É estimado que os Planos de Saúde estejam presentes no cenário nacional desde a década de 40, quando algumas estatais começaram a oferecer esse serviço a seus funcionários. Foi na década de 60, quando também as empresas privadas passaram a oferecer o serviço, que o mercado cresceu significativamente. A alavancada do segmento resultou em uma relevância constitucional em 1988, quando a Constituição Federal expressamente permitiu à iniciativa privada explorar o serviço de assistência à saúde mediante controle do estado. Apenas em 1998 foi aprovada a primeira lei para, efetivamente, regular a atividade.
Visando complementar 03 artigos da Lei 9.656/98, que atualmente regula a atividade dos planos de saúde, foi apresentado, em 17/08/2010 pelo deputado Chico Lopes do PCdoB – CE, o Projeto de Lei 7762/2010, que ainda está sem data para votação no Congresso.
Caso seja aprovado o Projeto de Lei 7762/2010, o que realmente mudará?
A Lei 9.656/98 surgiu, principalmente, para equilibrar as relações entre planos de saúde e consumidores, estabelecendo algumas garantias, como, por exemplo, a proibição da rescisão unilateral do contrato e a provação pelo governo das taxas de reajustes.
Foi por meio desta norma que se criou o Conselho Nacional de Saúde – CONSU, composto pelo Ministro da Saúde; Ministro da Fazenda; Ministro da Justiça; Superintendente da Superintendência de Seguros Privados – SUSEP; Secretário de Assistência à Saúde do Ministério da Saúde e pelo Secretário de Políticas de Saúde do Ministério da Saúde.
Em 04.11.1998 o CONSU fez publicar no Diário Oficial a resolução nº. 08/1998 que no artigo 4º determina que as operadoras de plano de saúde forneçam ao consumidor laudo circunstanciado, quando solicitado, bem como cópia de toda a documentação relativa às questões de impasse que possam surgir no curso do contrato, decorrente da utilização dos mecanismos de regulação. O consumidor deve ter suas dúvidas e impasses relativos às normas de regulação formalmente esclarecidas.
Uma das novidades do Projeto de Lei 7762/2010 é que se ampliará o universo das informações que devem ser prestadas ao consumidor. Será obrigatória a apresentação de justificativa ao cliente sempre que houver recusa de um procedimento, exames, internamento ou conduta similar. O Projeto de Lei inova ao trazer, expressamente, a forma como a justificativa deve ser prestada. Será ela por escrito, constando o fundamento legal ou contratual da negativa, o responsável pela análise técnica da solicitação e a data em que ela ocorreu.
Outra novidade é que as informações e justificativas não mais dependerão de prévia solicitação. Sempre que for negado um procedimento, a operadora do plano de saúde deverá, obrigatoriamente e independente de prévia solicitação, prestar ao consumidor todas as informações necessárias ao perfeito entendimento dos motivos da recusa.
Atualmente, esta obrigatoriedade é garantida pelo Código de Defesa do Consumidor – CDC, através do princípio à ampla informação do consumidor.
Se for aprovado, o referido projeto forçará as empresas operadoras de planos de saúde a analisarem, minuciosamente, os casos de recusa, pois uma vez prestada a informação ao consumidor de forma escrita e documentada, poderá servir de prova robusta em caso de eventuais abusos.
O PL 7762/2010 também inovou ao determinar que as fornecedoras de planos de saúde enviem trimestralmente o número de procedimentos negados à Agência Nacional de Saúde – ANS. Isso permitirá que a autarquia, criada para regular, normatizar, controlar e fiscalizar as atividades que garantam a assistência suplementar à saúde, efetivamente, verifique a quantidade e até mesmo a idoneidade das recusas.
O deputado Chico Lopes, idealizador da proposta, pretende, ainda, que as operadoras permitam a migração dos seus beneficiários do plano coletivo pra o individual sem a necessidade de novo prazo de carência e sob as mesmas condições, desde que o cliente assuma pagamento integral do plano. Esta obrigação será incluída no artigo 16 da lei 9.656/98 e caso o consumidor opte pela migração ela será estendida a todo o grupo familiar inscrito quando da vigência do plano coletivo.
Mais a Lei peca ao não estipular prazo para resposta das operadoras, pois gera insegurança, tanto para o cliente, como para as empresas. Essa lacuna dá margem a interpretações diversas sobre qual tempo seria razoável para a entrega da resposta.
É certo que exigências trazidas pelo Projeto de Lei, como maior complexidade na resposta das operadoras, e justificativa prestada por escrito no momento da recusa, inevitavelmente aumentarão o período de espera do consumidor pela resposta da operadora, tempo que o cliente pode não dispor.
Por outro lado, as operadoras ficam impedidas de prestarem qualquer resposta antes da formação do instrumento. Atualmente os planos de saúde estão autorizados a simplesmente recusarem o procedimento e justificarem posteriormente, caso seja solicitado. Essa faculdade torna a relação mais célere e tão segura ao consumidor, quanto na hipótese de aprovação da PL, pois o Código de Defesa do Consumidor vigente já garante aos clientes o direito a receber tais informações, ainda que posteriormente.
É bom frisar que não há mais dúvida sobre a aplicabilidade do CDC na relação entre os planos de saúde e seus clientes, pois a Súmula 469 do Superior Tribunal de Justiça - STJ, editada em 29.11.2010, esclareceu que a relação é mesmo de consumo. Mesmo assim, o mencionado PL preocupou-se em deixar expresso que a relação jurídica firmada entre os planos de saúde e seus clientes é sempre de natureza consumerista, ainda que firmada através de interposta pessoa. Fica garantido o direito à informação aos beneficiários de plano de saúde.
Com a aprovação do Projeto de Lei, a simples negativa de um procedimento, exames e internação ou conduta similar, sem o envio da justificativa, resultará em ilícito de consumo passível de multa administrativa, ainda que não cause danos ao consumidor. As operadoras deverão observar essa nova obrigação e enviar a justificativa mesmo sem a requisição do cliente, se não quiser sofrer o risco ver consumidor acionar o PROCN, mesmo em sofrer qualquer lesão.
A eventual aprovação do projeto de lei 7765/2010 trará, sem dúvida, novas e complexas obrigações para as fornecedoras de planos de saúde, entretanto, não concederá prazo para as operadoras adaptarem-se as reformas. A adequação necessária demandará novos procedimentos, contratação e treinamento de pessoal. É bem provável que as operadoras tenham que suportar altos custos, se o PL passar a vigorar a partir de sua publicação, como determinado o seu art. 2º.
Esses são indícios de que o PL sofrerá reformas antes de sua aprovação, a exemplo do que aconteceu, recentemente, com as operadoras de telefonia, no caso da portabilidade.
Conclusão.
Embora o projeto tenha a intenção de trazer benefícios ao consumidor, se aprovado poderá ter efeito contrário, pois ao burocratizar o procedimento de recusa, pode ocasionar um indesejado alongamento do prazo de espera da resposta. Ademais, o fato de não determinar um período para que as fornecedoras se adaptem aos novos procedimentos, prejudicaria as operadoras de plano de saúde, que notoriamente não podem atender tais exigências imediatamente.