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Responsabilidade do sócio-gerente no âmbito da medida cautelar fiscal

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09/02/2014 às 11:39
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O sucesso da medida cautelar fiscal proposta em face do sócio-gerente antes da constituição do crédito tributário depende da demonstração, em juízo de cognição de verossimilhança, da existência de ato ilícito por parte do administrador.

Introdução

O Direito Processual Brasileiro, seguindo uma tendência mundial, tem passado por uma constante reformulação instrumental, utilizando-se constantemente do termo efetividade, à procura de metas definíveis em seu campo de atuação.

No direito processual tributário destaca-se a medida cautelar fiscal, instituída pela Lei n° 8.397/92, cuja atividade jurisdicional dirige-se à segurança do profícuo resultado da execução fiscal. Trata-se de ação de titularidade da Fazenda Pública, cujo objetivo é decretar a indisponibilidade de bens e direitos do devedor de Dívida Ativa, precipuamente quando este tem a intenção de frustrar o seu pagamento.

A edição da Lei n° 8.397/92 tornou viável a indisponibilização de bens do administrador de pessoa jurídica devedora mesmo antes da constituição do crédito tributário. Entretanto, a teor do art. 135, caput, do CTN, tal responsabilização não prescinde da demonstração de ato ilícito por parte do administrador, situação que demanda instrução probatória muitas vezes dissociada da convicção judicial própria à concessão da tutela cautelar.

Nesse contexto, relevante verificar meios de conciliar a natureza urgente e provisória da medida cautelar fiscal com as exigências do redirecionamento da execução fiscal ao sócio-gerente à luz do art. 135, caput, do CTN.


Da responsabilidade tributária do sócio-gerente

Segundo definição de Luiz Emygdio Franco da Rosa Júnior, “[...] sujeito passivo da obrigação tributária é a pessoa física ou jurídica obrigada, por lei, ao cumprimento da prestação tributária principal, esteja ou não em relação direta e pessoal com a situação que constitua o respectivo fato gerador”[1]. Em atenção ao princípio da tipicidade tributária e com vistas à maior proteção de quem deve pagar o tributo, o sujeito passivo deve necessariamente ser definido em lei (CTN, art. 97, III).

O sujeito passivo direto é o contribuinte (CTN, art. 121, § único, I), ou seja, aquele que tem relação pessoal e direta com a situação que constitua o fato gerador tributário – fato típico prescrito na lei. Nos tributos com fato gerador não vinculado, contribuinte é aquele cuja capacidade contributiva é objeto de tributação. Já nos tributos com fato gerador não vinculado à atividade estatal, contribuinte será aquele que demanda o serviço público, que sofre o exercício do poder de polícia ou que tem seu imóvel valorizado pela obra pública.

O sujeito passivo indireto – ou responsável na definição legal (CTN, art. 121, § único, II), é aquele que, embora não seja contribuinte, possui obrigação decorrente de disposição expressa de lei. A definição do sujeito passivo da obrigação tributária é matéria estritamente legal, forte na garantia da legalidade tributária, e encontra suporte na previsão do artigo 97, III, do CTN[2].

O responsável não integra a relação contributiva, mas outra relação própria que guarda autonomia em relação àquela, na medida em que possui pressuposto fático específico. Na lição de Leandro Paulsen, “[...] a lei atribui a determinado pressuposto de fato específico – normalmente o descumprimento de determinados deveres de colaboração para com o fisco [...] – a consequência de responder pelo pagamento de tributo cujo inadimplemento tenha relação com o descumprimento daquele dever” [3].

A figura do responsável aparece na problemática da obrigação tributária principal por uma série de razões valorizadas pelo legislador ao definir a sujeição passiva tributária, que vão da conveniência à necessidade. Da lição de Leandro Paulsen, extraio o seguinte excerto:

Embora o chamamento a contribuir para as despesas públicas se dê em face do contribuinte, que realiza a hipótese de incidência e tem nela revelada sua capacidade contributiva, a necessidade de assegurar e facilitar a tributação faz com que o legislador tenha que impor obrigações formais e materiais a terceiros, de modo que estes participem dos atos de arrecadação ou que simplesmente respondam pela satisfação do crédito tributário[4].

A responsabilidade tributária é disciplinada pelo Código Tributário Nacional no capítulo V do título II (Obrigação Tributária) do livro segundo (Normas Gerais do Direito Tributário). Nos artigos 129 a 133 é regulada a responsabilidade por sucessão; a responsabilidade de terceiros, nos artigos 134 e 135; e a responsabilidade por infrações nos artigos 136 a 138. Todas essas regras encontram-se sob o comando geral do artigo 128, in verbis:

Art. 128 - Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.

Em especial, a responsabilidade pessoal dos diretores, gerentes ou representantes das pessoas jurídicas de direito privado é estabelecida pelo artigo 135, III, do CTN, abaixo transcrito:

Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: [...]


III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Discute-se na doutrina e na jurisprudência a definição da natureza da responsabilidade tributária dos administradores, se subsidiária (própria ou imprópria), por substituição ou solidária. A responsabilidade por sucessão, acima mencionada, não possui aplicação no exame do artigo 135 do CTN.

Simples leitura dos acórdãos do Superior Tribunal de Justiça pode confundir o estudioso do tema. Em muitos acórdãos, lê-se que a responsabilidade tributária prevista no artigo 135 do CTN é por substituição (AgRg no REsp 724.180/PR, REsp 670.174/RJ). Noutros julgados, consigna-se expressamente que a responsabilidade acolhida nesse preceito legal é subsidiária (REsp 833.621/RS, REsp 545.080/MG). Noutros, menciona-se como responsabilidade solidária (REsp 86.439/ES, AgRg no AG 748.254/RS). Encontra-se, inclusive, ementa na qual se refere, simultaneamente, à responsabilidade subsidiária e à responsabilidade por substituição (EDcl no REsp 724.077/SP).

A despeito da aparente dissonância, inexiste verdadeira divergência jurisprudencial em relação ao ponto. Aparentemente, o STJ não acolhe a distinção doutrinária entre responsabilidade por substituição e por transferência. Assim, quando se lê que o sócio responde “por substituição”, não se quer desonerar a sociedade. Simplesmente, quer-se dizer que o sócio-gerente responde em lugar da (em substituição à) sociedade quando esta não adimple os créditos tributários e a hipótese subsume-se à previsão do artigo 135, III, do CTN.

Em suma, a análise da jurisprudência do STJ no tocante à aplicação do artigo 135, III, do CTN, deve fundar-se mais nos seus pressupostos e conclusões do que nos signos “substituição”, “pessoalmente”, “subsidiária” e “solidária”, frequentemente empregados para qualificar a responsabilidade tributária do sócio-gerente que comete infração à lei.

A prática processual demonstra que a Fazenda Pública costuma, num primeiro momento, atingir o patrimônio da sociedade devedora (contribuinte). Infrutífera tal tentativa, busca o patrimônio pessoal dos administradores. Trata-se do chamado ‘redirecionamento da execução fiscal’, prática abonada pela jurisprudência e coerente com um sistema de responsabilidade subsidiária. Veja-se o seguinte precedente do STJ:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE DEVEDOR. NULIDADE DA CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA - CDA. REQUISITOS (AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO CO-RESPONSÁVEL PELO DÉBITO TRIBUTÁRIO E DE DISCRIMINAÇÃO DA DÍVIDA). ART. 2º, § 5º, DA LEI 6.830/80. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. AFASTAMENTO.

1 - Segundo remansosa jurisprudência desta Corte e do Colendo STF, a execução fiscal é proposta contra a pessoa jurídica, não sendo exigível fazer constar da CDA o nome dos co-responsáveis pelo débito tributário, os quais podem ser chamados supletivamente. Precedentes[5].

Por vezes, contudo, o nome do administrador consta da Certidão de Dívida Ativa e a execução fiscal é diretamente ajuizada contra o contribuinte e o responsável tributário. Trata-se de hipótese igualmente admitida pela jurisprudência, o que significa dizer que a pretensão é desde já exigível do administrador[6], podendo o Fisco ingressar em seu patrimônio sem que seja necessário esgotar a busca de bens da empresa.

Como se vê, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sustenta, em substância, a tese da responsabilidade solidária. O administrador que cometer o ato ilícito no exercício da gerência da empresa devedora responde solidariamente com a pessoa jurídica pelo pagamento do crédito tributário, sem benefício de ordem. Trata-se de responsabilidade autônoma quanto ao nascimento, natureza e cobrança, mas subordinada quanto à existência, validade e eficácia.

Nada impede a subsunção do administrador de fato da empresa devedora ao conteúdo do artigo 135, III, do CTN. Ainda que o contrato social ou estatuto não confira poderes a determinada pessoa para praticar atos de gerência, no caso de o Fisco apurar tratar-se de administrador de fato da pessoa jurídica, deve o mesmo ser responsabilizado pela prática de eventuais atos ilícitos. Com isto, elide-se a autonomia patrimonial e permite-se que os bens de que sejam titulares sejam responsabilizados pela dívida que, na condição de verdadeiros sócios e gestores, contraíram em nome das empresas.

Cumpre, ainda, referir que podem ser utilizados em face do responsável solidário quaisquer instrumentos de coerção utilizados contra os contribuintes. Declarada pela autoridade fiscal ato ilícito por parte do administrador, fica o infrator sujeito, atendidas as previsões legais pertinentes, à inscrição no CADIN (art. 2º, I, da Lei 10.522/2002), à Certidão Positiva de Débitos (art. 205 do CTN), ao arrolamento de bens e direitos (art. 64 da Lei 9.532/97) e, finalmente, à medida cautelar fiscal prevista pela Lei 8.397/92 e objeto do presente trabalho.

Outrossim, após exaustivas discussões jurisprudenciais, cuja enumeração refoge ao objeto do presente trabalho, restou consolidada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça a doutrina da responsabilidade tributária subjetiva dos administradores. Ressalte-se a simples exigência de ato ilícito, o qual, pela teoria geral do Direito, pode tanto ser decorrente de ato culposo como de ato doloso. Trata-se de conclusão lógica na medida em que a lei não separou as hipóteses de culpa em sentido estrito e de dolo. Conforme ressaltou Anselmo Henrique Cordeiro Lopes, “[...] em verdade, o Direito Tributário preocupa-se com a externalização de atos e fatos, não possuindo espaço para a persecução do dolo; basta a culpa”[7].

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Inúmeras conclusões decorrem da adoção da doutrina da responsabilidade tributária subjetiva dos administradores, dentre as quais destaco: a) o sócio sem poderes de gerência não responde pelas obrigações tributárias da sociedade; b) o sócio-gerente não pode ser responsabilizado pela ausência de recolhimento de tributo em período diverso de sua atuação, bem como por dissolução tida por irregular, ocorrida após sua retirada da sociedade; c) o mero inadimplemento do tributo não caracteriza infração legal para fins de responsabilidade pessoal do sócio-gerente; d) a responsabilidade pessoal do sócio-gerente sujeita-se à comprovação de atuação dolosa ou culposa na administração dos negócios, em decorrência de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatuto, além da hipótese de dissolução irregular da empresa devedora; e) a prova da prática de ato ilícito por parte do administrador compete à Autoridade Fiscal, salvo se o nome do responsável constar como corresponsável na Certidão de Dívida Ativa.

No tocante a esta última conclusão, cumpre referir que a indicação, na Certidão de Dívida Ativa, do nome do sócio-gerente da devedora originária como corresponsável tributário autoriza, formalmente, o redirecionamento da execução fiscal à sua pessoa. Não representa, contudo, juízo de certeza acerca da responsabilidade tributária do administrador, problemática pertencente ao direito material e regulamentada pelo Código Tributário Nacional (arts. 134, VII e 135, III). A presunção de certeza e liquidez do título executivo, prevista no artigo 3º, da Lei 6.830/80, e no artigo 204, parágrafo único, do CTN, é relativa, autorizando a ação executiva sem, necessariamente, legitimar os atos de execução. A referência aos administradores da devedora originária como corresponsáveis no título executivo, portanto, não consubstancia direito potestativo da Fazenda Nacional, tratando-se de requisito formal de redirecionamento, a ensejar inversão do ônus probatório nas vias cognitivas próprias. Admite-se a descaracterização, a cargo do executado, da responsabilidade tributária através da ação de embargos à execução fiscal.


Da responsabilidade do sócio-gerente no âmbito da medida cautelar fiscal

A medida cautelar fiscal foi instituída pela Lei nº 8.397, de 06.01/1992, parcialmente alterada pelo artigo 65 da Lei nº 9.532, de 10.12/1997. Trata-se de inovação no campo das medidas cautelares, pois regulou a matéria em face da Fazenda Pública, com o escopo de garantir a satisfação de seus créditos, tributários ou não tributários[8]

Segundo Cleide Previtalli Cais, “[...] da análise das normas da lei comentada, resulta a conclusão de que a denominada medida cautelar fiscal constitui nova figura de arresto, em versão fiscal” [9]. Trata-se de típica hipótese de medida cautelar, a par daquelas disciplinadas pelo Código de Processo Civil. Destas distingue-se, contudo, por trazer dispositivos dotados de maior rigor, pois o direito de perceber o crédito da Fazenda Pública constitui, no seu cerne, direito de toda a coletividade. Ainda assim, destaque-se a aplicação subsidiária das disposições gerais contidas no Código de Processo Civil, à vista do disposto no artigo 812 deste diploma.  

À semelhança das medidas cautelares reguladas pelo CPC[10], a medida cautelar fiscal pode ser incidental, quando já houver execução de dívida ativa em andamento, ou preparatória, quando inexistir execução em andamento (artigo 1º da Lei nº 8.397/92).

De qualquer forma, a medida cautelar fiscal será sempre dependente da execução fiscal, a cujos autos deve ser apensada, a teor dos artigos 5º, 11 e 14 da Lei nº 8.397/92. Trata-se de característica típica do processo cautelar, constante do artigo 809 do CPC, segundo o qual, “os autos do procedimento cautelar serão apensados aos do processo principal”.

Os requisitos à concessão da medida cautelar fiscal estão previstos no artigo 3º da Lei nº 8.397/92, quais sejam, prova literal da constituição do crédito fiscal e prova documental de algum dos casos mencionados no artigo 2º da mesma norma. A fazenda Pública há de possuir em seu favor, via de regra, um crédito regularmente constituído contra o sujeito passivo (fumus boni juris), e esse crédito deve estar com o adimplemento ameaçado por atos do sujeito passivo que revelem o propósito de furtar-se fraudulentamente do respectivo pagamento (periculum in mora).

A indisponibilidade de bens do devedor, até o limite da satisfação da obrigação, é o único objetivo da medida cautelar fiscal e produz-se automaticamente, em razão da decisão que a decreta (artigo 4º da Lei nº 8.397/92). Trata-se de medida de cautela e não implica penhora do patrimônio do devedor[11]. Ainda assim, a exemplo da constrição de bens em penhora para garantia da execução, a medida cautelar fiscal não pode objetivar a indisponibilidade de bem declarado impenhorável[12].

A legitimidade para a propositura da medida cautelar fiscal é definida pelo artigo 1º da Lei nº 8.397/92. Têm legitimidade ativa a União, Estados-membros, Distrito Federal e os municípios e suas autarquias.

Já os legitimados passivos da medida cautelar fiscal não vêm expressos na Lei nº 8.397/92, que diz apenas que a ação pode ser proposta contra o sujeito passivo de crédito tributário ou não tributário (art. 2º). Conforme exposto alhures, sujeito passivo da obrigação tributária é a pessoa física ou jurídica obrigada, por lei, ao cumprimento da prestação tributária principal, esteja ou não em relação direta e pessoal com a situação que constitua o respectivo fato gerador.

A teor do parágrafo 1º do supracitado artigo, a indisponibilidade recairá somente sobre os bens do ativo permanente da pessoa jurídica[13], podendo ser estendida “aos bens do acionista controlador e aos dos que, em razão do contrato social ou estatuto, tenham poderes para fazer a empresa cumprir suas obrigações fiscais ao tempo do fato gerador, nos casos de lançamento de ofício, ou ao tempo do inadimplemento da obrigação fiscal, nos demais casos”.

O responsável não integra a relação contributiva, mas outra relação própria que guarda autonomia em relação àquela, pois possui pressuposto fático específico. No caso do sócio-gerente da pessoa jurídica de direito privado, a responsabilidade pessoal é estabelecida pelo artigo 135, III, do CTN. Trata-se, como visto, de responsabilidade solidária e subjetiva, condicionada à comprovação de atos praticados com excesso de poderes ou infração à lei, contrato social ou estatutos, além da hipótese de dissolução irregular da empresa devedora durante a gestão do sócio-gerente. Conforme posicionamento jurisprudencial consolidado, a prova da prática do ato ilícito compete à autoridade fiscal, salvo se o nome do administrador constar da Certidão de Dívida Ativa na condição de corresponsável.

Os requisitos necessários à imputação da responsabilidade patrimonial do sócio-gerente na ação principal de execução são também exigidos na ação cautelar fiscal, posto acessória por natureza. Nesse sentido já decidiu o e. STJ:

PROCESSUAL TRIBUTÁRIO. MEDIDA CAUTELAR FISCAL. INDISPONIBILIDADE DOS BENS DOS SÓCIOS INTEGRANTES DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO. LEI 8.397/92. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EXCESSO DE MANDATO, INFRAÇÃO À LEI OU AO REGULAMENTO.  1. É assente na Corte que o redirecionamento da execução fiscal, e seus consectários legais, para o sócio-gerente da empresa, somente é cabível quando reste demonstrado que este agiu com excesso de poderes, infração à lei ou contra o estatuto, ou na hipótese de dissolução irregular da empresa (Precedentes: REsp n.º 513.912/MG, Rel. Min. Peçanha Martins, DJ de 01/08/2005; REsp n.º 704.502/RS, Rel. Min. José Delgado, DJ de 02/05/2005; EREsp n.º 422.732/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 09/05/2005; e AgRg nos EREsp n.º 471.107/MG, deste relator, DJ de 25/10/2004). 2. Os requisitos necessários para a imputação da responsabilidade patrimonial secundária na ação principal de execução são também exigidos na ação cautelar fiscal, posto acessória por natureza. 3. Medida cautelar fiscal que decretou a indisponibilidade de bens dos sócios integrantes do Conselho de Administração da empresa devedora, com base no artigo 4º, da Lei 8.397/92. 4. Deveras, a aludida regra deve ser interpretada cum grano salis, em virtude da remansosa jurisprudência do STJ acerca da responsabilidade tributária dos sócios. 5. Consectariamente, a indisponibilidade patrimonial, efeito imediato da decretação da medida cautelar fiscal, somente pode ser estendida aos bens do acionista controlador e aos dos que em razão do contrato social ou estatuto tenham poderes para fazer a empresa cumprir suas obrigações fiscais, desde que demonstrado que as obrigações tributárias resultaram de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos (responsabilidade pessoal), nos termos do artigo 135, do CTN.

No caso de liquidação de sociedade de pessoas, os sócios são “solidariamente” responsáveis (artigo 134, do CTN) nos atos em que intervieram ou pelas omissões que lhes forem atribuídas. [...][14].

Conforme redação do parágrafo 2º do artigo 4º da Lei nº 8.397/92, a indisponibilidade pode ser estendida aos bens adquiridos a qualquer título do requerido ou daqueles que estejam ou tenham estado na função de administrador, desde que a aquisição seja capaz de frustrar a pretensão da Fazenda Pública. Tal dispositivo é inaplicável face às disposições do CTN, na medida em que possibilita a extensão da indisponibilidade ao patrimônio de sócio que sequer era administrador da sociedade à época da ocorrência do fato gerador do débito tributário pendente de pagamento. A corroborar este entendimento:

RECURSO ESPECIAL – ALÍNEA “A” – EXECUÇÃO FISCAL – MEDIDA CAUTELAR FISCAL – INDISPONIBILIDADE DOS BENS DO SÓCIO - RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE – LIMITES - ART. 135, III, DO CTN – ARTIGO 4º, § 2º, DA LEI 8.397/92 – NÃO APLICAÇÃO. A responsabilidade excepcional do sócio-gerente somente se configura quando, no exercício da atividade de administração da pessoa jurídica, restar demonstrado que este agiu com abuso de poder, infração à lei, contrato social ou estatutos, a teor do disposto no artigo 135 do CTN, ou, ainda, se a sociedade foi dissolvida irregularmente. Não deve prevalecer, portanto, o disposto no artigo 4º, § 2º, da Lei 8.397/92, ao estabelecer que, na concessão de medida cautelar fiscal, “a indisponibilidade patrimonial poderá ser estendida em relação aos bens adquiridos a qualquer título do requerido ou daqueles que estejam ou tenham estado na função de administrador”. Em se tratando de responsabilidade subjetiva, é mister que lhe seja imputada a autoria do ato ilegal, o que se mostra inviável quando o sócio sequer era administrador da sociedade à época da ocorrência do fato gerador do débito tributário pendente de pagamento. Recurso especial não conhecido[15].

 Não resta dúvida, portanto, de que a indisponibilidade patrimonial apenas pode ser estendida ao sócio-gerente quando apresentados pela requerente indícios suficientes de ato ilícito a enquadrar-se na previsão do artigo 135, III, do CTN.

Não se olvide, contudo, que na busca da tutela de natureza cautelar, da qual não se exime a medida cautelar fiscal, o exame da verossimilhança da alegação não pode ser substituído pela sua evidência. Como já exposto, não existe prova característica ao processo cautelar, mas sim convicção judicial própria à concessão da tutela cautelar. Na tutela cautelar o julgador decide com base em convicção de verossimilhança preponderante. Em decorrência, a mesma revela-se incompatível com o aprofundamento do contraditório e da convicção judicial, situação que demanda porção de tempo a impedir a concessão urgente da tutela.

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Sobre o autor
Rodrigo Rebello Horta Görgen

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS / Analista Judiciário no Tribunal Regional Federal da 4ª Região / Especialista em Direito Público pela IMED

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GÖRGEN, Rodrigo Rebello Horta. Responsabilidade do sócio-gerente no âmbito da medida cautelar fiscal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3875, 9 fev. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26658. Acesso em: 22 dez. 2024.

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