As empresas importadoras de produtos estrangeiros estão obrigadas ao recolhimento das Contribuições PIS/PASEP-importação e COFINS-importação. Ocorre que, de acordo com o artigo 7º, I, da Lei 10.865/2004, a base de calculo destas contribuições é constituída pelo valor aduaneiro da mercadoria importada, assim entendido o valor que servir de base para o cálculo do imposto de importação, acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições.
Entretanto, a inclusão do valor do ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e o valor das próprias contribuições na base de cálculo da PIS/COFINS incidentes na importação é flagrantemente inconstitucional, visto que o conceito de valor aduaneiro utilizado pela referida Lei ampliou o conceito utilizado no Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT.
O“Acordo sobre a Implementação do Artigo VII do acordo Geral sobre Tarifas e comércio 1994 – GATT”, introduzido no ordenamento jurídico nacional pelo Decreto Presidencial nº. 1.355/94, já definia no seu artigo 1º, que “o valor aduaneiro de mercadorias importadas será o valor de transação, isto é, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias, em uma venda para exportação para o país de importação”.
Como a Emenda à Constituição nº. 33, que acresceu o inciso III ao artigo 149 da Constituição Federal, entrou em vigor no nosso ordenamento jurídico somente no ano de 2001, resta claro que o conceito de ‘valor aduaneiro’ adotado pela Constituição Federal é o conceito veiculado no Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT
Por sua vez, tanto o antigo (Decreto nº. 4.543/2002) quanto o atual Regulamento Aduaneiro (Decreto 6759/2009), determinam veementemente que o conceito de ‘valor aduaneiro’ é aquele estabelecido nas normas do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio - GATT 1994.
Foi com base nestas premissas que o Supremo Tribunal Federal reconheceu que o legislador, ao incluir o valor doICMS e das próprias contribuições na base de cálculo do PIS e da COFINS incidentes sobre a importação, alterou um conceito de direito privado já consolidado no ordenamento jurídico, alargando de forma inconstitucional a base de cálculo das citadas contribuições social.
Como mencionado, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 559.937/RS, declarou inconstitucional o acréscimo do ICMS-importação juntamente com o valor das próprias contribuições na base de cálculo da PIS/COFINS-importação.
Nesse sentido, transcreve-se abaixo trecho do voto-vista proferido pelo Relator MinistroDias Tofolli, in verbis:
“Cuida-se de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região mediante o qual se considerou inconstitucional o art. 7º, inciso I, da Lei 10.865/04 na parte em que se define a base de cálculo do PIS e da COFINS incidentes sobre a importação como sendo “o valor que servir ou que serviria de base para o cálculo do imposto de importação, acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições, na hipótese do inciso I do caput do art. 3º desta Lei”.
(...)
Portanto, é perfeitamente constitucional a instituição da COFINS-Importação e do PIS/PASEP-Importação mediante lei ordinária, pois o art. 195, § 4º, da Constituição Federal, que subordina a instituição de novas fontes de custeio à edição de lei complementar (art. 154, I, CF) está a se referir às hipóteses de novas contribuições, isto é, àquelas que não estão previstas no texto constitucional vigente, o que não ocorre com as contribuições em apreço, as quais foram, prévia e expressamente, previstas nos já citados arts. 149, § 2º, II; e 194, IV, da Carta Magna.
(...)
Sobre o conceito de valor aduaneiro, registro que, quando da edição da já citada EC nº 33/01, que, combinada com a EC nº 42/03, passaram a permitir a incidência do PIS/COFINS sobre a importação, o referido conceito já estava definido no art. 2º do Decreto-Lei nº 37/66, que dispõe sobre a base de cálculo do imposto de importação e remete, nos casos de alíquota ad valorem (inciso II), ao conceito de valor aduaneiro “apurado segundo as normas do art. 7º do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT”.
(...)
Portanto, na ausência de estipulação expressa do conteúdo semântico da expressão ‘valor aduaneiro’ pela EC nº 42/03, há de se concluir que o sentido pressuposto, e incorporado pela Constituição Federal, quando da utilização do termo para conferir competência legislativa tributária à União, remete àquele já praticado no discurso jurídico-positivo preexistente à sua edição.
Nessa linha, a simples leitura das normas contidas no art. 7º da Lei nº 10.865/04, objeto de questionamento, já permite constatar que a base de cálculo das contribuições sociais sobre a importação de bens e serviços extrapolou o aspecto quantitativo da incidência delimitado na Constituição Federal, ao acrescer ao valor aduaneiro o valor dos tributos incidentes, inclusive o das próprias contribuições. Importa deixar claro, na esteira do que já exposto, que a Lei nº 10.865/04 não alterou ou inovou o conceito de ‘valor aduaneiro’, base de cálculo do Imposto de Importação, tal como pactuado no Acordo de Valoração Aduaneira, de modo a abranger, para fins de apuração das contribuições para o PIS/PASEP-Importação e COFINS-importação, outras grandezas nele não contidas. Como bem ressaltou a Ilustre Relatora, “o que fez, sim, foi desconsiderar a imposição constitucional de que as contribuições sociais sobre a importação, quando tenham alíquota ad valorem, sejam calculadas com base no valor aduaneiro. Extrapolando a norma do art. 149, § 2º, III, a, da Constituição Federal, determinou que as contribuições fossem calculadas não apenas sobre o valor aduaneiro, mas, também, sobre o valor do ICMS-Importação e sobre o valor das próprias contribuições instituídas”.
(...)
Ante o exposto, reconhecendo a inconstitucionalidade da parte do art. 7º, inciso I, da Lei nº 10.865/04 que acresce à base de cálculo da denominada PIS/COFINS-Importação o valor do ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e o das próprias contribuições, acompanho a Ilustre Relatora, negando provimento ao recurso extraordinário.
RE 559.937/RS, Relator: Min. Ellen Gracie, Data de Julgamento: 20/03/2013, Data de Publicação: D.J. 04/04/2013)
Neste ponto, resta claro e evidente que a Carta Magna utilizou termos técnicos inequívocos, circunscrevendo a tais bases a respectiva competência tributária, não cabendo à lei que instituiu os referidos tributos ampliar o conceito de ‘valor aduaneiro’ utilizado na Constituição Federal (Art. 149, III, “a”), para acrescer à base de cálculo dessas contribuições o valor do ICMS-importação e das próprias contribuições (cálculo por dentro).
O conceito de ‘valor aduaneiro’ utilizado pela Constituição Federal no artigo 149, III, “a”, é aquele estabelecido nas normas do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio - GATT 1994. Portanto, a ampliação do conceito de valor aduaneiro para além do estabelecido no referido acordo internacional é inconstitucional, conforme assentado pelo STF no julgado acima mencionado.
Por outro lado, cumpre ressaltar ainda que é ilegal o acréscimo na base de cálculo dessas contribuições o valor do Imposto de Importação (II) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), conforme determinado pela Instrução Normativa 572/2005, haja vista a falta de previsão legal para tal acréscimo.
É que, conforme consta do artigo 7º, I, da Lei 10.865/2004, a base de cálculo destas contribuições é constituída pelo valor aduaneiro da mercadoria importada, assim entendido o valor que servir ou que serviria de base para o cálculo do imposto de importação.
A base de cálculo para o imposto de importação é determinada no artigo 75 do Regulamento Aduaneiro. De acordo com o Regulamento, a base de cálculo do Imposto de Importação é: a) quando a alíquota for ad valorem, o valor aduaneiro apurado segundo as normas do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio - GATT 1994; e, b) quando a alíquota for específica, a quantidade de mercadoria expressa na unidade de medida estabelecida.
Da simples leitura dos artigos acima mencionados, salta aos olhos a ilegalidade da inclusão na base de cálculo destas contribuições o valor do Imposto de Importação e do Imposto Sobre Produtos Industrializados. Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região tem se manifestado, in verbis:
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÕES AO PIS E À COFINS. IMPORTAÇÃO. EXIGIBILIDADE. BASE DE CÁLCULO. VALOR ADUANEIRO. ACRÉSCIMOS CONFERIDOS PELA LEI Nº 10.865/2004. IMPOSSIBILIDADE. IN/SRF Nº 572/2005. 1. Vindo o alargamento das hipótese de incidência das exações em comento talhado através de emenda constitucional (EC 42/2003), não há alegar o contribuinte a ofensa ao § 4º, do artigo 195, da CF. E com efeito, quando a regra constitucional menciona a possibilidade de "manutenção" e "expansão" da seguridade social, via instituição de novas fontes de receita, assim o faz tendo em mente acaso se fizessem tais inovações no plano legislativo ordinário, o que não foi o caso, posto que fixada a regra matriz no próprio texto magno. 2. A e. Corte Especial deste Tribunal, em julgamento da Argüição de Inconstitucionalidade na AC 2004.72.05.003314-1, em 22.02.2007 (DJU: 14.03.2007), sob a relatoria do eminente Desembargador Federal Antônio Albino Ramos de Oliveira, rematou a controvérsia relativa à apuração da base de cálculo do PIS e da COFINS sobre importações de bens ou serviços, declarando a inconstitucionalidade da expressão "acrescido do valor do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições" trazida na parte final do inciso I do artigo 7º da Lei nº 10.865/04, por ter ultrapassado os limites do conceito de valor aduaneiro, tal como disciplinado nos Decreto-Lei nº 37/66 e Decreto 4.543/2002, em afronta ao disposto no artigo 149, § 2º, III, a, da Constituição Federal. 3. Deve ser afastada a inclusão dos valores de II e IPI na base de incidência do PIS e da COFINS sobre importação trazida pela IN/SRF nº 572/2005, por ausência de previsão legal que autorizasse tal providência. 4. Apelação e remessa oficial desprovidas. (TRF4, APELREEX 0006469-17.2009.404.7108, Primeira Turma, Relator Eduardo Vandré Oliveira Lema Garcia, D.E. 20/10/2010) (grifou-se)
Nessa vereda, resta clara a inconstitucionalidade e ilegalidade da inclusão na base de cálculo das Contribuições PIS/PASEP-importação e COFINS-importação, o valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições, bem como o valor do Imposto de Importação (II) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), conforme determinado pela Instrução Normativa 572/2005.
DA MODULAÇÃO DOS EFEITOS
Conforme veiculado na impressa nacional, a União Federal pretende a modulação dos efeitos da decisão proferida pelo STF, nos termos do artigo 27 da Lei 9.868/1999, haja vista que, segundo a União Federal, a decisão gerará um impacto de cerca de R$ 34 bilhões de reais aos cofres públicos.
Com relação à modulação dos efeitos da decisão, nosso ordenamento jurídico adota a teoria da nulidade dos atos declarados inconstitucionais. A par disso, quando declarada inconstitucional Lei pelo Supremo Tribunal Federal, a declaração de inconstitucionalidade retroagirá seus efeitos desde a data da publicação do ato, isto é, a decisão produz efeitos extunc.
Entretanto, desde a edição da Lei 9.868/1999, é possível a modulação dos efeitos da decisão para determinar que, apesar declarada inconstitucional a Lei, a decisão gera efeitos somente a partir da data da publicação da decisão (efeitos ex nunc) ou a partir de uma data futura para a qual a decisão passará a valer (efeitos profuturo).
Na prática, caso haja a modulação dos efeitos da decisão pelo STF, os contribuintes não poderão pleitear a restituição dos valores pagos indevidamente nos últimos 5 (cinco) anos, podendo requerer, apenas, que a decisão tenha efeitos para operações futuras.
Contudo, aqueles que se insurgirem contra o ato antes da data de publicação a decisão de modulação, tem o direito à restituição dos valores pagos indevidamente.
Como a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal se deu no âmbito do controle difuso-concreto, somente os contribuintes que ingressarem com ação perante o Poder Judiciário terão direito à extirpação dos valores indevidos.