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A reforma processual e o novo rol de bens absolutamente impenhoráveis do art. 649 do CPC após a Lei nº 11.382/2006

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Agenda 24/02/2007 às 00:00

5. O NOVO ROL DE BENS ABSOLUTAMENTE IMPENHORÁVEIS E SUAS EXCEÇÕES

O art. 649 passou a vigorar com a seguinte redação:

Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:

I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;

II – os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;

III – os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;

IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no §3º deste artigo;

V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão;

VI – o seguro de vida;

VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;

VIII – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;

IX – os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;

X – até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança.

§1º A impenhorabilidade não é oponível à cobrança do crédito concedido para a aquisição do próprio bem.

§2º O disposto no inciso IV do caput deste artigo não se aplica no caso de penhora para pagamento de prestação alimentícia.

§3º (VETADO)

Conforme já exposto neste trabalho, os incisos I, II, IV, V, VI, VII e VIII são meras adequações aos incisos já existentes, porém adaptados aos atuais entendimentos jurisprudenciais e doutrinários acerca do tema.

O artigo trouxe agora, em parágrafo, as exceções à impenhorabilidade. No parágrafo primeiro diz que nenhum bem será impenhorável face à cobrança do crédito concedido para aquisição do próprio bem. A medida é lógica e razoável.

A outra exceção, já existente anteriormente, é a previsão de que não será oponível a impenhorabilidade do inciso IV quando se tratar de penhora para pagamento de prestação alimentícia, pelos motivos já expostos no item 4.4 e 4.7. Vale chamar atenção para o erro material da redação do inciso IV, que se refere ao §3º enquanto deveria referir-se ao §2º, sem qualquer prejuízo, entretanto, à compreensão da norma legal.

5.1. Os novos incisos no rol de bens absolutamente impenhoráveis

Os incisos II, IX e X são a novidade da lei 11.382/2006, sendo que o último e derradeiro será, talvez, o de maior impacto no caso concreto, vejamos cada um deles.

5.1.1. Os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor

Este inciso é mera textualização do entendimento já existente nos tribunais pátrios. Os bens pessoais não poderão ser penhorados. Entretanto, aqueles de elevado valor econômico não são abrangidos pela proteção legal.

Nesta exceção estariam as jóias da mulher, ou o ROLEX do homem, bens de uso estritamente pessoal mas que podem alcançar quantias suficientes para a quitação de uma dívida, na falta de outros bens.

5.1.2. Os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social

Este inciso trouxe a proteção dos recursos em questão, a nosso ver, face ao evidente interesse social existente nestes casos. As instituições privadas não poderão ver penhorados estes recursos. No entanto, deve-se chamar atenção da necessidade da compulsoriedade da aplicação dos mesmos em educação, saúde ou assistência social.

Caso a instituição privada tenha a faculdade de endereçar seus recursos, estes poderão ser tranquilamente penhorados, vez que estarão sendo utilizados para a quitação de dívidas da entidade.

A justificativa deste inciso está caracterizada na minimização do Estado, que está transferindo aos particulares, principalmente as OSCIPS, responsabilidade de gerenciamento e melhor aplicação de recursos estatais nas áreas básicas do governo, preferencialmente em parceria com fundos de renda privada.

Uma vez que o Estado está transferindo este ônus, há a necessidade de se proteger o recurso estatal com esta dotação, sob pena de desvirtuamento da medida. A seriedade destas entidades, no entanto, é, por vezes, questionável. Será necessário aguardar para verificar a correta aplicação deste inciso.

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5.1.3. Até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança

Este inciso é a principal alteração do dispositivo legal em análise. Já faz aproximadamente cinco anos que o poder judiciário firmou o convênio BACEN JUD com o Banco Central, o que possibilitou grande avanço e celeridade nos cumprimentos de sentença e execuções de títulos extrajudiciais.

Do ano de 2003 tem se tornado cada vez mais comum a utilização deste sistema de penhora, principalmente na Justiça do Trabalho. Recentemente a justiça comum estadual se rendeu aos avanços tecnológicos e estão fazendo uso desta facilidade tecnológica para penhora.

Diversas vozes levantaram-se contra o sistema de penhora eletrônica através do BACEN JUD, tanto é que resultou na propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3091 proposta pelo Partido de Frente Liberal (PFL), que foi distribuída ao Relator Ministro Joaquim Barbosa.

A ADIn baseia-se na inconstitucionalidade do convênio do TST com o BACEN em face dos incisos X e XII do art. 5º da Constituição Federal. Esta atitude gerou repúdio por parte da Ordem dos Advogados do Brasil, da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat) e da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra)(10).

A liminar não foi apreciada conforme pedido do PFL que, por sua vez, editou um projeto de lei que tramita no Legislativo, com o intuito de eliminar o BACEN JUD do Judiciário brasileiro.

A referida inconstitucionalidade, no entanto, é inexistente, vez que não divulgação do sigilo bancário do devedor, realizando-se a penhora tão somente no valor determinado.

Vale dizer, ainda, que este procedimento é idêntico ao procedimento anterior que era realizado pelo judiciário, no entanto, com incomparável agilidade. Antes o juiz expedia ofício ao Bacen solicitando as contas do devedor. Em seguida, solicitava o saldo da conta à agência bancária com o respectivo bloqueio. O gerente, por sua vez, poderia avisar o devedor que sua conta seria bloqueada, frustrando-se, assim, a penhora. Todo este procedimento durava, em médio, três a quatro meses. Hoje, através do convênio, este procedimento pode durar cerca de vinte e quatro horas.

No entanto, com o advento da lei 11.382/206, tem-se agora que são impenhoráveis quantias depositadas em contas poupanças até o limite de 40 salários mínimos.

Não nos parece justo que devedor tenha esta proteção, mormente quando se tratar de devedor de pouca renda, que sequer movimenta conta corrente. É muito comum, atualmente, os clientes bancários optarem pela movimentação de conta poupança no lugar da conta corrente, dada a existência de taxas nestas e inexistência naquelas.

As contas poupanças possuem cartão de débito, acesso pela internet e todos os requisitos necessários para sua normal utilização. As únicas diferenças da conta poupança para a conta corrente é a existência de taxas, talão de cheques e conta investimento.

O mau pequeno mau pagador vai encontrar sua proteção neste dispositivo legal, visto, particularmente, com bastante objeção.


5. CONCLUSÃO

Essa chamada terceira onda de reforma processual civil, ou a reforma dos onze, de certa forma busca trazer maior celeridade e praticidade ao processo. Os erros e acertos vão sendo observados pelos aplicadores e pensadores do direito. Na medida do possível estas observações vão sendo transformadas em texto legal.

Se, por um lado busca-se diminuir cada vez mais a chegada de processos aos tribunais superiores, com a supressão de recursos, por outro ganha-se, com o conjunto de medidas reformistas que vem sendo adotados (algumas passíveis de sérias críticas), celeridade na efetiva prestação jurisdicional.

A necessária atualização do rol de bens absolutamente impenhoráveis trazidos pela Lei 11.382/2006 vem somar com estas reformas, protegendo bens necessários.

Recebemos, no entanto, com grande reserva o novo inciso X do art. 469 do CPC, que protege a quantia de até 40 (quarenta) salários mínimos depositados em conta poupança. A execução deve ser a menos gravosa para o devedor. No entanto, não se justifica o não pagamento de uma dívida se o mesmo possui reservas econômicas.

Não se compreende reservar a quantia de 40 (quarenta) salários mínimos da poupança e deixar à disposição a integralidade de depósitos nas contas correntes e demais contas de investimento. Quanto ao restante, a reforma foi positiva.


NOTAS

  1. Jesualdo Eduardo de Almeida Júnior, "A terceira Onda de Reforma do Código de Processo Civil – Leis n° 11.232/2005, 11.277/2006 e 11.276/2006. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil – Porto Alegre: Síntese, volume 7, n° 40, mar/abr.2006
  2. MARCATO, Antônio Carlos, coord. VIGILAR, José Marcelo Menezes. Código de Processo Civil Interpretado. 2ª edição. São Paulo: Editora Atlas S.A., 200, p.1966.
  3. ASSIS, Araken. Manual do Processo de Execução. 5ª Edição, revista e atualizada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 318/319
  4. NEGRÃO, Theotônio e José Roberto F. Gouvêa. Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. 37ª edição, atualizada até 10 de fevereiro de 2005. São Paulo: Saraiva, 2005.
  5. ASSIS, Araken, op.cit., p. 326/327
  6. ROCHA, José de Moura. Sistemática. Nº 72, p.308 in ASSIS, Araken. Manual do Processo de Execução. 5ª Edição, revista e atualizada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 318/319
  7. Negrão, Theotônio, op.cit., p. 745/746
  8. Op.cit., p. 746
  9. Op.cit., p.330
  10. MACHADO, Gabriel da Silva Fragoso. Penhora on line: Credibilidade e agilidade na execução trabalhista. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, nº 395, 6 ago. 2004. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/5540. Acesso em: 27/01/2007.

REFERÊNCIAS

AGUIAR, João Menezes de. – Reforma do CPC IV – Liquidação. OAB/SP, São Paulo, 28 mar. 2006. Disponível em: http://www.oabsp.org.br/asp/esa/comunicacao/esa1.2.3.1.asp?id_noticias=51. Acesso em: 24 jun. 2006.

ALMEIDA JÚNIOR, Jesualdo Eduardo. – A Terceira Onda de Reforma do Código de Processo Civil – Leis nºs 11.232/2005, 11.277/2006 e 11.276/2006, in REVISTA IOB DE DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL, volume 7, nº 40. – Porto Alegre: Síntese, mar/abr. 2006.

ASSIS, Araken. Manual do Processo de Execução. 5ª Edição, revista e atualizada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998.

BOLLMANN, Vilian. Mais do mesmo: reflexões sobre as reformas processuais. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1037, 4 maio 2006. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/8351. Acesso em 27/01/2007.

DOURADO, Maria de Fátima Abreu Marques. A reforma do processo de execução. Pontuações ao Projeto de Lei nº 3.253/2004. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 938, 27 jan. 2006. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/7885. Acesso em: 24 jun. 2006.

MACHADO, Gabriel da Silva Fragoso. Penhora on line: Credibilidade e agilidade na execução trabalhista. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, nº 395, 6 ago. 2004. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/5540. Acesso em: 27/01/2007.

MARCATO, Antônio Carlos, coord. VIGILAR, José Marcelo Menezes. Código de Processo Civil Interpretado. 2ª edição. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2005.

NEGRÃO, Theotônio e José Roberto F. Gouvêa. Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. 37ª edição, atualizada até 10 de fevereiro de 2005. São Paulo: Saraiva, 2005.

OLIVEIRA, Hélder B. Paulo de. Mais linhas sobre a nova execução civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, nº 1301, 23 jan. 2007. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/9418. Acesso em: 27/01/2007.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, volume 2. 32ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

WAMBIER, Luiz Rodrigues – coord.. Curso Avançado de Processo Civil, volume 2. 8ª ed., revista, atualizada e ampliada. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.

Sobre o autor
Rafael Lara Martins

advogado em Goiânia (GO), especialista em Direito do Trabalho pela Universidade Católica de Goiás (UCG), especializando em Direito Civil pela Universidade Federal de Goiás (UFG), especializando em Direito Processual Civil pela Universidade Federal de Goiás (UFG), auditor vice-presidente do Tribunal de Justiça Desportiva Universitária do Estado de Goiás, membro da Comissão do Advogado Jovem da OAB/GO

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Rafael Lara. A reforma processual e o novo rol de bens absolutamente impenhoráveis do art. 649 do CPC após a Lei nº 11.382/2006. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1333, 24 fev. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9528. Acesso em: 19 nov. 2024.

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