CAPÍTULO VI
6.1DO RITO
Como em tantos outros pontos, a nova lei foi omissa quanto ao procedimento aplicável à impugnação ao cumprimento de sentença, deixando um vácuo legislativo perceptível à primeira vista.
Não se trata, contudo, de omissão capaz de comprometer a efetiva a aplicação das novas regras, uma vez que a própria lei traz, em seu bojo, o mecanismo apto ao suprimento das respectivas lacunas. Refiro-me ao já citado art. 475-R, que manda aplicar ao cumprimento de sentença, de forma subsidiária ou supletiva, no que não contrariar a coerência orgânica do sistema, as normas que regem o processo de execução por título extrajudicial.
Destarte, a impugnação seguirá o rito sintético previsto no art. 740 do CPC, com a redação dada pela Lei nº 11.382/06.
Ressaltando a necessidade de ser observado um procedimento mínimo, Schenk (2007: 06-08) corrobora este entendimento:
"Ademais, nota-se que sequer o procedimento mínimo a ser observado por essa impugnação restou alinhavado pela reforma. Daí as indagações: como se dará, então, a instrução referida no § 2º do art. 475-L? (rectius: 475-M). Será ela realizada a critério de cada juiz? Melhor, também aqui, e para não se deparar, na prática, com verdadeiros absurdos, que se aplique, e agora sim, subsidiariamente, no que couber, o procedimento previsto no mencionado art. 740 e parágrafo único, do Código de Processo Civil".
Mais adiante, acrescenta: "Com efeito, na onda de reformas do Processo Civil, a vontade do legislador processual de simplificar os procedimentos esbarra, por vezes, em óbices de maiores magnitudes. A simplificação, em nome da celeridade, onde há excesso de formalismo, afigura-se louvável. De outra banda, não se pode reconhecer como legítimo um processo judicial sem que exista um mínimo de etapas legais, previamente estabelecidas e divulgadas, a serem observadas pelo Estado-juiz e pelos jurisdicionados.
Daí é que, para por a salvo a constitucionalidade da impugnação do devedor à execução para cumprimento de sentença fundada em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais, trazida pela recente Lei 11.232/2005, reafirma-se, também nesta sede, a sugestão acima lançada para aplicação subsidiária do procedimento previsto no art. 740, do CPC, com as adequações necessárias, uma vez que as Disposições Gerais do Título que trata dos embargos do devedor não foram revogadas pela lei reformadora. É de rigor se exigir alguma formalidade, pois op título executivo judicial que se estará desconstituindo, ao final, e conforme resultado da impugnação, encontrava-se coberto pelo manto protetor da coisa julgada, com todas as conseqüências que essa qualidade lhe garantia. Será, em suma, da própria estrutura do sistema processual civil que se estará tratando, sendo, portanto, recomendável a cautela".
Portanto, o rito a ser empregado consistirá nas seguintes etapas: estando a petição "inicial" em termos e verificando o juiz não ocorrer qualquer uma das causas de indeferimento liminar da impugnação, ouvirá o exeqüente impugnado, em quinze dias; do contrário, fixará prazo para o impugnante suprir eventuais defeitos de forma (CPC 284). Caso não atendida a diligência, será o caso de indeferimento liminar da impugnação por defeito capaz de comprometer o exame do mérito (art. 284, parágrafo único, do CPC). Oferecida a resposta do impugnado, o juiz julgará imediatamente o pedido (art. 330 do CPC), ou designará audiência de conciliação, instrução e julgamento, se necessário. Havendo necessidade de prova que dependa de conhecimento especial técnico (art. 420, parágrafo único, inc. I, do CPC), o juiz nomeará perito para a realização do respectivo exame, ouvindo as partes sobre o laudo correspondente, em dez dias, proferindo a decisão sobre a impugnação, em igual prazo.
6.2DOS EFEITOS DO RECEBIMENTO DA IMPUGNAÇÃO
Diversamente do que ocorria em relação aos embargos do devedor - no formato anterior à reformulação introduzida à execução por título extrajudicial pela Lei nº 11.382/06 -, a impugnação ao cumprimento de sentença não tem, em regra, o efeito suspensivo, como se infere da dicção literal do art. 475-M do CPC, de modo a não servir de empeço ao desenvolvimento do procedimento executório.
De fato, antes da reforma da Lei nº 11.332/05, o efeito suspensivo dos embargos se dava ope legis, isto é, por obra da lei. Em conseqüência, ao regular taxativamente a sujeição dos antigos embargos "à segurança do juízo" e definir que eles sempre teriam efeito suspensivo, a letra fria da lei retirava do juiz, a priori, a possibilidade de romper qualquer uma dessas diretrizes. A opção do legislador do CPC de 1973 partia de duas premissas: (a) da indiscutibilidade, como regra, dos títulos executivos - seja em decorrência do grau de certeza que pode fornecer acerca da existência do direito, seja em virtude da qualidade de seu emitente, e assim por diante – e que, por isso, antes de possibilitar ao executado qualquer meio de defesa, alguns atos executivos deveriam ser necessariamente realizados; (b) da idéia de que a penhora realizada na fase inicial da execução traria ao exeqüente algum grau de satisfação de sua pretensão executiva, a ponto de fazê-lo conformar-se com o tempo gasto no processo e julgamento dos embargos para, só então, se realizarem atos executivos capazes de proporcionar a integral satisfação da obrigação executada.
Esses fenômenos – imprescindibilidade da "segurança do juízo" e efeito suspensivo "automático" dos embargos, no entanto, geravam situações insatisfatórias, tanto para o exeqüente quanto para o executado, haja vista que tais premissas foram estabelecidas de modo abstrato pelo legislador, sem adequada consideração com a relação jurídica de direito material controvertida, isto é, sem a exata correspondência com a realidade vivenciada pelos sujeitos da relação de direito material controvertida, em última análise os principais interessados na efetividade da prestação jurisdicional, criando uma estrutura fechada e rígida, incompatível com a ponderação judicial dos interesses em jogo, realizada de acordo com as necessidades reais da causa, à luz do postulado constitucional da tutela jurisdicional efetiva.
E, por mais absurdo que pudesse parecer aos olhos do jurisdicionado, o revogado § 1º do art. 739 do CPC possibilitava a suspensão da execução, pelo só fato da oposição dos embargos, quaisquer que fossem os fundamentos alegados. Assim, ainda que manifestamente protelatórios, fundados em orientação doutrinária ou jurisprudencial de há muito superadas, suspendia a força executória emergente da sentença judicial transitada em julgado. Em outras palavras, o Estado permitia, impassível, que o devedor suspendesse, a seu talante, um ato emanado da soberania estatal, já acobertado pela imutabilidade da coisa julgada, numa absurdez inaceitável nos tempos atuais.
Este panorama, felizmente, mudou radicalmente, como visto nas linhas atrás, com as alterações introduzidas pela Lei nº 11.232/05. Doravante, o juiz poderá deferir efeito suspensivo à impugnação mas desde que sejam relevantes os fundamentos jurídicos expendidos e o do processamento da execução possa resultar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação. Ao juiz caberá, diante de criterioso exame das alegações, verificando a relevância dos fundamentos lançados em teto de impugnação, ou seja, a forte probabilidade do direito invocado, aliada ao periculum in mora em sentido inverso (em favor do executado), suspender pro tempore a prática dos atos executórios propriamente ditos.
Assim, a suspensão da execução da sentença, que antes se dava ope legis, dependendo da simples interposição de embargos à execução, com a reforma passou a ocorrer ope judicis, isto é, decorrente de decisão proferida pelo juiz, à luz dos requisitos estabelecidos no caput do art. 475-M, do CPC.
A relevância jurídica da fundamentação se assemelha aos requisitos estabelecidos na legislação processual civil para a concessão de tutelas antecipatórias (arts. 273; 461, § 3º; 558, caput, todos do CPC), bem como para a concessão de efeito suspensivo aos embargos à execução (art. 739-A, § 1º, do CPC). Advirta-se, porém, que não se está diante de mero fomus boni juris, característico das medidas cautelares previstas nos arts. 796 e seguintes do CPC; mais do que isto, se exige que os fundamentos apresentados pelo impugnante convençam o juiz da efetiva probabilidade de êxito no julgamento do mérito das matérias suscitadas na impugnação, numa dimensão muito próxima da verossimilhança fundada em prova inequívoca do alegado (art. 273 do CPC).
Exige ainda o caput do art. 475-M do CPC que o risco de dano ao executado seja manifesto, isto é, evidente e, por conseguinte, incompatível com o temor fruto da mera subjetividade do executado. Além disso, o dano a ser evitado com o prosseguimento da execução deve ser grave, não se compadecendo a lei com a iminência de eventual prejuízo de índole patrimonial, posto que inerente a qualquer processo executivo. Por último, acresça-se que este dano grave de ser de difícil ou e incerta reparação.
Ressalte-se que os atos executivos potencialmente danosos ao executado são extremamente variáveis. Por exemplo, a adjudicação e a alienação do bem poderão, conforme o caso, causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, situação que poderá ser naturalmente contornada pelo exeqüente, mediante a caução suficiente e idônea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos (art. 475-M, § 1º, do CPC).
Deferido o efeito suspensivo, a impugnação será processada nos próprios autos (art. 475-M, § 2º, do CPC), sendo lícito ao exeqüente, como já assinalado no parágrafo anterior, levantar o efeito suspensivo atribuído à impugnação mediante a prestação de caução idônea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos (art. 475-M, § 1º, do CPC), com a finalidade de ressarcir o executado de eventuais prejuízos ou danos suportados como conseqüência da prática de atos expropriatórios.
Tratando-se, contudo, de litisconsórcio passivo, o efeito suspensivo deferido ao impugnante um não alcançará os demais executados quando a matéria aduzida tiver natureza pessoal (v.g. ilegitimidade ad causam, ausência de citação restrita ao impugnante, etc.) podendo, contudo, beneficiar os demais executados nas hipóteses em que a causa petendi e o petitum deduzidos se aplicarem aos co-obrigados, como em todos os casos previstos no inc. VI, do art. 475-L, do CPC, por aplicação subsidiária (art. 475-R do CPC) do previsto no § 4º do art. 739-A do CPC, in verbis:
"§ 4º. A concessão de efeito suspensivo aos embargos oferecidos por um dos executados não suspenderá a execução contra os que não embargaram, quando o respectivo fundamento disser respeito exclusivamente ao embargante".
Ressalte-se, porém, que o juiz não está obrigado, por óbvias razões, a admitir a caução ofertada pelo exeqüente, notadamente quando não se revestir dos atributos de "suficiência e idoneidade", como nos casos de títulos da dívida pública (papéis podres) e outras garantias não passíveis de imediata conversão em dinheiro (v.g. precatório judicial, títulos de crédito, fiança pessoal, etc.), mesmo porque a medida poderá não ser conveniente diante da razoabilidade do direito invocado pelo executado e da forte probabilidade do executado vir a sofrer danos irreparáveis ou de difícil reparação por conta dos atos executórios que serão praticados.
Todavia, negado o efeito suspensivo a execução prosseguirá normalmente com os atos tendentes à realização do direito declarado no título executivo judicial, com a impugnação processada em autos apensos (art. 475-M, § 2º, do CPC), de modo a não servir de óbice à prática dos atos executórios.
6.3.DA NATUREZA JURÍDICA DO ATO QUE DECIDE A IMPUGNAÇÃO E DOS RECURSOS CABÍVEIS
A deliberação judicial que resolve a impugnação tem natureza híbrida, ora revestindo a forma de sentença (art. 162, § 1º do CPC), ora de mera decisão interlocutória (art. 162, § 2º, do CPC), a primeira desafiando apelação cível e a segunda, agravo de instrumento, nos termos do art. 475-M, § 3º, do CPC, in literis:
"§ 3º. A decisão que resolver a impugnação é recorrível mediante agravo de instrumento, salvo quando importar extinção da execução, caso em que caberá apelação".
Assim, quando a impugnação é inteiramente acolhida pelo juiz, com a conseqüente extinção da execução e, via de conseqüência, a desconstituição do próprio título executivo judicial, a decisão consubstancia genuína sentença sendo, assim, passível de revisão por meio de recurso apelatório.
Já quando a impugnação é totalmente rejeitada, o juiz o faz por meio de decisão interlocutória justificando, assim, o cabimento do agravo de instrumento, a ser recebido, em regra, sem o efeito suspensivo (art. 475-M, § 3º, 1ª parte, do CPC), cabendo ao executado o ônus de demonstrar a relevância jurídica do direito invocado e a probabilidade de lesão grave de difícil reparação para que o relator possa examinar o pedido de efeito suspensivo, à luz dos arts. 527, inc. III, e 558, caput, ambos do CPC.
Casos haverá em que, a despeito do acolhimento integral da impugnação, a decisão será interlocutória, posto não ensejar a extinção da execução mas apenas a sua adequação aos ditames legais, tais como nos casos de penhora incorreta e avaliação errônea (art. 475-L, inc. II, do CPC); excesso de execução (inc. V); algumas causas supervenientes à sentença, modificativas da obrigação (inc. VI), tais como transação, a quitação parcial, etc. Nessas hipóteses, faltando ao executado o requisito da sucumbência, o interesse em recorrer é apenas do credor, que poderá manejar o agravo de instrumento, dotado, em regra, do efeito meramente devolutivo, prosseguindo a execução quanto à parte remanescente. Provido o recurso do credor agravante, a este será lícito executar, de forma suplementar, a outra parcela do crédito.
Por fim, ainda poderá ocorrer, na prática, o acolhimento apenas parcial da impugnação - que importará, para o impugnante, sua rejeição parcial -, a exemplo da matéria constante do inciso V, do art. 475-L do CPC. Aqui, a rigor, nada impede que o juiz acolha parcialmente as razões do devedor impugnante, adequando a execução ao quantum efetivamente devido, repartindo entre ambos os sujeitos da relação processual os ônus da sucumbência. Neste caso específico, o interesse recursal será reconhecido a ambas as partes e, como a impugnação não dará azo à extinção da execução, o recurso cabível será o agravo de instrumento, como já assinalado nos parágrafos precedentes.
Em síntese, ao qualificar juridicamente a decisão que decide a impugnação, o legislador processual tomou em consideração o conteúdo material da deliberação judicial: se extingue a relação jurídico-processual executória, ter-se-á uma de sentença; do contrário, o ato se revestirá de cunho meramente interlocutório.
Neste mesmo diapasão, disciplinou os recursos cabíveis: para sentença, apelação cível; para decisão interlocutória, agravo de instrumento. Aquela dotada, em regra, dos efeitos suspensivo e devolutivo; este recebido, em regra, no efeito meramente devolutivo.
6.4DOS EFEITOS PRECLUSIVOS DA DECISÃO QUE RESOLVE A IMPUGNAÇÃO
A coisa julgada material, doutrinariamente reputada como "preclusão máxima", é a qualidade que torna imutável e indiscutível o comando emergente da parte dispositiva da sentença de mérito não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário.
Sua raiz remonta ao texto constitucional (art. 5º, inc. XXXVI, da CF/88), mas a disciplina normativa que lhe corresponde opera no plano infraconstitucional, dela se ocupando, com primazia, os arts. 467 a 475 do CPC.
Pela dicção literal do art. 467 do CPC: "Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário", infere-se, com meridiana clareza, que apenas as sentenças de mérito proferidas com fundamento no art. 269 do CPC, são acobertadas pela autoridade irradiante da coisa julgada.
Logo, apenas as sentenças que julguem o mérito da impugnação, deliberando pela desconstituição do título executivo judicial ou por sua inexigibilidade, é que fazem coisa julgada material.
Assim, o fenômeno da coisa julgada material dar-se-á, por exemplo, nas sentenças que extinguirem a execução por reconhecer: (a) falta ou nulidade da citação não supridas; (b) extinção da obrigação por pagamento, novação, compensação, confusão, remissão, etc, supervenientes à sentença; (c) inexigibilidade do título fundado em coisa julgada inconstitucional; etc.
Em todas essas situações, o comando emergente do dispositivo sentencial estará acobertado pela força irradiante da coisa julgada, tornando o "decisum" imutável e indiscutível, de forma a obstar que qualquer uma das partes volte a juízo ressuscitando qualquer uma das matérias já decidas pela sentença transitada em julgado, ainda que em relação jurídica processual diversa.
No entanto, no que diz respeito às decisões interlocutórias, produz-se apenas o fenômeno da preclusão (temporal, lógica ou consumativa), impedindo que a decisão seja rediscutida na mesma relação jurídica processual, mas não em outra, envolvendo as mesmas partes ou não, como se dessume da interpretação literal do art. 473 do CPC, in verbis:
"Art. 473. É defeso à parte discutir, no curso do processo, as questões já decididas, a cujo respeito se operou a preclusão".
Portanto, sendo a impugnação resolvida por mera decisão interlocutória, nada obsta que qualquer uma das partes, em um outro processo, provoque a rediscussão da matéria; logo, na hipótese do juiz rejeitar, em sede impugnatória, a alegação de ausência ou nulidade de citação, a preclusão em sede executória não impede o executado de ajuizar a actio querela nullitates tendo por objeto da mesma matéria, posto que a preclusão, em qualquer uma de suas modalidades (temporal, lógica ou consumativa) opera apenas nos limites da relação jurídica processual em que se verificou.
6.5DA SUBSISTÊNCIA DA OBJEÇÃO E DA EXCEÇÃO DE EXECUTIVIDADE
Fruto de construção pretoriana, a objeção e a exceção de executividade se caracterizam pela possibilidade do devedor opor-se à execução, independentemente da garantia do juízo, quando as matérias alegadas ou são daquelas que ao juiz compete conhecer de ofício ou, dependentes de provocação da parte interessada, se evidenciam de plano, prescindindo de qualquer dilação probatória.
No regime anterior à recente reforma, a defesa do executado se processava, em regra, por meio de embargos à execução, após a "segurança do juízo" pela penhora de bens ou o depósito da coisa (art. 737 do CPC).
Em algumas hipóteses, contudo, era possível ao devedor opor-se à execução, sem a prévia "garantia do juízo", se a única matéria que lhe interessava era, a título de exemplo, a prescrição da ação ou a nulidade do título, extinção da obrigação por pagamento, novação, etc., desde que demonstráveis de plano.
Para tanto, poderia lançar mão da objeção de executividade ou da exceção de executividade, conforme a matéria aduzida fosse daquelas que ao juiz cabia conhecer de ofício (matérias de ordem pública) ou, se dependentes de provocação da parte, estivessem comprovadas de plano.
Discorrendo sobre a matéria, Nery Jr. e Nery (2002: 1039-1041) assim pontificavam anteriormente às inovações até aqui retratadas:
"... Exceção de Executividade. O primeiro meio de defesa de que dispõe o devedor no processo de execução é a exceção de executividade. Admite-se quando desnecessária qualquer dilação probatória para demonstração de que o credor não pode executar o devedor. Daí ser exceção de executividade e não de pré-executividade: o credor não tem exceção contra o devedor. Denomina-se exceção porque instrumento de defesa de direito material, que contém matérias que o juiz somente pode examinar a requerimento da parte. São argüíveis por meio de exceção de executividade: a prescrição, o pagamento e qualquer outra forma de extinção da obrigação (adimplemento, compensação, confusão, novação, consignação, remissão, sub-rogação, dação, etc.) (Gomes, Obrigações, n. 67, p. 87), desde que demonstráveis prima facie...
... Objeção de executividade. Quando a matéria que o devedor pretende alegar como causa para a ilegalidade, nulidade ou descabimento da execução for de ordem pública, é admissível a objeção de executividade. Essas matérias, por serem de ordem pública, devem ser conhecidas de ofício pelo juiz. Assim, ao opor a objeção, o excipiente apenas alerta o juiz para o fato de que deve pronunciar-se ex officio sobre aquela matéria. Por essa razão, pode o devedor opor objeção a qualquer tempo e grau ordinário de jurisdição, independentemente da segurança do juízo pela penhora ou depósito."
Quer parecer que, a despeito de todas as inovações de que até agora se ocupou, na execução por título judicial - agora denominada cumprimento de sentença -, persiste o interesse jurídico do executado no emprego tanto da objeção quanto da exceção de executividade, posto que o manejo da impugnação pressupõe a prévia segurança do juízo.
Assim, segundo entendemos, o devedor que não tem bens passíveis de penhora não fica impedido de questionar, por exemplo, os casos de extinção da obrigação e de ineficácia do próprio título, por ausência ou nulidade da citação, com o emprego da objeção ou da exceção de executividade, respectivamente.
Se de um lado não se desconhecem, no quotidiano forense, os abusos cometidos no uso indiscriminado desses mecanismos processuais, por outro não se pode negar ao executado, ainda que sob a marca da excepcionalidade, a possibilidade de opor-se à execução sem comprometimento de seu patrimônio, quando as questões suscitadas são de tal gravidade que ao juiz delas compete conhecer até mesmo de ofício (matérias de ordem pública), ou se aquelas já se comprovam de plano, independentemente de qualquer iniciativa probatória.
Considere-se, ainda, que a morosidade processual não decorre dos mecanismos processuais em si, concebidos com outros propósitos que não o da procrastinação mas do uso que se lhes devota. E, na práxis forense, tem-se registrado, com notável freqüência, o uso indiscriminado de medidas processuais concebidas para remediar situações excepcionais, de cujo mal padecem tanto a objeção quanto a exceção de executividade.
Na execução por título extrajudicial, diferentemente, parece ser de todo inaplicáveis tais premissas, haja vista que o manejo dos embargos à execução, com as inovações introduzidas pela Lei nº 11.382/06, não mais depende da prévia "segurança do juízo" (art. 736 do CPC), restringindo-se tal exigência apenas para fins de suspensão da execução (art. 739-A, § 1º, do CPC).
No entanto, considerando o caráter meramente incidental da impugnação, espera-se que a utilização da objeção ou da exceção de executividade fique, de fato, restrita a situações excepcionalíssimas. Neste sentido, obtempera o Araken de Assis (2006: 307):
"... a esperança de que, ensejada a defesa do executado através de impugnação incidental, se eliminaria automaticamente o campo propício à exceção de pré-executividade desvanece-se à primeira vista. Em primeiro lugar, ao executado interessa impedir a penhora; ora, a impugnação pressupõe semelhante constrição, notando-se que o prazo para impugnar (art. 475-J, § 1º) fluirá da intimação que porventura se faça desse ato executivo. Ademais, vencido o prazo para impugnar, por qualquer motivo, subsistem as objeções (por exemplo, a ilegitimidade) e as exceções (por exemplo, a prescrição) imunes ao fenômeno da preclusão".
6.6DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Em face da concentração das etapas de formação e de execução do título executivo judicial numa única relação jurídica processual, passou-se a questionar se após as inovações introduzidas pela referida Lei nº 11.232/05 continuaria aplicável às execuções por título judicial (rectius: fase de cumprimento de sentença) o disposto no art. 20, § 4º, do CPC, que dispõe sobre os honorários advocatícios nas causas que enumera, in literis:
"§ 4º. Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior".
Pelo novo formato desenhado para o cumprimento de sentença, parece induvidoso que somente serão cabíveis honorários advocatícios se não ocorrer o pagamento voluntário da obrigação no prazo de quinze dias previsto no caput do art. 475-J do CPC posto que, neste caso, não haverá fundamento ético-jurídico capaz de justificar a imposição de novos honorários de sucumbência, cumulativamente àqueles já arbitrados na sentença exeqüenda.
Tal cumulatividade bem se justificava na vigência do regime anterior, quando a execução inaugurava uma nova relação jurídico-processual; era da lógica do próprio sistema que houvesse a imposição de novos honorários sucumbenciais quer fosse embargada a execução, quer não fosse.
O panorama processual agora é outro. O cumprimento de sentença não passa de mera fase do processo de conhecimento, hipótese em que a imposição de honorários advocatícios importaria num bis in idem inaceitável, notadamente quando o devedor satisfaz, voluntariamente e no prazo de quinze dias, a pretensão executória.
Todavia, não adimplindo o executado voluntariamente a obrigação no prazo de quinze dias, tem plena incidência a regra do art. 20, § 4º, do CPC, com o arbitramento de honorários advocatícios segundo apreciação eqüitativa do juiz, cumulativos com a multa de 10% prevista no art. 475-J, caput, do CPC.
E, vindo o executado a opor resistência ao cumprimento de sentença, incidem as regras ordinárias que disciplinam os ônus da sucumbência (art. 20 do CPC), arcando com os honorários advocatícios e demais ônus sucumbenciais a parte vencida na impugnação. Se recíproca a sucumbência, arcarão as partes, proporcionalmente, com os ônus respectivos.
Neste sentido, Carneiro (2007: 108) lembra que o c. STJ,tratando do artigo 20, § 4º, do CPC, já decidira ser induvidoso o cabimento de honorários em execução, mesmo se não embargada (REsp. 158.884, rel.Min.Gomes de Barros j. 30.10.2000), asseverando ainda que tal orientação permanece válida mesmo sob a nova sistemática de cumprimento de sentença, sendo "irrelevante, sob este aspecto, que a execução passe a ser realizada em fase do mesmo processo, e não mais em processo autônomo".
Araken de Assis (2006: 264) do comunga do mesmo entendimento, asseverando:
"... harmoniza-se com o espírito da reforma, e, principalmente, com a onerosidade superveniente do processo para o condenado que não solve a dívida no prazo de espera de quinze dias, razão pela qual suportará, a título de pena, a multa de 10% (art.475-J, caput), a fixação de honorários em favor do exeqüente, senão no ato de deferir a execução, no mínimo na oportunidade do levantamento do dinheiro penhorado ou produto da alienação dos bens." E segue afirmando: "Do contrário, embora seja prematuro apontar o beneficiado com a reforma, já se poderia localizar o notório perdedor: o advogado do exeqüente, às voltas com difícil processo e incidentes, a exemplo da impugnação do art.475-L, sem a devida contraprestação".