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Uma análise da festa do peão de boiadeiros acerca dos direitos fundamentais

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4  CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percebe-se que os direitos fundamentais são tidos como direitos inerentes a qualquer indivíduo, derivado de um princípio maior que é a dignidade. A proteção desses direitos atualmente não é competência exclusiva do Estado, cabendo à coletividade difusa também buscar pela salvaguarda desses direitos previstos no texto constitucional. Pelo fato de os animais não humanos serem também passíveis de percepção e sofrimento (já que estes, na concepção de Bentham, são os elos existentes entre os humanos e os demais animais) e de sua proteção também ser prevista no Texto Maior, os direitos que resguardam a dignidade, tais como a proteção à vida e à integridade física, devem ser estendidos a eles. E um dos instrumentos fiscalizadores dessa tutela jurídica ocorre justamente na liberdade de denunciar, isto é, de expressar, situações que porventura infrinjam os direitos fundamentais previstos constitucionalmente.

Contudo, essa liberdade de expressão, como qualquer outro direito fundamental, é passível de ponderação e pode sofrer restrições. Os limites expostos a esse direito, em específico, podem ser elencados da seguinte forma: a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem. Entretanto, tais condicionamentos não são afetados no caso que foi objeto de análise do presente artigo. A entidade não governamental PEA, ao proferir sua opinião sobre o aspecto violento inerente aos rodeios e a crueldade contra os animais, emitiu uma avaliação de caráter subjetivo e ético, não se configurando como abuso de direito, pois estava apenas exercendo a prerrogativa decorrente da liberdade de expressão e, indiretamente, praticando o dever difuso de proteger os interesses dos animais.

No caso analisado como objeto do presente artigo, a Festa do Peão, ou seja, os rodeios, antes de serem observados como manifestações culturais e economicamente aferíveis, devem ser analisados como um espaço em que alguns direitos fundamentais estão sendo desrespeitados. Por isso, é legítimo ao cidadão, individual ou coletivamente organizados, questionar sobre a inconstitucionalidade desses eventos. Dessa forma, a possibilidade de censura por parte do Judiciário (no caso, o TJ/SP) não é procedente, uma vez, como bem diz Uadi Bulos, “que a liberdade de expressão quando exercida nos parâmetros constitucionais, representa uma salvaguarda para o regime democrático.” [24]


5 REFERÊNCIAS

BORNHOLDT, Rodrigo Meyer.  Liberdade de expressão e Direito à honra. Uma nova abordagem no Direito Brasileiro. Joinville, SC: Bildung, 2010.

BULOS, Uadi Lammengo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2012.

DIAS, Edna Cardozo. Os animais como sujeitos de direito. Disponível em: <http://www.abolicionismoanimal.org.br/artigos/os_animais_como_sujeitos_de_direito.pdf> acesso em 11 de julho de 2013.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, São Paulo: Saraiva, 2012.

MENDES, Gilmar Mendes; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva. 2009.

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito constitucional descomplicado. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método: 2011.

RODRIGUES, Danielle Tetü. O direito e os animais: uma abordagem ética, filosófica e normativa. Curitiba: Juruá, 2010.

SILVA, Tagore Trajano de Almeida. Direito animal e hermenêutica jurídica da mudança: animais como novos sujeitos de direitos. Disponível em: <http://www.abolicionismoanimal.org.br/artigos/hermeneutica.pdf> acesso em  11 de julho de 2013.

SINGER, Peter. Ética prática. São Paulo: Martins Fontes.

STEINMETZ, Wilson. “Farra do Boi”, fauna e manifestação cultural: uma colisão de princípios?  Disponível em: <http://www.dfj.inf.br/Arquivos/PDF_Livre/09_artigo_11.pdf> acesso em 10 de julho de 2013.

VIDAL, Delcia Maria de Mattos. Informação e liberdade de expressão: uma análise desses direitos fundamentais. Disponível em <http://www.fnpj.org.br/soac/ocs/viewpaper.php?id=391&cf=16> acesso em 13 de jul. 2013


Notas

[1] BOBBIO, Norberto. A era dos direitos, Rio de Janeiro: Campos, 1992, p. 4. In: MENDES, Gilmar Mendes; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva. 2009, p. 266.

[2] Idem, Ibidem, p. 269.

[3] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e a teoria da Constituição, Coimbra: Almedina, 1998, p. 373. In: MENDES, Gilmar Mendes; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva. 2009, p. 270.

[4] Segundo José Afonso da Silva, há uma perspectiva interna da liberdade de opinião, que carrega em si outros direitos pressupostos (tais como a liberdade de crença e de convicção política) que atuariam como uma dimensão prestacional desse direito; e uma perspectiva externa, consistente, de um modo geral, ao âmbito coletivo, como por exemplo, a liberdade de comunicação, de transmissão e recepção do conhecimento. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional Positivo. 15. Ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 244-246. In: BORNHOLDT, Rodrigo Meyer.  Liberdade de expressão e Direito à honra. Uma nova abordagem no Direito Brasileiro. Joinville, SC: Bildung, 2010, p. 83.

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[5] MENDES, Gilmar Mendes; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva. 2009, p. 403.

[6]Idem, Ibidem, p.403.

[7] In: BORNHOLDT, Rodrigo Meyer.  Liberdade de expressão e Direito à honra. Uma nova abordagem no Direito Brasileiro. Joinville, SC: Bildung, 2010, p. 85 e 86.

[8]MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, São Paulo: Atlas, 2005. In: PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito constitucional descomplicado. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método: 2011, p. 131.

[9]Habermas distingue cinco categorias dos direitos fundamentais, dentre as quais destaca-se os  “direitos fundamentais a uma participação em condições de igualdade nos processos de formação da opinião e da verdade no âmbito do qual os cidadãos exercem a sua autonomia política através do qual instauram o direito legítimo”.  HABERMAS, Jürgen. Faktizität und Geltung. In: VIDAL, Delcia Maria de Mattos. Informação e liberdade de expressão: uma análise desses direitos fundamentais. Disponível em <http://www.fnpj.org.br/soac/ocs/viewpaper.php?id=391&cf=16> acesso em 13 de jul. 2013.

[10] BORNHOLDT, Rodrigo Meyer.  Liberdade de expressão e Direito à honra. Uma nova abordagem no Direito Brasileiro. Joinville, SC: Bildung, 2010, p. 140.

[11] DOTTI, Renné Ariel. A proteção da vida privada e liberdade de informação. Possibilidades e limites. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980, p. 145. In: BORNHOLDT, Rodrigo Meyer.  Liberdade de expressão e Direito à honra. Uma nova abordagem no Direito Brasileiro. Joinville, SC: Bildung, 2010, p. 84.

[12] CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital. Constituição da República Portuguesa anotada. Coimbra: Coimbra Editora, 1991, p. 225-226. In: BORNHOLDT, Rodrigo Meyer.  Liberdade de expressão e Direito à honra. Uma nova abordagem no Direito Brasileiro. Joinville, SC: Bildung, 2010, p. 85.

[13] MARCUSE, Herbert. Tolerância repressiva. In BORNHOLDT, Rodrigo Meyer.  Liberdade de expressão e Direito à honra. Uma nova abordagem no Direito Brasileiro. Joinville, SC: Bildung, 2010, p. 84.

[14] LUHMANN, Niklas. Die Realität der Massenmedien, p. 159-168. In BORNHOLDT, Rodrigo Meyer.  Liberdade de expressão e Direito à honra. Uma nova abordagem no Direito Brasileiro. Joinville, SC: Bildung, 2010, p. 116.

[15] LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1204.

[16] Idem, ibidem, p. 1206.

[17] STEINMETZ, Wilson. “Farra do Boi”, fauna e manifestação cultural: uma colisão de princípios?. Disponível em: <http://www.dfj.inf.br/Arquivos/PDF_Livre/09_artigo_11.pdf> acesso em 10 de julho de 2013.

[18] LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1206.

[19] SILVA, Tagore Trajano de Almeida. Direito animal e hermenêutica jurídica da mudança: animais como novos sujeitos de direitos. Disponível em: <http://www.abolicionismoanimal.org.br/artigos/hermeneutica.pdf> acesso em  11 de julho de 2013.

[20]DIAS, Edna Cardozo. Os animais como sujeitos de direito. Disponível em: <http://www.abolicionismoanimal.org.br/artigos/os_animais_como_sujeitos_de_direito.pdf> acesso em 11 de julho de 2013.

[21] SINGER, Peter. Ética prática. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 66.

[22] Idem, Ibidem, p. 85.

[23]DIAS, Edna Cardozo. Os animais como sujeitos de direito. Disponível em: <http://www.abolicionismoanimal.org.br/artigos/os_animais_como_sujeitos_de_direito.pdf> acesso em 11 de julho de 2013.

[24] BULOS, Uadi Lammengo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 577.

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Sobre os autores
Marina Coêlho Sousa

Estudante de Direito (UFPI)

Marcos Victor Teixeira Colaço

Estudantes de Direito (UFPI)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUSA, Marina Coêlho ; COLAÇO, Marcos Victor Teixeira. Uma análise da festa do peão de boiadeiros acerca dos direitos fundamentais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4002, 16 jun. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29492. Acesso em: 26 abr. 2024.

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