Notas
[1] PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. OFERTA. ANÚNCIO DE VEÍCULO. VALOR DO FRETE. IMPUTAÇÃO DE PUBLICIDADE ENGANOSA POR OMISSÃO. ARTS. 6º, 31 E 37 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRINCÍPIOS DA TRANSPARÊNCIA, BOA-FÉ OBJETIVA, SOLIDARIEDADE, VULNERABILIDADE E CONCORRÊNCIA LEAL.
DEVER DE OSTENSIVIDADE. CAVEAT EMPTOR. INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA NÃO CARACTERIZADA.
1. É autoaplicável o art. 57 do Código de Defesa do Consumidor - CDC, não dependendo, consequentemente, de regulamentação. Nada impede, no entanto, que, por decreto, a União estabeleça critérios uniformes, de âmbito nacional, para sua utilização harmônica em todos os Estados da federação, procedimento que disciplina e limita o poder de polícia, de modo a fortalecer a garantia do due process a que faz jus o autuado.
2. Não se pode, prima facie, impugnar de ilegalidade portaria do Procon estadual que, na linha dos parâmetros gerais fixados no CDC e no decreto federal, classifica as condutas censuráveis administrativamente e explicita fatores para imposição de sanções, visando a ampliar a previsibilidade da conduta estatal. Tais normas reforçam a segurança jurídica ao estatuírem padrões claros para o exercício do poder de polícia, exigência dos princípios da impessoalidade e da publicidade. Ao fazê-lo, encurtam, na medida do possível e do razoável, a discricionariedade administrativa e o componente subjetivo, errático com frequência, da atividade punitiva da autoridade.
3. Um dos direitos básicos do consumidor, talvez o mais elementar de todos, e daí a sua expressa previsão no art. 5o, XIV, da Constituição de 1988, é "a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço" (art.
6º, III, do CDC). Nele se encontra, sem exagero, um dos baluartes do microssistema e da própria sociedade pós-moderna, ambiente no qual também se insere a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva (CDC, arts. 6º, IV, e 37).
4. Derivação próxima ou direta dos princípios da transparência, da confiança e da boa-fé objetiva, e, remota dos princípios da solidariedade e da vulnerabilidade do consumidor, bem como do princípio da concorrência leal, o dever de informação adequada incide nas fases pré-contratual, contratual e pós-contratual, e vincula tanto o fornecedor privado como o fornecedor público.
5. Por expressa disposição legal, só respeitam o princípio da transparência e da boa-fé objetiva, em sua plenitude, as informações que sejam "corretas, claras, precisas, ostensivas" e que indiquem, nessas mesmas condições, as "características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados" do produto ou serviço, objeto da relação jurídica de consumo (art. 31 do CDC, grifo acrescentado).
6. Exigidas literalmente pelo art. 31 do CDC, informações sobre preço, condições de pagamento e crédito são das mais relevantes e decisivas na opção de compra do consumidor e, por óbvio, afetam diretamente a integridade e a retidão da relação jurídica de consumo. Logo, em tese, o tipo de fonte e localização de restrições, condicionantes e exceções a esses dados devem observar o mesmo tamanho e padrão de letra, inserção espacial e destaque, sob pena de violação do dever de ostensividade.
7. Rodapé ou lateral de página não são locais adequados para alertar o consumidor, e, tais quais letras diminutas, são incompatíveis com os princípios da transparência e da boa-fé objetiva, tanto mais se a advertência disser respeito à informação central na peça publicitária e a que se deu realce no corpo principal do anúncio, expediente astucioso que caracterizará publicidade enganosa por omissão, nos termos do art. 37, §§ 1º e 3º, do CDC, por subtração sagaz, mas nem por isso menos danosa e condenável, de dado essencial do produto ou serviço.
8. Pretender que o consumidor se transforme em leitor malabarista (apto a ler, como se fosse natural e usual, a margem ou borda vertical de página) e ouvinte ou telespectador superdotado (capaz de apreender e entender, nas transmissões de rádio ou televisão, em fração de segundos, advertências ininteligíveis e em passo desembestado, ou, ainda, amontoado de letrinhas ao pé de página de publicação ou quadro televisivo) afronta não só o texto inequívoco e o espírito do CDC, como agride o próprio senso comum, sem falar que converte o dever de informar em dever de informar-se, ressuscitando, ilegitimamente e contra legem, a arcaica e renegada máxima do caveat emptor (= o consumidor que se cuide).
9. A configuração da publicidade enganosa, para fins civis, não exige a intenção (dolo) de iludir, disfarçar ou tapear, nem mesmo culpa, pois se está em terreno no qual imperam juízos alicerçados no princípio da boa-fé objetiva.
10. Na hipótese particular dos autos, contudo, a jurisprudência do STJ, considerando as peculiaridades do caso concreto sob análise, é no sentido de que o anúncio publicitário consignou, minimamente, que o valor do frete não estava incluído no preço ofertado, daí por que inexiste o ilícito administrativo de publicidade enganosa ou abusiva. Desnecessário prevenir que tal conclusão soluciona o litígio apenas e tão somente no âmbito do Direito Administrativo Sancionador, isto é, de punição administrativa imposta na raiz do poder de polícia, sem que se possa, por conseguinte, fazer repercuti-la ou aproveitá-la em eventuais processos reparatórios civis, nos quais a análise da matéria ocorre à luz de outros regimes e princípios.
11. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no AgRg no REsp 1261824/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/02/2012, DJe 09/05/2013)
[2] Claudia Lima Marques aponta a existência de uma vulnerabilidade informacional, e nesse sentido, explica que se trata da “vulnerabilidade básica do consumidor, intrínseca e característica deste papel na sociedade. Hoje merece ela uma menção especial, pois na sociedade atual são de grande importância a aparência, a confiança, a comunicação e a informação. Nosso mundo de consumo é cada vez mais visual, rápido e de risco, daí a importância da informação”. (MARQUES, Cláudia Lima. BENJAMIN, Antônio Herman V. BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 94).
[3] Conforme se pode ver no Resp 200702835038, Nancy Andrighi, STJ - terceira turma, 13/10/2010.
[4] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
(...)
IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
[5] Daí porque o erro grosseiro não vincula, ante o princípio da boa fé objetiva, que deve ser exigido de ambas as partes.
[6] ADMINISTRATIVO. CONSUMIDOR. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. VÍCIO DE QUANTIDADE. VENDA DE REFRIGERANTE EM VOLUME MENOR QUE O HABITUAL.
REDUÇÃO DE CONTEÚDO INFORMADA NA PARTE INFERIOR DO RÓTULO E EM LETRAS REDUZIDAS. INOBSERVÂNCIA DO DEVER DE INFORMAÇÃO. DEVER POSITIVO DO FORNECEDOR DE INFORMAR. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONFIANÇA. PRODUTO ANTIGO NO MERCADO. FRUSTRAÇÃO DAS EXPECTATIVAS LEGÍTIMAS DO CONSUMIDOR. MULTA APLICADA PELO PROCON. POSSIBILIDADE.
ÓRGÃO DETENTOR DE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA DE ORDENAÇÃO.
PROPORCIONALIDADE DA MULTA ADMINISTRATIVA. SÚMULA 7/STJ. ANÁLISE DE LEI LOCAL, PORTARIA E INSTRUÇÃO NORMATIVA. AUSÊNCIA DE NATUREZA DE LEI FEDERAL. SÚMULA 280/STF. DIVERGÊNCIA NÃO DEMONSTRADA. REDUÇÃO DO "QUANTUM" FIXADO A TÍTULO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 7/STJ.
1. No caso, o Procon estadual instaurou processo administrativo contra a recorrente pela prática da infração às relações de consumo conhecida como "maquiagem de produto" e "aumento disfarçado de preços", por alterar quantitativamente o conteúdo dos refrigerantes "Coca Cola", "Fanta", "Sprite" e "Kuat" de 600 ml para 500 ml, sem informar clara e precisamente aos consumidores, porquanto a informação foi aposta na parte inferior do rótulo e em letras reduzidas. Na ação anulatória ajuizada pela recorrente, o Tribunal de origem, em apelação, confirmou a improcedência do pedido de afastamento da multa administrativa, atualizada para R$ 459.434,97, e majorou os honorários advocatícios para R$ 25.000,00.
2. Hipótese, no cível, de responsabilidade objetiva em que o fornecedor (lato sensu) responde solidariamente pelo vício de quantidade do produto.
3. O direito à informação, garantia fundamental da pessoa humana expressa no art. 5°, inciso XIV, da Constituição Federal, é gênero do qual é espécie também previsto no Código de Defesa do Consumidor.
4. A Lei n. 8.078/1990 traz, entre os direitos básicos do consumidor, a "informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentam" (art. 6º, inciso III).
5. Consoante o Código de Defesa do Consumidor, "a oferta e a apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores" (art. 31), sendo vedada a publicidade enganosa, "inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços" (art. 37).
6. O dever de informação positiva do fornecedor tem importância direta no surgimento e na manutenção da confiança por parte do consumidor. A informação deficiente frustra as legítimas expectativas do consumidor, maculando sua confiança.
7. A sanção administrativa aplicada pelo Procon reveste-se de legitimidade, em virtude de seu poder de polícia (atividade administrativa de ordenação) para cominar multas relacionadas à transgressão da Lei n. 8.078/1990, esbarrando o reexame da proporcionalidade da pena fixada no enunciado da Súmula 7/STJ.
8. Leis locais, portarias e instruções normativas refogem ao conceito de lei federal, não podendo ser analisadas por esta Corte, ante o óbice, por analogia, da Súmula 280/STF.
9. Os honorários advocatícios fixados pela instância ordinária somente podem ser revistos em recurso especial se o "quantum" se revelar exorbitante, em respeito ao disposto na Súmula 7/STJ.
Recurso especial a que se nega provimento.
(REsp 1364915/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/05/2013, DJe 24/05/2013)
[7] Art. 36. A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal.
[8] CDC - Art. 37 (...) § 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.
[9] Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios. (...) V - defesa do consumidor;
[10] Art. 5º. (...) XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;
[11] Nesse sentido, explica Renato Opice Blum e Caio César Carvalho Lima que: “Convém esclarecer que a contratação eletrônica não é apenas aquela processada pela internet, mas também por qualquer outra forma que se utilize de meios eletrônicos, como telefone, terminais de autoatendimento ou até mesmo aquisições realizadas pela televisão, como compra de filmes, por exemplo”. (BLUM, Renato Opice; LIMA, Caio César Carvalho. Novas Regras Tornam Comércio Eletrônico mais seguro. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-mar-30/novas-exigencias-trazem-seguranca-consumidor-eletronico>, acesso em 13 maio 2013).
[12] Durante un largo período de la historia del Derecho se legisló sobre tipos de contratos, de modo que sólo los que estaban nombrados o regulados tenían acciona En tiempos más recientes se admitió la posibilidad de que fuera la autonomía prívada la fuente de las obligaciones, sin necesidad de ajustarse a los tipos preestablecidos en la ley, surgiendo así el fenómeno de la atipicidad'. A posteriori, admitiéndose la costumbre como fuente de Derecho, se llegó a la conclusión de que la reiteración de conductas pueden crear un tipo de contrato que no es establecido por la ley sino por la costumbre, dando origen a la tipicidad social. (LORENZETTI, Ricardo Luiz. Tratado De Los Contratos – Tomo I . Buenos Aires: Rubinzal-Culzoni, pp. 19 e 20).
[13] Art. 1º Este Decreto regulamenta a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, para dispor sobre a contratação no comércio eletrônico, abrangendo os seguintes aspectos:
I - informações claras a respeito do produto, serviço e do fornecedor;
II - atendimento facilitado ao consumidor; e
III - respeito ao direito de arrependimento.
[14] Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.
Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.
[15] Assim, por exemplo, os artigos 46, 47, 51, 52 e 53 do Código de Defesa do Consumidor.
[16] RABELO, Cesar Leandro de Almeidaa; PRATA, Desiree Lorraine. A Proteção do Consumidor Brasileiro no Comércio Eletrônico Internacional. Disponível em:< http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9965>, acesso em 02 jul. 2013.
[17] BLUM, Renato Ópice. Mais segurança para o consumidor eletrônico. Disponível em: <http://www.opiceblum.com.br/lang-pt/02_artigos_a001.html?ID_ARTIGO=125>. Acesso em 02 jul 2013.
[18] Art. 3º Os sítios eletrônicos ou demais meios eletrônicos utilizados para ofertas de compras coletivas ou modalidades análogas de contratação deverão conter, além das informações previstas no art. 2º, as seguintes:
I - quantidade mínima de consumidores para a efetivação do contrato;
II - prazo para utilização da oferta pelo consumidor; e
III - identificação do fornecedor responsável pelo sítio eletrônico e do fornecedor do produto ou serviço ofertado, nos termos dos incisos I e II do art. 2º.
[19] Art. 7º A inobservância das condutas descritas neste Decreto ensejará aplicação das sanções previstas no art. 56 da Lei no 8.078, de 1990.
[20] BLUM, Renato Ópice. Mais segurança para o consumidor eletrônico. Disponível em: <http://www.opiceblum.com.br/lang-pt/02_artigos_a001.html?ID_ARTIGO=125>. Acesso em 02 jul 2013.
[21] Explica Renato Ópice Blum nesse sentido que: “É de se citar, por fim, que empresas que buscam a adequação em termos de segurança da informação pelas normas da ABNT (27001 e 27002, por exemplo), precisam estar em conformidade com a legislação em vigor e, portanto, devem cumprir meticulosamente as determinações do decreto comentado” (BLUM, Renato Ópice. Mais segurança para o consumidor eletrônico. Disponível em: <http://www.opiceblum.com.br/lang-pt/02_artigos_a001.html?ID_ARTIGO=125>. Acesso em 02 jul 2013).