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Depressão no ambiente laboral.

A possibilidade de caracterização da depressão enquanto acidente de trabalho

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08/04/2012 às 11:35
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4. A DEPRESSÃO ENQUANTO ACIDENTE DE TRABALHO

O tema ora exposto se mostra polêmico, haja vista que para alguns, a gênese da depressão se encontra em fatores orgânicos; outros, por sua vez, avaliam a origem da doença como sendo exclusivamente de caráter psicológico;

No que tange a definição de acidente de trabalho, a Lei 8.213/91 assevera que:

Art. 19. Acidente de trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho. [61]

Ressalte-se que além dos acidentes típicos de trabalho, também as doenças adquiridas pelos empregados no decorrer de suas atividades laborais, são equiparadas à acidentes de trabalho.

Assim é que existe a diferenciação entre doença profissional e doença do trabalho, sendo aquela peculiar à profissão exercida pelo trabalhador, bastando para ser caracterizado o acidente de trabalho, haver a comprovação do desempenho da atividade e o agravamento da doença laboral.

Por outro lado, a doença do trabalho ou mesopatia, é causada pela atividade desempenhada, porém não é exclusiva da mesma, vinculando-se à maneira como o trabalho é realizado pelo empregado. De igual maneira, deverá ser comprovado que a patologia desencadeada decorre das condições especiais de trabalho.

Registre-se que o art. 21, I da Lei nº 8213/91 equipara como acidente de trabalho o acidente que contribuiu para a morte do segurado, ainda que não tenha sido a causa única.

In verbis: O acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para a redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação. [62]

Assim, torna-se de difícil aceitação – tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência –

o reconhecimento da depressão enquanto acidente de trabalho, problemática que será tratada nos parágrafos subseqüentes.

4.1 A possibilidade de caracterização da depressão enquanto acidente de trabalho

A priori, surge a dúvida acerca de ser a depressão patologia decorrente do trabalho, desencadeada por este ou apenas de caráter biológico. 

Desta maneira, ao tentarmos associar a origem ou o agravamento da depressão ao ambiente laboral surgem as divergências teóricas.

No entendimento de Dejours,

Contrariamente ao que se poderia imaginar, a exploração do sofrimento pela organização do trabalho não cria doenças mentais específicas. Não existem psicoses do trabalho, nem neuroses do trabalho. Até os maiores e mais ferrenhos críticos da nosologia psiquiátrica não conseguiram provar a existência de uma patologia mental decorrente do trabalho. [...] As descompensações psicóticas e neuróticas dependem, em última instância, da estrutura das personalidades, adquirida muito antes do engajamento na produção.[63]

Partindo de tal entendimento, percebe-se que o autor não elenca a depressão enquanto acidente de trabalho.

Ilustrativamente, pode-se tomar como exemplo o acórdão prolatado em 12/08/04 pelo Tribunal Regional do Trabalho do Mato Grosso do Sul, o qual rejeitou o recurso interposto pela empregada Gislane Ramos Alves, que pedia o reconhecimento de estabilidade, decorrente de acidente de trabalho em razão de depressão.

Segundo o entendimento do Juiz relator,

não estando a depressão relacionada como doença profissional, há que ser negado o direito à estabilidade acidentária do autor, ante a impossibilidade

de determinação do nexo causal entre a doença e o trabalho e, ainda, por não se vislumbrar à ocorrência de condições especiais de labor.[64]

Todavia, de acordo com o art. 20 da Lei n. 8.213/99,

Consideram-se acidente do trabalho, as seguintes entidades mórbidas: 

I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social (atualmente Ministério da Previdência Social);

II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I. [65]

Importante mencionar que a relação contida no supracitado art. 20, I, da Lei 8.213/91 está contida no Anexo II do Decreto n. 3048/99 do atual Regulamento da Previdência Social. De acordo com tal anexo, existem 200(duzentas) novas doenças do trabalho, dentre as quais está incluída a depressão.

No entender de Sebastião Geraldo de Oliveira,

A nova lista de doenças ocupacionais do INSS, relacionada no Anexo II do Decreto n. 3048/99, já indica o grupo dos “Transtornos mentais e do comportamento relacionados com o trabalho (Grupo V do CID-10)” apontando dentre outros fatores destas doenças: problemas relacionados com o emprego e com o desemprego, condições difíceis de trabalho, ritmo de trabalho penoso, reação após acidente grave, reação após assalto no trabalho, desacordo com o patrão e colega de trabalho, circunstâncias relativas às condições de trabalho, má adaptação à organização do horário de trabalho, etc.” [66]

Todavia, para uma parcela da doutrina, apesar do Anexo tratar a depressão como doença do trabalho, isto ocorre apenas quando houver a vinculação do quadro depressivo à exposição profissional à determinadas substâncias químicas tóxicas.

Desta forma, aos trabalhadores expostos a tais substâncias químicas tóxicas no ambiente laboral, é possível considerar o trabalho como sendo causa do agravamento doepisódio depressivo. Caso contrário, seria improvável que o trabalhador desenvolvesse tal patologia em decorrência da atividade laboral.

Em posição favorável à caracterização da depressão enquanto doença do trabalho, Fernanda Moreira de Abreu afirma que

[...] apesar da depressão não possuir previsão expressa enquanto doença do trabalho quando adquirida ou desencadeada em função de problemas relacionados com o emprego e desemprego, condições difíceis de trabalho, ritmo de trabalho penoso, reação após acidente grave, reação após assalto no trabalho, desacordo com o patrão e colega de trabalho, circunstâncias relativas às condições de trabalho, má adaptação à organização do horário de trabalho etc., ela pode ser assim considerada pela sua ligação íntima com os outros dispositivos existentes no mesmo grupo do Anexo II. [67]

Dentre tais dispositivos contidos no grupo do Anexo II supra e que apresentam ligação íntima com a depressão, estão os transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso do álcool, alcoolismo crônico (relacionado com o Trabalho), haja vista que em muitos casos, o uso excessivo de álcool costuma camuflar a depressão, quando esta, na realidade, é a causa do fato.

Do mesmo modo, têm-se as reações ao stress grave e transtornos de adaptação, onde o trabalhador apresenta dificuldades físicas e psicológicas para desempenhar suas atividades, em virtude de acidentes laborais ou após assalto ocorrido no trabalho.

Deste modo, torna-se de fácil percepção a tênue ligação existente entre as condições adversas de trabalho e os distúrbios mentais desencadeados, que se exteriorizam de diversas formas, tais como: alcoolismo, síndrome do pânico, transtornos de personalidade, bem como depressão.

Segundo Maria Elizabeth Antunes Lima[68]

[...] certas condições adversas de trabalho, podem favorecer a emergência de transtornos mentais específicos. [...] São, na sua maioria, quadros depressivos e de fadiga nervosa, síndrome do pânico, transtornos relacionados ao alcoolismo, estados de estresse pós-traumático, transtornos orgânicos de personalidade, dentre outros. [...] Recentemente, fizemos o diagnóstico de diversos trabalhadores de uma grande empresa do setor siderúrgico, afastados com quadros de fadiga nervosa, depressão, alcoolismo, acompanhados ou não de tentativas de suicídio [...].

Disto, depreende-se ser possível que um trabalhador com predisposição para a depressão, possa desencadeá-la em virtude das precárias condições de trabalho às quais é submetido.

Neste sentido, Sérgio Pinto Martins explica que:

É o que ocorre quando o fato superveniente a um evento vem a resultar, por exemplo, na morte do empregado. Seria a hipótese de um empregado quebrar um braço no local de trabalho e posteriormente vir a perdê-lo por gangrena. Como vemos, o segundo fato contribuiu para a ocorrência do evento final: a perda de todo o braço do trabalhador. O evento tempo entre o primeiro fato e o segundo não descaracteriza o acidente do trabalho, pois se o operário não tivesse quebrado o braço na empresa, não teria necessidade de amputar esse mesmo braço posteriormente (omissis). A concausa pode ser preexistente, superveniente ou simultânea. Se o trabalhador sofre ferimento leve e não obstante vem a morrer porque era diabético, tem-se que a concausa é preexistente. Se o trabalhador recebe ferimento leve e vem a morrer em virtude do tétano, trata-se de concausa superveniente. Se o trabalhador, acometido de mal súbito, cai de um andaime, morrendo em conseqüência, configura-se a concausa simultânea. (grifo nosso) [69]

Partindo disto, pode-se afirmar que a depressão enquanto acidente de trabalho pode decorrer de uma concausa preexistente, hipótese em que o trabalhador já possui a depressão antes de iniciar suas atividades profissionais e, em virtude de fatores relacionados à má organização do trabalho, a torna mais grave.

No entender de Odonel Urbano Gonçalves,

No exame da concausalidade, estudam-se fatos ou circunstâncias que se somam à causa, do que resulta o evento final: “morte”, “perda ou redução da capacidade para o trabalho.” [...] Ocorrido acidente de trabalho, configurado pelo tríplice nexo: trabalho-acidente, acidente-lesão, lesão-incapacidade, como, por exemplo, a quebra de uma perna, é possível que, no transporte do trabalhador para o hospital, haja circunstância outra que provoque sua morte (acidente de trânsito). Este segundo fato, embora não seja a causa única, contribuiu para o evento final. Ou seja, a morte do trabalhador. [70]

Neste sentido, deve-se refletir acerca do trabalhador que busca no ambiente de trabalho a satisfação pessoal e profissional e a partir disto desenvolve a depressão em virtude de uma soma de fatores interligados.

Segundo a psicóloga Daniela Juliani Borges Albini,

Pela má compreensão da depressão, os indivíduos muitas vezes não percebem que o meio pode desencadear a depressão. Ficam intolerantes, irritados e sem disposição para trabalhar, mas não sabem que estes sintomas fazem parte de um processo muito complicado. Com toda certeza, o meio de trabalho pode sim desencadear sintomas depressivos. [71]

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Partindo disto, entende-se que embora as causas ensejadoras da depressão sejam controvertidas, a mesma está vinculada a determinados fatores relacionados ao ambiente laboral, que reunidos podem gerar a patologia ou fortificá-la.

Caso o trabalhador não obtenha o reconhecimento esperado no âmbito em que desenvolve sua atividade profissional, bem como não consiga se adaptar às condições de trabalho impostas, ao ritmo e às exigências, possivelmente haverá o agravamento de uma patologia pré-existente.

Neste sentido, torna-se aceitável a equiparação da depressão enquanto acidente de trabalho, ainda que não esteja vinculada a exposição do trabalhador às substâncias químicas tóxicas, conforme vislumbra o Grupo V da CID-10.

Ademais, o reconhecimento da supracitada doença enquanto acidente de trabalho passa a ser necessário à medida que possibilita a efetivação da tutela trabalhista, consagrada na Constituição Federal e em normas previdenciárias. 

No entanto, para que seja possível tal reconhecimento, faz-se necessário haver a caracterização do nexo causal entre a depressão e as atividades às quais o trabalhador está submetido, assunto que será tratado nos parágrafos seguintes. 

4.2 O nexo causal entre depressão e o ambiente laboral  

De acordo com Maria da Graça Jacques, a classificação de Schilling, adotada no Brasil, traz um rol de três grupos de doenças legalmente reconhecidas, sendo que os transtornos mentais e os episódios depressivos não associados à exposição de substâncias químicas tóxicas se enquadram no grupo II.

No grupo II, o trabalho aparece como fator contributivo mas não necessário e, no grupo III, o trabalho é considerado um provocador de um distúrbio latente ou agravador de doença já estabelecida (Ministério da Saúde, 2001). Nos grupos II e III estão aquelas doenças não definidas a - priori como resultantes do trabalho, mas que podem ser causadas por este. Nesses casos impõe-se a necessidade de laudo técnico que estabeleça os nexos causais. Os transtornos mentais e do comportamento, conforme nomenclatura do Ministério da Saúde (2001), estão, em geral, classificados nos grupos II ou III, exceto aquelas causadas por substâncias tóxicas ou por fatores bem específicos como traumas físicos, por exemplo. Incluem-se neste caso (grupo I), quando excluídas causas não ocupacionais: demência, delirium, transtorno cognitivo leve, transtorno mental orgânico, episódios depressivos em trabalhadores expostos a substâncias químicas neurotóxicas e síndrome de fadiga relacionada ao trabalho. (...) Episódios depressivos e síndrome de fadiga relacionada ao trabalho quando não associadas à exposição a algumas substâncias químicas podem ser classificadas nos grupos II ou III (Ministério da Saúde, 1999). (grifos nossos) [72]

Conforme se verifica, a depressão está incluída nos grupos II e III, tendo em vista que o ambiente laboral pode surgir como fator contributivo para o agravamento da mesma, bem como provocá-la.

No entanto, em razão da dificuldade em estabelecer a diferenciação entre doenças comuns e doenças oriundas do trabalho, é imprescindível que haja o nexo causal, o qual assegura a constatação do liame entre o dano sofrido pelo trabalhador e o ambiente laboral.

Contrariamente à idéia de existência do nexo causal, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, mediante acórdão de Recurso Ordinário, decidiu pelo não provimento do mesmo, em virtude da descaracterização do nexo causal na alegação de depressão oriunda de trabalho, conforme demonstra a ementa abaixo.

EMENTA: DEPRESSÃO. DOENÇA OCUPACIONAL NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. IMPROCEDÊNCIA DAS PRETENSÕES.

Não comprovado nos autos o nexo de causa e efeito entre as condições de trabalho do autor e a alegada doença - distúrbio psicológico -, não faz jus ao pagamento de indenização por danos morais. Recurso não provido. Na inicial, o reclamante alega que foi contratado pela reclamada em 05-11-2007, para exercer a função de auxiliar de produção, tendo sido pactuado um contrato de experiência com prazo de 30 dias, o qual poderia ser prorrogado por mais 60 dias em não havendo manifestação em contrário das partes. Noticia que devido ao stress e pressão sofridos durante o pacto laboral, aliados às exigências demasiadamente severas da reclamada, começou a sentir-se mal e sem vontade de trabalhar, motivos pelos quais iniciou tratamento psiquiátrico, com o diagnóstico de episódios depressivos. Relata que a partir de 24-01-2008 foi afastado do trabalho e encaminhado para perícia médica junto ao INSS, para fins de recebimento de auxílio-doença. Argumenta que é portador de doença do trabalho, nos termos do inciso II do art. 20 da Lei n. 8.213/91, moléstia essa que decorre de culpa da empregadora, que lhe cobrava de forma excessiva rapidez e rendimento, exigindo trabalho sob pressão, além de chamá-lo por apelidos, tal como lerdinho, aranha e vagaroso. Sustenta que a reclamada mostrou-se negligente por não se precaver contra possível ocorrência de dano. [73]

O autor Rubens Camargo de Mello assevera que

Doentes, uns mais, outros menos, depois de certa idade, todos nós somos, salvo raríssimas exceções. As doenças, conforme o grau de incidência, podem ou não ensejar incapacidades laborativas, parciais ou totais, temporárias ou permanentes. Quando, então, dão azo a prestações acidentárias, quer rurais, quer urbanas? Quando, por evidente, houver nexo etiológico (causal) entre seus males e as condições de trabalho do obreiro infortunado. É a teoria da causalidade e também da concausalidade. Como se sabe, acidente é um acontecimento violento e fortuito, enquanto doença é um estado de morbidez orgânica; esta implica a existência de um processo mais ou menos demorado e insidioso, de natureza patológica. Sua caracterização é o mediatismo entre sua causa e seu efeito; tem formação não-instantânea. [74]

Conforme se verifica, é necessário que o nexo causal nas doenças ocupacionais seja analisado, pois de igual maneira, também será analisado o ambiente laboral, as condições de trabalho às quais o empregado está exposto, os riscos inerentes às atividades desempenhadas, dentre outros.

Assim sendo, para que a depressão seja considerada acidente de trabalho, devem ser investigados os fatores que propiciaram o surgimento ou evolução do quadro depressivo, verificando como se dá a organização do trabalho e em que medida o trabalho é fator determinante na eclosão ou agravo do quadro depressivo.

De acordo com a Juíza do trabalho Sueli Teixeira,

O não reconhecimento da depressão como doença ocupacional traz prejuízos tanto para os trabalhadores quanto para os cofres públicos, pois, quando não reconhecido o nexo causal, não há o recolhimento do FGTS correspondente ao período de afastamento, além do empregado perder o direito à estabilidade acidentária provisória de um ano após a alta previdenciária, conforme previsão do art. 118, da Lei 8.213/91 que assegura garantia de emprego nas hipóteses de acidente típico, doenças profissionais, doenças do trabalho e as outras hipóteses mencionadas na lei como equiparadas a infortúnio do trabalho. [75]

Para que o nexo causal seja reconhecido, entende-se como necessária a realização de investigações aprofundadas.

 Neste sentido se posiciona a autora Fernanda Moreira de Abreu, para a qual,

na prática, pouco tem se cogitado da possibilidade do reconhecimento deste nexo causal e, normalmente, não se faz a profunda investigação que esta patologia demanda. Isso ocorre talvez pela falta de tempo ou pelo receio da criação de uma “indústria de manipulação desta doença” para a aquisição de benefícios e para posterior tentativa de responsabilização da empresa na esfera cível e penal. [76]

Nesta esteira, pode-se constatar a forma negligenciada com o qual a depressão é tratada enquanto doença do trabalho, o que gera obstáculos ao trabalhador depressivo que desencadeou tal patologia no âmbito laboral, no que tange à obtenção de seus direitos legalmente assegurados.

Assim, em virtude da dificuldade ao diagnosticar a depressão, é imperioso que no âmbito jurídico haja maior atenção no que tange à aplicabilidade das normas protetivas voltadas ao trabalhador.

Deste modo, filio-me ao entendimento do autor Daniele di Nunzio, para quem

O direito de quem trabalha de não arriscar, não apenas a vida, mas a própria saúde é um direito que nenhum governo pode negligenciar, pois a tutela do trabalho, em todos os seus aspectos, é um vínculo de confiança fundamental entre a cidadania e as pessoas eleitas para representá-la [...] Portanto, temos, no mundo do trabalho, não apenas uma desigual distribuição das riquezas, mas também uma desigual distribuição da saúde, dos acidentes de trabalho, das doenças e dos mortos, cuja causa pode ser encontrada na desigual repartição dos direitos e das tutelas. [77]

É inegável que o papel do trabalho é possibilitar a motivação profissional do trabalhador, que encontra naquele, uma forma digna de edificar sua vida e sentir-se útil.

Contrariamente, quando o ambiente de trabalho torna-se fator agravante ou originário do quadro depressivo do empregado e esteja comprovada a culpa do empregador haverá a responsabilidade civil da empresa.

4.3 A responsabilidade civil da empresa por acidentes de trabalho

A priori, por responsabilidade civil, entende-se que “deriva da agressão a um interesse jurídico em virtude do descumprimento de uma norma jurídica pré-existente, contratual ou não. A lei busca reconstituir o ordenamento jurídico violado.” [78]

Desta maneira, existem duas teorias quanto à responsabilidade civil: teoria subjetiva e teoria objetiva.

De acordo com a responsabilidade subjetiva, ou teoria da culpa, o elemento fundamental da responsabilidade civil é o dolo ou culpa, do qual resulta o dano, conforme alude o art. 7º, XXVIII da Carta Magna. In verbis:

Art. 7.º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...] XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa. [79]

A partir da Constituição Federal de 1988, a caracterização da culpa grave para garantir o dever de indenizar deixou de ser necessária, sendo suficiente a culpa simples, representada através das modalidades de imperícia, imprudência ou negligência, conforme vislumbra o art. 186 do Código Civil.

Assim, a ação ou omissão praticada pelo empregador deve estar diretamente vinculada ao acidente de trabalho sofrido pelo empregado, o qual deve comprovar tal ligação.

Em contrapartida, a responsabilidade civil objetiva significa a inexigibilidade da constatação da culpa do agente que ocasionou o dano, diferentemente da responsabilidade subjetiva, a qual pressupõe culpa resultante da ação ou omissão.

Segundo Carla Cristina Pepe,

mantém-se na legislação acidentária a doutrina da responsabilidade objetiva, ou seja, a vítima deve ser reparada financeiramente pelo dano, independentemente da culpa. Não se discute mais a culpabilidade, nem o risco profissional e a figura do empregador como presumível responsável desaparece. Subentende-se que a sociedade, através do Estado, deve arcar com os danos ocorridos no exercício do trabalho. [80]

Atualmente, no que pertine à responsabilidade civil, a teoria que possui maior aplicabilidade é a da responsabilidade objetiva, que se baseia no risco-proveito.

 Desta maneira, a teoria do risco é subdividida em: teoria do risco-proveito, teoria do risco criado, risco profissional, risco excepcional e risco integral.

Segundo Michael Hideo Atakiama Silva,

A teoria do risco-proveito funda-se na premissa em que aquele que tira proveito de uma atividade deve suportar todos os ônus decorrentes dela (ubi emolumentum, ibi onus), mesmo que sua conduta seja isenta de culpa. Já a teoria do risco criado preceitua que aquele que cria ou acentua os riscos para a atividade econômica desenvolvida deve responder pelos eventuais danos que surgirem. [...] Com efeito, não é um risco qualquer, inerente à atividade humana e imprevisível. O risco deve ser incomum e excepcional, evitável e previsível. [...] A teoria do risco profissional considera apenas a atividade profissional da vítima para delimitar a responsabilidade civil pelo dano sofrido, devendo estar intimamente ligada com o acidente de trabalho[...] A teoria do risco excepcional caracteriza-se pela responsabilidade em função da atividade desenvolvida pela vítima, a qual deve constituir-se em um risco excepcional, de natureza perigosa[...][81] (grifo nosso)

Importante mencionar que em caso de acidente de trabalho, será levada em conta a teoria do risco integral,

De sorte que nem mesmo as causas de exclusão do nexo causal – culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior – afastam o direito do obreiro, desde que o evento tenha se dado no trabalho ou em razão dele. [82]

A meu ver, no que tange à depressão enquanto doença do trabalho, a teoria que melhor se enquadra é a do risco profissional, a qual

[...] Baseia-se no fato de que o acidente é visto como conseqüência do trabalho e como parte integrante do negócio, ou seja, o lucro do empresário está ligado ao risco de ocorrência de acidentes. Em conseqüência, é função da empresa indenizar o acidentado.[83]

Com isso, em virtude de acidente de trabalho, surge o direito pertencente ao trabalhador de ser indenizado, caso seja comprovada a culpa do empregador. 

O Código Civil pátrio vislumbra que para haver responsabilização civil é fundamental existir nexo causal entre o dano sofrido e o ato alegadamente violador do direito. No que tange à depressão, deve ser provado o nexo de causa e efeito entre as condições trabalho e o agravamento da mesma.

Conforme o entendimento de Gustavo Filipe Barbosa Garcia,

No plano jurídico-legal, para que a depressão, quando desvinculada de exposição às mencionadas substâncias químicas, possa ser considerada acidente do trabalho, deve-se verificar se esta doença resultou das condições especiais em que o trabalho é executado, bem como se com ele se relaciona diretamente, conforme a regra prevista no § 2º do art. 20 da Lei 8.213/1991. No entanto, como é evidente, são diversas as dificuldades, concretas e práticas, de se fazer subsumir a depressão a estes estritos requisitos legais. É necessário que se faça o reconhecimento do nexo causal mediante o entendimento de que a síndrome depressiva foi desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho foi realizado. [84]

Com isto, para que seja considerado cabível qualquer pedido de indenização partindo do empregado face ao empregador, é necessário que haja responsabilidade por parte deste, a qual se fundamenta através da culpa.

Segundo Michael Hideo Atakiama Silva,

O direito à indenização pela ocorrência do acidente de trabalho funda-se no constante anseio social da busca pela justiça, ou seja, tendo o agente causado um dano, deve repará-lo para que se estabeleça o status quo ante. Isto quer dizer que, na medida do possível, repõe-se a vítima à situação anterior à lesão, de forma in natura ou pecuniária. [85]

No mesmo sentido, Paula Gonçalves M. Mattos entende que

tanto o  Código Civil de 2002 quanto a Constituição Federal asseguram ao ofendido a reparação a todos os danos decorrentes do acidente de trabalho, quais sejam, os danos morais, estéticos e materiais. A extensão da reparação é regida pelo princípio da indenização completa, segundo o qual a reparaçãodeve abranger todas as conseqüências advindas do ato do qual decorre a obrigação de indenizar o dano.[...][86]

Assim, faz-se necessário entender que a busca pela indenização por parte do empregado se explica com base no contrato de trabalho, que traz cláusula implícita garantindo a incolumidade física e mental dos trabalhadores, sendo que o empregador deve assumir os riscos inerentes à atividade empresarial desenvolvida. 

Seguindo esta linha de pensamento, Sebastião Geraldo de Oliveira preleciona que

A indenização por acidente de trabalho tem como suporte principal a responsablidade subjetiva, isto é, exige-se a comprovação da culpa do empregador, de qualquer grau, para nascer o direito da vítima. No entanto, há inovações significativas no campo da responsabilidade objetiva que apontam uma tendência de socialização dos riscos, desviando o foco principal da investigação da culpa para o atendimento da vítima, de modo a criar mais possibilidades de reparação dos danos. [87]

 Importante mencionar que a responsabilidade da empresa em decorrência do acidente de trabalho dependerá da atividade desempenhada pelo empregado lesado, estabelecendo-se, desta maneira, a responsabilidade subjetiva ou objetiva. 

De acordo com a responsabilidade subjetiva, ou teoria da culpa, o elemento fundamental da responsabilidade civil é o dolo ou culpa, do qual resulta o dano, conforme alude o art. 7º, XXVIII da Carta Magna. In verbis:

Art. 7.º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...] XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa. [88]

A partir da Constituição Federal de 1988, a caracterização da culpa grave para garantir o dever de indenizar deixou de ser necessária, sendo suficiente a culpa simples, representada através das modalidades de imperícia, imprudência ou negligência, conforme vislumbra o art. 186 do Código Civil.

Assim, a ação ou omissão praticada pelo empregador deve estar diretamente vinculada ao acidente de trabalho sofrido pelo empregado, o qual deve comprovar tal ligação.

Em contrapartida, a responsabilidade civil objetiva significa a inexigibilidade da constatação da culpa do agente que ocasionou o dano, diferentemente da responsabilidade subjetiva, a qual pressupõe culpa resultante da ação ou omissão.

Segundo Carla Cristina Pepe,

mantém-se na legislação acidentária a doutrina da responsabilidade objetiva, ou seja, a vítima deve ser reparada financeiramente pelo dano, independentemente da culpa. Não se discute mais a culpabilidade, nem o risco profissional e a figura do empregador como presumível responsável desaparece. Subentende-se que a sociedade, através do Estado, deve arcar com os danos ocorridos no exercício do trabalho. [89]

Neste sentido, o art. 37, §6º da CF dispõe que

As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Atualmente, no que pertine à responsabilidade civil, a teoria que possui maior aplicabilidade é a da responsabilidade objetiva, que se baseia no risco-proveito.

 Desta maneira, a teoria do risco é subdividida em: teoria do risco-proveito, teoria do risco criado, risco profissional, risco excepcional e risco integral.

Segundo Michael Hideo Atakiama Silva,

A teoria do risco-proveito funda-se na premissa em que aquele que tira proveito de uma atividade deve suportar todos os ônus decorrentes dela (ubi emolumentum, ibi onus), mesmo que sua conduta seja isenta de culpa. Já a teoria do risco criado preceitua que aquele que cria ou acentua os riscos para a atividade econômica desenvolvida deve responder pelos eventuais danos que surgirem. [...] Com efeito, não é um risco qualquer, inerente à atividade humana e imprevisível. O risco deve ser incomum e excepcional, evitável e previsível. [...] A teoria do risco profissional considera apenas a atividade profissional da vítima para delimitar a responsabilidade civil pelo dano sofrido, devendo estar intimamente ligada com o acidente de trabalho[...] A teoria do risco excepcional caracteriza-se pela responsabilidade em função da atividade desenvolvida pela vítima, a qual deve constituir-se em um risco excepcional, de natureza perigosa[...][90] (grifo nosso)

Importante mencionar que em caso de acidente de trabalho, será levada em conta a teoria do risco integral,

De sorte que nem mesmo as causas de exclusão do nexo causal – culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior – afastam o direito do obreiro, desde que o evento tenha se dado no trabalho ou em razão dele. [91]

A meu ver, no que tange à depressão enquanto doença do trabalho, a teoria que melhor se enquadra é a do risco profissional, a qual

[...] Baseia-se no fato de que o acidente é visto como conseqüência do trabalho e como parte integrante do negócio, ou seja, o lucro do empresário está ligado ao risco de ocorrência de acidentes. Em conseqüência, é função da empresa indenizar o acidentado.[92]

Assim, ao realizar atividade profissional intimamente ligada ao agravamento do quadro depressivo, o empregado poderá invocar a teoria do risco profissional, que, neste caso, dará ensejo à responsabilidade civil.

Em se tratando de depressão agravada no ambiente laboral, entendo que deve ser levada em consideração a teoria da responsabilidade objetiva, a qual parte da inexigibilidade da comprovação de culpa ou dolo. 

A meu ver, a responsabilidade subjetiva não se torna proveitosa ao empregado, tendo em vista sua condição hipossuficiente em relação ao empregador, dependendo economicamente deste. Assim, a pressão exercida pelo empregador, bem como as dificuldades de obter meios de provas, criam obstáculos à obtenção da indenização pretendida pelo empregado lesado.

Do mesmo modo, entendo que a concausalidade sustenta a possibilidade de caracterização da depressão enquanto acidente de trabalho, tendo em vista que a tal patologia pode ser agravada no ambiente laboral em virtude de causas antecedentes.

Neste sentido, pode-se citar como exemplo um trabalhador diabético que se fere no trabalho, sofrendo intensa hemorragia e morrendo. Caso o mesmo fosse sadio, não haveria maiores conseqüências.

De igual maneira, um indivíduo depressivo que trabalha sob condições penosas, não se adaptando ao ritmo acelerado de trabalho, às exigências, poderá desencadear a depressão pré-existente e torná-la mais grave em virtude de tais fatores negativos.

Conforme se pode observar, a depressão enquanto doença psicológica e cuja origem é controversa, gera polêmicas na seara jurídica, quando tratamos de assuntos relacionados a acidentes de trabalho.

Logo, é necessário que o nexo causal entre o agravamento da doença e as condições laborais às quais o trabalhador estava exposto seja analisado minuciosamente, visando elucidar dúvidas que porventura existam no que tange ao vínculo necessário para configurar a culpa do empregador e a conseqüente responsabilidade civil, bem como garantir os direitos do trabalhador que for lesado em virtude da má organização do trabalho.

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Sobre a autora
Izabela Curvina

Graduada em direito pela Unidade De Ensino Superior Dom Bosco – São Luís,MA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CURVINA, Izabela. Depressão no ambiente laboral.: A possibilidade de caracterização da depressão enquanto acidente de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3203, 8 abr. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21438. Acesso em: 29 mar. 2024.

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