4 DA ESTABILIDADE DA GESTANTE NO CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO NA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT)
4.1 ANTIGO ENTENDIMENTO
O antigo entendimento sobre a estabilidade da gestante no contrato por prazo determinado do TST era que, sendo ele até mesmo de experiência, não gerava nenhuma estabilidade provisória conforme preceituava a antiga Súmula 244, III, do TST :
Não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa.
Os motivos eram um tanto quanto óbvios, pois, já que havia pacto no momento da contratação acerca do tempo, ambas as partes já sabiam o momento que iria encerrar este contrato.
A vasta e ampla doutrina trabalhista uniu-se ao TST e concordou com a antiga súmula. Francisco Ferreira e Jouberto Cavalcante[8] prelecionam: ‘’A estabilidade não se coaduna com o contrato por prazo determinado. A predeterminação faz com que as partes tenham ciência do termo final da contratação.’’
Da mesma forma entende Sérgio Pinto Martins[9]:
No contrato de trabalho por tempo determinado as partes sabem desde o início quando o pacto irá terminar. Assim, se a empregada ficar grávida no curso do ajuste laboral, será indevida a garantia de emprego, pois não está havendo dispensa arbitrária ou sem justa causa. Há apensas o decurso do prazo do pacto de trabalho celebrado entre as partes. Situações que ocorram no curso do pacto laboral de prazo determinado não podem ser opostas para modificar a sua cessação, salvo se houver ajustes entre as partes.
Não há direito à garantia de emprego à gestante no contrato de trabalho por tempo determinado, inclusive no contrato de experiência (S. 244,III, TST), de safra, de obra certa.
Portanto, era pacífico o entendimento que a empregada contratada grávida, ou ficando grávida no curso destes contratos, não teria direito à estabilidade.
Além do mais, como já visto, o ADCT 10,II,’’b’’ é claro ao mencionar que a dispensa da gestante é vedada de forma arbitrária ou sem justa causa. Assim, quando acaba o contrato de trabalho determinado, por exemplo, o de experiência, não há que se falar em forma arbitrária ou sem justo motivo para esta extinção, visto que simplesmente acabou o contrato, pois ele preleciona um prazo certo, não havendo nenhum motivo para continuar. Vejamos julgado histórico neste sentido:
CONTRATO DE EXPERIÊNCIA - GESTANTE - Dispensa Arbitrária - O art. 10, II, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias adotou o princípio da impossibilidade da dispensa arbitrária ou sem justa causa. Portanto, na hipótese do contrato de experiência não se identifica dispensa arbitrária nem sem justa causa, já que sequer se dá a dispensa em si, havendo apenas o término da relação de trabalho da gestante porque atingido o termo final do contrato de experiência, não havendo que se falar em estabilidade constitucional provisória.(RR - 304713-32.1996.5.09.5555 , Relator Ministro: Galba Velloso, Data de Julgamento: 17/03/1999, 4ª Turma, Data de Publicação: 23/04/1999)
Sendo assim, o TST era pacífico, juntamente com a doutrina, em conceder a estabilidade à gestante somente no contrato por prazo indeterminado.
4.2 DIVERGÊNCIA ENTRE TRIBUNAIS
O Supremo Tribunal Federal em 2005 discutiu pela primeira vez o tema e o entendimento foi o de que, se a gestante tivesse o filho ainda no curso do contrato por prazo determinado, visto que iria começar a percepção da licença maternidade de 120 dias ainda no contrato, teria direito à estabilidade, tendo como base a Constituição Federal a qual protege o nascituro.
No julgado do Recurso Extraordinário nº 287.905-3 de Santa Catarina (05/10/2004- Relatora Min. Ellen Greice, 2ª Turma do STF), a empregada temporária para o cargo de professora fora contratada em 1998 pelo Estado de Santa Catarina e renovara seu contrato a cada ano. Porém, após dois anos de seguidas renovações contratuais, o Estado não concedeu a renovação visto que ela estava grávida. Nos votos, os ministros deixaram bem claro que o direito à estabilidade bem como a licença maternidade é para resguardar o nascituro, vejamos:
Com efeito, o E. Tribunal Superior do Trabalho, demonstrando possuir plena compreensão do alto significado dessa relevante conquista da mulher trabalhadora, tem enfatizado, a respeito do alcance da garantia constitucional da estabilidade provisória (ADCT, art. 10, ii,’’b’’), que esta- precisamente por visar à tutela da maternidade e do nascituro- prescinde da comuniaçao prévia da gravidez ao empregador (...).
Até o momento, somente mais três julgados chegaram a Suprema Corte, todos reconhecendo a estabilidade gestacional, independentemente do regime jurídico de trabalho.
EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário. Servidora gestante. Cargo em comissão. Exoneração. Licença-maternidade. Estabilidade provisória. Indenização. Possibilidade. 1. As servidoras públicas, em estado gestacional, ainda que detentoras apenas de cargo em comissão, têm direto à licença- maternidade e à estabilidade provisória, nos termos do art. 7º, inciso XVIII, c/c o art. 39, § 3º, da Constituição Federal, e art. 10, inciso II, alínea b, do ADCT. 2. Agravo regimental não provido.(RE 420839 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 20/03/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-081 DIVULG 25-04-2012 PUBLIC 26-04-2012)
Nesse mesmo entendimento tem-se:
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. LICENÇA MATERNIDADE. MILITAR. ADMISSÃO EM CARÁTER TEMPORÁRIO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. ISONOMIA. ART. 7º, XVIII, DA CONSTITUIÇÃO E ART. 10, II, b, DO ADCT. AGRAVO IMPROVIDO. I – As servidoras públicas e empregadas gestantes, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, conforme o art. 7º, XVIII, da Constituição e o art. 10, II, b, do ADCT. II – Demonstrada a proteção constitucional às trabalhadoras em geral, prestigiando-se o princípio da isonomia, não há falar em diferenciação entre servidora pública civil e militar. III - Agravo regimental improvido.(RE 597989 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 09/11/2010, DJe-058 DIVULG 28-03-2011 PUBLIC 29-03-2011 EMENT VOL-02491-02 PP-00347)
E ainda:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. LICENÇA MATERNIDADE DE MILITAR TEMPORÁRIA. ART. 7º, XVIII, E ART. 142, VIII, CF/88. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. A estabilidade provisória advinda de licença maternidade decorre de proteção constitucional às trabalhadoras em geral. 2. O direito amparado pelo art. 7º, XVIII, da Constituição Federal, nos termos do art. 142, VIII, da CF/88, alcança as militares. 3. Inexistência de argumento capaz de infirmar o entendimento adotado pela decisão agravada. 4. Agravo regimental improvido.(RE 523572 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 06/10/2009, DJe-204 DIVULG 28-10-2009 PUBLIC 29-10-2009 EMENT VOL-02380-06 PP-01132)
Após esses julgados, o TST viu-se compelido a modificar o item III da Súmula 244, considerando que o novo entendimento do STF era conflitante com o seu.
CONCLUSÃO
Em 14/09/2012, o TST promoveu a Semana de Atualização de Jurisprudência. Dentre as mudanças, adveio a da Súmula 244, inciso III, que impedia a gestante de gozar do seu direito à estabilidade provisória, como já visto.
A nova redação dada foi:
GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA I O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, “b” do ADCT).II A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade.III A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art.10, inciso II, alínea b, do ADCT, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado.
Primeiramente, nos incisos I e II nada foi modificado. O entendimento do TST e da doutrina acerca da teoria objetiva foi mantido, qual seja, a empregada gestante tem direito à estabilidade mesmo que não tenha avisado ao seu patrão, isto é, mesmo com o desconhecimento do estado gravídico. Portanto, este direito se dá do momento da concepção da gravidez até o parto, independentemente de aviso anterior.
No inciso II da súmula supracitada, o TST ainda continuou entendendo que a gestante só tem o direito à reintegração se ela estiver em gozo do período de estabilidade, ou seja, da concepção até 5 (cinco) meses após o parto. Caso esta venha pleitear este direito ‘’a posteriori’’, ela só fará jus aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade. Não percebendo, assim, a reintegração.
No caso da gestante desejar a reintegração, cogita-se a indenização. Este é um ponto sombrio tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Sérgio Pinto Martins[10] opina que:
Na hipótese de a empregada afirmar categoricamente que não tem interesse em retornar a trabalhar na empresa, quando esta lhe coloca à disposição o emprego, renuncia ao direito à garantia de emprego, pois, do mesmo modo a Constituição assegura o direito ao emprego e não a indenização. Não querendo a emprega trabalhar na empresa, resta indevido o direito à garantia de emprego prevista na Constituição.
Contudo, a mudança ocorreu no já colacionado item III da Súmula, item este objeto do presente estudo.
O atual inciso é totalmente oposto ao antigo entendimento, visto que, como já analisado, este vedava a estabilidade provisória à gestante no contrato temporário. O novo entendimento traz de forma clara que em qualquer contrato de prazo determinado, seja ele de experiência ou temporário, aquela tem o direito adquirido à estabilidade, amoldando-se com os julgados do STF.
O primeiro motivo que ensejou a presente mudança é o de que a estabilidade de 5 (cinco) meses após o parto juntamente com os 120 (cento e vinte) dias de licença maternidade são para resguardar o nascituro e seus primeiros meses de vida. Assim entende a Juíza do Trabalho da 4ª Região, Valdete Souto Severo[11], a qual assevera a importância do Estado intervir no maior período de relação da criança com a sua mãe:
[...] A inserção do Brasil no rol dos países que protegem minimamente a infância, emprestando eficácia aos termos do art. 227 do texto constitucional, segundo o qual é também dever da sociedade e do Estado assegurar à criança, com absoluta prioridade, o direito à convivência familiar, colocando-a a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O princípio da proteção à vida trazido na Constituição Federal no caput do seu artigo 5º abrange principalmente a proteção ao nascituro quando cita que todos são iguais perante a lei, ‘’(...) garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida’’. Assim, o nascituro tem o principal direito garantido pela Constituição, que é a vida.
Há verdadeira divergência na doutrina sobre este assunto, mas atualmente prevalece a corrente majoritária de que o nascituro é um ser humano de direito. Partindo do pressuposto que um nascituro já é um ser humano, Ives Gandra da Silva Martins[12] ressalta que:
O primeiro e mais importante de todos os direitos fundamentais do ser humano é o direito à vida. É o primeiro dos direitos naturais que o direito positivo pode simplesmente reconhecer, mas que não tem a condição de criar. O homem nasce com certos direitos, que não vem a receber por mera repetição de fatos históricos que os valorizam. O direito a vida é o principal direito do ser humano. Cabe ao Estado preservá-lo, desde a sua concepção, e preservá-lo tanto mais quanto mais insuficiente for o titular deste direito. Nenhum egoísmo ou interesse estatal pode superá-lo. Sempre que deixa de ser respeitado, a História tem demonstrado que a ordem jurídica, que o avilta perde estabilidade futura e se deteriora rapidamente.
Outro fator fundamental para esta modificação é o de que o ADCT artigo 10, II, ‘’b’’ garante o direito a estabilidade provisória de forma geral, não restringindo a nenhum grupo ou contrato de trabalho. Vale a pena colacionar novamente:
Art. 10. Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição:
[...]
II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:
[...]
b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.
Por fim, pode-se retirar dois posicionamentos acerca da modificação em contento. O primeiro é que as gestantes e até mesmo as mulheres em idade fértil serão discriminadas, pois não serão contratadas por prazo determinado, principalmente nos contratos temporários realizados nas épocas festivas, visto que o empregador tem a pretensão de contratar por no máximo 3 meses, mas correria o risco de pagar encargos e uma funcionária a mais, sem necessidade, por até 14 meses (somados nove meses de gestação mais cinco meses de estabilidade) além de 120 (cento e vinte) dias de licença maternidade e demais direitos como PIS, férias proporcionais aos 14 (quatorze) meses não trabalhados, depósito FGTS e 13º salário.
Em 2004, a Min. Ellen Gracie, em julgado acerca da estabilidade de uma professora gestante no contrato temporário no STF, salientou na sua antecipação de voto que:
Embora a mim agradasse muito deferir este mandato de segurança, que vejo com preocupação as consequências que podem advir para as mulheres em geral no mercado de trabalho, que poderão, a partir de uma tal orientação, deixar de ser admitidas para esses contratos temporários já que o empregador nunca saberá se, ao término do contrato, não terá, face a uma gravidez, que prorrogar pagamentos por mais um período que não estava em suas previsões. [13]
Em contrapartida, há entendimentos defendendo que esta opinião é machista e descabida como a da Juíza do Trabalho da 4ª Região Valdete Souto Severo[14]:
Já está mais do que na hora de o Brasil ingressar no rol dos países que protegem efetivamente a infância. O cuidado direto do bebê, pela mãe, nos primeiros meses de vida, terá reflexos sociais que certamente superam eventual dificuldade momentânea em lidar com o afastamento da trabalhadora do serviço. Não é possível, portanto, crer no discurso alarmista, pelo qual a extensão do benefício implicará dificuldades na inserção da mulher no mercado de trabalho. A mulher já está definitivamente incorporada ao mercado de trabalho. As dificuldades que ela enfrenta não decorrem da maternidade, mas de uma cultura machista que, embora mitigada, ainda conta com seus fiéis representantes. Negar proteção em nome de um suposto prejuízo é reforçar o preconceito. Uma infância protegida, de crianças bem nutridas, alimentadas no seio materno, é de interesse de todos. Lutemos para conquistá-la!
Tendo como base esta divergência, o que se propõe é que o governo possa conceder incentivos e ajudar as empresas para que assim não haja discriminação em face das empregadas gestantes.