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A necessidade de demonstração da causa de pedir na ação monitória por cheque prescrito

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16/11/2014 às 13:33

Resumo:


  • Legislação e jurisprudência reconhecem a possibilidade de ajuizar ação monitória com base em cheque prescrito.

  • O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou entendimento de que é admissível a ação monitória fundada em cheque prescrito sem a necessidade de demonstração da causa debendi.

  • A apresentação da causa de pedir na ação monitória de cheque prescrito foi objeto de debate, mas o STJ decidiu que a menção ao negócio jurídico subjacente à emissão do cheque é dispensável na petição inicial, podendo a discussão sobre a causa debendi ocorrer nos embargos monitórios pelo réu.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

4. DA NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR NAS AÇÕES MONITÓRIAS POR CHEQUE PRESCRITO

Expostas as linhas gerais as características da causa de pedir, do titulo de crédito cheque e ainda verificada a possibilidade da propositura da ação monitória para perseguir a satisfação de crédito representada por cheque prescrito; passaremos ao exame do problema principal do presente trabalho, que é avaliar a necessidade de apresentar a causa de pedir neste tipo de demanda.

4.1. A CAUSA DE PEDIR NA AÇÃO MONITÓRIA POR CHEQUE PRESCRITO   

Inicialmente, verificamos que a causa de pedir na ação monitória do cheque prescrito será a própria causa debendi, ou seja, o negócio jurídico que dá origem à emissão do cheque.

Desta feita, verifica-se que a própria jurisprudência aponta que:  

O Tribunal a quo, ao analisar o mérito recursal, embora tenha se reportado à causa debendi, fê-lo no sentido de que basta a prova escrita configurada na apresentação dos cheques prescritos a instruir a demanda originária, que far-se-à presente a causa de pedir, ou seja, superada a aludida complementação da relação jurídica que originou o débito, conforme entendera o magistrado de primeiro grau.[...] Nada além, sem mais delongas, em relação à argüida necessidade de exposição dos fatos jurídicos, porquanto estes se apresentam enfeixados aos fundamentos jurídicos no procedimento especialíssimo da monitória. Apresenta-se, pois, satisfeito o elemento objetivo da demanda, qual seja, a causa de pedir, na forma abalizada pela teoria da consubstanciação, adotada pelo Código de Processo Civil. (BRASIL, 2008b).

Podemos chegar a esta conclusão, pois Wambier, Almeida e Talamini (2007, p. 128/129) explicam que a causa de pedir (causa petendi), também denominada como razão do pedido, pode ser definido rapidamente como o conjunto dos fundamentos apresentados ao juízo, composto pelos fatos e fundamentos jurídicos a eles aplicáveis. De maneira perfunctória, é possível afirmar que a causa de pedir é o motivo em virtude do qual a parte autora se dirige ao Poder Judiciário.

Todavia, necessário expor quais os principais desdobramentos da demonstração da causa de pedir na inicial, a fim de entender a relevância da discussão proposta com o presente trabalho.

A necessidade de o autor declinar à exordial a causa de pedir que arrima o seu pleito é evidente. Como já dito outrora, o direito brasileiro optou pela teoria da substanciação para a qual o demandante deve demonstrar à inicial não apenas o cotejo dos fundamentos jurídicos que embasam a sua pretensão, mas também os fatos que dão gênese ao seu pleito. Inclusive, a ausência de menção à causa de pedir importa em extinção da inicial em razão de inépcia, com atenção ao art. 295, § único, I do CPC.

Nesta linha, o contraditório e a ampla defesa serão desenvolvidos dentro dos limites propostos pelo autor ao no momento do aforamento da ação, estabelecidos por meio do declínio dos elementos identificadores da ação e também o objeto e a extensão da prestação jurisdicional que será rogada ao julgador.

Por isto mesmo, há especial importância de o autor declinar de maneira adequada a causa de pedir na peça portal da ação, possibilitando a garantia do contraditório, considerando que a ampla defesa assegura ao réu conhecer os fatos constitutivos do direito exarado pelo autor. Por isto mesmo, visualizamos a imposição legal do art. 282, III do CPC, que obriga o autor a demonstrar a causa de pedir do direito pleiteado.

Não se pode esquecer também que a demonstração adequada da causa de pedir encontra especial ressonância na identificação de litispendência e coisa julgada, a teor dos §§ 2º e 3º do art. 301 do CPC.

Ademais, estabilizada a causa de pedir na fase postulatória, o objeto da prova ficaria delimitado de modo que a modificação do substrato fático em que se funda a ação importaria em verdadeira inovação ilegal com evidente prejuízo ao demandando. Isto porque operada a citação, a demanda resta estabilizada e alterar a causa de pedir depende de aceitação prévia da parte ré, a teor do art. 264 do CPC.

Com atenção a todo o exposto, é que Tucci (2001, p. 135) aponta como principais consequências da adoção da teoria da substanciação, as seguintes: a) os fatos expostas na exordial limitam a cognição judicial; b) impossibilidade de alteração do conteúdo causal no decorrer do processo; c) limitação dos efeitos da coisa julgada àquelas matérias deduzidas e decididas; d) possibilita a propositura de outra ação discutindo a mesma relação substancial, mas com causa de pedir diversa; e) a não ocorrência da preclusão absoluta daquela relação.

Logo, não resta qualquer dúvida de que a causa de pedir na ação monitória por cheques prescritos será o negócio jurídico que deu origem à emissão da cártula. Outrossim, verificamos as repercussões importância da descrição especifica da causa de pedir na inicial de qualquer demanda, eis que essencial ao trâmite regular do processo.

4.2. DOS POSICIONAMENTOS PRETORIANOS SOBRE A PROBLEMÁTICA

A necessidade de demonstração da causa de pedir nas ações monitórias com arrimo em cheque prescrito foi alvo de controvérsia jurisprudencial por muito tempo, até que houvesse uma orientação concreta sobre a matéria.

Inclusive, encontramos duas correntes com posicionamentos diferentes sobre a matéria que, em suma, divergiam sobre a necessidade ou não de destacar a causa debendi do crédito. Todavia, o STJ, por via de julgamento de recurso repetitivo representativo de controvérsia, proferiu entendimento sobre a matéria, com azo principal de por fim à celeuma.

Assim, far-se-á uma análise sobre os argumentos defendidos por cada uma destas correntes, bem como deixar assente qual é o entendimento majoritário no cenário jurídico atual.

4.2.1. Primeira Corrente: Necessidade de Comprovação da Causa de Pedir 

A primeira corrente existente sobre a matéria defendia a indispensabilidade da comprovação da causa de pedir na exordial da demanda monitória que tem como seu fundamento principal o cheque que já tem sua pretensão executiva prescrita.  O principal Tribunal adepto a este pensar é o do Distrito Federal – TJDF, e de maneira mais incipiente, encontramos arestos no Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – TJMG.  

Segundo os adeptos desta corrente, a ação monitória é passível de contraditório, oportunidade em que deverá ser garantia a ampla defesa ao demandado. Assim, não apresentada a causa de pedir, não estão presentes os fatos que dão origem ao pedido e consequentemente a petição seria completamente inepta.

Com este rumo, colhemos do TJMG o precedente abaixo:  

AÇÃO MONITÓRIA – CHEQUE PRESCRITO – ILEGITIMIDADE ATIVA – CHEQUE NOMINAL A TERCEIRO – SENTENÇA EXTINTIVA. CHEQUE PRESCRITO – NECESSIDADE DE NARRAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR MEDIATA – EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM EXAME DO MÉRITO. [...] – A petição inicial da ação monitória, diversamente da execução, não está dispensada da descrição da causa de pedir mediata. – A descrição da causa de pedir é necessária tendo em vista que na aludida ação pode haver o contraditório, de modo que ao réu deve ser proporcionada a possibilidade de ampla defesa. (MINAS GERAIS, 2005).      

No mesmo norte, o TJDF já decidiu de maneira semelhante:

CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. APTIDÃO PARA INSTRUIR A AÇÃO INJUNTIVA. PRECEDENTES. VENCIMENTO DO PRAZO PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO DE ENRIQUECIMENTO. ARTIGO 61 DA LEI N.º 7357/85. NECESSIDADE DE O AUTOR DECLINAR, NA AÇÃO MONITÓRIA, A CAUSA DEBENDI. PRESCRIÇÃO PARCIAL DA COBRANÇA. PRAZO QUE SE REGULA PELA LEGISLAÇÃO DE DIREITO MATERIAL. OBRIGAÇÃO CONCERNENTE À PRESTAÇÃO RELATIVA A ALUGUÉIS. ARTIGO 178, §10º, IV, CCB de 1916.

1 - Na esteira dos precedentes deste Tribunal, considera-se o cheque prescrito documento apto a ensejar a propositura da ação monitória;

2 - Prescrito o cheque e ultrapassado o prazo bienal estabelecido no artigo 61 da Lei do Cheque (Lei n.º 7357/85), deve o proponente da ação monitória declinar a relação jurídica material que ensejou a emissão do título prescrito;

3 - O direito à ação monitória fundada em cheque prescrito proposta após o vencimento do prazo da ação de enriquecimento prevista no artigo 61 da Lei do Cheque prescreve em 5 (cinco) anos, se o pedido disser respeito à cobrança de aluguéis. Artigo 178, §10º, inciso IV.

4 - Apelo parcialmente provido. (DISTRITO FEDERAL, 2009).

Neste último acórdão, verificamos ainda que não há qualquer dúvida quanto à viabilidade de o cheque prescrito aparelhar a ação monitória pela qual o demandante pretende resgatar o valor, mas a cártula servirá como mero indício da existência do crédito, devendo o autor descrever a causa de pedir na exordial e incumbirá ao demandado trazer a lume causa modificativa, extintiva ou impeditiva do pleito inicial.    

Ademais, encontramos ensinamento doutrinário que apresenta outras importantes situações que impõem a necessidade da indicação da causa de pedir para os casos em que seu objeto for o cheque prescrito.

Segundo o ensinamento de Costa (2007, p. 373), a partir do momento em que o cheque está prescrito ele necessariamente terá vinculação ao seu negócio de origem; ao fato que motivou a sua emissão, sendo necessário o esclarecimento quanto à sua causa debendi, pois poderá por muitas vezes decorrer de atos ilícitos (extorsão, fraude, etc.), o que necessariamente viciaria a vontade do emitente. Na mesma esteira, poderiam estar incluídas junto ao valor exigido na cártula verbas indevidas, tais quais juros extorsivos e decorrentes de agiotagem.

Pouco adiante, o autor faz outra importante observação quando assevera que o cheque prescrito perde as características inerentes aos títulos de crédito, como a sua autonomia, aduzindo que:

A ação monitória é mista, é um processo de conhecimento com prevalente função executiva. Daí a necessidade de ser inserida a origem do débito ou causa de pedir no contexto próprio do processo de conhecimento, mesmo estando evidenciada a demonstração de que o cheque foi devolvido por insuficiência de fundos. Mas é preciso, para tanto, conhecer a relação jurídica que ensejou a emissão do cheque. Não há, na espécie, como sustentar que o título e suas declarações são autônomos. Isso porque, perdendo sua força executiva em razão da prescrição, aquele cheque prescrito deixa de ser um título de crédito e perde todos os seus atributos. (COSTA, 2007, P. 373).

Esta é a principal argumentação daqueles que defendem a necessidade de demonstração da causa de pedir para estes casos, a ação será de cunho causal, de conhecimento, sendo necessária a demonstração da origem da cártula. Agora o cheque já não tem mais todas as características de um título de crédito, bem como de um título executivo extrajudicial, emergindo a necessidade de averiguar a legalidade em sua gênese.

Corroborando esta assertiva, apontamos Malfatti (2008, p. 216):

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[...] tem-se como possível que a ação monitória seja aparelhada com fundamento num cheque prescrito  após o prazo de dois anos previsto no art. 61 da Lei n.º 7.357/1985. Trata-se de “ação causal” em que o credor deve ao menos indicar – como causa de pedir – o negócio originário travado entre as partes. O art. 62 da Lei n.º 7.357/1985 apenas ratificou a possibilidade de ajuizamento de uma ação de cobrança do crédito que deu origem ao cheque. E, como salientam Restiffe e Restiffe Neto (2000, p. 60), “esse direito de ação comum causal pode ser exercido através de um procedimento, seja de cobrança (ordinária ou sumária), seja por ação monitória, desde que satisfeitos os requisitos pertinentes”. Na hipótese tratada, em todas as espécies de demanda, incluindo-se a ação monitória, deve o autor indicar a causa debendi.   

Assim, excedido o prazo de dois anos para o ingresso com a ação de enriquecimento ilícito, o cheque não passaria de mero indício de prova da obrigação, havendo, portanto, imposição de declinar o negócio jurídico subjacente para que haja êxito na ação monitória então intentada.

Encontramos julgado o Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC neste sentido:

[...] Segundo entendimento majoritário desta Corte, "indispensável a revelação e a comprovação da causa debendi em ação monitória intentada após o término do prazo mencionado no art. 61 da Lei n. 7.357/85, porquanto o cheque, nessa hipótese, configura tão-somente elemento probatório da obrigação subjacente a ser explicitada pelo credor" (Apelação cível n. 2004.009788-3, de Balneário Camboriú, rel. Des. Ricardo Fontes, j. em 23/09/2004). (SANTA CATARINA, 2005).

Observamos, contudo, que, embora tal entendimento tenha fundamentos juridicamente relevantes e que tenham como principal norte a garantia de segurança jurídica; gradativamente foi sendo superado pelos Tribunais, muito embora a discussão tenha se mantido viva.

Porém, denota-se que já há algum tempo em que tal corrente perdeu força, sucumbindo ao entendimento de que é prescindível a comprovação da causa de pedir no momento da propositura da monitória por cheque prescrito, conforme demonstraremos adiante.  

4.2.2. Segunda Corrente: Dispensabilidade da Comprovação da Causa Petendi

 O segundo entendimento, e também dominante nos Tribunais Pátrios, é de que no momento em que proposta a ação monitória arrimada em cheques prescritos, será dispensável a comprovação da causa de pedir e consequentemente o negócio jurídico subjacente à emissão da cártula.

De acordo com este forma de pensar, o cheque, ainda que prescrito, será  suficiente para deflagrar a demanda injuntiva em face ao devedor, mormente considerar que o título é emitido, adquire irrefragavelmente as características da abstração e também da autonomia. Assim, o título ficará desprendido à situação fática que lhe deu causa.

Imprescindível destacar o entendimento de Talamini (2014, p.157), quando defende que “[...], prescrita a força executiva do cheque, nem por isso ele perde integralmente os seus atributos de título de crédito (em que se destaca a abstração da causa debendi). [...]”.

Nada obstante, a prescrição obsta a possibilidade do cheque embasar ação de execução, pois embora ainda esteja dotado dos requisitos da certeza e da liquidez, já que não tem mais a característica da exequibilidade própria dos títulos de crédito extrajudiciais.  

Em verdade, à exceção do TJDF, verificamos de praticamente todos os demais tribunais nacionais adotam orientação com este norte.

Inicialmente, citamos de maneira ilustrativa o seguinte precedente do TJSC:

MONITÓRIA. CHEQUES PRESCRITOS. AJUIZAMENTO DO PEDIDO APÓS TER ESCOADO O PRAZO PARA AÇÃO DE LOCUPLETAMENTO SEM CAUSA. DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CAUSA DEBENDI. TÍTULO QUE, MESMO DEPOIS DA PERDA DO PRAZO PARA AS AÇÕES CAMBIAIS, NÃO PERDE A SUA NATUREZA DE AUTONOMIA EM RELAÇÃO AO NEGÓCIO JURÍDICO SUBJACENTE À SUA EMISSÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS EMBARGOS MANTIDA. "Com respaldo na recente orientação emanada do STJ, é dispensável a revelação da causa debendi na ação monitória que tem por base cheque prescrito, independentemente da ocorrência de prescrição da demanda de enriquecimento ilícito (art. 61 da Lei n. 7.357, de 2-9-85)". (...) (ACV n. , de Capinzal, rel. Des. Ricardo Fontes, j. 04/09/08). (SANTA CATARINA, 2010).

Colhemos deste julgado não apenas a persistência da autonomia e abstração do título, mas ainda que também permanece inalterada a impossibilidade de trazer a lume as ditas exceções pessoais, até mesmo para o cheque prescrito, razão que também reforça a ausência de interferência da demonstração da causa debendi para o deslinde da ação monitória.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul – TJRS não diverge deste pensar:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. DOCUMENTO HÁBIL À INSTRUÇÃO DO PEDIDO. IMPUGNAÇÃO. INICIAL. DESCRIÇÃO DE CAUSA DEBENDI. DESNECESSIDADE. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME. (RIO GRANDE DO SUL, 2008).

E também o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP também foi adepto deste raciocínio:

Ação monitória Prescrição – Cheque prescrito Aplicação da prescrição qüinqüenal porque cheque prescrito equivale a instrumento particular representativo de confissão de dívida líquida (art. 206, § 5º, I do CC e súmula 18 do TJSP) – Prescrição não consumada Recurso negado. Ação monitória Não é necessário declinar-se a causa subjacente da emissão do cheque prescrito na ação monitória O cheque prescrito é título bastante para instruir ação monitória, que possui como requisito a prova escrita sem eficácia de título executivo, conforme dispõe o artigo 1.102a do CPC. A ação monitória com base em cheque prescrito dispensa a causa da sua emissão – Procedência da ação monitoria Constituição da prova escrita em título executivo – Recurso negado. Correção monetária Incidência a partir da emissão do cheque Recurso negado. Sucumbência Sucumbência mínima do pedido da autora, de modo que a sentença corretamente impôs ao réu por inteiro as despesas e honorários (art. 21, § único, do CPC) Recurso negado. Recurso negado. (SÃO PAULO, 2012).

Ademais, ainda trazemos a título exemplificativo do entendimento ora demonstrado em aresto do próprio STJ:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. DOCUMENTO HÁBIL À INSTRUÇÃO DO PEDIDO. IMPUGNAÇÃO. INICIAL. DESCRIÇÃO DE CAUSA DEBENDI. DESNECESSIDADE. I. A jurisprudência do STJ é assente em admitir como prova hábil à comprovação do crédito vindicado em ação monitória cheque emitido pelo réu, cuja prescrição tornou impeditiva a sua cobrança pela via executiva. II. Para a propositura de ações que tais é despicienda a descrição da causa da dívida. III. Recurso especial conhecido em parte e provido. (BRASIL, 2008a).

O aresto acima dá início à importante discussão quanto à matéria que pode ser debatida nos embargos monitórios. No corpo do voto proferido pelo relator, Ministro Aldir Passarinho Junior, visualizamos que, de fato, o autor está dispensado de descrever e comprovar a causa de pedir do seu pleito; sendo a cártula prova suficiente para amparar a ação monitória.

Todavia, faz a ressalva de que a defesa apresentada via embargos monitórios é a mais ampla possível, incumbindo ao réu suscitar neste momento processual fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do demandante. Esta constatação decorre da identificação da ação monitória com o rito ordinário, bem como de que o art. 333, II do CPC[24] é de clareza solar neste sentido.

Ou seja, ao revés do que constatamos de uma análise perfunctória desta corrente, de que a causa de pedir não tem relevância ao deslinde da ação, a comprovação desta poderá ser essencial ao desate da ação.

Como já foi abordado anteriormente, depois de ser devidamente citada na ação monitória, a parte ré poderá tomar três providências distintas: i) realizar o pagamento do valor, quando ficará isenta do ônus de sucumbência; ii) permanecer inerte, oportunidade em que será revel e o mandado inicial converter-se-á de pleno direito em executivo; ou iii) apresentar os embargos, fazendo com que a demanda siga o rito ordinário, até ser proferida sentença.

Embora na exordial não seja necessário ao demandante comprovar a causa de pedir, sem que esta tenha qualquer ingerência nos casos de pagamento dívida ou da revelia; poderá o réu trazer a lume situações que maculem a causa debendi e consequentemente a causa de pedir e obstaculize o interesse processual do demandante, curso até mesmo na improcedência do pleito inicial.

Assim, não haveria enriquecimento ilícito do demandante ou até mesmo pedido juridicamente inadmissível se não demonstrada a causa de pedir na inicial, pois poderá o réu fazê-lo no momento em que opuser os embargos monitórios, oportunidade em que também deverá fazer prova de suas alegações.

Corroborando este pensar, citamos julgado do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná – TJPR:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO MONITÓRIA - EMBARGOS IMPROCEDENTES - CHEQUE PRESCRITO - DOCUMENTO HÁBIL A INSTRUIR O PEDIDO MONITÓRIO - ARTIGO 1.102-A, DO CPC - DESCRIÇÃO DA CAUSA DEBENDI - DESNECESSIDADE - APELAÇÃO CÍVEL NÃO PROVIDA. A ação monitória instruída com cheque prescrito dispensa a descrição da "causa debendi", cabendo ao devedor, através dos embargos, demonstrar que o título não tem causa ou ela é ilegítima (Precedente STJ - 3ª Turma, REsp 262.657/MG - Min.CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO). (PARANÁ, 2012).

Há no corpo do acórdão informação de que, inclusive, deve ser garantido o contraditório; respeitando-se o onus probandi inerente a cada uma das partes, incumbindo ao demandante fazer prova de sua pretensão, mediante a juntada do título, e ao réu prova que seja apta a desconstituir este título.

No mesmo jaez, o Tribunal de Justiça do Estado do Pernambuco – TJPE também decidiu da seguinte forma:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOVAMENTE INTERPOSTOS. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO NO JULGADO. CHEQUE PRESCRITO. DOCUMENTO HÁBIL A INSTRUÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. CABIMENTO DA DEMANDA MONITÓRIA. INADMISSÍVEL DISCUSSÃO DA CAUSA DEBENDI. ÔNUS DE DEMONSTRAÇÃO DOS FATOS IMPEDITIVOS, MODIFICATIVOS OU EXTINTIVOS DO DIREITO EM SEDE DE EMBARGOS À MONITÓRIA. INOCORRÊNCIA. APLICAÇÃO DE MULTA. ACORDÃO MANTIDO. NEGADO PROVIMENTO AOS ACLARATÓRIOS. 1. Em se tratando de ação monitória inexiste a exigência legal no sentido de que o autor "ab initio", comprove a origem do débito, bastando que estejam preenchidos os requisitos do artigo 1102-A do CPC, cabendo ao emitente o ônus da prova da inexistência do débito. 2. O juiz a quo, suficientemente motivado, analisou toda a matéria de fundo e ressaltou que o embargado/autor fez prova do seu crédito sendo indiscutível a discussão da "causa debendi" em demanda fundada em cheque, visto que constituindo ordem de pagamento à vista sua emissão representa reconhecimento do débito pelo emitente. 3. No que tange a preliminar rejeitada, da ausência de cerceamento do direito de defesa, verifica-se que a demanda foi fundada no título de crédito, sendo a matéria exclusivamente de direito, a qual comporta julgamento antecipado, de acordo com o artigo 330, inc. I do CPC. [...]  (PERNAMBUCO, 2011).

Antes de finalizar, ainda, citamos Talamini (2014, p. 158/160) que se atenta a ponto fundamental desta temática. Após a prescrição da demanda executiva, ainda há a possibilidade de propositura da ação por enriquecimento ilícito, prevista expressamente no art. 61 da Lei n.º 7.357/85[25]. Todavia, poderá o demandante escolher tanto pela ação do rito ordinário quanto pela demanda injuntiva, sendo que em ambos os casos ficará o autor dispensado da demonstração da relação jurídica subjacente à emissão do cheque, com o argumento de que embora a cártula prescrita e sem força executiva, o cheque ainda mantém seus atributos cambiários, ressaltando em especial a característica da abstração.  

Destarte, constatamos que o entendimento pretoriano convergiu para o rumo de dispensar do autor a necessidade de demonstrar a causa de pedir nas ações monitórias fundamentadas em cheques prescritos, esta entendida como a relação jurídica subjacente à emissão do título. Todavia, não vedou a discussão da matéria nos embargos monitórios, quando incumbirá ao réu trazer toda a matéria que possa desconstituir o título que motivou a demanda.  

4.3. O JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA N.º 1.094.571 DO STJ SOBRE CAUSA DE PEDIR NA AÇÃO MONITÓRIA POR CHEQUE PRESCRITO

A discussão sobre a necessidade, ou não, da descrição da causa de pedir na inicial da ação monitória com fulcro em cheque prescrito tomou tamanha proporção que os Recursos Especiais sobre a temática ganharam o status de recurso repetitivo, nos termos do art. 543-C do CPC, sendo que o Recurso Especial n.º 1.094.571 foi utilizado como representativo desta controvérsia.

A ação versava sobre ação monitória ajuizada por J. C. Ferrari & CIA ajuizou em face de Oswaldo Murari Filho, tendo como objeto cheque emitido pelo demandando em 22 de dezembro de 2000, no valor de R$ 486,00 (quatrocentos e oitenta e seis reais).

A inicial foi indeferida pelo Juízo de 6ª Vara Cível da Comarca de São José do Rio Preto/SP diante da ausência da demonstração da causa debendi originária do título, que resultava na falta de interesse de agir. O TJSP manteve a sentença recorrida.

Desta forma, foi interposto Recurso Especial suscitando a violação do art.  1.102a do CPC e a divergência pretoriana quanto à aplicação da Súmula n.º 229 do STJ e a prescindibilidade da comprovação da cláusula subjacente à emissão da cártula já prescrita para que seja viável o aforamento da ação monitória.   

No julgamento daquele reclamo, os ministros integrantes da Segunda Seção do STJ começaram pacificando a questão atinente ao cabimento da ação injuntiva arrimada em cheques prescritos. Neste ínterim, destacou que a ação monitória exige prova escrita suficiente para formar o convencimento do magistrado, sendo que a cártula, ainda que coberta pela manta da prescrição, é apta a tal mister, apontando que:

De fato, para admissibilidade da ação monitória, não é necessário que o autor instrua a ação com prova robusta, estreme de dúvida, podendo ser aparelhada por documento idôneo, contanto que, por meio do prudente exame do magistrado, exsurja juízo de probabilidade acerca do direito afirmado pelo autor.

[...] O cheque, ordem de pagamento à vista, tem por função extinguir a obrigação causal que ensejou sua emissão, sendo, em regra, pro solvendo, de modo que, salvo pactuação em contrário, só extingue a dívida, isto é, a obrigação que o título visa satisfazer consubstanciada em pagamento de importância em dinheiro, com o seu efetivo pagamento.

Dessarte, a menos que exista pactuação expressa prevendo que a cártula terá efeito pro soluto, a regra é que o cheque  não opera novação, subsistindo a obrigação concernente ao débito que decorre do negócio jurídico subjacente.

(BRASIL, 2013b).

  Ademais, o acórdão também ressaltou a viabilidade da ação monitória por cheque prescrito já fora pacificada em decorrência da edição da Súmula 299 editada por esta mesma corte.

Pacificada, pois, a quaestio referente ao cabimento da ação, a excelsa corte passou a análise a necessidade de declinar a causa de pedir nas demandas desta natureza.

Inicialmente, destacou que o procedimento monitório foi criado no intuito de ser uma alternativa rápida à constituição de um título executivo judicial com a consequente expedição do mandado de pagamento ou de entrega de coisa; tudo  isto praticado em sede de cognição sumária. Ademais, ocorre verdadeira inversão da iniciativa do contraditório, considerando que será de responsabilidade do demandando a faculdade da oposição dos embargos abordando toda a matéria de defesa e recaindo sobre si a iniciativa de provar suas alegações.

Neste rumo, citando vários precedentes daquela Corte de Justiça, o acórdão frisa ser desnecessário constar da inicial qual é a causa de pedir que fundamenta advinda do negócio jurídico que motivou a emissão da cártula que se busca a satisfação. Todavia, não haverá qualquer óbice à discussão de todos e quaisquer fatos impeditivos, modificativos ou extintivos que interfiram diretamente no causa debendi do título, ficando ao critério do demandado a iniciativa do contraditório e também o ônus de fazer prova de todo o alegado.

Abstrai-se do corpo do aresto que:

A autorizada doutrina, em lição que guarda estrita sintonia com a lei processual, propugna que, no procedimento monitório, tendo em vista o seu propósito de propiciar a celeridade na formação do título executivo judicial, a expedição do mandado de pagamento ou de entrega da coisa é feita em cognição sumária, havendo inversão da iniciativa do contraditório, cabendo ao demandado a faculdade de opor embargos, suscitando toda a matéria de defesa, visto que recai sobre ele o ônus probatório. [...]

Com efeito, de acordo com a jurisprudência consolidada no âmbito do STJ,  o autor da ação monitória não precisa, na exordial, mencionar ou comprovar a relação causal que deu origem à emissão do cheque prescrito, todavia nada impede o requerido, em embargos à monitória, discuta a causa debendi, cabendo-lhe a iniciativa do contraditório e o ônus da prova - mediante apresentação de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor. (BRASIL, 2013b).

Para finalizar, ainda há menção de que inexiste qualquer prejuízo à ampla defesa do réu pela supressão da necessidade de indicar a causa de pedir na inicial da ação monitória do cheque prescrito, considerando que a natureza jurídica dos embargos é de defesa e pode propor a análise da demanda em cognição exauriente, com ampla produção probatória. Nada obstante, o entendimento jurisprudencial permite ao demandado apresentar resposta na forma de reconvenção.   

Por fim, o acórdão foi resumido na seguinte ementa:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.ART. 543-C DO CPC. AÇÃO MONITÓRIA APARELHADA EM CHEQUE PRESCRITO.DISPENSA DA MENÇÃO À ORIGEM DA DÍVIDA.

1. Para fins do art. 543-C do CPC: Em ação monitória fundada em cheque prescrito, ajuizada em face do emitente, é dispensável menção ao negócio jurídico subjacente à emissão da cártula.

2. No caso concreto, recurso especial parcialmente provido.

(BRASIL, 2013b).

Destarte, a celeuma restou pacificada por meio do julgamento supra, sendo adotado o entendimento de não ser necessário declinar na exordial da ação monitória qual é a causa de pedir (causa debendi ou negócio jurídico subjacente) que originou a emissão da cártula já prescrita. Todavia, viabilizou a discussão de qualquer matéria que tenha inferência neste plano por via dos embargos monitórios facultados ao demandando, sendo também seu o ônus de comprovar todas a suas alegações.

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Sobre o autor
Felipe Rudi Parize

Advogado, inscrito na OAB/SC 32.341, graduado no curso de Direito pela Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), em 2011. Especialista em Processo Civil, em 2013 e em Direito e Processo do Trabalho, em 2018, pelo Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina (CESUSC). Secretário Geral da Comissão Estadual do Jovem Advogado da OAB/SC na gestão 2013/2015.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PARIZE, Felipe Rudi. A necessidade de demonstração da causa de pedir na ação monitória por cheque prescrito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4155, 16 nov. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30029. Acesso em: 23 dez. 2024.

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