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A autonomia municipal e as limitações orçamentárias

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09/04/2013 às 16:14
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CONCLUSÃO

O estudo das questões que envolvem a municipalidade no bojo da federação possibilita o entendimento, ainda que parcial, da conjuntura político-institucional brasileira. Não é sem razão que se ouvem diversas entidades representativas dos municípios manifestarem-se cada vez com maior veemência contra o pacto federativo, nas condições que atualmente é estabelecido. Mais do que manifestações corporativas, os protestos que partem dos governos locais deveriam ser vistos como um sinal de alerta que põe em risco a estabilidade do próprio Estado.

Tudo isso porque há flagrante incongruência entre a configuração constitucional do Município e o exercício efetivo do poder no que tange à divisão de atribuições aos três entes federados. A União possui capacidade para atrair e concentrar recursos, distribuindo-os de maneira equívoca e insuficiente para os outros entes. Os Estados, em posição intermediária, agregam ao seu orçamento, além da arrecadação própria, os repasses da União. Destinam parte dessa arrecadação aos municípios, porém não abrem mão do montante maior. A fração menor do conjunto total da carga tributária destina-se ao tesouro municipal.

Esse quadro serve de base para se aferir o grau de autonomia que o município possui para gerir os seus destinos. Como ser autônomo com tamanha dependência dos outros entes federados? A pergunta orientou os estudos realizados na busca dos indícios de que a Constituição expressa a situação ideal, longe de ser concretizada plenamente na prática.

É evidente que houve um avanço significativo da conquista da Autonomia Municipal na ordem constitucional vigente. Ao se percorrer, mesmo que de forma rápida, a história do constitucionalismo pátrio, observou-se que o Município jamais teve o mesmo status. No princípio, serviu apenas de base para a extração de recursos naturais. Dessa situação, seguindo-se o modelo romano, os povoados foram organizados em torno dos interesses de arrecadar impostos pelo governo central. Faltou a orientação administrativa na base da formação da municipalidade brasileira. Um povo sem afirmação local, sujeito aos interesses de barões e coronéis, legítimos representantes do poder econômico, preocupados em garantir e ampliar suas riquezas. Assim, na origem, os Municípios padeceram por não possuírem força governamental para planejarem seus rumos.

Com o advento da República, pouco se alterou em termos de garantias de independência do governo local. Os prefeitos eram nomeados pelos governadores. Mesmo com a instituição do voto direto, a restrita parcela de eleitores votava em conformidade com os desejo do coronel mor, líder político regional. Essa cultura se propagou pelos séculos, de maneira que a autonomia, por mais que houvesse lutas por parte das lideranças locais, foi sempre concedida parcialmente. Também, o processo das conquistas municipais não foi regular. Há períodos de retrocessos constitucionais, notadamente, nos momentos em o Brasil foi governado por ditaduras, na era Vargas e no governo militar.

Por isso, ao estabelecer a autonomia política em seu sentido mais amplo, conferindo ao município a condição de ente federado, a Constituição atual consagrou enorme avanço para o municipalismo brasileiro. No entanto, ao arquitetar um sistema tributário totalmente centralizador, demonstrou que os resquícios dos tempos do coronelismo explícito não se resume aos livros de História. É bem verdade que a União deve transferir por força de lei os recursos que são devidos aos municípios independente da situação política local. Porém, trata-se apenas de uma pequena fatia que é vinculada.

Com mais de 50% da carga tributária disponível, já descontados os repasses legais aos Estados e aos Municípios, é claro que o Governo Federal possui um poder muito grande para negociar apoio político, liberando discricionariamente as verbas como melhor lhe convier. Isso não faz lembrar os primeiros anos da exploração portuguesa no Brasil. O Município, dessa forma, ainda não é visto como um reduto de sustentação política para os mandatários de Brasília?

Se é para ser autônomo, livre da ingerência administrativa dos outros entes federados, o Município deveria ser dotado de recursos orçamentários compatíveis com todas as suas competências institucionais. É o governo local que suporta, de imediato, todos os problemas de ordem pública. A população, que paga os tributos para sustentar os três entes federados, vive no Município. Tudo o que se faz em termos de Administração Pública, no país, envolve questões da municipalidade.

A União e o Estado, ao arrecadar e depois transferir os recursos, enredam-se numa teia burocrática que facilita os desvios e os desperdícios do dinheiro público. O Município deveria arrecadar mais impostos para contabilizar os recursos próprios. É o caso, por exemplo, do ITR (Imposto Territorial Rural) em que a União arrecada e repassa 50% aos municípios. Esse tributo deveria ficar em sua totalidade nos cofres municipais por ser uma fonte de arrecadação genuinamente local.

Sendo assim, evidenciou-se que, embora a intenção do constituinte fosse proporcionar ao Município a Autonomia, o fez parcialmente. Isso demonstra que há uma longa estrada a ser percorrida pelo municipalismo brasileiro, no sentido de convencer as autoridades federais e estaduais, por forças das carências municipais, de que é preciso o aperfeiçoamento da ordem constitucional vigente. Do contrário, o país continuará dividido, com um pé no futuro e outro no passado, sem definição clara de sua identidade: República Centralista, Monarquia Disfarçada ou, simplesmente, República da Eterna Simulação.


REFERÊNCIAS

AFONSO, José Roberto R. 5 ANOS DE LRF. Disponível em: <http://www.inesc.org.br/conteudo/agenda/MNP85g0iMFiERqmd919kwtAP01cDVK3x/050526-INESC-LRF5Anos1.pdf>. Acesso em: 20 out. 2006.

BRAZ, Petrônio. Direito Municipal na Constituição. 4. ed. São Paulo: Ed. LED – Editora de Direito, 2001.

BRASIL. Constituição Federal 1988. 20. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2003.

CASA CIVIL DO GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ. Prefeitos do Paraná. Disponível em: <http://www7.pr.gov.br/cau/consulta_orgao.php?codcargo=5&codigo=PREFEITOS_DO_PARANÁ>. Acesso em: 23 out. 2006.

CASTRO, José Nilo de. Direito Municipal Positivo. 1.ed. Belo Horizonte: Ed. Del Rey, 1991.

INSTITUTO BRASILEIRO DE ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL. Finanças Municipais. Disponível em: <http://www.ibam.org.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm>. Acesso em: 08 out. 2006.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍTICA. Pesquisa de Informações Municipais 2004.  Disponível em: <ww.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/perfilmunic/default.shtm>. Acesso em: 20 out. 2006.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍTICA. Pesquisa Nacional de Saneamento Básico. Disponível em: <ttp://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/pnsb/default.shtm>. Acesso em: 18 out. 2006.

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 1. ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2005.

MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2004.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 14. ed. atual. São Paulo: Ed. Malheiros Editores, 2006.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Malheiros Editores, 2004.

RAPETTI, José Alberto. Estrutura Administrativa de municípios. Disponível em: <http://nutep.adm.ufrgs.br/pesquisas/estruturadm.htm>. Acesso em: 28 out. 2006.

RIBEIRO, Renato Jorge Brown et al. Responsabilidade fiscal: pessoal, renúncia de receita,  divida e controle. 1.ed. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2002.

RECEITA FEDERAL. Estudos tributários 15: Carga Tributária no Brasil 2005. Disponível em <http://receita.fazenda.gov.br/publico/estudotributário/cargafiscal/CTB2005.pdf.>. Acesso em: 16 out. 2006.

SILVA, Edson Jacinto da. O Município na Lei de Responsabilidade Fiscal. 1. ed. São Paulo: LED – Ed. de Direito, 2001.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.  23. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Malheiros Editores, 2004.


ANEXO A

Pesquisa Nacional de Saneamento Básico

 

Tabela 46 - Distritos, total e sem rede coletora de esgoto, por principal solução alternativa, segundo as Grandes Regiões, Unidades da Federação, Regiões Metropolitanas e Municípios das Capitais - 2000

Grandes Regiões, Unidades da Federação, Regiões Metropolitanas e Municípios das Capitais

Total de distritos

Distritos sem rede coletora de esgoto

Total

Principal solução alternativa

Fossas sépticas e sumidouros

Fossas secas

Valas abertas

Lançamento em cursos d'água

Outros

Sem declaração

Brasil

9 848

5 751

2 776

2 431

197

143

185

19

Norte

607

572

182

284

85

14

4

3

Rondônia

76

71

60

11

-

-

-

-

Porto Velho

12

11

11

-

-

-

-

-

Acre

22

19

12

2

-

1

2

2

Rio Branco

1

-

-

-

-

-

-

-

Amazonas

81

80

-

-

80

-

-

-

Manaus

1

-

-

-

-

-

-

-

Roraima

15

13

2

11

-

-

-

-

Boa Vista

1

-

-

-

-

-

-

-

Pará

232

217

57

146

3

9

2

-

Belém

8

4

4

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de Belém

13

8

8

-

-

-

-

-

Amapá

30

25

-

21

-

4

-

-

Macapá

5

4

-

4

-

-

-

-

Tocantins

151

147

51

93

2

-

-

1

Palmas

3

2

-

2

-

-

-

-

Nordeste

3 084

2 151

1 026

865

94

53

113

-

Maranhão

244

238

179

39

5

5

10

-

São Luís

1

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana Grande São Luís

5

4

2

2

-

-

-

-

Piauí

221

218

201

10

3

3

1

-

Teresina

1

-

-

-

-

-

-

-

Ceará

760

652

264

251

51

8

78

-

Fortaleza

5

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de Fortaleza

73

61

14

47

-

-

-

-

Rio Grande do Norte

186

133

75

21

5

17

15

-

Natal

1

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de Natal

8

3

3

-

-

-

-

-

Paraíba

283

152

6

146

-

-

-

-

João Pessoa

1

-

-

-

-

-

-

-

Pernambuco

381

121

32

87

-

2

-

-

Recife

1

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de Recife

24

10

6

4

-

-

-

-

Alagoas

114

74

19

54

1

-

-

-

Maceió

1

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de Maceió

11

5

-

5

-

-

-

-

Sergipe

83

33

20

6

4

3

-

-

Aracaju

1

-

-

-

-

-

-

-

Bahia

812

530

230

251

25

15

9

-

Salvador

1

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de Salvador

17

8

7

-

1

-

-

-

Sudeste

3 115

571

146

312

10

52

40

11

Minas Gerais

1 568

354

57

260

3

26

4

4

Belo Horizonte

3

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de Belo Horizonte

65

12

4

8

-

-

-

-

Colar Metropolitano da Região Metropolitana de Belo Horizonte

32

10

3

7

-

-

-

-

Região Metropolitana Vale do Aço

7

-

-

-

-

-

-

-

Colar Metropolitano da Região Metropolitana Vale do Aço

39

4

-

4

-

-

-

-

Espírito Santo

249

78

27

9

4

17

15

6

Vitória

2

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana Grande Vitória

19

8

-

2

4

-

-

2

Rio de Janeiro

276

65

37

16

3

9

-

-

Rio de Janeiro

1

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana do Rio de Janeiro

44

12

9

-

3

-

-

-

São Paulo

1 022

74

25

27

-

-

21

1

São Paulo

96

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de São Paulo

162

2

-

-

-

-

2

-

Região Metropolitana Baixada Santista

11

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de Campinas

24

-

-

-

-

-

-

-

Sul

2 342

1 841

1 234

555

8

24

17

3

Paraná

748

592

238

343

1

1

8

1

Curitiba

1

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de Curitiba

46

32

25

6

1

-

-

-

Região Metropolitana de Londrina

18

13

8

3

-

-

2

-

Região Metropolitana de Maringá

14

8

-

8

-

-

-

-

Santa Catarina

447

351

298

20

4

18

9

2

Florianópolis

12

9

9

-

-

-

-

-

Núcleo Metropolitano da Região Metropolitana de Florianópolis

25

17

17

-

-

-

-

-

Área de Expansão Metropolitana da Região Metropolitana de Florianópolis

24

18

13

-

-

5

-

-

Núcleo Metropolitano da Região Metropolitana do Vale do Itajaí

6

-

-

-

-

-

-

-

Área de Expansão Metropolitana da Região Metropolitana do Vale do Itajaí

14

6

2

2

-

-

-

2

Núcleo Metropolitano da Região Metropolitana Norte/Nordeste Catarinense

4

2

1

-

1

-

-

-

Área de Expansão Metropolitana da Região Metropolitana Norte/Nordeste Catarinense

27

23

23

-

-

-

-

-

Rio Grande do Sul

1 147

898

698

192

3

5

-

-

Porto Alegre

1

-

-

-

-

-

-

-

Região Metropolitana de Porto Alegre

59

27

24

3

-

-

-

-

Centro-Oeste

700

616

188

415

-

-

11

2

Mato Grosso do Sul

163

139

32

99

-

-

8

-

Campo Grande

3

2

-

2

-

-

-

-

Mato Grosso

227

207

109

96

-

-

2

-

Cuiabá

4

2

-

2

-

-

-

-

Goiás

309

270

47

220

-

-

1

2

Goiânia

2

1

-

1

-

-

-

-

Região Metropolitana de Goiânia

13

9

3

6

-

-

-

-

Distrito Federal

1

-

-

-

-

-

-

-

Brasília

1

-

-

-

-

-

-

-

Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno

35

28

-

27

-

-

-

1

 
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Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de População e Indicadores Sociais, Pesquisa Nacional de  Saneamento Básico 2000.

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Sobre o autor
Paulo Cezar Basilio

Professor QPM - Paraná. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BASILIO, Paulo Cezar. A autonomia municipal e as limitações orçamentárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3569, 9 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24154. Acesso em: 23 dez. 2024.

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