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Pedágio é serviço público amparado pelo Código de Defesa do Consumidor?

Leia nesta página:

A proteção dada aos usuários do serviço de pedágio é advinda do CDC, da Constituição e do Código Civil.

O sistema de pedágio se constitui na cobrança de tarifas dos usuários de determinadas rodovias, com o objetivo de investir na manutenção e segurança das mesmas.

A prestação deste serviço possui a natureza pública, logo, a sua execução caberia ao Estado. No entanto, com o objetivo de se focar na efetivação de serviços essenciais e por sua vez, desafogar a denominada “máquina pública”, verificou-se a necessidade de delegar à iniciativa privada certas tarefas, em razão de sua melhor capacidade de realização.

Com o advento da CF/88, surgiu o instituto da concessão, o qual viabiliza a prestação de um serviço público por uma pessoa jurídica.

Segundo Diógenes Gasparini:

“Concessão de serviço público é o contrato administrativo pelo qual a Administração Pública transfere, sob condições, a execução e exploração de certo serviço, que lhe é privativo, a terceiro que para isso manifeste interesse e que será remunerado adequadamente mediante a cobrança, dos usuários, de tarifas previamente por ela aprovada.”

A sua regulamentação surgiu com a lei nº. 8.987/95, abolindo qualquer espécie de concessão sem prévia licitação.

O conceito de concessão é de suma importância para a questão em voga, pois o serviço de pedágio no Brasil é delegado na maioria das vezes a um ente de direito privado.

No mais, independente do serviço de pedágio ser executado pelo Estado ou por uma concessionária, o que se discute é a existência de uma relação de consumo entre estes e os usuários.

Ora, ao se analisar o teor dos artigos 2º. e 3º. do CDC, que determinam os conceitos de fornecedor e consumidor, constata-se que as partes da relação exposta acima se enquadram nestas definições, o que por si só já garante a proteção por esta legislação.

Rizzato Nunes, em sua obra Curso de Direito do Consumidor, reitera a assertiva mencionada:

‘O CDC, no art. 3º, como dito, incluiu no rol dos fornecedores a pessoa jurídica pública (e, claro, por via de conseqüência, todos aqueles que em nome dela – direta ou indiretamente – prestam serviços públicos), bem como ao definir “serviço” no § 2º do mesmo artigo, dispôs que é qualquer atividade fornecida ao mercado de consumo, excetuando apenas os serviços sem remuneração ou custo e os decorrentes das relações de caráter trabalhista.’

Cabe ressaltar que o art. 22 do referido diploma legal corrobora o amparo dado aos usuários deste tipo de serviço, não excluindo os casos em que a prestadora é uma concessionária:

“Art.22 – Os órgãos públicos, por si ou suas empresas concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços, adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único – Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código.”

Deste conceito, se consolida a existência de uma relação de consumo e conseqüentemente a proteção dada aos usuários do serviço de pedágio pelo Código do Consumidor, tanto quando o agente executor é o próprio Poder Público ou quando através da concessão, é uma pessoa de direito privado.

O ilustre autor mencionado destaca a importância deste dispositivo:

‘No art. 22, a lei consumerista regrou especificamente os serviços públicos essenciais e sua existência, por si só, foi de fundamental importância para impedir que os prestadores de serviços públicos pudessem construir “teoria” para tentar dizer que não estariam submetidos às normas do CDC.’

Neste sentido, temos os seguintes julgados do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO COM CAVALO EM RODOVIA PEDAGIADA. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO DO ANIMAL. ART. 936 DO NCCB. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA FUNDAMENTADA NO CDC E NA TEORIA DO RISCO. DEVER DE INDENIZAR. COMPROVAÇÃO DOS DANOS. A responsabilidade do proprietário por prejuízos causados pelo seu animal é objetiva, na forma do art. 936 do NCCB. É inaplicável a responsabilidade objetiva típica das concessionárias de serviço público para a hipótese de danos decorrentes da falha do serviço prestado pela concessionária de rodovia pedagiada. Essa hipótese, inaplicável ao caso em tela, respeita à responsabilidade extracontratual objetiva da Administração Pública ou de quem lhe esteja fazendo as vezes em face de terceiros caracterizados pela ausência de vínculo preexistente com o Estado. No caso de rodovia pedagiada, o usuário não pode ser equiparado a terceiro justamente porque estabelece relação contratual, configurando vínculo preexistente, ao pagar o pedágio. Assim, a responsabilidade da concessionária deve ser aferida segundo o CDC, como já reconheceu o STJ. A invasão de cavalo na rodovia cuida de fato do serviço, regulado no art. 14 do CDC, o que torna a responsabilidade da concessionária objetiva. A referida invasão decorreu unicamente da desídia fiscalizatória da concessionária, que, por isso, deve responder por sua conduta. Justifica também a responsabilidade da concessionária a teoria do risco, segundo a qual aquele que colhe os bônus de uma atividade lucrativa deve responder pelos ônus dela decorrentes independentemente de ter agido com culpa. Os danos comprovados pelo autor e que devem ser ressarcidos pelos réus respeitam ao conserto da sua Kombi, representado por nota fiscal, e aos danos emergentes comprovados mediante recibo e relativos à contratação de fretes individuais pelo autor, que é comerciante, para o transporte de produtos adquiridos na CEASA. A desvalorização do seu veículo não restou minimamente comprovada, e o dano moral inexiste, porquanto ausente qualquer lesão a atributo da personalidade do autor. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

(Recurso Cível Nº 71001623479, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Maria José Schmitt Santanna, Julgado em 16/07/2008)

RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO OCORRIDO EM RODOVIA PEDAGIADA DECORRENTE DE EXISTÊNCIA DE ANIMAIS NA PISTA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPRESA QUE TEM O DEVER DE RESSARCIR OS DANOS CAUSADOS. POSSIBILIDADE DE A CONCESSIONÁRIA SER DEMANDADA PERANTE O JUIZADO ESPECIAL. 1. Concessionária de serviços públicos não é pessoa jurídica de direito público, podendo ser demandada perante o Juizado Especial. 2. A existência de animais sobre a pista não pode ser considerada culpa exclusiva do seu detentor, quando se está diante de rodovia concedida à exploração. Cumpre à concessionária adotar as medidas necessárias à segurança daqueles que pagam o valor do pedágio para ali transitarem, cabendo-lhe não só o bônus da concessão, mas também assumir os ônus daí decorrentes. Ocorrendo o acidente, decorrente da insatisfatória prestação dos serviços concedidos, subsiste o dever de indenizar, impondo-se à concessionária e não ao usuário dos serviços ¿ buscar o direito de regresso junto ao proprietário do animal. 3. A ré, concessionária de serviço público, assumiu a obrigação de prestar serviço adequado, eficiente e seguro (artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor CDC), só ficando exonerada do dever de indenizar na hipótese de comprovar, de maneira inequívoca, as situações elencadas no artigo 14, § 3º, do CDC, o que não restou evidenciado. Mostra-se devida a indenização pelos danos materiais causados, na medida em que devidamente quantificados e comprovados pelos orçamentos juntados pela parte autora (fls. 07/10), afastando-se a pretensão relativa aos danos morais. Não demonstrada a propriedade dos animais, atribuída à co-demandada, não há lugar para reconhecer-se a solidariedade passiva. Sentença reformada para julgar parcialmente procedente a ação.

(Recurso Cível Nº 71001332493, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Clovis Moacyr Mattana Ramos, Julgado em 19/09/2007)

Compartilhando dos mesmos posicionamentos, destacam-se os julgados do Tribunal de Justiça do estado de São Paulo:

ACIDENTE DE TRANSITO - ANIMAL NA PISTA - OBRIGAÇÃO DA CONCESSIONÁRIA EM INSPECIONAR A RODOVIA NÃOCOMPROVADA - RELAÇÃO DE CONSUMO CARACTERIZADA RESPONSABILIDADE OBJETIVA - INDENIZAÇÃO DEVIDA. Conforme jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, as concessionárias de serviços rodoviários, nas suas relações com os usuários, estão subordinadas à legislação consumensta. Portanto, respondem, objetivamente, por qualquer defeito na prestação do serviço, pela manutenção da rodovia em todos os aspectos, respondendo, inclusive, pelos acidentes provocados pela presença de animais na pista.

(APELAÇÃO CÍVEL N° 912 942-0/9, Rel. Des. MENDES GOMES, D.J 28-07-2008)

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RESPONSABILIDADE CIVIL. Animais na pista Rodovia Presidente Dutra Concessionána do serviço público. Cerceamento de defesa. Não ocorrência Responsabilidade objetiva. Eventual ilicitude de terceiros não exclui a responsabilidade pelos danos causados no veículo do autor ao colidir com animais bovinos na pista de rolamento. Defeito na prestação do serviço. Relação de consumo. Inteligência do artigo 22 do CDC e Lei n° 8 987, de 13-02-1995. Dever de ressarcimento dos danos materiais comprovados. Indenização por dano moral afastada. Motorista profissional que trabalha com caminhão de 'reboque'. Transtornos que não extrapolam os limites da razoabilidade Mantida indenização por dano material, estimada em R$ 2 749,00 e honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor da condenação Recurso da ré provido em parte.

(APELAÇÃO CÍVEL N° 802.792-5/9-00, Rel Des. EDSON FERREIRA DA SILVA. D.J 23.09.2008)

Desta feita, verifica-se que o serviço de pedágio é amparado pelo Código de Defesa do Consumidor, possuindo esta afirmativa um fundamento legal, doutrinário e jurisprudencial.

Além do mais, a proteção dada aos usuários deste tipo de serviço não é somente advinda do CDC, pois a Carta Magna e o Código Civil também a proporcionam.

A proteção constitucional possui fulcro no artigo 37, § 6º, que preleciona que toda pessoa jurídica de direito público ou privado que preste serviço público responderá pelos danos causados a terceiros, pois é seu dever executá-lo de forma eficiente.

E na esfera civil, os usuários estão protegidos pelo instituto da responsabilidade civil, que através do art. 927 do Código Civil, garante que o dano originado de ato ilícito deve ser reparado por quem o causou.

Todavia, é evidente que a proteção pelo Código do Consumidor se constitui mais eficaz, visto que o art. 14 desta lei assegura a reparação sem a necessidade de provar o elemento culpa.


Referências Bibliográficas

NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva: 2007.

GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. 10ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2005.


Notas

1. Art. 175 Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

2. Art.2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.”

“Parágrafo Único: Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

3. Art.3º - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

4. Art.37§6 da CF/88 – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

5. Art. 927 Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

6. Art.14 – O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

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Sobre as autoras
Maria Angélica Moraes da Silva

Advogada trabalhista e consumerista em Belém (PA).

Amanda Abnader Machado

Advogada consumerista em Belém (PA).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Maria Angélica Moraes ; MACHADO, Amanda Abnader. Pedágio é serviço público amparado pelo Código de Defesa do Consumidor?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3151, 16 fev. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21106. Acesso em: 22 dez. 2024.

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