Juiz político não é juiz. Deste só se exige uma política, a da coisa certa a fazer. Magistrado medroso não é magistrado, é fantoche. Quem se curve a ameaças, expressadas ou veladas, não será digno do cargo ocupado.
Assim penso, sem hipocrisia. Assim também ajo, certo de que a ninguém ofendo e a nenhum direito impeço. Por fim, “não são os postos que honram os homens; são os homens que honram os postos” (Agesilau – rei de Esparta: 399-360 a.C.).
Eis a introdução necessária ao fato notório de 11 de junho de 2014. Sabidamente, no episódio do mensalão, o ministro Joaquim Barbosa foi e continua sendo o fiel da balança. Como ninguém, entregou-se à busca da verdade, com a qual comprometido – a bem do povo brasileiro.
Às vésperas da aposentadoria voluntária, esse Magistrado (de se notar o “M” maiúsculo) continua na missão de dar um basta a malfeitos de toda ordem – e de forma exitosa! Foi do que fez em sessão do STF, que preside, no uso indeclinável de seu poder de polícia.
Ao início dos trabalhos, sessão instalada, inesperadamente, assomou à tribuna o advogado do condenado José Genoíno, mensaleiro de todos conhecido. Fê-lo à revelia de não estar em pauta pedido de interesse do constituinte. De dedo em riste e tom ameaçador, cobrava do ministro providência tendente à sua pronta apreciação pelo Pleno do Tribunal.
Discurso exageradamente exaltado, aos gritos e insistentemente, tentava impor seus argumentos. Palavra cassada, em vão. Intento persistente, a mais não poder, resultante naquela cassação e no microfone desligado. Este o contexto do momento.
Indaga-se: Barbosa tinha outra alternativa, senão a determinação de sua retirada do plenário? Abuso de autoridade do Ministro Presidente, que tem o dever de manter ordem no ambiente de trabalho? Decididamente, não!
Basta se veja do art. 445, I e II, do Código de Processo Civil. Ou seja, compete ao magistrado manter a ordem e o decoro na audiência (em última análise, sessão pública) e ordenar que desta se retirem os que se comportarem inconvenientemente. E teria sido conveniente a forma pela qual agiu o advogado? Sem prévia consulta, invadiu a tribuna e, de forma acintosa e extravagante, dirigiu-se ao Presidente do STF, ferindo o critério de ordenação de sessão já em curso.
Por outro lado, o comum da vida nos mostra que, entre pessoas educadas, há limites a respeitar. Por exemplo, jamais me abalançaria a ir portas adentro do escritório dum advogado, estivesse ele fazendo o que estivesse, para, independentemente de qualquer outra coisa (incondicionalmente, pois), com ele me avistar ou dele algo cobrar – inda mais “na marra”. Além disso resultar da lógica das coisas, tem tudo a ver com a educação da pessoa.
Assim, de se adotar e preservar critérios para a boa convivência dos profissionais do foro, sob pena de se instaurar confusão. Está na Constituição Federal: meu direito vai até onde comece o do outro. Isto, sim, é democracia – o mais é baderna!
De fato, até no Brasil há de se ter limites! Uma coisa é a prerrogativa legal do advogado, outra, muito diferente, o abuso dessa prerrogativa, a ferir princípios comezinhos de Direito e a motivar fundada reação do magistrado, que tem o dever, porque detentor do poder de polícia da Sessão, de agir. Na situação, eram possíveis ao advogado (há quem diga estivesse alcoolizado), sem invadir a tribuna e confrontar o Presidente do STF, providências outras no sentido de defender o interesse do cliente.
O fato, qual se deu, passa ao largo do regular exercício da advocacia, a desbordar em nítido abuso, suscetível de coibição. Em verdade, deu-se desacato à autoridade do ministro – pela forma desrespeitosa e, ao final, até ameaçadora do advogado, que disse: “Eu pegarei Vossa Excelência... por abuso de autoridade”.
Note-se: entre a parte inicial da frase e a final, decorreu certo tempo, a denotar, por inferência circunstancial, de parte do ameaçador, que o verbo “pegar” implicou muito mais que a só perspectiva de providência eventual correlata a possível (quão inexistente) abuso de autoridade.
Repita-se: quem abusou foi o advogado. O bom profissional não faz isso. Não foge ao equilíbrio para invadir a tribuna duma audiência ou sessão de julgamento, em tom provocativo e ameaçador. Ao contrário, busca no avistamento regular, pelas vias comuns de contato entre verdadeiros profissionais do foro, resolver possíveis problemas.
Tem-se dito que a OAB pretende tomar providências contra o ministro. Se o fizer, fará muito mal! Aliás, já o faz, apequenando-se, ao dar apoio à atitude destrambelhada do associado. Compete-lhe, isto sim, não se afastar do discernimento da questão, reconhecendo a atitude descomedida do advogado, que se expôs, inclusive, à ordem de prisão por desacato – pois foi isso o que de fato sucedeu (queiram ou não).
Equilibrado, no estrito legítimo exercício do poder de polícia, o ministro limitou-se a providências de menor repercussão, cassando a palavra de quem, ali e naquele instante, não deveria estar, a perturbar a ordem natural da sessão em curso.
Neste País, há muito, tem-se confundido democracia com anarquia, num desrespeito flagrante à autoridade constituída. E, definitivamente, não é por aí... Aliás, também não se pode trocar alhos por bugalhos, pois o direito à palavra, ínsito ao advogado no exercício de seu mister, tem limites – os da lei!
Numa democracia de verdade, ninguém pode tudo; cada um faz sua parte, dentro de limites preestabelecidos.
E, na situação, o advogado não fez sua parte, aparentemente, a servir de joguete de interesses outros, quiçá de cunho político, para atingir, uma vez mais, propositalmente, a figura do hoje herói da brasilidade – o ministro Joaquim Barbosa. São os inimigos da verdade em ação, contra quem age desbaratando a mentira!
Grande é o advogado que se respeita, respeitando aos outros e o primado da lei. Quando, como qualquer profissional doutra área, foge disso, apequena-se, e ai da sociedade ou da Associação de Classe que o referende, pois deslustrará sua história, tornando-se pequena quando haveria de permanecer grande.
Na realidade, no seu campo de atuação e adstrito ao que pode, Barbosa tem segurado a corrupção com braço de ferro, no uso regular do poder de polícia que lhe é ínsito, ajustado à autoridade moral de quem, ao menos aparentemente, não trai seus princípios – na luta incessante pela prevalência do bem comum.