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As implicações do direito urbanístico no desenvolvimento sustentável das cidades sob o enfoque do plano diretor da cidade do Natal/RN

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O estudo analisa as implicações do Plano Diretor no desenvolvimento sustentável das cidades, com enfoque no Plano Diretor de Natal/RN.

Resumo: O presente artigo analisa o Direito Urbanístico, com princípios e regras próprias, regulamentado na Constituição Federal brasileira juntamente com o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001). Esse último adquiriu o status de ser um marco institucional na reforma urbana, já que tem como objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, além de elencar um rol de instrumentos urbanísticos que o Município irá dispor para ordenar a ampliação das políticas urbanas, cujo principal é o Plano Diretor (lei municipal). No caso, a pesquisa bibliográfica realizada tem enfoque nas implicações do Plano Diretor da Cidade do Natal (Lei Complementar nº 082/07).

Palavras-chaves: Direito Urbanístico, Estatuto das Cidades, Desenvolvimento Sustentável das Cidades, Plano Diretor de Natal (LC nº 082/07).

SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Direito Urbanístico, Estatuto das Cidades e Plano Diretor; 2.1. Direito Urbanístico 2.2. Estatuto das Cidades 2.3. Plano Diretor – 3. O Plano Diretor no desenvolvimento sustentável das Cidades. 3.1 Conceito de Desenvolvimento Sustentável. 3.2. Plano Diretor e sustentabilidade. – 4. Implicações do Plano Diretor  de Natal no desenvolvimento sustentável das cidades 4.1. Plano Diretor da Cidade do Natal (LC nº 082/07) 4.2. As implicações do Plano Diretor de Natal – 5. Considerações Finais – 6. Referências   


1 INTRODUÇÃO

O Direito Urbanístico, com princípios e regras próprias, surge objetivando resolver os problemas decorrentes do processo intenso de urbanização. A Constituição Federal prevê os parâmetros gerais do seu desenvolvimento, juntamente com o Estatuto das Cidades (Lei nº 10.257/2001) que regulamenta o artigo 182 da CF e estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências.

Sem dúvida, este Estatuto adquiriu o status de ser o novo marco institucional na reforma urbana, já que tem como objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana (também sob o enfoque ambiental).

Assim sendo, para garantir o desenvolvimento sustentável e o bem-estar da população, o Estatuto das Cidades traz um rol de instrumentos urbanísticos que o Município ira dispor para ordenar o desenvolvimento das políticas urbanas.

Essa competência assegurada aos Municípios implica, por sua vez, na formação de instrumentos normativos, dentre os quais possui maior destaque constitucional o plano diretor que é o principal instrumento de política urbana e está previsto nos artigos 39  a 42 do Estatuto.

Posteriormente, passa-se às implicações do Plano Diretor no incremento da sustentabilidade das cidades, mencionando o conceito de direito sustentável e retratando as características e funções do Plano diretor, bem como se esse está cumprindo o seu papel de ordenar a função social da cidade e da propriedade urbana (também sob o enfoque ambiental), objetivando combater as desigualdades sociais da cidade e garantir a qualidade de vida da população.

E, no último tema, será visto se o Plano Diretor da cidade do Natal/RN (Lei Complementar nº 082/07) está cumprimento à finalidade deste instrumento para a ordenação e aplicação de políticas urbanas.

O presente trabalho será realizado de forma bibliográfica, em nível nacional e municipal, mais especificamente na cidade do Natal/RN, na qual trará contribuições para o conhecimento humano por meio do estudo de forma aprofundada no âmbito do direito urbanístico, consagrado na Constituição atual brasileira, bem como as implicações do Plano Diretor no desenvolvimento sustentável das cidades.


2 DIREITO URBANÍSTICO, ESTATUTO DA CIDADE  E PLANO DIRETOR

No presente capítulo serão abordadas as diretrizes gerais do Direito Urbanístico, o Estatuto das Cidades e o Plano Diretor, que objetivam ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, bem como garantir o desenvolvimento sustentável.

2.1 DIREITO URBANÍSTICO

Com o intenso processo de urbanização brasileira surgiram várias dificuldades que não foram corretamente enfrentados pela política pública de ordem e planejamento do espaço urbano.

Os mencionados problemas se respaldam quanto à migração da população rural para as cidades e, consequentemente, ocasionando especulação imobiliária, tendo em vista o grande número de pessoas que passaram a buscar meios de acesso à moradia que não eram atendidos pelos serviços públicos, como por exemplo, áreas periféricas, irregulares e sujeitas a problemas de riscos ambientais. Assim, cria-se um quadro em que as cidades brasileiras passam a ter seu território dividido em uma área legal (atendiam os padrões da legislação) e outra ilegal (não era abrangida pelos planos públicos).[1]

Diante desta problemática, surge a necessidade do Poder Público regularizar uma legislação urbanística, com princípios e regras próprias. A partir daí o Direito Urbanístico que foi incluído na Constituição Federal atual brasileira em um capítulo específico que trata de normas urbanísticas, em seus artigos 182 e 183.

Além disso, insta ressaltar as diretrizes gerais fixadas no Estatuto das Cidades (Lei Federal nº 10.257/2001) que regulamenta o artigo 182 CF e estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências.

Nesse sentido, Janaína Rigo e Ricardo Quinto, asseveram que o Direito Urbanístico “tem como objetivo ordenar o desenvolvimento das cidades como um todo, entendendo que os problemas urbanos não se dão de maneira isolada, mas sim que possuem ligação entre si e com a conjuntura do país”.[2]

Na mesma linha de intelecção, Rogério Gesta Leal[3] assevera que

O direito urbanístico teria por objeto o interesse da boa organização, ou seja, da melhor organização do território. Não uma organização meramente administrativa, mas calcada em princípios e orientações democráticas e que visem ao atendimento do bem-estar da sociedade como um todo.

Victor Carvalho tem outro ponto de vista, entendendo que  o direito urbanístico regula a produção do ambiente construído, cujo maior exemplo seriam as cidades que resultam da ação de vários agentes, ao longo de muitas gerações. É através do direito urbanístico que é definido os responsáveis pela criação do ambiente construído e as condições em que poderão operar.[4]

Importante mencionar os princípios que regulamentam o direito urbanístico. José Marcelo Ferreira Costa apud Regina Helena Costa[5] adverte que “a legislação disciplinadora do Urbanismo no Brasil é escassa, esparsa e pouco didática, o que dificulta a extração de princípios informadores desta matéria.”.

Nessa perspectiva, a obra de José Marcelo Ferreira Costa[6] traz os princípios elencados abaixo que foram extraídos das análises da mencionada autora, bem como do autor José Afonso da Silva:

a) Princípio da função social da propriedade: previsto no artigo 5º, LIV e XXIV. Isto é, a CF privilegiou o direito de propriedade no momento em que sua perda apenas se dará com o devido processo legal, sendo possível mediante justa e prévia indenização em dinheiro quando a desapropriação for por necessidade ou utilidade pública. Ressalta-se que este direito fundamental não é absoluto, tendo em vista que o próprio legislador mitigou sua extensão, por exemplo, no artigo 5º, inciso XXII e XXIII.

b) Princípio do Urbanismo como exercício da função pública: significa dizer que o meio urbano é ordenado pelo Poder Público que intervém, de forma direta, na propriedade privada.

c) Princípio da afetação das mais-valias ao custo da urbanificação: no momento em que há uma valorização dos imóveis urbanos, através de benefícios oferecidos pelo Poder público, os proprietários dos lotes devem satisfazer os gastos da urbanificação. Este princípio está expresso no artigo 2º, inciso XI, do Estatuto da Cidade.

d) Princípio da justa distribuição dos benefícios e ônus derivados da atuação urbanística: é consequência do princípio da isonomia, tendo em vista que o Poder Público no momento em que traça a política de desenvolvimento urbano deve observar a pauta de investimentos ao disponibilizá-los aos diversos grupos urbanos do Município. Este princípio encontra-se positivado no artigo 2º, inciso IX do Estatuto das Cidades.

Salienta-se que a doutrina confunde o princípio da função social da cidade com o princípio da função social da propriedade, ora já mencionado. Na realidade a diferença é mínima, aquela está inserida nessa.

Segundo Janaína Rigo e Ricardo Quinto apud Letícia Marques Osório, [7]

A função social da cidade, como uma construção coletiva, tem objetivos maiores do que a função social da propriedade isoladamente. A cidade tem ‘um compromisso com a dignidade da pessoa humana e com a garantia dos direitos fundamentais: moradia, trabalho, saúde, educação, lazer, acesso à justiça, segurança, entre tantos outros’. Assim, a cidade deverá tutelar a propriedade para que esta atenda às demandas da vida em coletividade e o desenvolvimento sustentável.

Simplificadamente fica claro que a função social da propriedade coincide com a função social da cidade, pois para que a cidade permaneça ordenada torna-se imprescindível que a propriedade cumpra sua função social.

O artigo 182 da CF menciona a função social da cidade e no artigo 2º do Estatuto da Cidade dispõe que a finalidade da política urbana é ordenar o desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana.

O § 2º do mesmo dispositivo legal e o artigo 39 do Estatuto das Cidades dispõem que a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende as exigências de ordenação das cidades divulgadas no plano diretor e para que a função social da cidade seja efetivada é necessário o cumprimento dos artigos 5º, 6º, 7º e 225º da CF que tratam sobre direitos e deveres individuais e coletivos, direitos sociais e direito a um meio ambiente sustentável.[8]

Com muita propriedade, Victor Carvalho afirma que “embora os princípios do urbanismo sejam de fácil compreensão, a sua aplicação concreta exige conhecimento técnico específico.”.[9]

 Isto quer dizer que os planos e projetos urbanísticos têm que ser elaborados por especialistas das mais diversas matérias, não podendo unicamente ser discutido pela sociedade.

No artigo 40, do Estatuto das Cidades fala da necessidade do processo de formulação do plano diretor e a fiscalização de sua implementação ser viabilizados com a participação social, utilizando-se, por exemplo, de audiências publicas e debates com participação da população.

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Ou seja, não basta apenas à interpretação dos princípios do direito urbanístico, é imprescindível observar os instrumentos que o Poder Público Municipal (competente para a execução da política urbana conforme artigo 182, caput, CF) deverá utilizar para enfrentar os problemas de desigualdade social e territorial das cidades, causados pela problemática do processo desenfreado de urbanização.

Esses instrumentos, bem como as diretrizes gerais de políticas urbanas estão elencados no Estatuto das Cidades e são consideradas normas gerais de direito urbanístico.

2.2 ESTATUTO DAS CIDADES

O artigo 182 da CF determinou que a política de desenvolvimento urbano fosse executada conforme diretrizes fixadas em lei. Essa lei é o Estatuto das cidades (Lei nº 10.257/2001).

Este Estatuto visa consolidar o direito  urbanístico brasileiro, regulamentando a política urbana e definindo novos princípios e objetivos, diretrizes e instrumentos urbanísticos.

Vê-se na dicção do artigo 2º da lei que a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e as serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.

O autor Rogério Gesta Leal[10] explica tal dispositivo:

O âmbito de sustentabilidade das cidades precisa ser medido em face dos direitos e garantias fundamentais assegurados pela Carta Constitucional vigente e do espaço físico e social em que eles podem se dar, a saber, notadamente, no âmbito das cidades (democráticas de direito). Isto implica reconhecer que mesmo o Estatuto da Cidade, enquanto diretriz/princípios gerais da ordenação deste espaço está totalmente vinculado à força normativa da constituição.

Assim, o Estatuto das Cidades representa um passo marcante em matéria constitucional urbanística, tendo em vista que se preocupa com o pleno desenvolvimento das funções sociais das cidades, objetivando garantir o direito às cidades sustentáveis.

Com perspicácia, adverte Janaína Rigo e Ricardo Quinto apud Edésio Fernandes[11]:

A Constituição Federal garantiu competência ao Município para agir no controle da urbanização, e o Estatuto das Cidades regulamentou os instrumentos constitucionais previstos para essa intervenção, como também criou um rol mais amplo de instrumentos. Tais instrumentos podem e devem ser usados pelos Municípios a fim de que os processos de uso, desenvolvimento e ocupação do solo urbano, sejam satisfatórios e para que as cidades brasileiras possam oferecer melhores condições de vida para a população, oferecendo condições de regularização fundiária às cidades ilegais e inibindo o uso da propriedade para fins especulativos, o que causa exclusão social e mau ordenamento espacial.

Os instrumentos a que o Estatuto se refere, de forma exemplificativa (já que se trata de uma lei geral), estão enumerados no artigo 4º e tratam de planejamento, urbanísticos, jurídicos, tributários e financeiros de gestão orçamentária participativa, entre outros.

Finalizando entendimento, Janaína Rigo e Ricardo Quinto ensinam que  a partir do Estatuto “os municípios brasileiros possuem as condições de executar uma política urbana articulada, amparada por princípios e diretrizes claras e traduzida em instrumentos capazes de intervir, de forma eficaz, sobre as mazelas do urbano.”.[12]

2.3. PLANO DIRETOR

O Plano Diretor é o principal instrumento de política urbana instituído pela Constituição Federal e enumerado no Estatuto das cidades, previsto no artigo 39 a 42.

Victor Carvalho afirma que “o plano urbanístico é fundamental para a qualidade de vida dos habitantes da cidade. Um bom plano pode prevenir a maior parte dos problemas urbanos”.[13]

Sua relevância reside, pois é detentor de um mecanismo mais sistematizado e eficiente do que os demais instrumentos de política urbana (parcelamento, edificação compulsórios, IPTU progressivo no tempo, desapropriação, entre outros), por estar sujeito a inúmeros requisitos de validade e diretrizes norteadoras.

No que tange à consecução deste princípio, o Município tem competência para disciplinar o plano diretor quanto ao seu conteúdo, processo de elaboração e implementação, já os Estados-membros apenas têm competência para legislar sobre direito urbanístico.

Corroborando entendimento, Rogério Gesta Leal[14] preconiza:

O planejamento de um Município deve obedecer às metas e diretrizes dos planos da região envolvente, do Estado ou da União, o que deve vir esboçado em sua legislação particular, notadamente em sua Lei Orgânica, principalmente pelo fato de que a Constituição Federal de 1988 não estabeleceu qualquer prazo para a elaboração do Plano Diretor nos Municípios, restringindo-se a exigi-lo nas cidades com mais de 20.000 habitantes. Diante disto, tal tarefa deve ser suprida pela Lei Orgânica, que deve dispor sobre ele no que diz respeito ao prazo para a sua elaboração e aprovação, quorum e mecanismos de participação popular.

Nesse cenário, as normas estaduais, gerais ou específicas devem ser observadas pelo Município, desde que estejam em consonância com a Constituição Federal, que apenas estabeleceu a criação do Plano Diretor para cidades com mais de 20.000 (vinte mil) habitantes.

Janaína Rigo e Ricardo Quinto apud Saule Júnior [15] afirmam que o Estatuto das Cidades considera

O Plano Diretor (lei municipal) como instrumento básico da política de desenvolvimento urbano e, por meio dele, que o Município deverá alcançar os objetivos de tal política, a garantir o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade, o cumprimento da função social da propriedade e condições dignas de vida urbana. 

Por fim, as funções sociais da cidade e da propriedade somente terão garantia constitucional se for condizente com os demais objetivos e princípios fundamentais do Estado brasileiro.

Isto é, a política de desenvolvimento tem que ter como prioridade às necessidades essenciais das populações pobres das cidades, objetivando não estar em conflito com as normas constitucionais, com o sistema de proteção dos direitos humanos e com o princípio do desenvolvimento sustentável.


3 O PLANO DIRETOR NO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DAS CIDADES

O desenvolvimento na cidade somente poderá ser considerado sustentável se tiver voltado para a eliminação da pobreza e redução das desigualdades sociais, assim sendo, passa-se ao estudo do conceito de desenvolvimento sustentável, bem como as questões paradoxais que impedem a implementação do direito a cidade sustentável.

3.1 CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

“A construção de um modelo sustentável de desenvolvimento não pode ser considerado como um caminho fechado, único, determinista, mas sim como um processo aberto, um horizonte em construção, diversificado e indeterminado.”[16]

Nesse sentido, o conceito de desenvolvimento sustentável não é algo concreto, é um processo em edificação, e que está de acordo com as necessidades e expectativas de cada sociedade.

Sendo assim, torna-se imprescindível que a sociedade seja chamada para debater o desenvolvimento sustentável das cidades. Corroborando entendimento Sandro Ari Andrade de Miranda e Luciana Leal de Matos de Miranda[17] falam com precisão sobre o tema:

A radicalização democrática seria um dos primeiros passos para instrumentalizar a efetivação de uma sociedade sustentável, posto que a participação, mais do que um mecanismo de decisão, também cumpre um importante papel educativo, além de permitir que vozes outrora não ouvidas possam se manifestar quanto ao novo modelo de sociedade. Nesse sentido, as iniciativas de planejamento participativo introduzidas em várias cidades brasileiras nos últimos anos podem ser importantes pontos de partida para este caminho.

Nesse cenário, Rogério Gesta Leal[18] afirma que:

o desenvolvimento na cidade somente poderá ser considerado sustentável se estiver voltado para a eliminação da pobreza e redução das desigualdades sociais, devendo, para tanto, adotarem-se políticas que priorizem os segmentos pobres da população. Do contrário, estará ela em pleno conflito com as normas constitucionais, com o sistema internacional de proteção dos direitos humanos (aqui compreendidos como direitos fundamentais) e com principio internacional do desenvolvimento sustentável. 

Ainda na óptica do autor supramencionado, esse assevera que a concepção de uma “cidade sustentável engloba, necessariamente, sua integralidade física, econômica, cultural e ambiental, vista como um todo vivo, no qual qualquer desequilíbrio de uma parte afeta todas as demais.”.[19]

Por fim, o desenvolvimento sustentável é um conceito em construção e que radicaliza a democracia, já que a participação da população torna-se imprescindível para a constituição de uma sociedade mais justa e participativa.

3.2 PLANO DIRETOR E SUSTENTABILIDADE

A sustentabilidade, nos últimos anos, passou a ser incorporada pelas políticas públicas voltadas ao planejamento e desenvolvimento urbano.

A construção de cidades sustentáveis é o foco essencial dessa política urbana que foi prevista no Estatuto das Cidades em seu artigo 2º, inciso I:

    Art. 2º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: I - garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;

Diante do artigo 182 da Constituição Federal, a política de gerenciamento urbano deve ser executada pelo Poder Público municipal,  objetivando ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.

Nesse sentido, o Plano Diretor Municipal tem a função de desenvolver a política urbana que cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas naquele Plano.

Se a carta constitucional desempenhou esta competência para a maioria dos Municípios brasileiros, por que a maioria deles não consegue dar efetividade aos ditames constitucionais?

Segundo Daniella Dias[20] algumas questões impedem à implementação do direito a cidade sustentável, a saber:

inexistência da autonomia financeira dos municípios, o problema das competências concorrentes para o desenvolvimento de políticas urbanas e a falta de vivência do federalismo cooperativo, a incipiente democracia participativa, a necessidade de redimensionamento das atividades realizadas pelo Ministério Público e pelo Poder Judiciário para dar um novo sentido e legitimidade às funções institucionais, tendo em vista o resgate da democracia e da cidadania.

Quanto à autonomia jurídico-financeira dos municípios e a repartição das receitas tributarias, a CF ampliou os percentuais de transferências tributárias aos Estados e Município, transferência essa não vinculada, apenas para a educação (artigo 167, inciso IV c/c artigo 212 CF).

Não obstante, ainda sobre o entendimento da autora supramencionada[21], a maioria dos municípios não possui essa autonomia financeira, tendo em vista que dependem de repasse de verbas pelo governo (União e Estados) para gerir suas atividades. Assim, a falta de autonomia jurídico-financeira é óbice à concretização dos princípios  e regras constitucionais para o desenvolvimento urbano.

No quesito das competências concorrentes para o desenvolvimento de políticas urbanas, tem-se que no Brasil ainda não há claramente definidas  e devidamente cumpridas às atribuições, sejam legislativas como administrativas.Essa falta de disposições normativas impede a concretização de políticas positivas ao espaço urbano. É necessário que cada Ente Federado faça jus de sua competência para a consecução de objetivos de desenvolvimento urbano.

Urge ressaltar sobre a inexistência de planejamento para a implementação de políticas públicas o que ocasiona a falta de efetividade do plano diretor municipal. Isto quer dizer que no âmbito municipal o planejamento ainda não é visto como uma importante ferramenta para o enfrentamento dos problemas urbanos.

Nesse pensamento, assevera Daniella Dias[22] que

As políticas públicas são realizadas aleatoriamente e o plano diretor, instituído primordial para se traçar as diretrizes e regras para a implementação de políticas de desenvolvimento e expansão urbana, ainda não ganhou a relevância necessária nos Municípios brasileiros. (...) os administradores municipais ainda não tomaram consciência sobre a importância da existência e da efetividade do plano diretor para o cumprimento das funções sociais da cidade e da propriedade.

Assim sendo, apesar de o plano diretor ser o principal instrumento no desenvolvimento de política urbana, sua aplicação e efetividade deixa a desejar em alguns municípios brasileiros, o que impede a concretização do direito a vida digna.

Importante mencionar, ainda, a participação do Ministério Público nas políticas de desenvolvimento urbano.

Consoante intelecção de Chynthia  Miner[23],

O Estatuto da Cidade, em seu corpo, menciona o Ministério Público uma única vez, ao fazer referência às ações de usucapião, o que não significa que seja esse o único papel da Instituição frente às inovações trazidas pela Lei. Ao contrário, a concepção que permeia o Estatuto da Cidade reclama a intervenção do Ministério Público em absolutamente todo o processo de implementação das políticas de desenvolvimento urbano.

Corroborando entendimento, Daniella Dias[24] diz que o “Estatuto da Cidade apresenta o Ministério Público como ator indispensável no processo de planejamento e crescimento dos espaços urbanos.”.

Ou seja, o Promotor de Justiça será agente determinante para a consecução de uma nova gestão urbanística.

Chynthia  Miner apud Amaitê de Mello[25] afirma:

De forma sintética, podemos afirmar que a obrigatoriedade da participação do Ministério Público nos instrumentos de política urbana decorre de quatro fatores principais, previstos na própria Lei n.º 10.257/01:

A)                as normas urbanísticas ali tratadas são de ordem pública;

B)                tais comandos normativos versam sobre interesse social indisponível;

C)                regem-se pelo princípio da participação democrática;

D)                a ordem urbanística, direito difuso, passa a integrar expressamente o rol da ação civil pública.

Nesse cenário, as diversas possibilidades de atuação do Ministério Público nas políticas urbanas, faz com que se torne imprescindível a criação de Promotorias de Justiça de Habitação e Urbanismo que possibilite a constante e necessária do Estatuto das Cidades, havendo, assim, um redimensionamento de suas atividades.[26]

Por fim, importante trazer à baila o funcionamento da democracia participativa, já que apesar do Estatuto das Cidades, em seus artigos 2º, II e 45, ter tratado da participação da população como imprescindível nas políticas urbanas, na prática, ela ainda é muito frágil, a depender de cada Estado.

Sem dúvida, a democracia atuante por meio de processos participativos é um instrumento básico da política urbana na construção de cidades sustentáveis e para que a democracia seja exercida nesse âmbito, o poder público municipal deve investir em processos democráticos.

Entre esses mecanismos de democracia, destacam-se dois principais para a construção da sustentabilidade das cidades: o orçamento participativo e o plano diretor, na qual à participação efetiva da população nas deliberações é condição de validade das Leis.

A par disso, Rogério Gesta Leal[27] traz à baila:

Dada a tradição excludente que impera em nosso pais, a participação de todas as parcelas da população tem-se tornado um dos principais elementos de legitimidade e validade de políticas publicas e formas de administração publica local. Assim, os governos nominados de democráticos caracterizam-se pelos espaços de participação social na gestão dos interesses comunitários que criam e efetivam em seus cotidianos.

Nessa esteira, o sistema de gestão democrática compreende a participação da sociedade civil, que tem competência para normatizar, fiscalizar e executar as atividades do Poder Público e agentes privados. A sociedade civil deve ser instituída por lei (Lei Orgânica Municipal ou Plano Diretor) que determinará sua competência.[28]

O Orçamento Participativo foi implementado, inicialmente, pela Prefeitura de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul. Esse instrumento permitiu uma maior transparência na atuação da administração pública com relação à estruturação do orçamento da cidade, que se ajusta periodicamente às necessidades locais, buscando uma forma de facilitar o debate entre a população e a sociedade civil com o governo municipal. [29]

Nesses debates, há discussão acerca do investimento do dinheiro público, na qual se escolhe as prioridades de aplicação dos recursos públicos conforme cada necessidade específica, bem como permite que  as partes conheçam os limites legais, políticos, financeiros e orçamentários que fazem parte da atual dinâmica da gestão.

Finalizando entendimento, Sandro Ari Andrade de Miranda e Luciana Leal de Matos Miranda[30], asseveram que

O orçamento participativo, ao abrir a gestão dos recursos públicos para a população, e tornar possível a transferência dos investimentos administrativos para locais de maior carência, também é um instrumento fundamental para o desenvolvimento de uma cidade sustentável, promovendo uma verdadeira desconcentração dos recursos públicos.

O Plano Diretor, conforme estudado no capítulo anterior, foi regulamentado na Constituição Federal de 1988 e no Estatuto das Cidades, este último passou a exigir a participação popular em todo o seu processo.

Nesse cenário, essa inovação legislativa permitiu que o cidadão  passasse a atuar com um papel importante nesta matéria, tendo em vista que historicamente os planos diretores sempre foram tratados por técnicos e especialistas. Esta participação da população não deve ficar restrita ao processo de elaboração da Lei do Plano Diretor, mas sim, abrange todo o seu processo de implementação, como por exemplo, vários instrumentos de política urbana: estudo de impacto de vizinhança, o estudo de impacto ambiental, planejamento orçamentário, entre outros.[31]

Ocorre que, esses instrumentos de participação democrática são frágeis em alguns Estados, no entanto, no presente trabalho, será discutido apenas o mecanismo do Plano Diretor de Natal/RN.

Diante do exposto, os supramencionados quesitos são os motivos pelo qual a maioria do Municípios brasileiros não conseguem dar maior efetividade aos ditames constitucionais do direito a cidade sustentável.

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Sobre a autora
Hemily Samila da Silva Saraiva

Mestranda em Direito/UFRN. Especialista em Direito Administrativo/UFRN, Direito Privado: Civil e Empresarial/UNP e Direito Processual Civil/UNI-RN. Advogada. Natal - RN – Brasil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SARAIVA, Hemily Samila Silva. As implicações do direito urbanístico no desenvolvimento sustentável das cidades sob o enfoque do plano diretor da cidade do Natal/RN. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3926, 1 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27336. Acesso em: 22 dez. 2024.

Mais informações

Orientador: Aurino Lopes Vila- Doutorando pela Universidade do país Basco; Mestre em Direito pela Universidade do Ceará.

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