Considerações Iniciais
Para cada uma dessas diferentes concepções de justiça, a liberal, a libertária, a comunitarista, a igualitária e a capacitária, existe diferentes pensadores que aparecem como grandes expoentes dessas concepções. Assim, podemos dizer que numa abordagem básica a respeito da “Teoria da Justiça” enfatizaremos as teorias de Jonh Rawls como representante da perspectiva liberal, Robert Nozick como representante da perspectiva libertária, Michael Walzer da perspectiva comunitarista, Ronald Dworkin da perspectiva igualitária, e Amartya Sen da perspectiva capacitaria.
1. Concepção Liberal
Quanto a Rawls, representante da perspectiva liberal de justiça, este tem na publicação de Theory of Justice (Teoria da Justiça), de 1971, o estabelecimento de uma das principais contribuições ao debate sobre justiça do século XX. Neste livro, Rawls procura pensar a justiça como eqüidade. Muito próximo de algumas ideias fundamentais da ética kantiana, Rawls parte da pessoa como um absoluto moral. Quer com isso dizer que todo ser humano, uma vez alcançada a idade da razão, é autônomo e tem um perfeito senso de justiça. Assim, estabelece uma ponte entre os conceitos de "pessoa moral" e "sociedade bem-ordenada". Para que ocorra o perfeito entrosamento entre as duas variáveis, pessoa e sociedade, estabelece como imprescindíveis alguns direitos individuais e sociais primários. Estes seriam liberdades básicas de pensamento e de consciência que capacitariam o indivíduo para tomar decisões e buscar a implantação do bem e da justiça; liberdade de movimento e de livre escolha de ocupações; liberdade de rendas e riquezas; e condições sociais para o respeito a todo indivíduo como pessoa moral.
Rawls considera que uma sociedade somente será justa se todos os valores sociais, tais como liberdade e oportunidades, ingressos e riquezas, assim como as bases sociais e o respeito a si mesmo, forem distribuídos de maneira igual, a menos que uma distribuição desigual de algum ou de todos esses valores redunde em benefício para todos, em especial para os mais necessitados.
Para este filósofo americano, os dois pressupostos para se fazer uma sociedade mais justa seriam: 1) igualdade de oportunidade aberta a todos em condições de plena eqüidade; e 2) os benefícios nela auferidos devem ser repassados preferencialmente aos membros menos privilegiados da sociedade, satisfazendo as expectativas deles, porque justiça social seria, antes de tudo, amparar os desvalidos. Para se conseguir isso é preciso, todavia, que uma dupla operação ocorra. É necessário que os talentosos, os melhor dotados - por nascimento, herança ou dom - aceitem com benevolência em ver diminuir sua participação material em bens, salários, lucros e status social, minimizadas em favor dos outros, daqueles que se encontram desassistidos socialmente. Estes, por sua vez, poderiam assim ampliar seus horizontes e suas esperanças em dias melhores, maximizando suas expectativas.
O ponto de partida de Rawls, portanto, está numa concepção geral de justiça que se baseia na ideia de que todos os bens sociais primários - liberdades, oportunidades, riqueza, rendimento e as bases sociais da auto-estima - devem ser distribuídos de maneira igual a menos que uma distribuição desigual de alguns ou de todos estes bens beneficie os menos favorecidos. Mas esta concepção geral ainda não é uma teoria da justiça satisfatória. A razão é que a ideia em que se baseia não impede a existência de conflitos entre os vários bens sociais distribuídos. Por exemplo, se uma sociedade garantir o acesso a uma determinada escolaridade a todos os seus cidadãos e ao mesmo tempo exigir que essa escolaridade seja assegurada por uma escola da área de residência, no caso de uma pessoa preferir uma escola fora da sua área de residência por ser mais competente e estimulante, gera-se um conflito entre a igualdade de oportunidades no acesso à educação e a liberdade de escolher a escola que cada um acha melhor.
Nesse sentido, a concepção geral de justiça de Rawls deixa estes problemas por resolver. Será então indispensável um sistema de prioridades que justifique a opção por um dos bens conflitados. E nesse caso, se escolhemos um bem em detrimento de outro, é porque temos uma razão forte para considerar um dos bens mais prioritário do que outro. Com isso, Rawls divide a sua concepção geral em três princípios: Princípio da liberdade igual, em que a sociedade deve assegurar a máxima liberdade para cada pessoa compatível com uma liberdade igual para todos os outros; Princípio da diferença, em que a sociedade deve promover a distribuição igual da riqueza, exceto se a existência de desigualdades econômicas e sociais gerar o maior benefício para os menos favorecidos; e Princípio da oportunidade justa, em que as desigualdades econômicas e sociais devem estar ligadas a postos e posições acessíveis a todos em condições de justa igualdade de oportunidades.
2. Concepção Libertária
No tocante a Robert Nozick, sua obra mais relevante é de 1974, Anarchy, state and utopia (Anarquia, Estado e utopia). Ali, o autor elabora um tratado teórico sobre a função do Estado moderno, propondo uma nova função desse Estado, no qual se expõe uma nova teoria da justiça distributiva, um modelo utópico experimental sob um novo conceito de Estado mínimo. Também propõe uma integração entre a ética, a filosofia moral e a teoria econômica, conjugadas com uma posição unificada em matéria política. Segundo Nozick no prefácio do referido livro, indivíduos têm direitos, e há coisas que nenhuma pessoa ou grupo pode fazer com os indivíduos sem violar seus direitos. Tão fortes e de tão alto alcance são esses direitos que colocam a questão do que o Estado e seus servidores podem e não podem fazer. Assim, o debate no livro envolve a natureza do Estado, suas funções legítimas e suas justificações.
Nesse sentido, Nozick começa com uma formulação categórica dos direitos individuais, abordando com grande seriedade a alegação anarquista de que, na manutenção de seu monopólio do uso da força e da proteção de todos dentro de um território, o Estado tem que violar direitos individuais e, por conseqüência, é intrinsecamente imoral. Refutando essa alegação, o autor argumenta, inicialmente, que um Estado nasceria da anarquia, mesmo que ninguém tivesse essa intenção ou tentasse criá-lo, através de um processo que não precisaria violar direitos de ninguém. Se na primeira parte do livro, Nozick justifica um Estado mínimo, na segunda parte alega que nenhum Estado mais amplo pode ser justificado, e finaliza com uma descrição hipotética de como ele poderia surgir, mostrando quão pouco atraente seria esse tipo de Estado mais amplo.
Dessa forma, Nozick se inscreve numa perspectiva de justiça anarquista libertária, contestando a refutação final da legitimidade de toda forma de Estado. No desenvolvimento do seu argumento, Nozick raciocina, como Hobbes e Locke, a partir do estado de natureza. Porém aqui o autor tenta mostrar, ao contrário dos dois tradicionais contratualistas, que não é necessário formular a hipótese de um contrato social – fundando o Estado político exterior à Sociedade – para fugir dos inconvenientes desse estado de natureza (a guerra de todos contra todos ligada à incerteza da distinção entre o que é de um e o que é de outro). Trata-se, para ele, de pensar a emergência de um modelo Estado Moderno Mínimo a partir de uma inteligência estritamente econômica do social.
Esse Estado mínimo que Nozick defende deveria garantir unicamente a proteção (à propriedade, às garantias individuais, etc). Ademais, para os libertários, qualquer concepção de Estado maior que o Estado mínimo não é legítima, pois teria que interferir na vida das pessoas, ferindo suas liberdades. A liberdade, por sua vez, diz que as escolhas devem ser individuais, e a escolha de uma mão só (como seria a do Estado) poderia violar a possibilidade de escolha do indivíduo. Seguindo essa lógica, a concepção libertária é uma crítica à justiça distributiva, alegando que a distribuição não pode ser ponto de legitimidade para a ampliação do Estado.
3. Concepção Comunitarista
Passando agora para a concepção de justiça comunitarista, temos como principal expoente Michael Walzer. Os comunitaristas têm as suas raízes no aristotelismo, em Hegel e na tradição republicana da Renascença (como por exemplo, Maquiavel e "O Príncipe”). O comunitarismo propõe que o indivíduo seja considerado membro inserido numa comunidade política de iguais. E, para que exista um aperfeiçoamento da vida política na democracia, exige-se uma cooperação social, um empenhamento público e participação política, isto é, formas de comportamento que ajudem ao enobrecimento da vida comunitária. Consequentemente, o indivíduo tem obrigações éticas para com a finalidade social, devendo viver para a sua comunidade organizada em torno de uma só ideia substantiva de bem comum.
Os comunitaristas surgem a partir da crítica que elaboram em relação às concepções liberais e libertárias. Aqui, eles vêem a comunidade como o lugar onde aparece o espaço comum da cultura, da política, dentre outras esferas sociais. A cultura dentro da comunidade é que vai definir esse espaço de compartilhamento das práticas sociais. No comunitarismo, a concepção de bem é o que informa o direito, é aquilo que é justo ou injusto, portanto. Os comunitaristas alegam que a concepção liberal equivoca-se por ser uma concepção neutra. Afinal, para eles não há como a justiça ou o Estado serem neutros, pois como seria possível distribuir direitos sem levar em conta os bens em questão. Eles respondem que não é possível ver os indivíduos isolados, devendo ser olhadas segundo a perspectiva da comunidade em que estão inseridas, uma vez que cada modo individual de vida é também determinado pela comunidade.
Assim, bens sociais diferentes podem e devem, segundo Walzer, ser distribuídos de formas diversas por razões e procedimentos distintos, conforme as diferentes esferas de aplicação da justiça. Nesse sentido, nas suas esferas de justiça, que compõem a ideia de igualdade complexa, devem se levar em conta: 1) os bens sociais distintos; 2) as razões sociais distintas; 3) os procedimentos distintos; 4) os agentes distributivos distintos, em que não só o Estado pode participar.
Se para os liberais a justiça deveria ser aplicada independentemente da comunidade, para os comunitaristas deve-se levar em conta a comunidade em que o indivíduo está inserido, de modo que se possa, a partir daí, aplicar efetivamente aquilo que consideram justiça. Assim, se Rawls parece querer apresentar sua teoria da justiça como uma verdade universal, os comunitários argumentam que os padrões da justiça devem estar fundados na forma de vida e tradições das sociedades em particular, o que, portanto, pode variar de contexto para contexto. Para Michael Walzer, a conclusão é a mesma, quer dizer, que uma efetiva crítica social deverá se repousar e refletir sobre os hábitos e tradições da vivência de um povo, em tempos e lugares específicos. Quem abstrai o contexto particular, para universalizar o procedimento, está fadado à incoerência filosófica e à irrelevância política.
Dessa forma, os liberais partem da ideia de que nas condições modernas de pluralismos de valores, somente o princípio geral da igualdade de direitos, liberdades, e oportunidades, pode servir como pauta normativa da justiça. Já os comunitaristas respondem que é preciso um referencial prévio, um horizonte de valores comunitariamente compartilhados para se decidir sobre questões de justiça numa sociedade. Por isso colocam os valores da comunidade e suas orientações à frente dos atributos do universalismo, dão prioridade à noção de bem comum na fixação de critérios de justiça, e fazem a inevitável referência aos determinantes contextuais e à tradição para a criação e imposição de normas.
Com isso, os liberais dão primazia aos direitos individuais, que antecedem qualquer forma de determinação coletiva, enquanto os comunitaristas colocam prioridade na forma de vida comunitária. Para estes últimos uma sociedade baseada meramente na garantia dos direitos individuais carece de força motivadora e integradora capaz de uma coesão solidária suficiente para manter a própria sociedade. Por este motivo julgam o projeto liberal demasiadamente errado no sentido de garantir e manter a estabilidade social, a legitimação política e a cidadania.
4. Concepção Igualitária
Chegando agora na concepção igualitária, cujo expoente principal é Ronald Dworkin, o que é interessante na filosofia política deste autor, e junto com ela a sua filosofia do Direito, é a tentativa de mostrar que a liberdade e a igualdade não se contradizem, mas se complementam. Apesar de ele trabalhar segundo a lógica da tradição liberal de autores como Rawls, sua compreensão do liberalismo é bastante particular, na medida em que acredita que a igualdade é o seu fundamento.
Na reinterpretação dos pressupostos fundamentais do liberalismo, Dworkin elabora algumas críticas a autores como Rawls e Nozick. Em primeiro lugar, Dworkin não concorda com a prioridade atribuída por Rawls como sendo o primeiro princípio de justiça, aquele segundo o qual todos teriam igual direito às liberdades básicas como liberdade de consciência, liberdade de falar sobre assuntos políticos, liberdade de votar, liberdade para possuir propriedades, liberdade para não ser preso e julgado sem o devido processo, etc. Considera a tese de Rawls segundo a qual qualquer ser racional preferiria, tendo as condições mínimas de vida satisfeitas, incrementar a liberdade e não a riqueza material, uma proposição injustificada. Além disso, alega que Rawls possuiria uma visão conservadora do caráter das pessoas. Isso significa que Dworkin pensa que, mesmo sob o véu da ignorância, as pessoas poderiam arriscar e assumir princípios de justiça não igualitários achando que estariam em posições de vantagem sobre os demais. Portanto, segundo Dworkin, a tentativa de Rawls de mostrar que as liberdades básicas são mais importantes do que as diferenças econômicas e sociais, é falha.
Com relação à teoria liberal defendida por Nozick em Anarchy, state and utopia, Dworkin concorda que as pessoas possuem direitos e que estes são invioláveis, mas discorda que esses direitos existam independentemente do Estado civil, numa espécie de estado de natureza. Considera que para Nozick, a liberdade é tudo e a igualdade nada, e nisso há uma completa oposição nas visões dos dois filósofos. Dworkin discorda também do papel quase exclusivo dado ao direito à propriedade e, conseqüentemente, da concepção mínima de Estado e das funções que ele deve cumprir, ou seja, o de garantir este direito e de zelar pela segurança dos cidadãos.
Portanto, Dworkin discorda de Nozick na sua ideia básica, isto é, que se assumirmos seriamente os direitos humanos teremos que condenar as práticas do Estado de Bem-Estar Social. Criar impostos para fins de redistribuição de riqueza, nesse sentido, não é violar direitos nem uma forma de escravizar indivíduos, argumenta Dworkin. Além disso, apesar do fato de que ele concorda com Nozick que a justiça é na tradição liberal independente de qualquer noção sobre a boa vida, discorda que um liberal deva ser absolutamente cético quanto à melhor forma de viver. Na verdade, ele sustenta que se deve deixar ao indivíduo a decisão sobre como ele quer viver, mas isso não significa que as diferentes formas de viver não devam ser escrutinadas, discutidas e justificadas publicamente.
Dworkin nega, com efeito, que a noção de direitos individuais esteja em conflito com a igualdade. Nega, também, que defender direitos implique num abandono da noção clássica de bem comum que parece ser realmente o fim último da política. Quer dizer, o bem-estar social não precisa estar em oposição aos direitos individuais. O conflito é, para Dworkin, apenas aparente e superficial, pois no fundo acredita que tanto direitos individuais quanto o bem-estar social estão fundados na igualdade.
Dworkin estabelece em seu igualitarismo liberal uma enfática concepção substantiva de igualdade baseada, por exemplo, na igual distribuição de recursos. Dworkin se afasta das teorias liberais baseadas em Rawls que pretendem dar conta da justiça em termos puramente políticos. Tal separação entre ética e política é, segundo ele, esquizofrênica, pois nela não podemos reconhecer as convicções mais elementares da vida moral quotidiana. Assim, Dworkin sustenta que um Estado liberal deve, realmente, ser neutro quanto às diferentes formas de vida, isto é, ele não deve impor uma concepção particular de vida feliz. Entretanto, deve também garantir as condições mínimas para que todas as formas de vida possam realizar seus projetos de vida boa. Portanto, há uma continuidade entre ética e política, ou seja, uma forma de vida só pode realizar-se num contexto social.
Um outro princípio básico do igualitarismo liberal requer que o governo trate todos aqueles que estão sob sua responsabilidade igualmente na distribuição de algum recurso de oportunidade. Assim, Dworkin sustenta que certas condições mínimas devem ser garantidas pelo Estado para que os cidadãos realizem seus projetos existenciais. O acesso à educação básica, por exemplo, é uma condição necessária para que haja sucesso no estabelecimento de metas dos diversos planos de vida e a sua efetiva realização. E quanto à igual distribuição de recursos, Dworkin sustenta que eles devem de algum modo figurar como parâmetros porque não podemos descrever o desafio de viver bem sem fazer algumas pressuposições sobre os recursos que devem estar disponíveis para uma boa vida.
Nesse sentido, aquilo que Dworkin chama de "igualdade liberal" consiste numa visão segundo a qual uma distribuição justa de recursos é atingida quando todos podem usufruir igualmente daquelas condições que são necessárias para a sua forma de vida. Conseqüentemente, as desigualdades de recursos devem ser retificadas pela simples transferência e as desigualdades pessoais devem ser compensadas por um sistema de impostos redistributivos, por exemplo.
5. Perspectiva Capacitária
Por fim, a perspectiva capacitária de justiça tem como expoente Amartya Sen, economista indiano que ganhou o prêmio Nobel em 1998 por suas contribuições a chamada economia do bem-estar. Mesmo antes de ganhar o Nobel, o autor já vinha ganhando notoriedade devido aos posicionamentos acerca da busca por justiça. Sen vem realizando uma crítica rigorosa e sistemática dois fundamentos “welfaristas” da economia do bem-estar e das limitações teóricas e práticas de suas conseqüências. Ele mostra como a pobreza e a fome não são necessariamente eliminadas pelos boons econômicos e conseqüentes aumentos da renda média.
Em “Desigualdade Reexaminada”, livro de 2001, o autor procura fazer, exatamente como o nome diz, um reexame da questão da desigualdade. Ali defende que, na busca por justiça social, as capacidades é que devem ser igualadas. Capacidades são poderes para fazer ou deixar de fazer, sem os quais não há escolha genuína. Na economia filosófica de Sen predomina a ideia de que a “vida boa” é uma vida com escolhas genuínas, na qual ninguém é forçado a viver de alguma forma específica, por mais rica que esta forma de vida possa ser outros aspectos.
Uma questão chave levantada ao se falar em desigualdade corresponde exatamente sobre o que seria o seu contrário, ou seja, “igualdade de quê?”. Como falar em igualdade se os homens são diferentes entre si, sejam por características internas, sejam externas. Nesse sentido, a heterogeneidade básica dos seres humanos seria a primeira contradição da ideia de igualdade. Daí ser errado, a seu ver, usar apenas a ideia de renda como sendo a principal variável focal para medir a desigualdade. Ou seja, deve-se levar em conta a multiplicidade de variáveis em cujos termos a igualdade pode ser julgada.
Sen diverge de Rawls, alegando que sua abordagem negligencia certas considerações que podem ser de grande importância para a avaliação substantiva da igualdade. Alega que como as pessoas são diferentes entre si, duas pessoas podem deter um mesmo pacote de bens primários, mas podem ter diferentes liberdades para buscar suas respectivas concepções do bem, quer estas concepções coincidam ou não. Por outro lado, Sen ressalta que Rawls teve o grande mérito de transformar o modo como se pensa a questão da justiça. Sua teoria teve o efeito de mudar os interesses por desigualdades apenas de resultados e realizações para aquelas de oportunidades e liberdades.
Na visão de Sen, querer a igualdade de alguma coisa, algo visto como importante, tem de ser estudado com cuidado, pois exigir a igualdade num espaço pode fazer com que se seja anti-igualitário em outro espaço. Uma das conseqüências da diversidade humana é que a igualdade num espaço tende a andar junto com a desigualdade noutro. Rendas iguais, por exemplo, não necessariamente significa igual sentimento de felicidade, pois nem todas possuem as mesmas potencialidades humanas (saúde, habilidade, disposição, etc). Fossem as pessoas todas iguais e a igualdade num espaço seria congruente com as igualdades em outros.
Outro aspecto de Sen consiste na sua defesa da liberdade como instrumento para a pessoa buscar bem-estar. A liberdade de escolha pode ter importância direta para a qualidade de vida e bem-estar de uma pessoa. Agir livremente e ser capaz de escolher são, nesta concepção, diretamente conducentes ao bem-estar. A análise do bem-estar de uma pessoa deve levar em conta, com isso, a liberdade que ela tem de buscar suas ações. Se alguém passa fome, por exemplo, deve-se saber se é provocado pela falta de recursos disponíveis para se alimentar ou se é questão de jejum por opção. O aspecto do bem-estar, nesse sentido, é especialmente importante em problemas com os de seguridade social, alívio da pobreza, remoção da desigualdade econômica acentuada e, em geral, na busca por justiça social. Definindo suas características, faz-se necessário buscá-las.
Sen acredita que as capacidades possuem um papel direto no bem-estar das pessoas, pensando a educação como uma das maneiras mais eficazes para se desenvolver as capacidades individuais. Assim, se estivéssemos oferecendo um emprego, e tivéssemos três candidatos, a sabe, um muito pobre, outro muito infeliz e outro com doença crônica, faríamos justiça capacitaria empregando aquele que tem uma doença crônica. Isso porque a partir dos recursos auferidos no trabalho o indivíduo terá aumentada a sua capacidade ligada à saúde.
Considerações Finais
Dessa forma, pensar o conceito de justiça a partir dessas concepções apresentadas ganha destaque quando atentamos para os principais representantes dessas perspectivas teóricas. Entre elas há aproximações e diferenciações, buscando cada qual pensar a justiça segundo uma lógica particular, sendo todas entretanto extremamente relevante para o pensamento global sobre o tema, e que muito pode contribuir para a evolução da ciência do Direito.
Bibliografia consultada
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WALZER, Michael. Spheres of Justice – A defense of pluralism and equality. New York: Basic Books, Inc., Publishers, 1983.