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O debate em torno do "auto de resistência": morte decorrente de intervenção policial

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Conclusão

Ao elevar a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado brasileiro (art. 1º,III, da CF), a Lei Maior impõe que a existência do Estado deve ser voltada e se justifica, acima de tudo, para a proteção da pessoa humana, e não o contrário. O Poder Público deve ser estruturado em derredor de seus cidadãos, a todos eles buscando proporcionar uma vida com padrões dignos, com qualidade, e com garantias contra intervenções indevidas ou abusivas, sobretudo do próprio Estado.

Não por outra razão, as técnicas operacionais tanto para o policiamento ostensivo e preventivo (realizado pelas polícias militares), quanto para a atividade repressiva de investigação criminal (incumbência das polícias civis e federal), devem buscar o máximo de eficiência com o mínimo de transtorno aos direitos de cada indivíduo.

Para tanto é preciso contínuo aperfeiçoamento das táticas para o uso progressivo da força, com emprego de armas menos letais, e reiterado treinamento dos agentes policiais, focado num trabalho de inteligência, legalidade e otimização no manejo das informações obtidas, sempre voltado à preservação da vida.

O presente ensaio pretendeu cuidar, em breves linhas, das implicações legais afetas à formalização de fatos envolvendo suposta resistência exercida por indivíduos contra as forças policiais no momento de suas abordagens e prisões, até então registrados na peça intitulada “auto de resistência”, que passa a cair em desuso por sua associação a condutas espúrias. 

Destacou-se também a importância da repressão e da responsabilização criminal de maus policiais, que forjam falsas resistências sob a real intenção de camuflar homicídios qualificados, e que exterminam vidas humanas de modo covarde e ao arrepio da ordem jurídica vigente.

Ainda que seja possível cogitar a documentação dos fatos por meio de outra designação, como “auto de morte decorrente de intervenção policial”, por exemplo, e não mais a do famigerado “auto de resistência”, atendendo da mesma maneira o destacado artigo 292, do CPP, a tendência atual é que o registro inicial seja realizado em boletim de ocorrência circunstanciado, intitulado nos moldes da primeira nomenclatura (“morte decorrente de intervenção policial”), o qual fará as vezes do referido “auto” exigido pelo diploma processual, com apuração por intermédio de inquérito policial instaurado via portaria.

Nesse boletim de ocorrência, serão descritos os fatos de modo pormenorizado, ocasião em que serão hauridas as oitivas dos policiais e pessoas envolvidas presentes, com requisição dos exames periciais cabíveis e esgotamento de todas as demais diligências investigativas imediatas, as quais serão incorporadas ao inquérito policial para o pleno e imparcial esclarecimento do que ocorreu.

Como se demonstrou, para que isso de fato se concretize, a polícia judiciária, responsável pela repressão criminal, assim como e em especial o delegado de polícia, presidente das investigações, precisam manter uma postura legalista, firme e isenta. O delegado de polícia, como agente político e representante da vontade estatal, exerce papel essencial no combate a quaisquer condutas que ultrapassem os limites legais, para tutelar a dignidade e a integridade física e moral de todo cidadão, mormente aquele submetido a uma investigação ou custodiado, angariando todos os elementos probatórios disponíveis e assim cuidando também para que os verdadeiros criminosos sejam encaminhados a Justiça e devidamente responsabilizados.


NOTAS

[1] O exame residuográfico busca revelar a presença de micropartículas de chumbo ou outras substâncias nas mãos das pessoas que fizeram ou suspeitas de fazer uso de arma de fogo.

[2] Conforme notícias veiculadas na mídia, como na revista juridica Consultor Jurídico, disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-mai-23/sete-policiais-acusados-matar-juiza-rio-preventiva-decretada>. Acesso em: 10 mar.2013.

[3] Art. 284.  Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso.

[4] Crime de Resistência: Art. 329. Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio: Pena - detenção, de dois meses a dois anos.


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Sobre o autor
Rafael Francisco Marcondes de Moraes

Mestre e Doutorando em Direito Processual Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Graduado pela Faculdade de Direito de Sorocaba. Delegado de Polícia do Estado de São Paulo. Professor concursado da Academia de Polícia de São Paulo (Acadepol). Autor de livros pela editora JusPodivm: www.editorajuspodivm.com.br/autores/detalhe/1018

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORAES, Rafael Francisco Marcondes. O debate em torno do "auto de resistência": morte decorrente de intervenção policial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3572, 12 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24119. Acesso em: 2 nov. 2024.

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