1. DA EXPOSIÇÃO DO TEMA
Após as alterações da Lei n.º 11.232/2005, como se sabe, houve a extinção do processo autônomo de execução, subsequente natural do processo de conhecimento. Atualmente, fala-se em fase de cumprimento de sentença, sem a necessidade de instauração de um novo processo, com nova citação, etc.
Entretanto, em se tratando de execução contra a Fazenda Pública, o processo de execução remanesce como uma demanda autônoma (art. 730 do CPC). Desse modo, há a necessidade de citação da Fazenda Pública para, querendo, ajuizar embargos à execução (art. 741 do CPC), que podem ser uma terceira demanda a ser ajuizada no fito de resolver definitivamente a mesma lide originária.
Por ser uma demanda autônoma, nada mais justo, em tese, que finda a execução haja condenação em honorários advocatícios a ser suportada pela parte sucumbente. Diz isso em função da celeuma acerca da condenação em honorários na fase de cumprimento de sentença, hoje já chancelada pelo Superior Tribunal de Justiça.
Certo é que não há propriamente controvérsia no processo de execução, a qual, se existente, terá lugar no seio dos embargos à execução. Dito de outro modo, as controvérsias residem no processo de conhecimento e nos embargos, não, contudo, no processo de execução.
Quanto aos honorários decorrentes da demanda executória, o Supremo Tribunal Federal definiu, em 29.9.2004, as linhas que pautam toda a orientação jurisprudencial até o presente momento. Trata-se do multicitado RE 420816, cujo acórdão foi relatado pelo Min. Sepúlveda Pertence, a ser examinado em seguida.
Entretanto, não obstante a pacífica jurisprudência capitaneada pelo STF, ainda é controversa na jurisprudência a condenação de honorários advocatícios decorrentes do processo de execução quando a Fazenda Pública, antes da citação, ou antes mesmo da petição inicial de execução, cumpre espontaneamente o julgado e apresenta cálculos do valor devido. É a chamada execução invertida.
Eis a problemática a ser abordada neste artigo: a condenação em honorários nos casos que tais, abordada através do precedente da Corte Suprema e valendo-se da técnica do distinguishing.
2. DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E SUA CRÍTICA
O Plenário do STF, no RE acima apontado, abordou a constitucionalidade da Medida Provisória 2.180-35/2001, que versava o seguinte:
Art. 4º A Lei nº 9.494, de 10 de setembro de 1997, passa a vigorar acrescida dos seguintes artigos:
[...]
"Art. 1º-D. Não serão devidos honorários advocatícios pela Fazenda Pública nas execuções não embargadas." (NR)
Nesta demanda, através de uma interpretação conforme, a Corte afastou a aplicação do dispositivo à hipótese de execução por quantia certa contra a Fazenda Pública cujo valor cobrado fosse definido em lei como de pequeno valor, que não se submete ao regime de precatório.
Entretanto, adiantam-se aqui algumas palavras quanto à diferenciação de regime de pagamento. Assim como no regime de precatórios, quando a União, suas autarquias, fundações de direito público e demais órgãos incluídos no orçamento geral da União são condenados a pagar crédito de pequeno valor, o Tribunal organiza, mensalmente, a relação das requisições em ordem cronológica, contendo os valores por beneficiário, encaminhado-a à Secretaria de Planejamento, Orçamento e Finanças do Conselho da Justiça Federal.
Em outras palavras, o discrímen que deu azo ao julgamento do RE 420816, na prática, inexiste. Embora o prazo para pagamento seja mais curto no caso de RPV, o processo de pagamento é iniciado pelo Judiciário, seguindo seu curso "automaticamente", tal como no precatório.
Nessa hipótese, a Fazenda Pública, assim como nos precatórios, também não poderia determinar o pagamento antes do início do processo de execução. Em outras palavras, exige-se o mesmo esforço do advogado do exequente para cobrar valor sujeito a precatório e o sujeito a RPV.
Não obstante essas críticas (a de inexistir, de um lado, controvérsia no processo de execução e, de outro, dicrímen razoável entre o pagamento por precatório ou RPV), há outros argumentos contra a condenação em honorários no processo de execução mencionados no julgamento do RE 420816. Passa-se, pois, a analisar alguns deles.
3. DOS FUNDAMENTOS PARA A NÃO-CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS PRESENTES NO RE 420816
Abordar-se-á, nesse ponto, argumentos sobre a condenação em honorários decorrente do processo de execução contra a Fazenda Pública, especificamente no caso de cumprimento espontâneo.
Inicialmente, ressalta-se a postura do Min. Cezar Peluso, o qual afirmou, nos debates, que "nenhuma parte recorre à execução, para lhe sofrer as delongas, senão quando não vê seu direito satisfeito espontaneamente".
Tal raciocínio seria válido para o processo de conhecimento, uma vez que, se a parte autora teve de valer-se de uma ação judicial para buscar a invalidade de um ato administrativo, há uma nítida causalidade quanto à sucumbência.
Frise-se, aqui, em parênteses, quão problemático se torna tal raciocínio quando se reconhece interesse de agir a quem não tenha feito seu pedido administrativamente. Nesses casos, pode-se tornar duvidosa a causalidade, uma vez que a Fazenda Pública nem sequer tomou ciência dos pleitos do cidadão.
Quanto ao processo de execução, por sua vez, se a Fazenda Pública ofereceu cálculos que posteriormente foram reputados corretos, cumpriu eventual obrigação de fazer constante da decisão judicial, de modo que sequer houve inicial! Quando há, trata-se de mera repetição dos cálculos já apresentados, razão pela qual forçoso é reconhecer que, nesses casos, a parte "não teve de recorrer à execução".
Em outro momento intervém o Min. Carlos Velloso: "seria lícito obrigado o advogado a trabalhar de graça?". Tal ponderação, veja-se, não se aplica ao caso concreto, uma vez que o advogado não foi obrigado a trabalhar; em verdade, sequer trabalhou, pois somente aproveitou-se do trabalho realizado pela Fazenda Pública para requerer honorários.
Ilustre-se: se diante da apresentação dos cálculos pela Fazenda Pública, o exequente somente manifesta ciência e concordância, há aqui, em verdade, uma "transação pré-executória", consistente no consenso a respeito do quantum debeatur antes mesmo de se iniciar o processo de execução.
Sendo assim, há nítido enriquecimento ilícito por parte do causídico, que receberá honorários (com verbas públicas), maiores que no processo de conhecimento, para juntar uma cópia (dos cálculos) que já estava nos autos e iniciar um processo que não possui lide!
De fato, nos casos ora abordados, não há trabalho do advogado se a Fazenda Pública ou a advocacia pública já apurou o quantum, pelo que a gratuidade invocada não é um problema a ser corrigido.
Sobre a ausência de trabalho acima exposta, veja-se que o Min. Gilmar Mendes já havia ponderado que "a própria medida provisória, obviamente, não teve por pressuposto a questão da qualidade da Fazenda Pública, mas o fato de não haver, como o Ministro Cezar Peluso já havia esclarecido, qualquer esforço. Tanto é que não se pretendeu retirar os honorários da condenação do processo de conhecimento, simplesmente, ou na execução embargada, porque não se discutia isso. Tão-somente na hipótese em que de fato era uma ficta execução".
Em prosseguimento nos debates, o Min. Sepúlveda Pertence asseverou que "nas execuções contra particular, só se vai ao processo de execução se há mora. Mas ao contrário, a Fazenda não pode pagar sem precatório".
Ponto crucial para o debate, deve-se reconhecer que, por mais que a Fazenda Pública se esforce para garantir um deslinde célere à demanda judicial, deve-se submeter a formalidades dignas do trato com verbas públicas, notadamente ao regime de pagamento por precatório, requisição de pequeno valor ou ordem de pagamento, esta última no caso de demandas acidentárias contra o INSS (art. 128 da Lei n.º 8.213/91 c/c art. 17, § 1.º, Lei n.º 10.259/2001).
Assim, se se considerar que somente o pagamento impediria o nascimento do processo de execução, e, consequentemente, expurgaria a causalidade, deve-se concluir que, quando houver quantia a ser satisfeita, nunca a Fazenda Pública poderá resolver o litígio precocemente e sempre deve pagar honorários advocatícios.
Evitando uma política de recorrer e embargar por qualquer razão, a Fazenda Pública pode optar por encerrar mais rapidamente o litígio, cumprindo sua obrigação e apresentando cálculos do valor devido. Tal providência traz benefícios para o jurisdicionado, para o Judiciário e para a própria Fazenda.
Entretanto, caso haja condenação em honorários a despeito do acima exposto, haveria certo incentivo à desídia. Basta pensar que, caso se "insista" em uma razão para oferecer embargos, a condenação em honorários nessa esfera supriria a da execução e ainda haveria certa chance de procedência. Ora, com ou sem embargos não haveria condenação tripla (conhecimento, execução, embargos), mas somente dupla (conhecimento, execução ou conhecimento, embargos).
Prosseguindo nessa ideia, agora sob um aspecto político, se a Fazenda-executada apresenta cálculos (obrigação legal do exequente) e cumpre eventual obrigação de fazer contida no título, age em benefício da celeridade e tal esforço trabalho deve ser recompensado. Ainda que indiretamente, a ausência de honorários pode ser encarada como um incentivo.
O ministro Cezar Peluso, sobre o assunto, disse que "por isso mesmo que não há sucumbência e não são devidos honorários advocatícios". E lembre-se que aqui não se aborda diretamente o cumprimento espontâneo, mas a necessidade da execução. De fato, transpondo a afirmação para o caso de apresentação espontânea de cálculos, mais absurdo seria cogitar acerca de sucumbência na demanda executória em favor do exequente.
Dessa análise verifica-se que, já em 29.9.2004, no RE 420816, encontram-se alguns argumentos para fundamentar a impossibilidade de condenação da Fazenda Pública em honorários quando cumpre espontaneamente o julgado: a) impossibilidade de pagamento direto e imediato; b) ausência de trabalho do advogado; c)inexistência de pretensão resistida; d) imperiosidade de premiar quem confere celeridade ao deslinde do feito e e) ausência de sucumbência.
4. DA APLICAÇÃO DO JULGADO SOB A ÓPTICA DO DISTINGUISHING
Como visto acima, o STF pacificou que, se a execução contra a Fazenda Pública perseguir valor considerado de pequeno valor, em não havendo embargos à execução, cabem honorários advocatícios decorrentes do feito executório.
Não se abordou, como se vê, o caso em que a Fazenda Pública cumpre eventual obrigação de fazer e apresenta cálculos da quantia que considera devida, ainda que não efetue, de imediato, o pagamento.
Estaria tal caso abrangido pela decisão naquele julgado? Seria ele uma exceção?
Em nossa opinião, trata-se de uma exceção oriunda da peculiaridade do caso concreto, o que não se contrapõe ao perfilhado pela Corte Suprema.
É que deve-se, no caso, consagrar a técnica interpretativa conhecida como distinguishing, através da qual o julgador deixa de aplicar um precedente judicial ao caso concreto em razão de o fato sob análise ser distinto do que imaginaram os criadores do precedente.
Tal regra, de origem norte-americana, versa sobre a hipótese de afastamento da ratio decidendi de um precedente ao caso concreto diante de suas peculiaridades.
Para uma adequada compreensão do tema, preciosa é a lição de Fredie DIDIER JR, Paula Sarno BRAGA e Rafael Oliveira:
Quando se estuda a força vinculativa dos precedentes judiciais (enunciado de súmula de jurisprudência predominante de um tribunal, por exemplo), é preciso investigar a ratio decidendi dos julgados anteriores, encontrável em sua fundamentação. Assim, as razões de decidir do precedente é que operam a vinculação: extrai-se da ratio decidendi , por indução, uma regra geral que pode ser aplicada a outras situações semelhantes. Da solução de um caso concreto (particular) extrai-se uma regra de direito que pode ser generalizada. Configura exatamente o que Luiz Guilherme Marinoni chama de norma jurídica criada pelo magistrado, à luz do caso concreto, a partir a da conformação da hipótese legal de incidência às normas constitucionais. Só se pode considerar como ratio decidendi a opção hermenêutica que, a despeito de ser feita para um caso concreto, tenha aptidão para ser universalizada.
Mais adiante complementam:
Fala-se em distinguishing (ou distinguish) quando houver distinção entre o caso concreto (em julgamento) e o paradigma, seja porque não há coincidência entre os fatos fundamentais discutidos e aqueles que serviram de base à ratio decidendi (tese jurídica) constante no precedente, seja porque, a despeito de existir uma aproximação entre eles, alguma peculiaridade no caso em julgamento afasta a aplicação do precedente. Para CRUZ E TUCCI, o distinguishing é um método de confronto, "pelo qual o juiz verifica se o caso em julgamento pode ou não ser considerado análogo ao paradigma. Sendo assim, pode-se utilizar o termo "distinguishing" tanto para designar o método de comparação entre o caso concreto e o precedente, como para designar o resultado desse confronto, nos casos em que se conclui haver entre eles alguma diferença.
MARCELO SOUZA cita um caso de distuinguishing: "em Bridges v. Hawkesworth [1985] LJ 21 QB 75, a um consumidor foi reconhecido o Direito de guardar o dinheiro que ele encontrou no chão de uma loja. Diferentemente, em South Staffordshire Water Company v. Sharwood [1986] 2 QB 44, a uma pessoa que encontrou dois anéis de ouro na lama do fundo de um reservatório de água não foi reconhecido o direito de retê-los, porque o lugar em que os achou não estava aberto ao público.
De fato, concretizando tais ensinamentos, conclui-se que não há como se transpor a ratio decidendi do acórdão proferido pelo STF ao exame da condenação em honorários na hipótese de espontaneidade na apresentação de cálculos pela Fazenda Pública. Ao revés, tem-se um fato suficiente para determinar o afastamento do precedente, dada as peculiaridades examinadas acima.
Pode-se pensar que a aplicação do distinguishing pode levar a uma relativização da força do precedente, bem como a uma situação da desigualdade.
Entretanto, ainda que a diretriz ideal seja a da aplicação uniforme do direito, a riqueza da concretude dos fatos sempre trará exceções não previstas pela norma ou, no caso, pelo precedente judicial. Em outras palavras, ainda que se trate de uma decisão com efeitos erga omnes, não há como extirpar meios de averiguar se o precedente deve ou não ser aplicado ao caso concreto.
É que pode haver duas zonas cinzentas: a do conteúdo da decisão e a das peculiaridades do caso concreto. No primeiro, o intérprete deve buscar se o precedente alcança determinada situação, debruçando-se sobre os próprios termos do julgado; já no segundo, deve-se focar no dado da realidade, na possibilidade de a aplicação do precedente der ensejo a resultados absurdos, injustos ou não pretendidos pelos criadores do precedente.
Para a primeira situação, devem-se utilizar as orientações da hermenêutica jurídica; para a segunda, deve-se aplicar a técnica do distinguishing.
Abordando o tema das súmulas vinculantes, Antonio Moreira Maués faz comentários extremamente úteis para elucidar a questão, atendo-se, particularmente, à isonomia e à excepcionalidade. Confira-se:
Partindo da ideia de que a divergência jurisprudencial na aplicação da Constituição não afeta apenas o direito à segurança, mas também o direito à igualdade, propomos um modelo alternativo que busca garantir a igualdade na aplicação judicial do direito, protegendo de modo adequado outros direitos fundamentais, como o próprio direito à segurança. As características desse modelo são as seguintes:
a) reconhecimento da possibilidade do juiz afastar-se do precedente, desde que o faça de modo fundamentado, apresentando argumentos que indiquem sua inaplicabilidade ao caso;
b) existência de mecanismos que possibilitam rever o precedente;
c) reconhecimento da importância das circunstâncias do caso para a interpretação da norma.
Esse modelo reconhece, em princípio, a autoridade do precedente firmado pelo STF, mas possibilita que o juiz realize a interpretação do conjunto normativo aplicável ao caso e não apenas da decisão ou da súmula que se invoca como vinculante naquela lide. De modo similar à técnica do distinguishing adotada no sistema da common law, o modelo aqui proposto não implica negar validade ao precedente do STF, mas reconhecer que as circunstâncias do caso impedem sua aplicação em nome da proteção de direitos fundamentais. Portanto, uma fundamentação adequada para deixar de aplicar uma decisão ou súmula vinculante não parte da discordância do juiz com a interpretação realizada pelo STF, mas de sua inaplicabilidade àquele caso.
[...]
No julgamento do Agravo Regimental na Reclamação nº 3.034, ajuizada pelo Estado da Paraíba, o STF manteve decisão do Presidente do Tribunal de Justiça da Paraíba, que expedira ordem de seqüestro de bens do Estado para quitação de precatório, em razão de grave moléstia que acometia a credora da Fazenda Pública. Para o Supremo Tribunal, essa decisão não conflitava com seu julgamento da ADIn nº 1.662, que declarara inconstitucional hipótese similar de seqüestro. Nas palavras do Min. Eros Grau, "a situação de fato de que nestes autos se cuida consubstancia uma exceção (...) O estado de exceção é uma zona de indiferença entre o caos e o estado da normalidade, uma zona de indiferença capturada pela norma. De sorte que não é a exceção que se subtrai à norma, mas ela que, suspendendo-se, dá lugar à exceção – apenas desse modo ela se constitui como regra, mantendo-se em relação com a exceção".
[...]
O distinguishing já foi mencionado em alguns julgados da Corte Suprema, como na reclamação n.º 2298, em que o Ministro Gilmar Mendes exarou decisão de cujo texto se extrai o seguinte excerto: "nesse juízo de delibação, entendo que, embora haja decisão desta Corte, não é de se excluir que, na hipótese dos autos, possa realizar-se um adequado distinguishing...".
Embora não se utilizando expressamente da técnica ora exposta, alguns Tribunais, ao examinar o tema aqui proposto, afastam a aplicação do precedente dadas as circunstâncias excepcionais do caso. É o caso do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, cujo relator, o Desembargador Cesar Abreu, assim já decidiu:
O recurso não comporta provimento.
A situação é singular.
Transitada em julgado a sentença que concedeu ao segurado o benefício do auxílio acidente, os autos baixaram à origem tendo, após certificado a intimação do réu (INSS, fl. 118 v.), aportado duas petições: a primeira (fl. 119), do autor, solicitando que o INSS apresentasse os cálculos; a segunda (fl. 120, do INSS apresentando os cálculos para conferência do autor.
Manifestada pelo autor a concordância com os cálculos e pedida a citação do INSS para pagamento (fl. 131), o ilustre magistrado dispensou a citação e mandou expedir o RPV, sendo ato contínuo satisfeita a obrigação e extinta a execução.
Ora, essas circunstâncias impõem reconhecer tenha o INSS satisfeito espontaneamente a dívida, o que afasta a possibilidade de incidência de nova aplicação da verba honorária.
Não há dúvida que nas execuções de pequeno valor, mesmo não embargadas, é devido honorários, entretanto, apenas na hipótese restrita de não ter o devedor satisfeito voluntariamente a obrigação.
Ora, in casu, não houve, sequer, a citação. O INSS compareceu aos autos, assim que teve ciência do seu retorno à origem, apresentando os cálculos do que entendia devido, submetendo-o à aprovação do credor que manifestou concordância. O pagamento lhe foi imediato.
Assim, não há como se acolher a irresignação.
Apelação Cível n. 2007.060017-9, de Orleans, Relator: Des. Cesar Abreu
Como já anotado em precedente (STJ, Edcl no AgRg no Resp n. 642.972-RS):
"em se tratando de execução por quantia certa de título judicial contra a Fazenda Pública, a regra geral é a de que somente são devidos honorários advocatícios se houver embargos;"
"essa regra, todavia, é aplicável apenas às hipóteses em que a Fazenda Pública está submetida a regime de precatório, que impede o cumprimento espontâneo da prestação devida;"
"havendo resistência por parte da Fazenda Pública, no caso de execução de pequeno valor, ao cumprimento espontâneo da prestação devida, autorizando promova o credor a execução forçada, tem-se por justificada a imposição de honorários advocatícios, nos termos do art. 20,§ 4º do CPC".
DECISÃO
Ante o exposto, por votação unânime, a Câmara decidiu negar provimento ao recurso.
O julgamento, realizado no dia 8 de abril de 2008, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Orli Rodrigues, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Cid Goulart. Funcionou como Procurador de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Jobel Braga de Araújo.
Florianópolis, 15 de abril de 2008.
Cesar Abreu
Relator
Partilhando do mesmo entendimento, encontram-se julgados do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EXECUÇÃO NÃO EMBARGADA. DÍVIDA DE PEQUENO VALOR.
1. Em 29.09.2004, o Supremo Tribunal Federal (Recurso Extraordinário n.º 420.816/RS) declarou, incidentalmente, a constitucionalidade do art. 1º-D da Lei 9.494/97 (vide Informativo n.º 363/2004), com interpretação conforme, cuja Ata da sessão foi publicada no DJU de 06.10.2004.
2. Firmada a posição pelo c. STF, três situações distintas podem surgir acerca da fixação de honorários em execução movidas contra a Fazenda Pública, quais sejam: a) são devidos honorários advocatícios nas execuções contra a Fazenda Pública ajuizadas antes da publicação da MP nº 2.180/35; b) não são devidos honorários para as execuções contra a Fazenda Pública não embargadas e ajuizadas após a publicação da referida MP, nos casos em que o pagamento venha a ser efetuado por meio de precatório, ou seja, em que o valor da condenação seja superior ao equivalente a 60 salários mínimos; c) são devidos honorários nas execuções, inclusive não embargadas, cujo pagamento se efetue por RPV (valor até o equivalente a 60 salários mínimos).
3. Se o devedor espontaneamente comparece nos autos para reconhecer seu débito, não há razão para que incidam honorários de execução, os quais pressupõem omissão de sua parte e, mais do que isso, necessidade de propositura de execução por parte do credor.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 2007.70.99.004069-8/PR (PUBLICAÇÃO: 27.1.2009)
5. CONCLUSÃO
É de se concluir, pois, que o fato de a Fazenda Pública haver cumprido espontaneamente o julgado e apresentado cálculos é suficiente para afastar o precedente amplamente adotado de que cabem honorários advocatícios, nos processos de execução, quando não haja embargos e quando o valor seja inferior ao considerado por lei como de pequeno valor.
Assim, até que se revise a orientação do STF, equivocada a nosso sentir, nos casos em que houver a espontaneidade mencionada, deve-se aplicar o precedente mediante a técnica do distinguishing.
Infelizmente, quase todos os julgados que não acolhem a arguição da excepcionalidade aplicam, pura e simplesmente, o leading case do STF, sem abordar as minúcias do caso concreto.
Entretanto, dada a impossibilidade de pagamento direto e imediato; a ausência de trabalho do advogado; a inexistência de pretensão resistida e de sucumbência e a conveniência de se premiar quem confere celeridade ao deslinde do feito, tal providência se afigura como a mais acertada.
Tal conclusão, como visto acima, não retira a autoridade do precedente, mas dá-lhe plena aplicação em casos de anormalidade, de forma a se interpretar a norma em conjunto com as peculiaridades do caso concreto.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei n. 5869, de 11 de janeiro de 1973. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm>. Acesso em: 28 de janeiro 2011.
BRASIL. Medida Provisória n.º 2.180-35, de 24 de agosto de 2001.Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/mpv/2180-35.htm>. Acesso em 28 de janeiro de 2011.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Pleno. RE n. 420816-PR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 10/11/2006.
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A fazenda pública em juízo. São Paulo: Dialética. 5. ed. 2007.
DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil: direito probatório, decisão judicial, cumprimento e liquidação da sentença e coisa julgada. Salvador: JusPODIVM, v. 2. 2. ed., 2008.
MAUÉS, Antonio Moreira. Ensaio sobre a harmonização da jurisprudência constitucional. Anais do XV Congresso Nacional do CONPEDI. Disponível em <http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/bh/antonio_gomes_moreira_maues.pdf>. Acesso em: 27 de janeiro de 2011.