RESUMO: O presente trabalho busca discutir a efetividade da prestação jurisdicional, principalmente no âmbito civil, e mais especificamente sobre a aplicabilidade da penhora em sua modalidade virtual, utilizando com substrato de pesquisa a doutrina pátria e jurisprudência dos principais tribunais. Em uma interpretação teleológica do sistema legal brasileiro, o texto objetiva advogar a possibilidade de aplicação do instituto virtual como primeiro utensílio constritivo no cumprimento do título judicial, apesar de na prática forense ainda haver resistência à hipótese de aplicação imediata do instituto.
PALAVRAS-CHAVE: 1. Penhora On-line. 2. Celeridade. 3. Execução. 4. Eficácia. 5. Proporcional.
INTRODUÇÃO
O sistema normativo brasileiro atualmente vem sendo presenteado com diversas mudanças legislativas que objetivam atacar o dilema rançoso e antigo da falta de efetividade e rapidez judicial, tendo como grande exemplo a Emenda Constitucional nº 45/04. A morosidade e ineficácia de diversos institutos é um problema que vem sendo atacado por medidas interessantes, entre estas se destaca a Penhora On-line. O estudo da Penhora On-line será desenvolvido com ênfase na matéria cível. O enfoque principal será a normatização processual ou adjetiva no que diz respeito às atuais modificações no processo executivo, mas especificamente no ato judicial de Penhora.
O aspecto da atualidade do tema pesquisado é relevante na medida em que cumpre um papel informador e introdutório no conhecimento do novo assunto. Pois, em que pese a previsão inicial no convênio firmado entre Banco Central e Judiciário, a modalidade é praticamente desconhecida na esfera cível.
Desta forma, pretende-se demonstrar como foi recepcionado o instituto da Penhora eletrônica, no ordenamento pátrio, com as devidas repercussões principiológicas e normativas advindas da nova sistemática legal, evidenciar os pontos negativos e positivos da implantação desse novo utensílio jurídico segundo posicionamento de diversos autores contrapondo entendimentos antagônicos, debaterem as críticas mais frequentes apresentadas pelos especialistas, discorrer sobre a matéria no âmbito processual, analisar a modalidade eletrônica de constrição de créditos segundo as regras e características da Penhora, bem como sua possibilidade de implantação na atual sistemática executória brasileira.
Não se objetivou exaurir todas as vicissitudes e vertentes pertinentes ao adequado estudo da Penhora, apenas esclarecer os pontos obscuros e discutíveis relacionados à modalidade On-line, não nos furtando, contudo, a análise dos tópicos notadamente pacíficos nos diversos entendimentos.
1 A INSERÇÃO DOS MEIOS ELETRÔNICOS NO PROCESSO
Na mesma proporção que os primeiros computadores e a criação da rede mundial de computadores impactaram positivamente nossa civilização, o meio jurídico brasileiro está sendo revolucionado pelo auxilio dessas novas tecnologias no combate a demora na prestação jurisdicional.
O Direito utiliza o substrato social na formulação de suas normas e princípios. Por isso deve ser sensível a mudanças socais em qualquer de seus diversos ramos. Acompanhando essa lógica, não pode o processo ficar excluído do mundo eletrônico e digital, com esse pensamento, diga-se tardiamente, o legislador introduziu a primeira norma que visava o auxilio eletrônico ao processo, no bojo da lei 10.259/2001, dos Juizados Especiais Federais [01].
No Processo Civil, a primeira menção sobre a colaboração dos meios eletrônicos aconteceu na lei 11.280/06, que acrescentou o art. 154ao Código de Processo Civil. Como se depreende da leitura do parágrafo único, o legislador processual civil se cercou de muita cautela, especificando condições restritivas em sua aplicabilidade, em vista de ser melhor absorvida a mudança pelos oposicionistas ao desenvolvimento digital do processo e pela sociedade brasileira, jurídica ou não.
Um grande exemplo desse esforço legislativo se traduziu na lei 11.382/06, trazendo verdadeira revolução no processo de execução, ao fazer cinco referências à possibilidade de utilização de meios eletrônicos no processo, dentre as quais a própria Penhora On-line.
Ademais, foi apenas através deste instituto que houve a regulamentação do procedimento utilizado para a prática de atos processuais por meio eletrônico, possibilitando definitivamente a efetivação dos meios virtuais no mundo processual e a permuta de um método pautado na utilização de documentos em papel, para um sistema de prestação jurisdicional total ou parcialmente digitalizado.
A lei andou bem quando previu a utilização de meios de autenticação digital nos documentos enviados e anexados no processo virtual. Como sabemos, o maior problema da informatização do processo é a insegurança trazida pela rede mundial de computadores e pela fragilidade dos meios de proteção contra invasores e falsificadores.
Tendo em mente essa problemática, deve-se dispensar especial importância para a matéria na busca de um meio de autenticação digital seguro contra esses previsíveis inimigos do progresso judicial, caso contrário seus opositores impeliram a inércia dos Tribunais na iniciativa da digitalização dos meios processuais [02].
Existem ainda aqueles que enxergam graves danos causados pela implantação da lei no processo digital. O ponto chave apontado pelos críticos seria a exclusão de alguns brasileiros como partes do processo eletrônico, devido à falta de recursos e instrução frente à utilização de meios eletrônicos, incluindo advogados atuantes principalmente nas comarcas mais longínquas.
Contudo, a inserção dos meios eletrônicos no processo é um avanço natural e imprescindível para o Direito, às iniciativas contrárias não podem prosperar sob pena de estarmos enfatizando garantias a uma minoria em detrimento do objetivo maior das Ciências Jurídicas: a Justiça entregue à sociedade.
2 CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA E EFEITOS
Como o objetivo do trabalho não é desenvolver estudo completo da Penhora, pois é impossível abarcar um tema tão grandioso sem renegar pontos importantes da modalidade digital, a exposição dos elementos comuns da Penhora será breve e servirá como acessório ao desiderato principal.
Este é o momento crucial e central deste estudo, onde os esforços se concentram em buscar a melhor definição de Penhora e mais especificamente de sua modalidade On-line. Utilizando a gramática para desvendar o termo, demonstrando a origem e o caráter histórico, para enfim explicar o significado através da análise dos elementos que o constituem, Guilherme Goldschmidt entende que:
Penhora (etimologicamente, pignus = garantia, mas que não deve ser confundida com penhor – pacto adjeto ou obrigação acessória, em virtude da qual o devedor entrega coisa móvel sua ou de outrem, por este autorizado, para nela ser cumprida a obrigação principal, quando não resgatada a dívida) é ato de apreensão judicial, pelo qual se tomam bens do devedor, a fim de que neles se cumpra o pagamento da dívida ou satisfação da obrigação objeto da execução. [03]
Enfatizando o efeito da especificação de bens dentre o patrimônio do executado que suportaram a execução, define Marinoni: "A penhora é procedimento de segregação dos bens que efetivamente se sujeitarão a execução, respondendo pela dívida inadimplida". [04]
A penhora é ato de afetação de bem ou bens, identificados como mais apropriados pelo exequente para suportar os efeitos da execução, visando individualizá-los, para caso não seja paga a quantia constante no título judicial ou extrajudicial, venha a sofrer os atos expropriatórios em favor do exequente.
Em parecer objetivo, Santos nos brinda com visão geral e estrutural da Penhora asseverando: "É, em síntese, o primeiro ato executivo e coativo do processo de execução por quantia certa". [05]
Quanto à natureza jurídica do instituto, Humberto Theodoro Jr. identifica três principais correntes dentro da doutrina. A primeira considera a Penhora como medida cautelar, a segunda corrente atribui a penhora natureza unicamente executiva, a terceira corrente, maioria esmagadora da doutrina, posiciona a penhora como ato executivo com efeitos conservativos. Em vistas de definir a natureza jurídica da penhora, Marinoni posiciona a penhora como: "ato processual pelo qual determinados bens do devedor (ou terceiro responsável) sujeitam-se diretamente à execução". [06]
Parte da doutrina [07] divide os efeitos da penhora em processuais e materiais. Os efeitos processuais são três: a garantia do juízo ocorre quando são tocados pela Penhora bens suficientes pra suportar a Execução, ficando seguro o pagamento do saldo constante em título executivo; a individualização dos bens que servirão para satisfazer o exequente; e o surgimento do direto a preferência, ou seja, dentre os credores quirografários e respeitando as preferências e privilégios, instituídas anteriormente a penhora, aquele que primeiro realizou a penhora terá preferência na satisfação de seus créditos.
Já os efeitos materiais da Penhora são dois: O primeiro de privar o devedor da posse direta dos bens penhorados, a não ser que os proprietários sejam nomeados depositários; Como segunda repercussão material, a Penhora torna ineficaz, em relação às participantes da execução, os atos de disposição, a fim de resguardar a eficácia da execução.
2.1 PRINCIPAIS VANTAGENS E PECULIARIDADES
O tópico visa definir as benesses da Penhora de numerários por meio eletrônico e falar mais detidamente sobre o procedimento na esfera cível a ser utilizado na Execução, para dessa forma, alicerçar o entendimento do leitor, demonstrado o ambiente adequado para a Penhora On-line.
Sobre o manto desta tendência mundial, diz-se, de buscar a efetividade na prestação jurisdicional, incluindo nesta, instrumentos legais aptos a fazer justiça, conjugados com a finalidade de rapidez e eficácia, surge o ambiente propicio para gênese da Penhora Virtual.
Prevista nos Arts. 655-A e Art. 659, §6º do CPC, caso seja desejo do credor ou assim considere adequado o magistrado, de acordo com a ordem preferencialmente instituída, o exequente será beneficiado com a celeridade da Penhora On-line no atendimento a satisfação de seu crédito.
A Jurisprudência pátria quanto ao tema está dividida, entre aqueles que entende ser apenas possível a Penhora Digital perante o pedido expresso do exequente [08], ou quando é nítido o caráter procrastinatório do executado em indicar bens à Penhora [09], quando lhes é incumbido o dever processual. Outra parte ainda considera que a modalidade apenas deverá ser aplicada como ultima alternativa expropriatória [10], após a frustração das demais modalidades.
A primeira corrente sustenta-se na interpretação literal do Art. 655-A do CPC, que em entendimento precipitado, atrela o juiz a apenas proceder a Penhora On-line ao "requerimento do exequente". A minoria da doutrina trilha este caminho, e infelizmente a maioria considerável dos magistrados, que ainda não se atualizaram com as novas reformas ainda sustentam o entendimento anterior à reforma da Lei 11.382/06, consideram que a modalidade On-line apenas será aceita como último utensílio executivo, como espécie de penalidade ao executado de má-fé, como se demonstra a exegese:
(...) I - O Juízo Singular bem decidiu ao acolher o pedido de bloqueio de valores da conta bancária do agravante, em razão de sua inércia procrastinatória, evidenciada quando deixou de pagar a quantia devida e deixou de utilizar-se do momento oportuno, para apresentar bens a serem penhorados.(...) (Tribunal de Justiça do Pará ;nº do acórdão: 67328; nº do processo: 200630073837; ramo: cível; recurso/ação: agravo de instrumento; órgão julgador: 4ª câmara cível isolada; comarca: Belém; publicação: data:04/07/2007 cad.2 pág.7; relator(a): Eliana Rita Daher Abufaiad).
De qualquer forma, inicia-se a exposição de um pensamento praticamente isolado [11] quando, no sentido de considerar a Penhora Virtual como primeira modalidade constritiva, utilizando da inteligência do revolucionário Art. 655-A do CPC.
Nesse diapasão, é de se sentir que futuramente a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça [12] irá caminhar neste sentido, da mesma forma que já admite a incidência da ordem preferência do artigo 11 da Lei nº 6.830/1980, aplicável as execuções fiscais, onde o dinheiro figura com preferência sobre as demais hipóteses de penhora:
EMENTA: EXECUÇÃO FISCAL. ESGOTAMENTO DOS MEIOS PARA LOCALIZAÇÃO DE BENS PENHORÁVEIS. PRESCINDIBILIDADE. QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO. SISTEMA BACEN JUD. PENHORA DE DINHEIRO. ORDEM LEGAL DE PREFERÊNCIA. LEI 6.830/1980.
I - A despeito de não terem sido esgotados todos os meios para que a Fazenda obtivesse informações sobre bens penhoráveis, faz-se impositiva a obediência à ordem de preferência estabelecida no artigo 11 da Lei nº 6.830/1980, que indica o dinheiro como o primeiro bem a ser objeto de penhora.
II - Nesse panorama, objetivando cumprir a lei de execuções fiscais, é válida a utilização do sistema BACEN JUD para viabilizar a localização do bem (dinheiro) em instituição financeira(...) grifei ( REsp 1009363 / BA, n° 2007/0279286-3; Relator(a) Ministro FRANCISCO FALCÃO; Órgão Julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA; Data do Julgamento 06/03/2008; Data da Publicação/Fonte: DJe 16/04/2008).
Deve ser ressaltada como sustentáculo da adoção do rol preferencial a atual tendência de celeridade na prestação jurisdicional, de modo a influenciar positivamente na utilização do rol legalmente aconselhado como regra no Art. 655 do CPC, onde se assevera em seu inciso primeiro, que a penhora recairá sobre "dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira".
Ainda não se pode descuidar do verdadeiro objetivo colimado na Execução, ou seja, de trazer justiça rápida e eficiente com respeito às normas impostas pelo próprio Estado.
A Penhora On-line atende os objetivos de todos, do Estado, pois traz justiça de forma rápida e prática desafogando suas varas e tribunais, o exequente é satisfeito de forma menos morosa e dispendiosa. Nas repercussões para o devedor são onde se alojaram os maiores avanços e benefícios trazidos pela reforma.
3 Princípio da Proporcionalidade e da Menor Onerosidade para o Executado
Parte da doutrina brasileira se apega ao princípio hermenêutico da proporcionalidade para bradar a ilegalidade ou até mesmo inconstitucionalidade da Penhora On-line, argumentando a ocorrência no caso concreto de excesso no valor da penhora ou multiplicidade de contas bloqueadas, ou ainda a repercussão do ato frente a direito de terceiros.
O princípio da proporcionalidade não é direcionado especialmente a nenhuma das partes do processo, tem caráter geral, constitucional e principalmente é utilizado para auxiliar a interpretação do operador do direito no caso concreto, sendo mais uma ferramenta do legislador na busca da justiça.
O nascedouro desse princípio é talvez o mais importante pilar processual, diz-se, o princípio do devido processo legal, que tem em sua repercussão material ou substancial o logradouro da ideia de proporcionalidade. Em rasas palavras, o princípio da proporcionalidade assevera a necessidade dos julgadores sopesarem os benefícios e malefícios quando da aplicação de certa medida, em vista a não cometer excessos e principalmente emitir decisão justa e menos gravosa possível para ambas às partes, mesmo que para isso haja a flexibilização da rigidez de umas normas abstratas em proveito de outras.
Fredie Didier Jr. emite seu entendimento acerca da matéria com pertinentes esclarecimentos quanto a sua faceta constitucional interpretativa do princípio:
Contemplando o tribunal pela impossibilidade de obtenção de um denominador comum aos bens jurídicos em conflito, haverá de observar que a mitigação que se faça a qualquer deles deverá ser a menos possível; as restrições a um direito fundamental/princípio constitucional, que são inevitáveis, serão lícitas, mas apenas na medida do necessário [13]. (...).
Idealizando um conflito principiológico no ambiente da execução civil, seria como utilizar a Penhora Virtual como representante do princípio constitucionalizado da duração razoável do processo ou da celeridade processual, porém cuidar para agredir minimamente os direitos do executado, mitigando-se o princípio da menor onerosidade do devedor, em vista da robustez constitucional do primeiro.
O nobre professor ainda nos traz à análise questão atinente à hierarquia das normas como fator de acomodação dos princípios em conflito. Como sabemos, a força motriz das últimas reformas do processo civil foi à constitucionalização do princípio da celeridade no andamento processual, que dentre as inovações trouxe a normalização da Penhora Digital, mais um instrumento em busca da efetividade e duração razoável do processo.
Em polo oposto, o princípio da menor onerosidade do executado foi instituído no âmbito civil do processo, mais precisamente no art. 620 do CPC, não contando com o arcabouço constitucional da primeira norma.
Frente a esse confronto sobre a aplicabilidade, disputa de força e supremacia entre princípio constitucional e infraconstitucional, seria bem recebida à exegese, de autoria de André L. Borges Netto:
Constituição, portanto, vista como documento jurídico que abriga no seu seio as normas supremas da comunidade, por ser documento jurídico que contém normas superiores às demais, que submete governantes e governados ao seu império, servindo de limite jurídico ao Poder, vem a ser, na definição abrangente de Dalmo de Abreu Dallari, ‘a declaração da vontade política de um povo, feita de modo solene por meio de uma lei que é superior a todas as outras e que, visando a proteção e a promoção da dignidade humana, estabelece os direitos e as responsabilidades fundamentais dos indivíduos, dos grupos sociais, do povo e do governo.
Assim, por conter normas que dão estrutura (organização) ao Estado, normas que estabelecem a forma de elaboração das outras normas e que fixam os direitos e as responsabilidades fundamentais dos indivíduos, é que a Constituição passa a ser reconhecida como Lei Fundamental, por ser à base de todo o direito positivo da comunidade que a adote, em especial naqueles países que possuem um sistema jurídico baseado na lei escrita, sobrepondo-se aos demais atos normativos por estar situada no vértice da pirâmide jurídica que representa idealmente o conjunto de normas jurídicas vigentes em determinado espaço territorial. [14]
Conclui-se, por lógico, não ser viável a derrogação de preceito constitucional por preceito infraconstitucional, ademais está se falando de instrumento previsto no próprio código de processo civil (art.655-A do CPC), por isso, respeitado os tramites e formalidades processuais, nada obstaculizam a aplicação da Penhora On-line.
Não se advoga que o processo justo se paute apenas na prestação jurisdicional rápida, pelo contrário, outros princípios como o devido processo legal e do acesso à justiça são tão importantes quanto o princípio da celeridade processual, contudo temos também que convir que a justiça deve ser prestada em tempo adequado sob pena de perda do objeto processual ou da ineficácia da sentença.
Em regra, fantasiam aqueles que enunciam existir esse conflito entre o sistema On-line e o princípio da menor onerosidade, até mesmo por que, como restou demonstrado em tópico anterior, esta modalidade de Penhora reduz o valor final da Execução, tanto em custas processuais quanto em possíveis subvalorações dos bens.
Nesse diapasão, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro- TJRJ, fincou entendimento exarado na Súmula 117 –TJRJ "A penhora On-line, de regra, não ofende o princípio da execução menos gravosa para o devedor".
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul comenta esplendidamente o tema da menor onerosidade do executado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. decisão monocrática. PROCESSO DE execução DE ALIMENTOS. PENHORA ON-LINE. ORDEM DE preferência. PRESCRIÇÃO NÃO CONFIGURADA. Artigo 198, inciso I, DO Código Civil
(...) seja porque a penhora On-line é mais econômica (pois o executado não terá que arcar com despesas processuais comuns às expropriações de bens). Não se afrontando o princípio de manutenção da execução pelo meio menos gravoso (Agravo de Instrumento Nº 70026065946; Oitava Câmara Cível, Rel. Dês. Alzir Felippe Schmitz, julgado em 27.08.2008).
O douto acórdão irradia a prática forense vivenciada pelos magistrados gaúchos, sentida, decerto, pela maioria dos juízes que adotaram o aparato da Penhora On-line como norte, por ser meio eficaz e célere disponível no corpo legislativo pátrio.
3.1 Excesso de Penhora, Multiplicidade de Bloqueios e a Repercussão Indireta a Direito de Terceiros
O excesso de execução e a multiplicidade de Penhoras em diversas contas soaram como críticas procedentes até a implantação da versão 2.0 do Bacen Jud, que recentemente causou alvoroço na opinião pública ao possibilitar ao juiz consulta ao extrato bancário dos executados.
Na rotina do processo judicial, podem ocorrer equívocos dentro de um percentual aceitável, o que é normal em qualquer atividade que envolva a pessoa humana, não obstante a versão 1.0 do referido convênio extrapolou essa margem de erro ordinária, dando asas a críticas procedentes de muitos colegas.
Esquadrinhando os instrumentos disponibilizados nas duas versões, se conclui: o programa 2.0 enfrentou frontalmente os problemas apresentados pela versão anterior, incluindo o excesso de penhora e a multiplicidade de bloqueios.
Na nova versão, estes problemas são facilmente evitados por simples diligência do magistrado na utilização da "ordem judicial de requisição de informações", onde serão auferidas em resposta as requisições dos magistrados, contendo de acordo com o pedido, os saldos, endereços, relação de agências, contas, extratos, pesquisas de relacionamentos de contas encerradas disponíveis na rede bancária e, de acordo com a conveniência, proceder em ato seguinte à escolha da conta ou contas onde haja recursos suficientes para suportar a execução, bloqueando-lhes a quantia necessária.
Dessa forma, o programa praticamente inviabiliza o antigo vício, pois, hodiernamente a modalidade On-line previne a incidência da mesma Penhora em diversas contas. Esse avanço foi possível, dentre outros mecanismos, pela possibilidade do juízo especificar o alvo bancário da constrição, em vistas de não ultrapassar a quantia executória inicial na somatória dos bloqueios.
Com a opção de especificar o valor a ser bloqueado em conta, se previne o excesso de penhora, haja vista não ser mais possível bloquear integralmente os proventos da conta, que mesmo tendo saldo superior, apenas será constrita na medida especificada pelo juízo no momento da emissão da ordem de bloqueio.
Outro mecanismo deveras eficiente é a possibilidade de cadastramento de conta junto ao Poder Judiciário, no intuito de suportar a lascívia da execução via Penhora Virtual. Esse avanço se tornou realidade com a entrada em vigor [15] da Resolução do Conselho Nacional de Justiça de n° 61 que "Disciplina o procedimento de cadastramento de conta única para efeito de constrição de valores em dinheiro por intermédio do Convênio BACENJUD e dá outras providências". Dentre suas determinações, prevê em seu art. 2° a obrigatoriedade dos magistrados procederem a seu cadastramento no sistema, e a possibilidade de qualquer pessoa física ou jurídica especificar junto ao Judiciário a conta onde desejam que recaia possível Penhora On-line, evitando também a multiplicidade de bloqueios e também a possível constrição de valor considerado impenhorável.
Destarte segundo a opinião dos próprios magistrados, naturalmente mais abalizados para enfrentar a questão, frente à prática rotineira de suas funções, essa realidade mudou. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul também noticia seus resultados favoráveis na utilização da medida constritiva, indicando o procedimento para valores menores, até mesmo pela possibilidade de delimitar a quantia penhorada na conta do executado:
Prático e efetivo, além de rápido, este mecanismo permite que, ao realizar o comando de penhora durante o dia, à noite o valor já esteja bloqueado na conta, segundo Beatriz Maria Contar, assessora jurídico-administrativo. Método utilizado há bastante tempo pelo Tribunal Regional do Trabalho, a penhora on-line foi adotada pelo TJMS de acordo com o entendimento do Tribunal Pleno, o qual determinou que o seqüestro é mais viável no caso de ações de pequeno valor (...). [16]
Como restou demonstrado pela citação alhures, a maioria da jurisprudência agasalha a utilização da Penhora On-line, e de outra forma não poderia ser, tendo em vista todos os benefícios já expostos, apenas se sustentando sua maleficência em discursos daqueles que visam procrastinar o atendimento da prestação jurisdicional.
Outra corriqueira visão negativa se perfaz na repercussão negativa da Penhora sobre terceiras pessoas, na medida em que estas são prejudicadas indiretamente pela constrição, como no caso de trabalhadores quem veem suspenso o regular recebimento de seus salários devido à Penhora recair sobre os recursos disponíveis para o pagamento correspondente.
Nestes casos de impenhorabilidade absoluta, o ônus de provar o gravame da impenhorabilidade da quantia constante na conta é da empresa, como muito acertadamente previu o legislador no art. 655-A, §2º do CPC. O magistrado procede à penhora da quantia da execução como dever legal de ofício, frente à inadimplência do executado, não podendo ser-lhe esperada outra atitude senão aquela de cumprir a lei.
Quanto ao ônus probante do executado, devem os fatos ser irremediavelmente demonstrados, caso reste alguma dúvida quanto à destinação dos valores constritos, deve-se privilegiar o sucesso da execução frente à incerteza das alegações do executado.
Uma situação adequada para provar a destinação salarial dos recursos seria a demonstração dos comprovantes de transferências mensais da conta alvo do bloqueio para outras contas-salários dos trabalhadores. Frente a provas contundentes, resta a obrigação do magistrado em proceder à substituição dos valores por outros bens já indicados previamente pelo executado, junto ao pedido de substituição da Penhora.
3.2 SIGILO BANCÁRIO
Outra crítica em voga sobre o sistema Bacen Jud, mais intensificada após a implantação da versão 2.0, foi a questão frutificada por parte da doutrina da lesão ao direito garantido constitucionalmente do sigilo bancário [17]. O convênio estaria lesionando o sigilo bancário do executado ao autorizar a visualização de informações como saldo, extrato e outros dados bancários pelo operador do sistema.
Preliminarmente, entendendo dessa forma realmente estaríamos eivando de vício de inconstitucionalidade o art. 655-A, §1º do Código de Processo Civil, entretanto, antes do julgamento deve-se visualizar o permissivo legal, que restringe a colheita de dados bancários a determinadas informações: "§ 1º As informações limitar-se-ão à existência ou não de depósito ou aplicação até o valor indicado na execução".
Segundo entendimento majoritário do STJ [18], no artigo supracitado, o legislador previu uma possibilidade da quebra do sigilo bancário no bojo de processo judicial, a exemplo da lei complementar nº 105 em seu Art. 1º, § 4º "A quebra de sigilo poderá ser decretada, quando necessária para apuração de ocorrência de qualquer ilícito, em qualquer fase do inquérito ou do processo judicial, e especialmente nos seguintes crimes:".
Ambas as leis visam excepcionalizar o direito ao sigilo bancário, portanto não há de se falar em inconstitucionalidade, até mesmo porque, os dispositivos apenas tratam de situações onde o legislador expressamente optou por derrogar a garantia em ambiente judicial.
Para outra parte da jurisprudência, representadas por alguns julgados do STF, o Art. 655-A do CPC que introduziu o instituto na esfera civil apenas previu em seu §1º o pedido de informação sobre contas ou depósitos na rede bancária até o valor da execução, sem quebra de sigilo bancário, ademais, sempre que o legislador pátrio prévio a quebra de sigilo bancário, o fez literalmente em texto de lei, como demonstra a exegese do Supremo Tribunal Federal:
EMENTA: DECISÃO RECURSO EXTRAORDINÁRIO - MATÉRIA FÁTICA - INTERPRETAÇÃO DE NORMAS LEGAIS - INVIABILIDADE - DESPROVIMENTO DO AGRAVO. 1. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou provimento a agravo de instrumento, ante fundamentos assim sintetizados (folha 72): EXECUÇÃO FISCAL. ACESSO AO SISTEMA BACEN JUD. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. "Inexistindo comprovação por parte do exeqüente de esgotamento das diligências em busca de bens penhoráveis em nome da executada, não mostra-se razoável conceder-lhe, por meio do sistema BACEN JUD, o acesso às informações acerca das contas bancárias, que poderão servir de garantia ao processo executivo. A quebra de sigilo bancário não se configura, uma vez que as informações requeridas limitam-se à existência ou não de contas bancárias em nome do devedor e eventual saldo disponível, não se tendo acesso à movimentação financeira do executado." (...) (AI 627751 / SC - SANTA CATARINA; Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO; Julgamento: 05/09/2007; Publicação, DJe-115; DIVULG 02-10-2007 PUBLIC 03-10-2007; DJ 03/10/2007 PP-00040)
No entanto, como acima explanado, o convênio Bacen Jud extrapola esses limites, pois além de prever a possibilidade de delimitação das informações na medida da execução, acena ao mesmo tempo com a possibilidade da colheita total das mesmas, dependendo do procedimento adotado pelo juízo:
No caso de saldos e extratos, pode-se delimitar a busca aos consolidados (total de todos os relacionamentos da pessoa pesquisada, por instituição). Alternativamente, pode ser especificado um valor limite para a pesquisa de saldos e o tipo de relacionamento para os extratos (de contas correntes/contas de investimento; de contas de poupança; de investimentos e de outros ativos). [19]
Assim, a norma do Art. 655-A, §1º do CPC apenas estaria sendo desrespeitada quando o juízo se descuidasse ao não especificar ao sistema a quantia buscada, levando a visualização de valor superior à execução ou até do saldo integral da conta ou contas do executado pelo juízo, haja vista, no caso de haverem contas com saldo superior à execução, a informação prestada além do valor da execução perfazer-se-a em violação ao sigilo bancário do devedor.
Em relação à visualização do extrato bancário do executado através do sistema do Banco Central, apesar de ser arma muito útil para detectar tanto fraudes a execução, como fraude contra credores, como em casos de saque na conta alvo da execução, já antevendo a incidência da Penhora Digital, infelizmente, essa possibilidade não está prevista legalmente no bojo das reformas do processo civil, mais especificamente nos artigos que tratam da Penhora Virtual. A despeito de o convênio Bacen Jud prever a visualização do extrato e movimentações bancarias do executado, a legalidade do pedido de informações foi insuficientemente debatido tanto na Jurisprudência quanto na doutrina pátria para se poder chegar a um porto seguro dentro do Direito.
Apesar disso, a sentir da lógica, qualquer manifestação judicial, através do sistema Bacen Jud, que exponha o extrato bancário do devedor deve ser considerada ilegal, não obstante sua previsão no convênio com o Banco Central, ainda não existe qualquer dispositivo legal que sustente tal prática.