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Reserva de domínio

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20/11/2013 às 08:33
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Conclusão:

O presente trabalho não teve como escopo uma análise exaustiva sobre o instituto analisado. Cogitar essa hipótese seria cegar-se perante a complexidade de cada situação que envolve não somente o instituto, mas todo um ordenamento jurídico no qual está inserido, além das interpretações doutrinárias e jurisprudenciais.

Sabendo dessa limitação, buscamos apresentar os contornos da reserva de propriedade, revelando posicionamentos da doutrina, comparando os ordenamentos jurídicos de vários países como o português, o brasileiro, o alemão, o italiano, o francês e o espanhol e oferecendo ponderações onde julgamos importante.

Além disso, buscamos oferecer uma oportunidade para os juristas observarem o tema alvo do artigo de forma mais profunda, uma vez que, tanto os manuais de direito civil quanto a própria legislação não trata a matéria de forma extenuante, acabando por gerar pontos conturbados e nebulosos, em que nos atemos a especificar alguns.


Notas:

[i] Tradução livre: Mesmo que no contrato somente conste que o cedente dos móveis conservava sua posse, esta não se refere nem poderia se referir a posse material que devido a cessão transmitia ao comprador, mas a que nasce e deriva do domínio, que foi a que em realidade se reservou. Semelhante contrato é perfeitamente lícito e obrigatório entre os celebrantes e em nada se opõe aos preceitos legais que supõe-se infringidos, porque segundo o artigo 1255 do C.C. (espanhol) os contraentes podem estabelecer pactos e condições que tenham por conveniente. Tribunal Supremo, 16 de febrero, 1894.

[ii] A venda com reserva de domínio não tinha previsão no código anterior, A matéria tinha tratativa, por outro lado, na lei processual civil (artigo 1.070 e 1.071). MEZZOMO, Marcelo Colombelli. Conhecendo o novo Código Civil. Série completa (3 partes). Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 826, 7 out. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/7234>.

[iii] Tradução livre: Art. 1523 Passaggio della proprietà e dei rischi: Nella vendita a rate con riserva della proprietà, il compratore acquista la proprietà della cosa col pagamento dell'ultima rata di prezzo, ma assume i rischi dal momento della consegna.

[iv] MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, parte especial: contratos – compra e venda, locação, empreitada. 2ª Ed. Coimbra: Editora Almedina, 2001, p., 37.

[v] LEITÃO, Luis Manuel Teles de Menezes. Direito das Obrigações: Volume III – Contratos em especial. 7ª Ed. Coimbra: Editora Almedina, 2010, p., 54.

[vi] LEITÃO, Luis Manuel Teles de Menezes. Ibidem, p., 55, nota 95.

[vii] Tradução livre do artigo 2.1 da Convenção Européia: En el sentido de la presente Convención, es preciso entender por contrato com cláusula de reserva de domínio simple (en adelante denominada “cláusula de reserva de domínio”) el contrato de compraventa de biens em virtud del cual la propriedad de los bienes objeto del mismo no se transfiere al comprador más que cuando éste há cumplido em su totalidad la contraprestación de la compra.

[viii] O artigo 522 do Código Civil brasileiro exige que a cláusula da reserva seja escrita.

[ix] FERNANDEZ, Manuel Rivera. La posicion del comprador em la venta a plazos con pacto de reserva de domínio. Valencia: Tirant lo Blanch, 1994, p., 32-33.

[x] Ainda é possível destacarmos outros posicionamentos como a teoria da condição suspensiva, a da venda obrigacional, da dupla propriedade e da venda com eficácia translativa imediata, associada à atribuição ao vendedor de uma posição jurídica, que lhe garante, com eficácia real, a recuperação do bem em caso de não pagamento do preço, conforme nos é exposto por LEITÃO , Luis Manuel Teles de Menezes. Direito das Obrigações: Volume III – Contratos em especial. 7ª Ed. Coimbra: Editora Almedina, 2010, p., 61.

[xi] FERNANDEZ, Manuel Rivera. Ibidem, p., 36.

[xii] Decisão do Tribunal do Porto se utiliza da expressão expectativa e reafirma a condição suspensiva: “A reserva de propriedade deve ser qualificada como uma condição suspensiva: a transmissão da propriedade sobre a coisa – isto é, o efeito real do contrato de compra e venda – fica subordinada a um acontecimento futuro e incerto; o comprador dispõe tão só de uma expectativa jurídica.” Processo: 0830728; Nº Convencional: JTRP00041369; Nº do Documento: RP200804240830728;  Data do Acordão: 24-04-2008.

[xiii] Tribunal Supremo, 26 enero de 1976.

[xiv] Manuel Rivera é muito claro no seu posicionamento contra a natureza de depositário do comprador: No parece correcta su aceptación por simples razones de coherencia jurídica, ya que el régimen propio del depósito es totalmente contrario a la esencia, finalidad y naturaliza, cualquiera que ésta sea, de la venta com reserva de domínio. E continua: - En primer lugar, el comprador en la venta con reserva de domínio no compra para ‘guardar y restituir’, como se deduce de la definición de depósito. Acrescenta que el depósito sólo afecta a las cosas muebles. E por último aduz que: Código Civil establece la expresa prohibición de uso de la cosa depositada, hecho substancialmente contrario a la función económico jurídica desempeñada por la venta con reserva de domínio que pretende, mediante esta peculiar forma de crédito, el acceso inmediato a la posesión y disfrute de bienes, a los que dificilmente se tiene acceso por los médios comunes de adquisición. P., 84-85.

[xv] Tradução livre: La dottrina e la giurisprudenza hanno invece tranquillamente affermato la validitá del contrato di vendita com riserva de propietá, considerandolo una normale ipotesi di compravendita ed hanno creato una forma di possesso ‘sui generis’ che non trova riscontro nel nostro ordenamento giuridico. GALASSO, A. La vendita com riserva di propietá. Giurisprudenza Siciliana, 1963.

[xvi] Artigo 1523 – Transferência da propriedade e do risco. Na venda parcelada com reserva de propriedade, o comprador adquire a propriedade da coisa com o pagamento da última parcela do preço, mas assume o risco no momento da entrega. Tradução livre: Art. 1523 Passaggio della proprietà e dei rischi: Nella vendita a rate con riserva della proprietà, il compratore acquista la proprietà della cosa col pagamento dell'ultima rata di prezzo, ma assume i rischi dal momento della consegn.

[xvii] Martinez não concorda com o nº 3 do artigo 796º “quando for suspensiva a condição, o risco corre por conta do alienante durante a pendência da condição.” O autor diz que o risco está mais atrelado com a titularidade das vantagens sobre o bem do que com a propriedade em si. A interpretação não seria contrária à lei, visto que ela não prevê a entrega do bem ao adquirente, caso em que a solução seria a oposta da referida na lei. Pode-se questionar esse pensamento, mas cremos ser a posição mais válida no que se refere a venda com reserva de propriedade. É o que se pode depreender pelo nº 1 do mesmo artigo segundo o autor. MARTINEZ. 2001, p., 41-42.

[xviii] Tradução livre: Planteada la cuestión, es opinión unánimente admitida que la transmisión del riesgo sobre la cosa, así como la adquisición de los frutos generados por esta, se transmiten al comprador desde que tiene lugar la entrega de la cosa por parte del vendedor. FERNANDEZ, Manuel Rivera. La posicion del comprador em la venta a plazos con pacto de reserva de domínio. Valencia: Tirant lo Blanch, 1994, p., 73-74.

[xix] Tradução livre:  Si el comprador, por la tradición posesoria, usa, goza, y hasta abusa de la cosa sin que haya abonado el precio en su totalidad, parece normal que soporte el periculum. PEREZ, Alonso M. El riesgo en el contrato de compraventa. Madrid, 1972, p., 373.

[xx] MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, parte especial: contratos – compra e venda, locação, empreitada. 2ª Ed. Coimbra: Editora Almedina, 2001, p., 38.

[xxi] Podemos acrescentar ainda Raul Ventura, Mário Júlio Almeida Costa, Jorge Ribeiro de Faria e Lima Pinheiro.

[xxii] Referente ao Processo: 084195, Nº Convencional:  JSTJ00022353, Nº do Documento: SJ199403170841952, Data do Acordão: 17-03-1994, Jurisprudência Nacional: AC STJ DE 1989/10/03 IN BMJ N390 PA408.

[xxiii] MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, parte especial: contratos – compra e venda, locação, empreitada. 2ª Ed. Coimbra: Editora Almedina, 2001, p., 39.

[xxiv] LEITÃO, Luis Manuel Teles de Menezes. Direito das Obrigações, : Volume III – Contratos em especial. 7ª Ed. Coimbra: Editora Almedina, 2010, p., 58, nota 106.

[xxv] MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, parte especial: contratos – compra e venda, locação, empreitada. 2ª Ed. Coimbra: Editora Almedina, 2001, p., 39.

[xxvi] O artigo 1524 do Código Civil italiano disciplina as situações de oponibilidade. A discutida por nós é tratada pela seguinte passagem: Sono salve le disposizioni relative ai beni mobili iscritti in pubblici registri (2683 e seguenti).

[xxvii] Baseado nos seguintes artigos do Código Civil brasileiro. Art. 525. O vendedor somente poderá executar a cláusula de reserva de domínio após constituir o comprador em mora, mediante protesto do título ou interpelação judicial.

Art. 526. Verificada a mora do comprador, poderá o vendedor mover contra ele a competente ação de cobrança das prestações vencidas e vincendas e o mais que lhe for devido; ou poderá recuperar a posse da coisa vendida.

[xxviii] A lei italiana segue o mesmo sentido no art. 1526: Se a resolução do contrato foi causado pelo inadimplemento do comprador, o vendedor deve restituir as parcelas pagas, salvo a compensação  ao direito pelo uso da coisa e pelo ressarcimento de danos. Tradução livre: Art. 1526 Risoluzione del contrato: Se la risoluzione del contratto ha luogo per l'inadempimento del compratore, il venditore deve restituire le rate riscosse, salvo il diritto a un equo compenso per l'uso della cosa, oltre il risarcimento del danno.

[xxix] O Código Civil brasileiro prevê a possibilidade do financiamento da compra por instituição financeira. Nessa situação, a instituição será a parte legítima para reaver o bem ou realizar a cobrança. “Art. 528. Se o vendedor receber o pagamento à vista, ou, posteriormente, mediante financiamento de instituição do mercado de capitais, a esta caberá exercer os direitos e ações decorrentes do contrato, a benefício de qualquer outro. A operação financeira e a respectiva ciência do comprador constarão do registro do contrato.”

[xxx] Tradução livre: Art. 1525 Inadempimento del compratore: Nonostante patto contrario, il mancato pagamento di una sola rata, che non superi l'ottava parte del prezzo, non dà luogo alla risoluzione del contratto, e il compratore conserva il beneficio del termine relativamente alle rate successive (1455; att. 176).

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[xxxi] Tradução livre: Ese algo más, especial de la reserva de domínio y que la configura autónoma dentro de nuestro ordenamento, debe ser la posibilidad de recuperar el bien vendido a plazos. FERNANDEZ, Manuel Rivera. La posicion del comprador em la venta a plazos con pacto de reserva de domínio. Valencia: Tirant lo Blanch, 1994, p., 46-47.

[xxxii] Para LEITÃO, a opção é estranha, “uma vez que a reserva de propriedade constitui uma garantia mais forte do que a penhora, mas não se pode negar ao vendedor recorrer aos meios à disposição dos credores comuns. Deve, no entanto, entender-se que essa opção implica uma renúncia à reserva, dado que é incompatível com ela”.

[xxxiii] Esse posicionamento nos é informado por Rivera na seguinte passagem: “- La doctrina dominante señala, en un intento de resolver esta ilógica situación, la existência de una renuncia tácita del vendedor a la propiedad del bien, en el preciso instante de practicarse el embargo. Desde ese momento el comprador es pleno propietario del bien embargado y, por lo tanto, susceptible de ejecución.” FERNANDEZ, Manuel Rivera. La posicion del comprador em la venta a plazos con pacto de reserva de domínio. Valencia: Tirant lo Blanch, 1994, p., 65-66.

[xxxiv] VALPUESTA, Fernandez. Acción reivindicatória, titularidad dominical y prueba. Valencia, 1993.

[xxxv] Esse princípio está normatizado no art. 1. 7º do Código Civil espanhol, no art. 5º, XXXV da Constituição brasileira: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, e no art. 20º, 1º da Constituição Portuguesa: “A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.” FERNANDEZ, Manuel Rivera. La posicion del comprador em la venta a plazos con pacto de reserva de domínio. Valencia: Tirant lo Blanch, 1994, p., 123.

[xxxvi] Tradução livre: al adquirente, con reserva de domínio, le competen las acciones posesorias: interdictos, destinadas a la recuperación o mantenimiento pacífico de la posesión adquirida a través de la efectiva ejecución de las obligaciones contractuales. Acciones que podrá ejercer frente a cualquier perturbador o despojante, incluído el vendedor. FERNANDEZ, Manuel Rivera. La posicion del comprador em la venta a plazos con pacto de reserva de domínio. Valencia: Tirant lo Blanch, 1994, p., 88.

[xxxvii] É possível, de acordo com parte da doutrina e jurisprudência, o incumprimento do comprador devido a transmissão do bem antes do pagamento total do preço. É o que se depreende de FERNANDEZ, Manuel Rivera. La posicion del comprador em la venta a plazos con pacto de reserva de domínio. Valencia: Tirant lo Blanch, 1994, p., 111.

[xxxviii] de FERNANDEZ, Manuel Rivera. La posicion del comprador em la venta a plazos con pacto de reserva de domínio. Valencia: Tirant lo Blanch, 1994, p., 93-94.


Referências:

BRASIL, Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Número do processo: 1.0342.04.050446-2/001(1); Númeração Única: 0504462-11.2004. 8.13. 0342; Data da Publicação: 13/10/2009;

FERNANDEZ, Manuel Rivera. La posicion del comprador em la venta a plazos con pacto de reserva de domínio. Valencia: Tirant lo Blanch, 1994.

FIUZA, César. Direito Civil: Curso Completo. 10ª Ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

FRANCISCO AMARAL. Direito Civil. Introdução. 5ª ed. Rio de Janeiro. São Paulo: Renovar, 2003.

JORGE, Pessoa. Lições de Direito das Obrigações – Edição da Associação Académica da F.D. Lisboa, 1975/76.

LEITÃO, Luis Manuel Teles de Menezes. Direito das Obrigações: Volume III – Contratos em especial. 7ª Ed. Coimbra: Editora Almedina, 2010.

MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, parte especial: contratos – compra e venda, locação, empreitada. 2ª Ed. Coimbra: Editora Almedina, 2001.

MEZZOMO, Marcelo Colombelli. Conhecendo o novo Código Civil. Série completa (3 partes). Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 826, 7 out. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/7234>.

OERTMAN, P. La reserva de domínio en la compraventa. RDP, 1930.

PORTUGAL. Tribunal de Relação do Porto. Processo: 9830809 Nº Convencional: JTRP00024063; Nº do Documento: RP199810019830809 Data do Acordão: 01-10-1998;

________________. Processo:   0830728; Nº Convencional: JTRP. 00041369; Nº do Documento: RP200804240830728; Data do Acordão: 24-04-2008;

VALPUESTA, Fernandez. Acción reivindicatória, titularidad dominical y prueba. Valencia, 1993. 

VARELA, João de Matos Antunes. Das Obrigações em Geral, vol. I.10ª Ed. Coimbra: Editora Almedina, 2000.

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Sobre o autor
André Guerra

Advogado, Mestre pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, pós-graduado pelo Centro de Direito Biomédico da Faculdade de Direito de Coimbra, pesquisador na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca 2012/2013,bacharel em direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais<br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GUERRA, André. Reserva de domínio. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3794, 20 nov. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25880. Acesso em: 2 nov. 2024.

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Quinto artigo sobre a análise das cláusulas especiais do contrato da compra e venda. Já abordamos a venda a contento e sujeita à prova, a retrovenda, da venda sobre documentos e da preempção ou preferência convencional.

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