DIREITOS HUMANOS, GÊNERO E VIOLÊNCIA: OLHARES ACERCA DA REALIDADE SUL-RIOGRANDENSE[1]
WENCZENOVICZ, Thaís Janaina[2]
POTT, Keily Giesel[3]
Resumo: O presente artigo trata de antecedentes históricos que contribuíram para aproximação de medidas protetivas, bem como a efetivação dos Direitos Humanos frente a violência exercida sobre as mulheres na sociedade contemporânea. A existência de um Estado democrático responsável pela elaboração de legislações contempla ações e políticas públicas as quais corroboram com o combate à violência de gênero e demais categorias.
Palavras-chave: Direitos Humanos. Gênero. Violência
INTRODUÇÃO
Durante muitos séculos a mulher foi deixada a sombra da História e por conseqüência de sua efetiva participação enquanto cidadã. O movimento de mulheres que, incansavelmente, vinham lutando para conquistar respeito e espaço na sociedade, enfrentando a discriminação - que remonta aos primórdios das civilizações - já bem cientes da existência da violência de gênero e da violência doméstica, com dimensões de uma epidemia social não denunciada foi efetivando seus direitos por conta da inclusão no mercado de trabalho e amparo legal.
A discriminação e a violência contra a mulher estiveram ocultas durante séculos, e refletem a desigualdade histórica nas relações de poder entre homens e mulheres. Eles sempre tiveram seu espaço e valor reconhecidos na sociedade, ao passo que elas tiveram que lutar e até pagar com a vida pelo direito de estudar, trabalhar e votar enquanto espectro e pelo direito à igualdade. Sabe-se que essa dinâmica posta está diretamente relacionada com o moderno conceito de “violência de gênero”, que leva em conta não as diferenças biológicas, mas sim, as diferenças na dimensão social, que implicam nas desigualdades sociais, econômicas e no exercício do poder entre homens e mulheres. A violência contra a mulher não pode ser vista de forma isolada do contexto sócio-histórico da cultura da violência.
Com o advento dos Direitos Humanos e as legislações correlatas foi possível aprofundar o debate e buscar melhorias substanciais. Embora a Constituição Federal, no artigo 5º, I, tenha reconhecido a igualdade formal entre os gêneros masculino e feminino, quando diz que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações...”, isto não bastou para promover a igualdade material ou real, que decorre da mudança de valores, de cultura e de mentalidade. Daí, na busca da igualdade material entre homens e mulheres, surge a necessidade da discriminação positiva, consistente em medidas especiais, capazes de assegurar o progresso de grupos ou segmentos sociais, acelerando o processo de busca pela igualdade (também chamadas de ações afirmativas). Entretanto, urgem do mesmo modo políticas públicas voltadas à prevenção e à erradicação da violência de gênero, como por exemplo, no debate enquanto eficácia dos Direitos Humanos.
O devido artigo divide-se em três partes assim constituídos: Mulher e Trajetória Histórica; A face da mulher no Rio Grande do Sul; Medidas Protetivas, Políticas Públicas e combate a violência contra mulher. O procedimento metodológico aqui utilizado é o analítico-interpretativo de investigação bibliográfica principal (Constituições e Legislação acerca das questões de Gênero) e secundária (diversos autores) escritos no decorrer da primeira década do século XXI relativo a historicidade da trajetória da mulher e as políticas públicas que cercam a temática. Enquanto metodologia de campo foi realizada pesquisa nos arquivos da Delegacia das Mulheres da cidade de Erechim e Porto Alegre/RS com a devida autorização de autoridades da Secretaria da Segurança Pública do Estado do Rio Grande do Sul, em especial da Polícia Civil.
- Mulher e trajetória histórica
A mulher na história do Brasil, nos escritos da historiadora Mary del Priore,[4] tem surgido recorrentemente sob a luz de estereótipos, dando-nos enfadada ilusão de imobilidade. Auto-sacrificada, submissa sexual e materialmente, à imagem da mulher de elite opõem-se a promiscuidade e a lascívia da mulher de classe subalterna. Essa realidade é de fácil associação se adentrarmos em analisar o destaque que a mídia atribui a temática.
Sabe-se que tais estereótipos, sem dúvida, buscam negar o papel histórico da mulher na constituição da sociedade brasileira, esquecendo que sua participação nas esferas econômica, política e por vezes social e cultural do país é tão antiga quanto a chegada dos portugueses no Brasil.
Vários são os estudos realizados acerca da figura feminina após 1980, entretanto um dos mais completos trabalhos foi redigido por Mary Del Priore. Sua obra intitulada História das Mulheres conta a trajetória das mulheres, do Brasil colonial aos nossos dias. Essa obra organizada por Mary Del Priore - da qual participam duas dezenas de historiadores além da conhecida escritora Lygia Fagundes Telles - mostra como nasciam, viviam e morriam as brasileiras no passado e o mundo material e simbólico que as cercavam. Percebendo a história das mulheres como algo que envolve também a história das famílias, do trabalho, da mídia, da literatura, da sexualidade, da violência, dos sentimentos e das representações, o livro abarca os mais diferentes espaços (campo e cidade, norte e sul do país) e extratos sociais (escravas, operárias, sinhazinhas, burguesas, donas de casa, professoras, bóias-frias). Também não se contenta em apenas separar as vitórias e as derrotas das mulheres, mas derruba mitos, encoraja debates, estimula a reflexão e coloca a questão feminina na ordem do dia a luz dos Direitos Humanos.
2. A face da mulher no Rio Grande do Sul
Comumente quando falamos no Estado do Rio Grande do Sul, circundam idéias de um espaço geográfico no Sul do Brasil onde a valentia, auto-determinação e conservadorismo afloram. Esses atributos fundam-se geralmente em seu processo de fundação, ocupação e povoamento de seu território. Estado brasileiro cuja história apresenta maior número de episódios de lutas e guerras, foi disputado pela Espanha e Portugal. O fato de possuir fronteiras com outros países é característica que sempre lhe impôs a necessidade de cuidado.
Ambas as Coroas – Espanha e Portugal - adotavam uma política expansionista, e estavam interessadas em ocupar o máximo possível de território. Portanto, mais cedo ou mais tarde, terminaria havendo um confronto na área do Rio Grande do Sul, na medida em que, se uma das potências decidisse fundar um núcleo de colonização, a outra imediatamente reagiria.
Das diversas possessões, pode-se citar a ação de Dom Pedro II de Portugal, que foi regente de 1668 a 1683 e rei de 1683 a 1706, quando decidiu que o Império Português deveria ocupar a margem esquerda do rio da Prata. E doou, em 1674, duas capitanias “nas terras que estão sem donatários” ao longo da costa e até a “boca do Rio da Prata”. Essa doação foi confirmada dois anos depois por uma Bula Papal, que considerava que o Bispado do Rio de Janeiro tinha como limite no sul o rio da Prata.[5]
O passo seguinte na consolidação da presença lusa no sul do continente foi a fundação da Colônia de Sacramento. Essa colônia tinha o objetivo de afirmar, definitivamente, a presença portuguesa na área, e servir como um ponto de apoio militar. A colônia foi fundada em primeiro de janeiro de 1680, nas margens do Rio da Prata. Era uma espécie de ponta de lança da presença portuguesa — estava muito afastada de qualquer outro ponto de colonização lusa no Brasil. Por isso, foi facilmente capturada pelos espanhóis em agosto do mesmo ano.[6]
A partir de então, portugueses e espanhóis se revezaram constantemente na posse da Colônia de Sacramento. Os tratados, que determinam sua posse, se sucedem. E, enquanto isso, os portugueses começam a estabelecer um novo ponto de apoio na ocupação do território do sul: Laguna, no atual Estado de Santa Catarina, que foi fundada em 1684 para servir como apoio para Sacramento. E é a partir de Laguna que vai se iniciar realmente a ocupação do território gaúcho.
Situado fora do eixo de comércio do Brasil com Portugal, coube ao Rio Grande o papel vital de fornecer o gado que sustentou o ciclo do ouro em Minas Gerais e o do charque, que era o alimento básico dos escravos e da população de baixa renda das cidades brasileiras. A partir do início do século XX, coube também ao Rio Grande a função de "celeiro do país", responsável por uma fatia significativa da produção agrícola nacional.
Dessas diferenças nasceram vários confrontos, fazendo com que, até o século XX, o Rio Grande fosse uma região potencialmente problemática não só pelos conflitos de fronteiras com outros países, mas também pelos problemas de suas elites com os grupos de comando nacionais.
Composto por diversas etnias, a participação das mulheres no desenvolvimento do Estado foi significativo. Das tarefas domésticas a objeto de estudo e análise da literatura a constituição histórica dos sul-riograndeses também está permeada por essa realidade conflitiva.
2.1. Literatura, Mídias e Mulheres
O aparecimento de Érico Veríssimo no cenário literário brasileiro, faz com que o sul do país chegasse além fronteiras. Com seus romances ele recria de maneira ímpar a história de uma família, do cotidiano e em primazia a figura da mulher sul-riograndense.
Érico Veríssimo em seus escritos em O continente I e II, sinaliza a contribuição da mulher na construção da história do Rio Grande do Sul. Uma leitura atenta de seu texto permite verificar que a mulher não contribuiu somente como parteira ou boa senhora como querem alguns historiadores, ou como auxiliares de médico em campos de batalha, mas ativamente na sociedade elitizada nas grandes propriedades rurais. A título de exemplo, é possível citar como base uma das personagens da obra: Ana Terra.
Ana Terra foi a matriarca da família Terra Cambará. Filha de imigrantes portugueses que chegam ao Rio Grande do Sul no século XVIII, Ana e sua família passam por todas as dificuldades de morar em uma região esquecida pelas autoridades e permeada de disputas por terras e fronteiras. Sua personalidade forte, de garra, obstinação e resistência frente a todas as perdas e violências que sofre faz de Ana Terra uma figura ímpar no imaginário da mulher sul-riograndense. Traços da personalidade de Ana e sua crença na vida serão encontradas nas mulheres das gerações futuras da família Terra Cambará, principalmente de sua neta Bibiana. O erotismo da jovem também é destacado, pois esta desperta em meio a solidão da fazenda onde Ana mora com a família e culmina com a sua entrega a Pedro Missioneiro.
Além disso, ela é quem estabelece a relação entre o vento e os acontecimentos importantes de sua vida que serão uma espécie de ligação entre o vento e a memória feminina em toda a obra do autor, como um consolo e arma de defesa de mulheres que assistem os homens lutarem e morrerem em suas guerras contemplando a realidade histórica da época.[7] O olhar sobre os escritos de Érico Veríssimo serve para situar a mulher sul-riograndense representada como agente ativo das mudanças sociais, concorrendo como o universo masculino, talvez não entranhado nas guerras, trincheiras ou campo de batalha, mas na sustentação e na caracterização econômico-cultural de um povo, uma região.
Na construção do imaginário simbólico, a mulher no decorrer dos anos passa ser vista por uma maioria como responsável pelas atividades domésticas e maternas, mantendo-se alheia ao mundo externo. Os direitos de igualdade perante os homens foram renegados, cabendo-lhes apenas atuar no restrito espaço privado - lar, sendo tarefa do elemento masculino o trabalho "árduo" - manutenção da família. Todavia, é preciso sair do campo econômico dependentista, espaço de reprodução de desigualdades, produtos de injustiças e manifestamente ideológico para evoluirmos enquanto sociedade justa e igualitária e, verificar a influência das mulheres no plano prático, onde muitas são reveladas pela prática, e pela habilidade em resolver problemas do cotidiano. Cotidiano esse nem sempre tão humanizador. Se a mulher desempenhou papel fundamental no decorrer da história, coube a ela também os reflexos dessa inserção: superação e violência.
Por outro lado, quando se observa a violência de gênero pela mídia, a primeira idéia relacionada é, certamente, a da violência doméstica. São tantas as mulheres que têm a sua integridade física violada diariamente que se acaba “condicionando” a conceber este tipo de violência como “padrão”. Entretanto, a violência contra as mulheres é exercida de maneira bastante plural, muitas vezes, camuflada em forma de propaganda, piada ou cena de novela/programa de TV.
Nesse aspecto, as mídias também corroboram com a difusão dos estigmas e exclusão. Por mais que a internet esteja cada vez mais acessível para grande parte da população de nosso país, as mídias e, especialmente a televisão, atualmente o meio de comunicação mais popular e mais utilizado pelos brasileiros adentra no cotidiano e contribui para a reprodução do ideário dominador/dominado. Sabemos que são milhões de pessoas que assistem todos os dias atrações que, ao invés de educar ou de promover a tolerância e a cidadania, reforçam estereótipos e preconceitos. Estes, quase sempre, envolvendo a mulher.
E como se não bastasse tudo isso, novelas exibidas em horário nobre mostram cenas com uma conotação extremamente machista. Estas são apenas algumas das situações que demonstram como a mulher é desrespeitada pela mídia que deveria corroborar para que os direitos delas (e de todos) sejam garantidos. E, enquanto formadora de opinião, deve ser responsabilizada por aquilo que exibe e dissemina.
2.2. História, Mulheres e Conquistas Jurídicas
A violência contra a mulher é produto de um construto histórico — portanto, passível de desconstrução — que traz em seu seio estreita relação com as categorias de gênero, classe e raça/etnia e suas relações de poder. Por definição, pode ser considerada como toda e qualquer conduta baseada no gênero, que cause ou passível de causar morte, dano ou sofrimento nos âmbitos: físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública quanto na privada.
A Organização das Nações Unidas (ONU) iniciou seus esforços contra essa forma de violência, na década de 50, com a criação da Comissão de Status da Mulher que formulou entre os anos de 1949 e 1962 uma série de tratados baseados em provisões da Carta das Nações Unidas — que afirma expressamente os direitos iguais entre homens e mulheres e na Declaração Universal dos Direitos Humanos — que declara que todos os direitos e liberdades humanos devem ser aplicados igualmente a homens e mulheres, sem distinção de qualquer natureza.
Desde então, várias ações têm sido conduzidas, a âmbito mundial, para a promoção dos direitos da mulher, e, no que compete ao Brasil, uma série de medidas protetivas vêm sendo empregadas visando à solução dessa problemática.
Para se compreender o fenômeno da violência torna-se necessário realizar um breve retorno ao legado deixado à mulher pela cultura ocidental. A classificação da mulher tem sido norteada pelo viés biológico e social, determinantes para a desigualdade de gênero, que traz em seu bojo uma relação assimétrica sob a égide de um discurso que se pauta na valoração de um sexo sob o outro.
Na Antiguidade Clássica, mais especificamente na Grécia, os mitos contavam que, devido à curiosidade própria de seu sexo, Pandora tinha aberto a caixa de todos os males do mundo e, em conseqüência, as mulheres eram responsáveis por haver desencadeado todo o tipo de desgraça. A religião é outro dos discursos de legitimação mais importantes. As grandes religiões têm justificado ao longo dos tempos os âmbitos e condutas próprios de cada sexo.[8]
Nas diversas civilizações antigas havia muitas diferenças entre homens e mulheres. As mulheres não tinham direitos jurídicos, não recebiam educação formal, eram proibidas de aparecer em público sozinhas, sendo confinadas em suas próprias casas em um aposento particular, a exemplo da Grécia (Gineceu), enquanto aos homens, estes e muitos outros direitos eram permitidos.
Segundo Vrissimtzis, o homem era polígamo e o soberano inquestionável na sociedade patriarcal, a qual pode ser descrita como o ‘clube masculino mais exclusivista de todos os tempos’. Não apenas gozava de todos os direitos civis e políticos, como também tinha poder absoluto sobre a mulher.[9]
Com o advento da cultura judaico-cristã houve alteração nas relações sócio-culturais e por conseqüência na condição da mulher. O Cristianismo retratou a mulher como sendo pecadora e culpada pelo desterro dos homens do paraíso, devendo por isso seguir a trindade da obediência, da passividade e da submissão aos homens, — seres de grande iluminação capazes de dominar os instintos irrefreáveis das mulheres — como formas de obter sua salvação. Assim a religião judaico-cristã foi delineando as condutas e a ‘natureza’ das mulheres e incutindo uma consciência de culpa que permitiu a manutenção da relação de subserviência e dependência. Mas não foi só a religião que normatizou o sexo feminino, a medicina também exerceu seu poder, apregoando até o século XVI a existência de apenas um corpo canônico e este corpo era macho. Por essa visão a vagina é vista como um pênis interno, os lábios como o prepúcio, o útero como o escroto e os ovários como os testículos.
Na ótica aristotélica, a crença da mulher como um homem invertido e, portanto, inferior, perdurou durante séculos. O modelo de sexo único prevaleceu durante muito tempo por ser o homem — ser humano nascido com o sexo biológico masculino, ou seja, pênis — o alvo e construtor do conhecimento humano. Dentro dessa visão androcêntrica, a mulher consistia em uma categoria vazia. Apenas quando se configurou na vida política, econômica e cultural dos homens a necessidade de diferenças anatômicas e fisiológicas constatáveis é que o modelo de sexo único foi repensado.
A visão naturalista que imperou até o final do século XVIII determinou uma inserção social diferente para ambos os sexos. Aos homens cabiam atividades nobres como a filosofia, a política e as artes; enquanto às mulheres deviam se dedicar ao cuidado da prole, bem como tudo aquilo que diretamente estivesse ligado à subsistência do homem, como: a fiação, a tecelagem e a alimentação. Um exemplo desta posição paradigmática pode ser observado em Rousseau (1817):[10]
A rigidez dos deveres relativos dos dois sexos não é e nem pode ser a mesma. Quando a mulher se queixa a respeito da injusta desigualdade que o homem impõe, não tem razão; essa desigualdade não é uma instituição humana ou, pelo menos, obra do preconceito, e sim da razão; cabe a quem a natureza encarregou do cuidado com os filhos a responsabilidade disso perante o outro.
Essa interpretação começou a mudar a partir da Revolução Francesa (1789). Nela as mulheres puderam participar ativamente do processo revolucionário ao lado dos homens por acreditarem que os ideais de igualdade, fraternidade e liberdade seriam estendidos a sua categoria. Ao constatar que as conquistas políticas não se estenderiam ao seu sexo, algumas mulheres se organizaram para reivindicar seus ideais não contemplados. Dentre elas pode-se citar Olympe de Gouges[11], que publicou em 1791, um texto intitulado Os Direitos da Mulher e da Cidadã.
Com a consolidação do sistema capitalista, no século XIX ocorreram profundas mudanças na sociedade como um todo. Seu modo de produção afetou o trabalho feminino levando um grande contingente de mulheres às fábricas. A mulher sai do locus que até então lhe era reservado e permitido — o espaço privado, e vai a esfera pública. Neste processo, contestam a visão de que são inferiores aos homens e se articulam para ocupar espaços no mundo do trabalho e minimizar as diferenças.
De uma forma objetiva, pode-se dizer que esse movimento corresponde à preocupação em eliminar as discriminações sociais, econômicas, políticas e culturais a qual a mulher sempre carregou.
Ao questionar a construção social da diferença entre os sexos e os campos de articulação de poder, surge o conceito de gênero, abrindo assim, portas para se analisar o binômio dominação-exploração construído ao longo dos tempos.
A violência contra a mulher traz em seu seio estreita relação com as categorias de gênero, classe e raça/etnia e suas relações de poder. Tais relações estão mediadas por uma ordem patriarcal proeminente na sociedade brasileira, a qual atribui aos homens o direito a dominar e controlar suas mulheres, podendo em certos casos, atingir os limites da violência.
3. Medidas Protetivas, Políticas Públicas e combate a violência contra mulher
Em 1979, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotaram a Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), conhecida como a Lei Internacional dos Direitos da Mulher. Essa Convenção visou a promoção dos direitos da mulher na busca da igualdade de gênero, bem como, a repressão de quaisquer discriminações.
Já contexto social brasileiro, a década de 70 é marcada pelo surgimento dos primeiros movimentos feministas organizados e politicamente engajados em defesa dos direitos da mulher contra o sistema social opressor — o machismo. A política sexista vivida até então, deixava livre e impunes muitos violentadores de mulheres sob o argumento de legítima defesa da honra. Como exemplo, temos o caso do crime que se tornou nome de Bairro na cidade de Porto Alegre – Rio Grande do Sul.
“Tristeza” é o nome do bairro da cidade de Porto Alegre onde uma mulher de 39 anos e seu filho de 5 foram assassinados dentro de casa, a golpes de faca. Para a Polícia Civil, o principal suspeito é o marido dela, pai da criança. Foram encontrados bilhetes em que ele afirmava suspeitar da fidelidade da esposa e lhe fazia ameaças [...][12]
O caso acima relatado é apenas um exemplo da grande impunidade à violência perpetrada contra as mulheres. A partir do engajamento do movimento de mulheres, surge em 1981, no Rio de Janeiro, o SOS Mulher; seu objetivo era construir um espaço de atendimento às mulheres vítimas de violência, além de ser um espaço de reflexão e mudanças das condições de vida destas mulheres. O SOS Mulher não se restringiu apenas ao Rio de Janeiro, esta iniciativa também foi adotada em outras capitais, como: São Paulo e Porto Alegre.
A busca dos movimentos - de mulheres e feministas - por parcerias com o Estado para a implementação de políticas públicas resultou na criação do Conselho Estadual da Condição Feminina em 1983; na ratificação pelo Brasil da CEDAW em 1984; ao que se seguiu, em 1985, a implantação do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher; e, da primeira Delegacia de Defesa da Mulher (DDM). A criação das Delegacias de Defesa da Mulher foi uma iniciativa pioneira do Brasil que mais tarde foi adotada por outros países da América Latina. Pela última pesquisa realizada em 2003/2004, contavam-se 380 delegacias, tendo sua maior concentração na região sudeste (40%).[13]
Ao ratificar a CEDAW o Estado brasileiro se comprometeu perante o sistema global a coibir todas as formas de violência contra a mulher e a adotar políticas destinadas a prevenir, punir e erradicar a violência de gênero.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 incorpora aos direitos e garantias do seu texto original, os estabelecidos em decorrência de acordos e tratados internacionais. Desta forma, as Resoluções da Convenção de Belém do Pará e da CEDAW são também garantias constitucionais, como expressa o artigo 5º parágrafo 2º, da Constituição Federal: ‘Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte’.[14]
Desta forma, a criação das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs) vm efetivar o compromisso assumido perante os sistemas internacionais. Tal iniciativa contribuiu para dar maior visibilidade a problemática da violência contra a mulher, especialmente a doméstica; favorecendo a discussão da natureza criminosa da violência perpetrada sob questões de gênero, além de criar uma via de enfrentamento e erradicação da violência contra a mulher no Brasil.
A violência contra a mulher voltou a pauta no cenário internacional em 1993 com a Declaração de Viena. Nela foram considerados os vários graus e manifestações de violência, incluindo as resultantes de preconceito cultural e tráfico de pessoas. Um grande avanço desta declaração foi a revogação da violência privada como criminalidade comum, considerando assim, que a violência contra a mulher infringe os Direitos Humanos e é realizada principalmente na esfera privada. Um ano depois, em 06 de junho, a Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos – OEA, aprovou a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, conhecida como Convenção de Belém do Pará. Essa Convenção foi ratificada pelo Brasil em 1995.
[...] esta representa um marco contextual e conceitual para a violência de gênero, uma vez que define em seu artigo 1° o conceito de violência contra a mulher. Violência contra a mulher significa, nos termos desta convenção, ‘qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause ou passível de causar morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada.’ (BRASIL, 2006, p. 15)
Nesse aspecto as diversas instâncias – nacionais e internacionais – buscaram legitimar o ‘Direito da Mulher’ de várias formas. Acordos, Leis, Campanhas Educativas, Programa de Ações Integradas Referenciais e incentivo a temática com veiculação na imprensa representaram algumas dessas alternativas.
3.1 A mulher no Rio Grande do Sul: Poder Público e Violência
Nesse cenário foi criada a Secretaria de Políticas para as Mulheres do Governo do Estado do Rio Grande do Sul (SPM-RS) através da Lei nº. 13.601.[15] Como missão o devido órgão tem como missão Atuar nos programas de governo, visando à promoção dos direitos da mulher para a eliminação das discriminações que as atingem, bem como à sua plena integração social, política, econômica e cultural.
É relevante assinalar que diversos e latentes eram os problemas no trabalho das delegacias comuns no atendimento e processamento das denúncias de violência doméstica e sexual contra as mulheres. Devido a uma visão de desvalorização da violência doméstica e sexual, havia grande dificuldade, por parte dos policiais e delegados, em reconhecer esse tipo de conflito como crime passível de penalidade. Agressões entre marido e mulher não eram consideradas como questões de polícia, mas incidentes meramente familiares. O cotidiano feminino era permeado por humilhação e constrangimento. Essas, geralmente eram desencorajadas a prosseguir com o registro policial e não raro aconselhadas a pensar se não haviam provocado a agressão, principalmente nos casos de violência sexual. [16]
Além de sua missão e fundamentação pode-se apontar enquanto competências da Secretaria de Políticas para as Mulheres do Governo do Estado do Rio Grande do Sul seis eixos:
I - assessorar a Administração Pública na formulação, coordenação e articulação de políticas para as mulheres;
II - elaborar e implementar campanhas educativas de combate a todo tipo de
discriminação contra a mulher no âmbito estadual;
III - elaborar o planejamento de gênero que contribua na ação do governo estadual com vista à promoção da igualdade entre os sexos;
IV - articular, promover e executar programas de cooperação entre organismos públicos e privados, voltados à implementação de políticas para as mulheres;
V - articular as políticas transversais de gênero do Governo;
VI - implementar e coordenar políticas de proteção às mulheres em situação de
vulnerabilidade.[17]
Superando a lógica de se tornar obrigatório ao poder público essa Secretaria também buscou minimante dar suporte a instalação das Delegacias das Mulheres e as prover com recursos humanos para reconhecer e incorporar as mulheres no complexo contexto de inclusão ao desenvolvimento de múltiplas estratégias para enfrentar a violência com práticas eficazes e fundamentais para a preservação e garantia dos Direitos Humanos.
A Delegacia das Mulheres tem suas atribuições e competências atualmente estabelecidas pelo decreto nº 42.082, de 12.08.97, e atendem mulheres, crianças e adolescentes de ambos os sexos. Sua maior atuação pode-se dizer que são as de lesões corporais leves, ameaças e injúrias, e as menos notificadas são as de natureza sexual.
Entretanto, por sua gravidade, merecem destaque as ocorrências de crimes sexuais considerados hediondos (Estupro e Atentado Violento ao Pudor, nas formas tentada e consumada), registradas em sistema próprio ou integrado. Nessa dinâmica procurou-se os arquivos da Delegacia das Mulheres da cidade de Erechim/RS para compor dados com fins de exemplificação num curto espaço de tempo – janeiro de 2006 a abril de 2012.
Tabela 1 – Crimes Sexuais ocorridos em Erechim/RS (2006-2012)
Ano
Mês
Dia
Dia da semana
Turno
Hora
Delito
Local
Idade vitima
Idade Autor
2006
1
4
4ª
Noite
22:00
Consumado
Via Publica
14
0
2006
1
19
5ª
Madrugada
01:10
Tentado
Outros
29
29
2006
2
1
4ª
Tarde
14:00
Consumado
Residência
9
31
2006
2
5
dom
Madrugada
02:50
Consumado
Via Publica
29
0
2006
2
18
sáb
Tarde
14:30
Tentado
Residência
20
0
2006
2
18
sáb
Noite
23:00
Tentado
Residência
13
39
2006
2
19
dom
Madrugada
00:01
Consumado
Via Publica
14
0
2006
2
19
dom
Madrugada
04:00
Tentado
Residência
90
0
2006
3
18
sáb
Noite
19:30
Consumado
Residência
9
16
2006
3
24
6ª
Madrugada
03:30
Consumado
Via Publica
14
22
2006
4
18
3ª
Tarde
13:00
Tentado
Residência
16
0
2006
4
20
5ª
Tarde
16:00
Tentado
Residência
16
21
2006
5
19
6ª
Tarde
13:45
Consumado
Residência
14
74
2006
5
25
5ª
Madrugada
01:00
Consumado
Via Publica
34
0
2006
6
2
6ª
Noite
19:40
Tentado
Hospitais/Clínicas
5
0
2006
6
7
4ª
Noite
22:30
Consumado
Residência
28
21
2006
6
8
5ª
Noite
19:10
Consumado
Via Publica
22
0
2006
8
23
4ª
Tarde
15:15
Tentado
Via Publica
15
0
2006
9
5
3ª
Noite
18:30
Consumado
Residência
20
36
2006
9
13
4ª
Noite
18:00
Consumado
Outros
2
0
2006
9
17
dom
Noite
21:30
Tentado
Residência
11
53
2006
9
23
sáb
Madrugada
01:00
Consumado
Residência
18
0
2006
10
1
dom
Tarde
14:00
Consumado
Residência
13
36
2006
10
10
3ª
Noite
18:00
Consumado
Outros
14
31
2006
10
24
3ª
Manhã
08:00
Consumado
Outros
2
0
2006
10
30
2ª
Tarde
14:00
Consumado
Outros
36
0
2006
11
29
4ª
Manhã
06:30
Tentado
Residência
25
31
2006
12
15
6ª
Tarde
15:00
Consumado
Residência
6
0
2006
12
30
sáb
Madrugada
05:00
Consumado
Residência
25
31
2007
1
1
2ª
Madrugada
02:00
Consumado
Residência
25
27
2007
1
6
sáb
Madrugada
03:00
Consumado
Outros
16
0
2007
1
10
4ª
Tarde
17:00
Consumado
Via Publica
16
0
2007
3
25
dom
Noite
20:00
Tentado
Residência
3
0
2007
3
29
5ª
Tarde
12:00
Consumado
Via Publica
15
0
2007
4
6
6ª
Noite
22:00
Tentado
Residência
48
38
2007
5
6
dom
Noite
23:30
Consumado
Residência
21
29
2007
5
13
dom
Noite
21:55
Tentado
Residência
90
55
2007
8
12
dom
Noite
20:00
Consumado
Residência
13
32
2007
8
24
6ª
Noite
21:00
Tentado
Residência
13
20
2007
9
9
dom
Noite
21:00
Tentado
Outros
18
35
2007
9
21
6ª
Tarde
15:00
Consumado
Residência
13
0
2007
9
24
2ª
Manhã
10:00
Consumado
Residência
11
39
2007
10
3
4ª
Noite
22:40
Tentado
Via Publica
19
29
2007
10
9
3ª
Manhã
10:00
Consumado
Via Publica
17
20
2007
11
12
2ª
Manhã
10:00
Consumado
Via Publica
7
0
2007
12
28
6ª
Noite
23:00
Consumado
Outros
14
0
2008
1
23
4ª
Noite
22:00
Consumado
Outros
23
0
2008
2
26
3ª
Manhã
07:45
Tentado
Via Publica
16
26
2008
3
15
Sáb
Manhã
07:30
Consumado
Outros
13
0
2008
6
1
Dom
Noite
22:00
Consumado
Residência
15
29
2008
6
8
Dom
Madrugada
05:00
Consumado
Via Publica
18
0
2008
6
20
6ª
Madrugada
00:01
Consumado
Residência
13
0
2008
7
15
3ª
Manhã
10:00
Tentado
Outros
23
0
2008
8
10
Dom
Madrugada
03:00
Tentado
Via Publica
18
0
2008
8
16
Sáb
Tarde
16:00
Consumado
Residência
15
77
2008
9
24
4ª
Noite
21:00
Tentado
Residência
17
18
2008
9
30
3ª
Tarde
13:45
Consumado
Via Publica
20
0
2008
10
31
6ª
Noite
23:00
Tentado
Residência
15
27
2008
12
15
2ª
Manhã
07:15
Consumado
Outros
22
0
2008
12
18
5ª
Manhã
10:30
Tentado
Estab.Ensino
14
14
2009
1
1
5ª
Madrugada
00:01
Consumado
Residência
14
37
2009
1
12
2ª
Manhã
10:00
Tentado
Via Publica
6
0
2009
1
15
5ª
Manhã
08:30
Consumado
Estab.Diversão
25
48
2009
2
18
4ª
Tarde
17:00
Consumado
Residência
11
30
2009
4
21
3ª
Madrugada
00:01
Consumado
Via Publica
31
0
2009
4
30
5ª
Noite
19:40
Consumado
Outros
19
27
2009
5
29
6ª
Noite
20:00
Consumado
Outros
16
0
2009
5
31
Dom
Manhã
08:30
Consumado
Residência
13
56
2009
8
12
4ª
Tarde
12:00
Consumado
Residência
7
0
2009
8
14
6ª
Noite
22:00
Consumado
Residência
13
21
2009
8
18
3ª
Noite
18:00
Consumado
Outros
18
0
2009
8
23
Dom
Tarde
15:30
Tentado
Residência
31
0
2009
10
3
Sáb
Noite
20:30
Tentado
Outros
36
0
2009
10
23
6ª
Tarde
15:00
Consumado
Residência
13
23
2009
10
27
3ª
Tarde
14:00
Tentado
Via Publica
29
23
2009
11
25
4ª
Tarde
15:00
Consumado
Estab.Comercial
25
0
2009
11
29
Dom
Manhã
07:50
Tentado
Residência
28
26
2009
12
1
3ª
Manhã
08:00
Consumado
Residência
11
17
2009
12
10
5ª
Tarde
12:30
Tentado
Residência
14
38
2009
12
18
6ª
Manhã
10:00
Consumado
Outros
12
55
2010
1
11
2ª
Noite
21:00
Consumado
Residência
15
0
2010
2
19
6ª
Noite
18:00
Consumado
Residência
25
23
2010
3
9
3ª
Tarde
14:00
Consumado
Residência
14
17
2010
3
9
3ª
Noite
22:00
Consumado
Via Publica
19
0
2010
3
17
4ª
Noite
21:30
Tentado
Via Publica
30
0
2010
3
22
2ª
Manhã
10:00
Consumado
Residência
27
0
2010
4
3
Sáb
Tarde
15:00
Consumado
Outros
12
0
2010
5
15
Sáb
Noite
20:30
Tentado
Residência
10
0
2010
5
27
5ª
Noite
18:00
Consumado
Residência
11
40
2010
7
1
5ª
Manhã
07:00
Consumado
Residência
15
58
2010
7
6
3ª
Tarde
13:00
Consumado
Residência
16
24
2010
7
14
4ª
Noite
19:30
Consumado
Via Publica
14
0
2010
7
30
6ª
Noite
18:00
Tentado
Outros
22
26
2010
8
20
6ª
Noite
20:00
Consumado
Residência
9
33
2010
9
3
6ª
Madrugada
02:25
Tentado
Outros
27
43
2010
9
19
Dom
Madrugada
04:00
Tentado
Via Publica
17
17
2010
9
27
2ª
Tarde
15:00
Consumado
Residência
14
0
2010
9
28
3ª
Tarde
17:30
Tentado
Residência
16
0
2010
11
7
Dom
Noite
18:00
Consumado
Outros
2
0
2010
11
16
3ª
Manhã
10:00
Consumado
Outros
15
0
2010
12
8
4ª
Tarde
12:30
Consumado
Outros
14
0
2011
1
19
4ª
Noite
19:00
Consumado
Residência
36
0
2011
1
19
4ª
Noite
20:00
Consumado
Outros
25
0
2011
1
22
Sáb
Tarde
16:30
Consumado
Residência
14
27
2011
2
19
Sáb
Madrugada
03:20
Tentado
Via Publica
18
0
2011
3
19
Sáb
Tarde
14:00
Consumado
Outros
5
17
2011
3
20
Dom
Tarde
17:00
Consumado
Residência
12
0
2011
3
25
6ª
Manhã
08:00
Consumado
Outros
9
0
2011
4
24
Dom
Noite
18:00
Consumado
Residência
30
32
2011
4
25
2ª
Tarde
13:55
Consumado
Hospitais/Clínicas
16
49
2011
5
2
2ª
Tarde
15:30
Consumado
Via Publica
23
0
2011
7
26
3ª
Manhã
06:35
Tentado
Outros
36
0
2011
8
1
2ª
Manhã
08:00
Consumado
Residência
7
46
2011
8
3
4ª
Tarde
15:00
Consumado
Via Publica
12
45
2011
8
28
Dom
Madrugada
01:30
Tentado
Via Publica
28
0
2011
9
27
3ª
Tarde
17:20
Consumado
Via Publica
35
39
2011
9
29
5ª
Tarde
12:00
Consumado
Via Publica
14
14
2011
10
14
6ª
Noite
23:20
Consumado
Outros
30
0
2011
10
25
3ª
Tarde
13:00
Consumado
Residência
13
26
2011
11
4
6ª
Tarde
16:30
Consumado
Estab.Ensino
4
46
2011
12
6
3ª
Tarde
16:30
Tentado
Residência
6
0
2012
1
2
2ª
Madrugada
00:15
Consumado
Via Publica
30
0
2012
1
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2ª
Madrugada
00:30
Consumado
Estab.Diversão
26
0
2012
1
31
3ª
Tarde
15:45
Consumado
Via Publica
24
0
2012
2
8
4ª
Madrugada
00:01
Consumado
Residência
3
0
2012
2
11
Sáb
Madrugada
05:00
Consumado
Outros
50
0
2012
2
22
4ª
Manhã
09:30
Tentado
Via Publica
32
0
2012
2
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Sáb
Noite
23:50
Consumado
Residência
17
38
2012
3
29
5ª
Madrugada
01:20
Consumado
Residência
32
24
2012
4
1
Dom
Madrugada
01:55
Consumado
Via Publica
21
0
Fonte: DIPLANCO, 2013.[18]
Da tabela acima exposta foram 134 casos, dos quais 53 tiveram como vítimas crianças e adolescentes de até 14 anos, lembrando que a grande maioria dos casos de abuso sexual infanto-juvenil ocorrem no ambiente doméstico. Nesse universo, também é possível constatar que a vítima criança e adolescente o ato de violência tende a ser consumado. Nesse delito sabe-se que poucos são presos em flagrante; alguns são presos através de prisão temporária (por representação da autoridade policial - delegado de polícia - ao juiz, durante as investigações do inquérito policial) e, posteriormente, por prisão preventiva (por representação da autoridade policial ao juiz, ao término das investigações, para que o acusado permaneça preso durante o processo até o julgamento).
A reflexão sobre o tema é recente no Brasil, embora seja um problema mundial e tão antigo quanto as relações de gênero e de trabalho. O assédio sexual ocorre quando alguém se vale de sua superioridade hierárquica, quer seja no campo do trabalho (onde mais ocorre), da educação, da religião ou em outras relações sociais, com o fim de obter vantagens sexuais. Na maioria das vezes os superiores se aproveitam da condição de fragilidade econômica, cultural ou social da vítima, condicionando um favor sexual a uma promoção ou concessão, ou à garantia de permanência no emprego (ameaça de demissão). Muitas são as formas de assédio, que vão desde palavras, escritos, gestos, presentes, toques no corpo da vítima, até formas mais agressivas. Característica marcante é a insistência importuna do assediador para atingir sua pretensão e o fato dele agir “entre quatro paredes”, sem a presença de testemunhas, como é comum nos crimes sexuais em geral.[19] As mulheres são a grande maioria das vítimas, o que se explica pela complexa problemática das relações de gênero já apresentada nesse estudo.
Como em todas as ocorrências de violência contra as mulheres, grande é o medo e a desinformação das vítimas, sem contar o constrangimento mesmo porque elas acabam sofrendo transtornos físicos e psicológicos em conseqüência da violência em geral e do assédio sexual em especial. Por isso, precisam de ajuda e não devem deixar de denunciar, ao menos devem procurar a Delegacia da Mulher, onde certamente receberão as devidas orientações sobre seus problemas. [20]
Em consonância a busca crescente dos avanços das políticas públicas dos Estados, na segurança jurídica e na tentativa de eficácia aos Direitos Humanos foram elaborados três programas no Estado do Rio Grande do Sul tentando amenizar a violência sistêmica ao gênero feminino:
Programa "Mulheres Construindo Autonomia RS" – que objetiva a capacitação de mulheres para o mercado de trabalho, no campo e na cidade.
Programa "Prevenção e Enfrentamento à Violência Contra a Mulher" – que visa o fortalecimento da rede de enfrentamento à violência contra a mulher em todas as regiões do Rio Grande do Sul.
Programa "Cidadania e Efetivação de Direitos das Mulheres" – que tem por meta a promoção da defesa dos direitos da mulher num diálogo entre o poder público e a sociedade gaúcha.
CONCLUSÃO
Na tríade apresentada como elemento de análise desse artigo: Direitos Humanos, Gênero, e Violência, sabe-se que muito já se discutiu e muito se tem a pesquisar. No decorrer histórico são notáveis as manifestações individuais e organismos humanitários frente a questão da mulher. Muitas foram as manifestações e estímulos para combater um flagelo que se tornou endêmico em muitas partes do mundo: violência a mulher.
Da evolução sócio-histórica pode-se citar o reconhecimento a necessidade de mudar o foco da mulher para o conceito de gênero, reconhecendo que toda a estrutura da sociedade, e todas as relações entre homens e mulheres dentro dela, tiveram que ser reavaliados. Só por essa fundamental reestruturação da sociedade e suas instituições poderiam as mulheres ter plenos poderes para tomar o seu lugar de direito como parceiros iguais aos dos homens em todos os aspectos da vida. Essa mudança representou uma reafirmação de que os direitos das mulheres são direitos humanos e que a igualdade de gênero era uma questão de interesse universal, beneficiando a todos e não somente um segmento.
É consenso que a violência contra a mulher deve ser combatida em todas as suas formas. Uma simples anedota pode fomentar uma atitude que envolva a violência física. Uma simples cena de novela pode justificar e naturalizar um comportamento agressivo. As tentativas de diminuir a importância de uma mudança significativa em nossa política podem ser os primeiros passos para validar uma relação de poder norteada pela injustiça. Por isso, defender a regulamentação daquilo que lemos ou assistimos também é uma forma de prevenção à violência contra a mulher.
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