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Tributação indutora sobre o setor elétrico:

breves considerações acerca dos aspectos da regulação por incentivos fiscais, desenvolvimento econômico e impactos financeiros

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Quais os efeitos da tributação indutora no setor elétrico causados sobre a economia nacional e finanças públicas?

“Em todos os tempos e em todos os Estados, os Ministros sempre tardam muito em baixar do plano olímpico das abstrações, em descer dos problemas abstratos e das soluções abstratas. E quando, passados muitos meses ou anos, finalmente seus pés tocam a terra dos homens, ficam perplexos e irritados ao verem que o antigo problema continua insolúvel e que aquela perfeita solução abstrata é um novo perfeito problema.” Alfredo Augusto Becker. O carnaval Tributário, 1989.

Sumário: 1.Breves considerações introdutórias. 2.Tributação sobre o setor elétrico: regulação por incentivos fiscais, desenvolvimento econômico e impactos financeiros. 3.Energia elétrica: insumo estratégico ao desenvolvimento econômico. 4.Tributação indutora sobre setor elétrico e impactos orçamentários. 5.Considerações finais. 6.Referências bibliográficas. 6.1.Acesso eletrônico. 


1. BREVES CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

O setor elétrico, desde o segundo pós-guerra, constitui estrutura basilar do desenvolvimento socioeconômico das nações e, em virtude de tal fato, sempre foi alvo de grandes e intensas preocupações governamentais.

No Brasil, diversos planos, estratégias e políticas estatais aplicadas ao setor foram se modificando ao longo da história, em virtude de ideologias políticas e econômicas que oscilaram ao balanço das crises atravessadas. No colapso dos anos 90, o modelo estatal foi sucedido pela privatização do setor elétrico, deixando o Estado o seu papel de executor direto da atividade econômica e passando a desempenhar a função de regulação setorial.

Novamente, o país experimenta momentos de tensão no setor elétrico devido, basicamente, ao altíssimo valor das tarifas, à pesadíssima carga tributária e à instabilidade do setor, levando, inexoravelmente, à perda de investimentos e decréscimo no desenvolvimento econômico. Para contornar parte dos problemas, a Presidente Dilma Rousseff e seu aparato Ministerial promulgou a Medida Provisória nº 579, prometendo redução nas tarifas praticadas, primordialmente, através de minoração e cortes nos encargos setoriais e prorrogação das concessões. A Medida, no entanto, não agradou suficientemente devido a vários aspectos.

O relativo insucesso da nova Medida deve-se, dentre outros fatores, à ausência de cotejo de um problema complexo, mas de urgente reflexão: a elevada carga tributária incidente sobre o setor.

Com efeito, é evidente a necessidade de arrecadação de receita por parte do Estado, no entanto, não é lógico ou racional onerar tão estridulantemente um domínio econômico chave ao crescimento, como o é o setor elétrico. Na realidade, seria incrivelmente mais producente tributá-lo de maneira a estimular seu desenvolvimento e, consequentemente, permitir o crescimento nacional e abrir as portas ao investimento econômico.

Para tanto, faz-se necessária a ponderação dos aspectos arraigados à tributação indutora sobre o setor, fazendo-se imprescindível a análise dos impactos econômicos e financeiros de tal política intervencionista.


2. TRIBUTAÇÃO SOBRE O SETOR ELÉTRICO: REGULAÇÃO POR INCENTIVOS FISCAIS, DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E IMPACTOS FINANCEIROS

A redução da tarifa de energia elétrica anunciada em setembro do corrente ano, por meio da Medida Provisória nº 579, teve o condão de trazer à baila a antiga e persistente preocupação com a reestruturação do setor elétrico, o qual possui insofismável essência estratégica enquanto ferramenta de propulsão da competitividade no âmbito da produção nacional. A aludida Medida Provisória prevê, dentre outras providências, a redução dos encargos setoriais, bem como a prorrogação das concessões de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, no intuito de amortizar os investimentos promovidos, estabelecendo o regime de comercialização da energia produzida pelas usinas hidrelétrica em consonância com o Novo Modelo do Setor Elétrico, instituído pela Lei nº 10.848, de 2004. Tais medidas vislumbram a beneficiar o consumidor final com a modicidade tarifária[1], conferir maior segurança ao setor energético e, principalmente, induzir a aceleração do desenvolvimento econômico e fomentar a competitividade da produção nacional.

Não obstante as diligências acima elencadas, o alto custo do setor elétrico permanece, devido, dentre outras causas, à elevada carga tributária sobre si incidente, fato que recoloca em discussão a premente necessidade de remodelação da estrutura tributária aplicada ao setor elétrico.

Realmente, a imposição da atual carga tributária sobre o setor elétrico sobrecarrega impiedosamente o valor final da energia, onerando o preço deste insumo básico e obstaculizando a tão sonhada consolidação da posição do Brasil no mercado competitivo global. Nesta senda, ingressa na baila da discussão o custo tributário ao longo da cadeia de produção, transmissão e distribuição da energia elétrica que, segundo consultoria realizada pela Pricewaterhouse Coopers em parceria com o Instituto Acende Brasil, corresponde atualmente a 45% do valor total da conta de energia elétrica.

Na realidade, o atual arcabouço fiscal incidente sobre o setor elétrico resulta de um “pragmatismo tributário” em que se almeja, notoriamente, o aumento da arrecadação de forma rápida e pouco transparente, ignorando-se as consequências. Neste contexto, tendo em vista a universalização e indispensabilidade da energia elétrica para consumidores e empresas[2], o governo maneja livremente a carga tributária incidente sem que haja uma prévia avaliação dos impactos financeiros, econômicos e sociais.

Exatamente em razão desta distorção entre o poder governamental e a essencialidade do bem (eletricidade), o mesmo estudo realizado pelo Instituto Acende Brasil com PricewaterhouseCoopers aponta a existência de uma assimetria entre a tributação do setor elétrico e o resto da economia[3], de tal maneira que, enquanto a carga tributária normalmente equivale a 35% do Produto Interno Bruto,  a carga tributária incidente sobre o setor elétrico é de 45%[4].

Assim, é latente a necessidade de reanalisar a atual política tributária incidente sobre o domínio elétrico, urgindo a compreensão do tributo sob um outro ângulo: como mecanismo indutor do mercado e desenvolvimento da economia.

Com efeito, há tempos a concepção liberal de Estado Fiscal[5] vem sendo deixada de lado e os tributos não mais vistos como simples mananciais de arrecadação de receita. Ao contrário, cada vez mais, incute-se na tributação o mecanismo de regulação e indução das atividades econômicas, legando-se aos tributos um tom a mais de extrafiscalidade. Justamente por tal razão, o atual modelo neoliberal, adotado pelo Brasil, apresenta o Estado como parte estratégica e portador de uma vigorosa arma: a tributação indutora.  

Assim, estima-se que a redução das alíquotas e retirada dos encargos setoriais da base de cálculo do ICMS, PIS e COFINS atrairia investimentos no mercado nacional, evitando a fuga de empresas brasileiras para outros países, cuja carga tributária é reduzida.

Inobstante, o cerne do problema da excessiva carga tributária sobre o setor elétrico é bem mais complexo do que se possa imaginar por uma breve análise. Exatamente por isso, faz-se salutar a detida compreensão dos fatores inerentes à consubstanciação do delineamento da tributação sobre o setor elétrico, assim como a repercussão da política fiscal adotada pelos governos sobre a evolução da economia e finanças públicas.

Com efeito, é preciso ponderar que eventual redução de arrecadação fiscal impactará no orçamento público, podendo levar à redução, à guisa de exemplo, do repasse constitucional de 25% da arrecadação de ICMS aos municípios. Da mesma forma, é preciso analisar os reais efeitos da política fiscal no fôlego do mercado e economia.

Nesta senda, levando em conta todas as premissas acima ventiladas, propõe-se o exame dos aspectos que cingem a tributação indutora no setor elétrico e as repercussões econômicas e financeiras. Em outras palavras, o estudo ora proposto visa a investigar os mecanismos de consubstanciação da tributação indutora sobre o setor elétrico e a perquirir as consequências concretas sobre as finanças públicas e a economia.


3. ENERGIA ELÉTRICA: INSUMO ESTRATÉGICO AO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A energia elétrica é considerada pelo Código Civil de 2002 e doutrina moderna como bem móvel de valor econômico. Tal bem desponta, incontestavelmente, como um dos insumos essenciais ao desempenho das atividades econômicas e, devido à imprescindibilidade que lhe é inerente, apresenta-se como instrumento estratégico no cenário competitivo atual.

Com efeito, a energia elétrica é bem essencial e de uso indispensável a atividades de toda sorte, seja utilizada por consumidores finais pessoas físicas ou jurídicas, seja empregada no setor industrial. A importância deste bem é absolutamente evidente.

Justamente por portar a característica da essencialidade, torna-se um bem pouco sensível à variação de seu preço no mercado, não revelando destacado nível de elasticidade-preço da demanda.[6] Nesta senda, os governos tendem a favorecer-se da essencialidade inerente à energia elétrica impondo alta carga de tributos e tarifas sobre o setor. A consequência de tal política é clara: eleva-se o preço deste insumo essencial e frustra-se o anseio por desenvolvimento econômico e competitividade no mercado internacional. O equívoco de tal política é saliente e tem resultado na estagnação da economia brasileira, ensinando aos governantes que o setor elétrico não pode ser visto como um manancial de fácil arrecadação de receita, mas como cerne estratégico do desenvolvimento econômico.

Com intuito de atenuar as pressões exercidas pelas empresas que atribuem ao alto valor da energia elétrica um dos fatores obstativos do desempenho da competitividade do mercado brasileiro, o atual governo editou a Medida Provisória nº 579, anunciando cortes e reduções de determinados encargos setoriais[7], além das prorrogações de concessões de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica. Inobstante, a Medida, dita histórica, não teve o impacto positivo esperado, sendo criticada pela obscuridade no valor das novas tarifas que serão cobradas a partir de 2013 e pela escancarada primazia do poder concedente face às empresas concessionárias.

O cenário traz à baila a elucubração acerca da estratégia adotada pelo Governo de Dilma Rousseff no que tange ao setor elétrico, avultando-se o debate em torno do necessário replanejamento da carga tributária incidente sobre o setor em vez das mudanças promovidas pela Medida nº 579. Estima-se que a desoneração tributária do setor elétrico consubstanciaria política racional e justa, impactando diretamente na produção e economia.

Nesta senda, defende-se ser indispensável a gradual redução das alíquotas do ICMS, e PIS/COFINS, além da exclusão dos encargos setoriais da base de cálculo dos referidos tributos. Afirma-se que a diminuição das alíquotas possibilitaria a manutenção do nível de arrecadação dos Estados e da União, bom como incentivaria o desenvolvimento do mercado nacional, desobstruindo o caminho para o crescimento econômico.

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A política fiscal de corte gradual das alíquotas de ICMS e PIS/COFINS como forma de estimular o aquecimento econômico nacional revela natureza intrínseca de tributação indutora sobre o setor elétrico, tema deveras complexo e que aporta inúmeros aspectos orçamentários e econômicos não são facilmente visíveis. Com efeito, a escolha de regulação do mercado por meio de mecanismos indutores revela a necessidade de bem examinar as minucias que envolvem o setor, seja do ponto de vista do nível de arrecadação, seja do ponto de vista do comportamento econômico desejável e o factível.

Assim, propõe-se, faz-se imperioso investigar os caminhos de respostas ao seguinte problema: quais os efeitos da tributação indutora no setor elétrico causados sobre a economia nacional e finanças públicas?

Pois, realmente, parece fácil perceber a necessidade redução da carga tributária incidente sobre o setor elétrico, no entanto, é imprescindível que tal atitude governamental esteja amparada em estudos e análises de comportamento econômico. Igualmente, é imprescindível conhecer os impactos no orçamento público de eventuais reduções no recolhimento do ICMS e PIS/CONFINS, como, por exemplo a redução nos repasses constitucionais e diminuição da receita dos estados, no caso do ICMS, ou, no caso do PIS e COFINS, as repercussões no financiamento da seguridade social ou integração social.


4. TRIBUTAÇÃO INDUTORA SOBRE SETOR ELÉTRICO E IMPACTOS ORÇAMENTÁRIOS

Nas palavras de Guido Mantega,

O custo Brasil sempre foi um problema para a economia brasileira, mas tornou-se uma questão de sobrevivência, desde que o país ficou exposto à pressão da competição internacional. [8]

Debruçar-se sobre as repercussões da tributação indutora sobre o setor elétrico torna imprescindível o exame destes dois grandes marcos epistemológicos: o setor elétrico e a tributação como mecanismos de indução econômica e seus efeitos. Para tanto, a análise doutrinária importa em ponto fulcral sobre o qual se sustenta o presente trabalho.

Como preconiza Clever Campos[9], uma das principais preocupações da sociedade brasileira é a expansão do setor elétrico, já que esta é condição indispensável para o desenvolvimento do país. Neste sentido, David Waltenberg[10] aponta que desde o segundo pós-Guerra, o desenvolvimento brasileiro se sustenta na industrialização, sendo que a energia elétrica apresenta-se como essencial para tanto. Não obstante, à época, não havia interesse por parte da iniciativa privada em realizar grandes investimentos no setor elétrico. Foi então que se deu, em fins dos anos 40, a guinada da estatização dos serviços de energia elétrica em duas escalas: a nível federal, criando empresas geradoras (CHESF, 1947; Eletrobrás, 1961) e a nível estadual, criando empresas distribuidoras. Tal modelo estatal, contudo, passou a enfrentar séria crise financeira a partir dos anos 80, devido, sobretudo, à forte recessão mundial, à defasagem na política tarifária e à ausência de regulação setorial.

Assim, Maria João Rolim indica que o setor elétrico brasileiro ingressa nos anos 90 “com esgotamento da capacidade de investimentos, significante perda da qualidade de serviço com inevitáveis reflexos no processo de desenvolvimento do país”.[11] Exatamente por isso, o modelo estatal predominou até o ano de 1995, com o início da privatização iniciado pelo Plano Nacional Desestatização.

Arnold Wald[12] aponta que, em vista de tal cenário e da mudança do papel do Estado de principal empresário do setor efetivo planejador e regulador, tornou-se indispensável a criação da ANEEL, em 1996, seguida do ONS e do MAE, em 1998. Pois, nas palavras de Marcos Juruema[13], “a par do planejamento e do fomento, a nova ordem econômica no setor elétrico é calcada no fortalecimento da regulação, inclusive com o reconhecimento da autorregulação”. Para Clever Campos[14], um grande passo neste sentido foi o estabelecimento, através da Lei 8.987/95, do regime de concessão e permissão, previsto no art. 175 da Constituição Federal de 1988, seguido da implantação da livre concorrência no setor elétrico, por meio da Lei 9.074 em 1995.

Assim, ensina Maria João Rolim que o modelo competitivo adotado, baseado no Projeto RESEB – Reestruturação do Setor Elétrico Brasileiro trouxe como premissas a competitividade através da desverticalização das empresas, licitação para concessões e permissões, regulação setorial, adoção de regime de tarifa pelo preço e instituição de regime regulatório amparado na agência independente. Nada obstante, diversos fatores culminaram em graves falhas no processo de reestruturação setorial, que acabaram por repercutir no regime de racionamento, em 2001, com efeitos nefastos para o desenvolvimento econômico. A crise no abastecimento levou à criação do Programa Prioritário das Termelétricas, à instauração do Programa de Revitalização do Setor e, finalmente, à promulgação da Lei 10.848 em 2004, introduzindo o Novo Modelo do Setor Elétrico .[15]

É oportuno cotejar esses aspectos que circundam o setor elétrico no intuito de verificar o quão importante é o poder Estatal enquanto planejador e regulador econômico, pois, como bem apregoa o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, “ atuação do governo pode representar a condição de vida ou a sentença de morte das empresas...”[16] E, é justamente nesta perspectiva que impende discutir a relevância da carga tributária e da política fiscal sobre o setor.

Ainda através de análise realizada por Maria João Rolim, é notória a intensa complexidade no sistema de tributação incidente sobre o setor elétrico, o que dificulta um estudo apurado da análise de eficiência da política tributária no sentido de atender aos princípios inerentes ao sistema de tributação de insumo produtivo, a energia elétrica. Neste mister, impera a necessidade de transparência e eficácia na tributação, possibilitando a arrecadação com o menor custo e atendendo ainda aos princípios da equidade e capacidade contributiva, sempre vislumbrando à justiça fiscal.

Em importante obra sobre tributação e regulação econômica, André Elali[17] mostra que, no intuito do equilíbrio das relações sociais, econômicas e financeiras, o Estado deve intervir de forma direta ou indireta no ou sobre o domínio econômico. Intervenção esta que, nos ensinamentos de Eros Grau[18] pode se dar de três formas: por absorção ou participação (quando o Estado desempenha diretamente uma atividade econômica), por direção (quando o Estado impõe determinada conduta) e por indução (Estado estimula determinada conduta). Especificamente, ao regular por indução, o Estado não impõe um comportamento, mas privilegia aquele desejável. No mesmo sentido entende Luís Eduardo Shoueri, para quem as normas indutoras estimulam ou desestimulam, assegurando a possibilidade de se adotar comportamento diverso, sem que para isso se cometa um ilícito[19]. Assim, contrariamente à norma diretiva, há apenas um consequente para determinada hipótese, de maneira que, se não houver obediência à norma diretiva, aplica-se a sanção.

Neste ponto, insta a observação de André Elali de que não se pode cogitar de direção estatal através de normas tributárias, já que estas implicam em o contribuinte incorrer ou não no fato gerador. Por isso, a incidência de norma diretiva sobre a tributação culminaria, inevitavelmente, no afronte teratológico ao princípio do não confisco, da proporcionalidade e da capacidade contributiva[20]. Assim, conclui Elali que, as “as normas tributárias indutoras são, antes de normas indutoras, normas tributárias”.[21]

Nestes termos, as normas tributárias indutoras, no intento de regular a ordem econômica, podem constituir benefícios ou agravamentos, visando à realização de comportamentos mais desejáveis pelos agentes econômicos. Autrement dit, os incentivos fiscais se apresentam como instrumentos hábeis à indução econômica.

O eminente professor Tércio Ferraz Jr.[22] ainda preleciona que os incentivos fiscais representam o reposicionamento do Estado perante a ordem econômica e, neste caminho, avança Adilson Rodrigues Pires[23] ensinando que, o afastamento da tributação da neutralidade incute o estímulo ao exercício de determinadas atividades privadas carentes de recursos e de apoio governamental para se desenvolverem. Arremata o Professor Heleno Taveira Torres[24] que “o papel promocional dos incentivos fiscais consiste em servir como medida para impulsionar ações ou corretivos de distorções do sistema econômico, visando a atingir certos benefícios, cujo alcance poderia ser tanto ou mais dispendioso, em vista de planejamentos públicos previamente motivados”.

Diante do exposto, conclui-se que os incentivos, se bem cotejados, possuem a capacidade de gerar eficiência econômica, atraindo o desenvolvimento. Para isso, as normas tributárias indutoras devem ser manejadas com rígido respeito à competência tributária, legislativa e reguladora, ou seja, observando-se as divisões do exercício do poder político que, na prática, passa pela observância básica dos arts. 20 ao 33 e do 153 ao 156 da Constituição Federal.

 Por outro lado, também devem ser examinados os efeitos dos incentivos para que estes não tragam consequências nefastas, gerando maiores assimetrias de mercado ou desarrazoadas perdas ao erário. Assim sendo, deverá o Estado, ao editar normas de indução, examinar previamente os efeitos sobre todo o processo econômico, evitando desperdício de investimento público e possível piora no sistema.

Nesta esteira, preceitua André Elali que, o surgimento do Estado intervencionista (entre os anos 50 e 70), fez brotar o princípio basilar do crescimento econômico, e para atingir tal desiderato, passou-se a adotar uma política de concessões de benefícios financeiros e fiscais, pois se entendia que os auxílios encontravam contrapartida no interesse público. Nada obstante, não foram ponderados os critérios necessários para delimitar os benefícios, nem houve planejamento estratégico consolidado para a concessão dos incentivos, levando os Estados[25] a grandes dificuldade ligadas ao déficit orçamentário. No Brasil não foi diferente, esta perverse fiscal policy, além de não conduzir ao crescimento esperado, gerou desperdício de dinheiro público e agravou o desequilíbrio financeiro nacional. [26]

Com a crise orçamentária dos anos 70, começou-se a repensar a necessidade de mudança no planejamento do desenvolvimento econômico e outorga de vantagens financeiras e fiscais. Passou-se a examinar criteriosamente a eficiência econômico-financeira dos incentivos e hoje se percebe que estes podem, sim, ser poderosos instrumentos a favor do desenvolvimento econômico e Estatal, desde que bem utilizados.

Neste oportuno, as palavras de André Elali são, como sempre, aclaradoras:

Por tais razões, deve-se classificar os auxílios estatais, independentemente das formas jurídicas, a partir da legitimidade de sua concessão e da eficiência que geram para o sistema econômico, uma vez que não se configurará legítimo e eficiente qualquer tipo de auxílio que viole as normas do sistema jurídico, e, em consequência, que gerará, ao invés de benefícios, maiores problemas à realidade econômica e social e às contas públicas. Legalidade, isonomia, capacidade contributiva, livre iniciativa, livre concorrência, proteção ao consumidor, dentre outras normas que devem informar tais práticas estatais, são verdadeiras limitações e balizamentos para o Estado.

Demais disso, insta ressaltar a observação de Calixto Salomão Filho de que a atividade planejadora do Estado deve buscar uma ação interventiva que, antes de tudo, permita ao Estado adquirir conhecimento do setor, suas utilidades e requisitos para o desenvolvimento.[27]

Analisar a atual tributação e política fiscal incidente sobre o setor elétrico à luz de todos os vieses acima tratados é encargo que comporta a ousada e dura missão de contemplar a estrutura fiscal-econômica-regulatória sob uma perspectiva externa e, ao mesmo tempo, axiológica, como o fez Antoine de Saint-Éxupery, em Terre des Hommes[28].

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Sobre a autora
Fabiana Augusta de Araújo Pereira

Advogada, Professora em Direito Tributário e Teoria das Finanças Públicas na UFRPE. Pos-graduação em Direito Tributário (IBET), e em Direito Constitucional (UNIDERP). Mestranda em Direito do Estado, regulação e tributação indutora (UFPE).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Fabiana Augusta Araújo. Tributação indutora sobre o setor elétrico:: breves considerações acerca dos aspectos da regulação por incentivos fiscais, desenvolvimento econômico e impactos financeiros. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3454, 15 dez. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23237. Acesso em: 21 nov. 2024.

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