto aos conceitos de razoabilidade e proporcionalidade, faz-se mister trazer à baila o entendimento de Marino Pazzaglini Filho:

A razoabilidade significa a propriedade, congruência ou justeza dos motivos que originaram a medida adotada pela Administração sob o prisma do caso concreto. A proporcionalidade consiste na adequação, na compatibilidade, na suficiência da resposta administrativa ao fato ou razão que a motivou.[74]

Logo, a razoabilidade quer dizer que a atuação da autoridade administrativa deve ser justa e equilibrada, agindo de forma necessária e, quando for necessário, agir de forma adequada, ou seja, de forma proporcional, ponderando os meios utilizados pela Administração e os fins almejados.

Sobre o tema, vislumbrar-se-á a apelação cível transcrita, onde uma Instituição Financeira, ingressou com recurso contra a decisão de primeiro grau que manteve a decisão administrativa aplicada pelo PROCON Municipal de Uberaba, Minas Gerais:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA. DECISÃO ADMINISTRATIVA. PROCON. IMPOSIÇÃO DE MULTA. ATO DISCRICIONÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE CONTROLE JURISDICIONAL DO MÉRITO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE DA MULTA APLICADA. Inexiste ilegalidade da multa aplicada pelo PROCON à instituição bancária que infringe normas previstas no Código de Defesa do Consumidor. Pela prática considerada abusiva, cabem as penalidades descritas nos decretos federal e municipal. A conclusão do processo administrativo e a imposição da penalidade administrativa cabível decorre do mérito da Administração, que não pode ser controlado pelo Judiciário, a quem só compete o exame da legalidade do ato. Recurso conhecido, mas não provido.[75] (grifos nossos).

O Apelante alegou nulidade do procedimento administrativo por estar ausente de motivação, bem como sustentou que a multa aplicada não possui fundamentação legal e que foi fixada em valor totalmente desproporcional. No entanto, o recurso não foi provido, restando claro que não há ilegalidade da multa aplicada, tendo em vista estar de acordo com os Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade, bem como respeitando a legalidade e legitimidade. Ademais, afere-se que Poder Judiciário, portanto, não pode analisar o mérito das decisões administrativa.

O Superior Tribunal de Justiça dispôs sobre o assunto que “é sabido que em tema de controle judicial dos atos administrativos, a razoabilidade e a proporcionalidade decorrentes da legalidade podem e devem ser analisadas pelo Poder Judiciário, quando provocado a fazê-lo.”[76]

Logo, quando houver a insatisfação do fornecedor quanto às decisões administrativas dos PROCONs, é direito recorrer ao Poder Judiciário, para anulação ou reforma da decisão, caso esta não esteja de acordo com os princípios supracitados, podendo assim, haver a intervenção do Judiciário posterior à aplicação de penalidade, bem como anteriormente. 

Dessa forma, importa analisar alguns julgados dos Tribunais de Justiça que interferiram nas decisões dos PROCONs, tornando-as inócuas segundo as suas finalidades. 

4.4.1 Acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás que reduziu a sanção pecuniária

Trata-se de apelação interposta contra sentença de primeiro grau que julgou improcedente seu pedido anulatório de ato administrativo (multa), em face da Superintendência Municipal de Proteção e Defesa aos Direitos do Consumidor – PROCON Itumbiara.

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. MULTA PROCON. ESTABELECIMENTO BANCÁRIO. TEMPO DE ESPERA EM FILA. COMPETÊNCIA DOS MUNICÍPIOS PARA LEGISLAR SOBRE A MATÉRIA. RELAÇÃO DE CONSUMO. LEGITIMAÇÃO DO PROCON. MULTA. MANUTENÇÃO. NÃO CABIMENTO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. 1 – Em sede de repercussão geral (RE 610221/RG), o STF pacificou o entendimento no sentido de que os municípios possuem competência para legislar sobre tempo máximo de espera de clientes em filas de instituições financeiras. 2 – No âmbito de defesa do consumidor, a Superintendência de Proteção aos Direitos do Consumidor -PROCON possui competência para instaurar processo administrativo, revelando-se válida a sanção pecuniária aplicada, quando não demonstrada nenhuma irregularidade ou ilegalidade no respectivo ato administrativo. 3 – O valor arbitrado a título de multa mostra-se desarrazoado, pois, ainda que a conduta do banco seja reprovável, não houve a demonstração da gravidade do ato que enseja o numerário aplicado, a impor redução da multa administrativamente fixada e confirmada no primeiro grau, visando alcançar o caráter pedagógico da sanção aplicada, servindo para desestimular qualquer outro comportamento recalcitrante. Conforme enunciado administrativo no 07, do STJ, “Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC”. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.[77]

A irresignação da Apelante pautava-se na questão da competência do Município para legislar sobre as atividades bancárias, notadamente, o tempo de espera nas filas do caixas, bem como a competência para regular funcionamento de agência bancária, além de objetivar a redução da multa que lhe foi aplicada administrativamente pela Apelada.

Quanto à questão de competência, não houve que se falar em nulidade do ato administrativo, visto que o Supremo Tribunal Federal já assentou, em sede de repercussão geral, que os Municípios possuem competência para legislar sobre definição de tempo máximo de espera de clientes em filas de instituições bancárias, visto que é assunto de interesse local.

No que tange à competência do PROCON para regular funcionamento da atividade bancária, não há dúvidas de que a relação entre cliente e instituição financeira é de consumo, sendo o PROCON, órgão competente para penalizar infratores da legislação consumerista.

No entanto, ao se falar da multa aplicada em razão do descumprimento da legislação municipal, que dispõe sobre o tempo máximo de espera em filas de banco, a 6° Câmara Cível, entendeu que o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), seria desproporcional à gravidade da infração, consistente em exceder 20 (vinte) minutos do tempo máximo na fila de espera, principalmente se levado em consideração tratar-se do 5° dia útil do mês (dia de pagamento salarial e pagamento de contas).

Quanto ao procedimento administrativo, consta que o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), já havia sido reduzido em decisão final de “atenuação”, sendo que o valor inicial perfazia o montante de R$ 33.882,61 (trinta e três mil oitocentos e oitenta e dois mil reais e sessenta e um centavos).

O valor atenuado, foi ratificado pelo sentenciante de primeiro grau, sob o argumento de que “O valor arbitrado está em consonância com o poder econômico da instituição financeira da autora, com a natureza e gravidade da infração, razão por que deve ser mantido (...)”.

Imprescindível ressaltar o pedido subsidiário apresentado pela Apelante na apelação em questão, pugnando pela redução do valor da multa, colacionando julgados análogos do juiz sentenciante do Município de Itumbiara, reduzindo para R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Sendo assim, a 6° Câmara Cível, impôs a redução da multa aplicada administrativamente pelo PROCON Itumbiara para o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) pautando-se nos argumentos: “De forma que concluo ser razoável a revisão do montante pecuniário sancionador em valor que melhor atenda às peculiaridades do caso e aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.”; “impõe reduzir (...) buscando a finalidade proposta pelo legislador, em repreender a conduta do ofensor, garantindo-se o caráter educativo da medida”; “ (...) em obediência aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, reduzir o valor da multa a ser pago pela instituição financeira (...)”.

A conduta realizada pela instituição bancária, é uma conduta frequente, que atinge incontáveis consumidores, que possuem tempo limitado para comparecerem em agências bancárias e aguardam um tempo superior ao que deveria ser cumprido, previsto em lei.

A aplicação da multa visa desestimular práticas reiteradas de infrações à legislação consumerista, portanto, não deve ter valor simbólico, deve ser aplicada em valor expressivo para atingir seus fins em cada caso. A redução da penalidade de forma tão exorbitante no caso em questão ocasiona a sua ineficácia e contraria todos os seus fins.

4.4.2 Segundo acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás que reduziu a sanção pecuniária

Trata-se de apelação cível interposta por empresa de telefonia contra sentença de primeiro grau que manteve a decisão administrativa, quanto ao arbitramento pelo PROCON Goiás da pena de multa em razão do descumprimento da legislação consumerista.

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO INSTAURADO PELO PROCON ESTADUAL, PARA APURAÇÃO DE INFRAÇÃO AOS DIREITOS DO CONSUMIDOR. MULTA ADMINISTRATIVA APLICADA. DESCONFORMIDADE COM OS CRITÉRIOS DE PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. QUANTUM. REDUÇÃO COMPORTÁVEL. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. INVERSÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. O PROCON-GO é órgão competente para imputar multa à Empresa fornecedora de produtos e serviços, decorrente de infração às normas de proteção ao consumidor, sendo legítima a sua atuação, na aplicação das sanções administrativas previstas na legislação (Lei nº 8.078/1990), decorrentes do poder de polícia que lhe é conferido. 2. Ao Poder Judiciário, no exercício do controle jurisdicional, é vedado interferir no mérito dos atos administrativos, competindo-lhe, tão somente, a apreciação de matéria relacionada à respectiva legalidade. Portanto, não cabe ao Estado-Juiz intrometer-se no mérito da atividade discricionária praticada pelo Poder Público, salvo na hipótese de concreta violação à razoabilidade, ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa constitucionais, exatamente para restaurar a ordem jurídica outrora transgredida pelo Executivo. 3. Para a fixação da penalidade pecuniária, devem ser observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Sob este enfoque, a adequação/redução da multa imposta, no montante de R$ 41.176,47 (quarenta e um mil, cento e setenta e seis reais e quarenta e sete centavos), para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), é dever do Judiciário, sem que isso caracterize afronta ao princípio da separação de poderes, pois ela não encontra suporte legal, diante do valor de aquisição do produto (chip de celular), objeto da reclamação apresentada pelo Consumidor, qual seja, R$ 10,00 (dez reais). 4. Em razão da alteração do julgado, a inversão dos ônus sucumbenciais é medida que se impõe. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA.[78]

A Apelante alegou que o PROCON Goiás não tem competência para revisar, ou interpretar cláusulas firmadas entre particulares, por ser tal função exclusiva do Poder Judiciário, objetivando a anulação da multa ou redução e alegando, ainda, que é abusiva e arbitrária, além de violar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

A multa foi aplicada administrativa e mantida pelo juízo a quo no valor de R$ 41.176,47 (quarenta e um mil cento e setenta e seis reais e quarenta e sete centavos), em razão de procedimento administrativo instaurado em favor de um consumidor, por não ter a Apelante entregue o produto adquirido pelo consumidor após ter efetuado 02 (dois) meses de pagamento.

O Tribunal reconheceu a competência do PROCON para aplicação da penalidade, no entanto, entendeu que a multa aplicada não se adequa aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, redimensionando o valor da penalidade para o importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e condenou o Estado de Goiás ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios no valor de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).

A sanção pecuniária é a punição mais comum aplicada nesses casos de infração à legislação consumerista, sendo utilizados instrumentos para aperfeiçoamento do processo sancionatório, objetivando a transparência e a fácil compreensão desse processo.

As empresas de telefonia possuem seus produtos e serviços disponibilizados de forma massificada no mercado e geram uma progressiva demanda no setor de atendimento dos PROCONs, frequentemente sofrendo a imposição de multa por ser constatado infringência ao Código de Defesa do Consumidor.

Pelo motivo esboçado, as multas devem ser aplicadas em valor expressivo para atingir seu fim punitivo e intimidativo, observando todos os critérios estabelecidos para a correta individualização da pena pecuniária em cada caso.

Quando isso não ocorre, vislumbra-se a perda da eficácia da penalidade aplicada pelo órgão administrativo que pautou-se em todos esses critérios.

4.4.3 Decisão de Primeiro Grau do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás que reduziu a sanção pecuniária

Cuida-se de embargos à execução oposto contra a Superintendência Municipal de Proteção e Defesa aos Direitos do Consumidor – PROCON Itumbiara/GO, objetivando a anulação do procedimento administrativo que deu origem à certidão de dívida ativa ou que seja reduzida a sanção pecuniária arbitrada, por ter a Embargada aplicado multa em desfavor da Embargante, mesmo tendo disponibilizado boleto bancária à consumidor por 02 (duas) vezes.

Consta que o PROCON aplicou multa à Embargante no valor de R$ 7.853,22 (sete mil oitocentos e cinquenta e três reais e vinte e dois centavos), em razão de não ter encaminhado à consumidora o boleto para que pudesse efetuar a liquidação antecipada de um contrato mútuo.

Verificou-se, porém, que em momento algum a Embargante comprova ter encaminhado o boleto bancário à consumidora, logo, não há que se falar em nulidade do processo administrativo, conforme dispôs o juiz sentenciante:

(...) Com essas considerações, não há nenhuma nulidade a ser reconhecida no processo administrativo ou mesmo na multa aplicada, valendo observar que o método utilizado para o cálculo da sanção observou os critérios dispostos no artigo 57 do Código de Defesa do Consumidor, quais sejam, a gravidade da infração, a vantagem auferida e a condição econômica do fornecedor.

Em complemento ao dispositivo legal retrocitado, o Decreto n.° 2.181/1.997, em seu artigo 24, dispõe que para a imposição da pena e sua gradação serão consideradas as circunstâncias atenuantes (artigo 25) e agravantes (artigo 26), bem como os antecedentes do infrator.

Assim, examinando com acurácia a decisão que aplicou a multa ao embargante (fls. 115/122), vislumbra-se que os critérios exigidos pela lei consumerista e pelo aludido decreto foram devidamente observados, não havendo que se falar em nulidade por ofensa aos princípios da legalidade, da verdade material ou mesmo da finalidade.

Por fim, quanto ao pedido de redução da sanção pecuniária fixada em R$ 7.853,22 (sete mil oitocentos e cinquenta e três reais e vinte e dois centavos), o mesmo merece ser amparado.

Isso porque o sancionamento por meio da imposição de multa deve ser graduado de acordo com a gravidade da infração, a vantagem auferida pelo infrator e a sua condição econômica, além de reclamar adequação ao seu caráter pedagógico, tudo com vistas a não configurar ofensa aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Todavia, a multa aplicada ao embargante é desproporcional à gravidade da infração, que consistiu na ausência de envio de boleto para liquidação antecipada de contrato de financiamento.

Portanto, a partir dessas circunstâncias, conclui-se que a sanção não atende aos critérios de adequação da pena e configura ofensa ao princípio da proporcionalidade, de sorte que reputo prudente reduzir a multa para o importe de R$ 3.000,00 (três mil reais). (...) (grifou-se)[79]

Nesta senda, os embargos foram parcialmente acolhidos e o valor da multa aplicada pelo PROCON, foi reduzido de R$ 7.853,22 (sete mil oitocentos e cinquenta e três reais e vinte e dois centavos), para o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais).

A penalidade administrativa pecuniária aplicada pelo PROCON tem caráter punitivo e pedagógico, sendo um mecanismo de execução da política de defesa do consumidor, com o propósito de garantir o cumprimento dos direitos assegurados aos consumidores.

A redução da multa sem observância dos mecanismos criados pelo PROCON para dar maior definição aos critérios definidos em lei e assegurar transparência ao procedimento de quantificação da multa, ocasiona a ineficácia de tais dispositivos, bem como da penalidade aplicada.

4.4.4 Acórdãos de Tribunais diversos que reduziram as sanções pecuniárias 

Não tem sido somente o Estado de Goiás a modificar as decisões emanadas do PROCON, no sentido de educar e observar os interesses do consumidor. Outros tribunais de diferentes regiões do país também têm incorrido nesta prática de modificação das decisões administrativas, interferindo na finalidade dos PROCONs e tornando as suas decisões inócuas, já que prevalecerá aquela decisão proferida pelo Poder Judiciário.

Com esse excesso de demanda ao Poder Judiciário, na certeza de que terão sido revistas as decisões e alteradas as mesmas, o PROCON acaba tendo uma avaliação negativa, visto que suas decisões acabam não tendo nenhuma eficácia no mundo jurídico em virtude desta revisão do Poder Judiciário, que não respeita os critérios determinados pelo PROCON, presentes no Código de Defesa do Consumidor e demais diplomas legais já citados ao longo deste trabalho.

São estes critérios, também já explicados no trabalho, que orientam as decisões emanadas pelo PROCON e que tentam dar um equilíbrio nas relações consumeristas, sem ofensa aos direitos individuais.

Neste sentido, tem-se algumas decisões proferidas pelos tribunais estaduais que interferiram na decisão do PROCON e tornaram-nas inócuas.

Exemplo é a ação promovida no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Trata-se de apelação cível interposta em face da Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado do Rio de Janeiro – PROCON, objetivando a anulação ou redução da penalidade aplicada.

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. MULTA APLICADA PELO PROCON/RJ. INFRAÇÃO AO ARTIGO 18, §1º, I, II e III, DO CDC. EMPRESA QUE AGIU EM DESCONFORMIDADE COM OS PRINCÍPIOS DE LEALDADE, BOA-FÉ E TRANSPARÊNCIA NAS TRATATIVAS COM O CONSUMIDOR, SENDO CORRETA E ADEQUADA A APLICAÇÃO DA MULTA ADMINISTRATIVA, NA MEDIDA EM QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE COMPROVAR QUE INEXISTE INFRAÇÃO AO ARTIGO 18 DA LEI 8.078/90. VALOR DA MULTA ARBITRADA QUE, DIANTE DA GRAVIDADE DA INFRAÇÃO PRATICADA, BEM COMO DO VALOR DO BEM, MOSTRA-SE EXCESSIVA, COMPORTANDO REDUÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO.[80]

(grifos nossos).

No caso em questão a aplicação de multa deu-se em razão da violação ao Código de Defesa do Consumidor, no que tange ao prazo máximo de 30 (trinta) dias para sanar o vício de produtos de consumo duráveis ou não duráveis.

A consumidora dirigiu-se ao PROCON, sendo instaurado um procedimento administrativo e aplicada penalidade de multa no valor de R$ 22.642,67 (vinte e dois mil seiscentos e quarenta e dois reais e sessenta e sete centavos).

Ocorre que apesar da clara violação aos direitos consumeristas e da fundamentação de que o procedimento administrativo não apresenta qualquer mácula, o valor fixado foi tido como desproporcional, sendo reduzido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro para o montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

A readequação do valor da multa ocasiona a perda da eficácia anteriormente pretendida pela Administração. Além disto, pode-se observar pela leitura da jurisprudência em questão que o tribunal foi bastante contraditório na sua decisão e não deixando claro o motivo da redução da multa, provocando novamente um descrédito ao PROCON e uma ineficácia às suas decisões.

Outro exemplo é a decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, prolatada em Apelação Cível interposta por uma empresa de eletrônicos contra o Município de Maringá/PR, que manteve a decisão prolatada em 1° instância, no sentindo de reduzir a multa aplicada pelo PROCON.

EMENTA 1) DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MULTA ADMINISTRATIVA DO PROCON. DECISÃO FUNDAMENTADA E CORRELATA COM A RECLAMAÇÃO FORMULADA PELO CONSUMIDOR. VALOR DA MULTA. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. a) A decisão administrativa que aplicou a multa está suficientemente fundamentada, pois há a indicação dos fatos e dos dispositivos legais aplicáveis, observando se, ainda, o devido processo legal, com contraditório e ampla defesa. b) Todavia, o Tribunal, em atenção ao princípio da razoável duração do processo, sem anulação, pode e deve reduzir multa aplicada pelo PROCON que se revela ofensiva ao princípio constitucional da proporcionalidade. c) Assim, no caso, em respeito ao princípio da razoabilidade e proporcionalidade, merece mantida a sentença que reduziu o valor da multa de R$ 24.000,00 (vinte e quatro mil reais) para R$ 3.000,00 (três mil reais), suficiente para desempenhar o papel de prevenção e retribuição à infração ao Código de Defesa do Consumidor. 2) APELO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.[81]

No caso em questão, a empresa foi autuada pelo PROCON após não ter cumprido o acordo realizado em audiência de conciliação, realizada em razão de reclamação do consumidor que encaminhou seu aparelho telefônico, adquirido em 23/09/2011, à assistência técnica autorizada, em 05/12/2011 e o mesmo retornou em 21/12/2011, como mesmo vício, tendo requerido, junto à loja em que efetuou a compra, a substituição do produto, que lhe foi negada, sob a informação de que a loja não é obrigada a fornecer um produto novo, em razão de possuir garantia.

Em audiência conciliatória, a empresa ofertou a restituição da quantia paga pelo produto, no prazo de 30 (trinta) dias, no entanto, não a fez, lesando novamente o consumidor.

Em reclamação, destacou-se que o consumidor tentou solucionar o problema diretamente com a empresa, restando infrutífera tal procura.

Após, foi arbitrada a penalidade de multa no valor de R$ 24.000,00 (vinte e quatro mil reais), não sendo interposto recurso pela empresa, tampouco sendo demonstrado que o pleito do consumidor foi atendido, mantendo-se a sanção no valor aplicado.

Em sede judiciária, o valor da multa foi reduzido para o importe de R$ 3.000,00 (três mil reais), sendo mantido em 2° grau, sob o argumento de que a conduta não foi tão grave, o dano foi individual e a condição econômica não pode, por si só, elevar arbitrariamente os parâmetros da penalidade.

A empresa lesou o consumidor, que teve seu produto acometido de vício menos de 90 (noventa) dias após adquiri-lo, quando não atendeu prontamente sua solicitação, antes da interferência do PROCON, tendo o lesado novamente quando devolveu seu produto ainda com vício e, uma terceira vez, quando ofertou a restituição e não a fez e, ainda, não se manifestou quando da aplicação da multa pelo PROCON. Esse conjunto de acontecimentos não seriam condutas graves no âmbito de proteção ao consumidor e respeito ao PROCON?

O valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), demonstra-se quantia irrisória no âmbito empresarial capitalista, incapacitando a eficácia do ato administrativo do PROCON, não educando, punindo ou reprimindo a conduta da infratora.

 Como mais um exemplo, pode-se citar a apelação interposta no Tribunal Regional Federal da 5° Região, contra decisão que anulou o ato administrativo do PROCON do estado do Rio Grande do Norte.

EMENTA: ADMINISTRATIVO. PROCON. MULTA APLICADA À CEF. POSSIBILIDADE. REDUÇÃO DO VALOR. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE.

I. Esta corte já fixou entendimento no sentido de que o PROCON é competente para fiscalização e aplicação de penalidades administrativas às instituições financeiras. O fato da CEF ser uma empresa pública federal não impede que sofra a fiscalização dos órgãos de proteção ao consumidor, pois sujeitam-se ao regime jurídico próprio das empresas privadas, consoante artigo 173, II, § 1º da Constituição Federal.

II. No caso presente, o debito discutido é de R$ 402,42 (quatrocentos e dois reais e quarenta e dois centavos) e a multa aplicada no valor de R$ 6.219,00 (seis mil, duzentos e dezenove reais) se mostra excessiva e afronta os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Multa reduzida para o dobro do valor do débito, ou seja, R$ 804, 84 (oitocentos e quatro reais e oitenta e quatro centavos.

III. Em razão da sucumbência recíproca, aplica-se o artigo 21, caput do CPC.

IV. Apelação parcialmente provida.[82]

O procedimento administrativo iniciou-se com a abertura de reclamação de um consumidor, em razão de ter adquirido um imóvel por meio de um leilão junto à Caixa Econômica Federal, onde no contrato não constava nenhum débito junto à CAERN e o COSERN. No entanto, foi constatado um débito no valor de R$ 402,42 (quatrocentos e dois reais e quarenta e dois centavos, de responsabilidade da CEF.

Sendo assim, após a decisão do juízo a quo, que entendeu por anular o ato administrativo, o estado do Rio Grande do Norte interpôs apelação, sendo que a multa aplicada pelo PROCON no valor de R$ 6.219,00 (seis mil, duzentos e dezenove reais) foi reduzida para o valor de R$ 804, 84 (oitocentos e quatro reais e oitenta e quatro centavos), sob a alegação de o valor aplicado pelo órgão administrativo ser exorbitante, afrontando o princípio da proporcionalidade e da razoabilidade.

O juízo ad quem considerou que a ausência da reclamada às audiências foi desproporcional ao dano causado ao consumidor.

O estado do Rio Grande do Norte fundamentou o recurso alegando que a penalidade fundamentou-se nos diplomas legais vigentes e que impôs os critérios a serem observados na fixação da pena, delimitando-se o juízo discricionário do administrador.

Em síntese, todo o descaso da instituição financeira foi punida/reprimida/educada com o valor de R$ 804, 84 (oitocentos e quatro reais e oitenta e quatro centavos), uma quantia insignificante, que claramente foi imposta sem análise dos critérios definidos em lei. 

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Amanda Cristina Basílio. A inocuidade dos atos administrativos punitivos do Procon e a intervenção do Poder Judiciário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5650, 20 dez. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68808. Acesso em: 5 nov. 2024.

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