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Colisão de princípios jurídicos fundamentais e o princípio da proporcionalidade:

Metodologia de aplicação a partir das contribuições de Robert Alexy.

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O presente estudo trata da colisão de princípios fundamentais e da aplicação do Princípio da Proporcionalidade, à luz da teoria de Robert Alexy, das bases do sistema jurídico concebido por esse autor e dos aspectos teórico-metodológicos da proporcionalidade.

1.INTRODUÇÃO.

Uma das maiores preocupações jurídicas atuais refere-se à normatividade dos princípios e as dificuldades de aplicá-los, embora esse problema não envolva nenhuma descoberta pós-moderna.[1]

Propaga-se a ideia marco de força normativa da Constituição (teoria de Konrad Hesse) e reforça-se a necessidade de consideração de princípios como normas jurídicas, ao mesmo tempo em que “o novo constitucionalismo foi se transformando em um campo fértil para o surgimento das mais diversas teorias com a pretensão de responder às complexidades exsurgidas dessa fase histórica que podemos denominar de pós-positivismo”.[2]

Os problemas práticos aparecem desde a perspectiva da prescrição das normas e principalmente na sua aplicação pelo julgador, sendo relevante a análise que se dará na solução ao caso concreto.

No contexto do novo constitucionalismo referido, destaca-se a Teoria dos Princípios e o Princípio da Proporcionalidade de Robert Alexy, que apresenta soluções para as situações mais complexas envolvendo direitos fundamentais.

Nesse sentido, importa apresentar e refletir sobre a teoria de Robert Alexy, cujo maior destaque em tela serve aos casos de colisão de princípios fundamentais, por meio da aplicação do Princípio da Proporcionalidade.

O enfoque no presente trabalho trata disso, explicitando as bases do sistema jurídico concebido por esse autor e os aspectos teórico-metodológicos da proporcionalidade que, na sua vertente do subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito, está a exigir uma atividade de ponderação pelo aplicador da norma.

Embora não se pretenda um estudo profundo de posições relacionadas à Filosofia do Direito, isso muitas vezes se apresenta por indicar as bases de apoio da teoria, inclusive, nos pontos relevantes das opiniões contrárias à teoria de Robert Alexy.

Dessa forma, o presente estudo visa, sem pretensão de esgotamento, ressaltar a metodologia do Princípio da Proporcionalidade e a sua ampla aplicação em casos de colisão de princípios constitucionais fundamentais, indicando a posição do autor em destaque sobre a possibilidade de controle da racionalidade e corretude nessa aplicação, sobretudo, na difícil atividade de ponderação.


2. O MODELO REGRAS/PRINCÍPIOS/PROCEDIMENTO

Os problemas da aplicação de direitos fundamentais, a partir de normas sob a estrutura de princípios e regras, têm demonstrado a necessidade de melhor compreensão do papel dos princípios, que sob o positivismo, estão fora do ordenamento jurídico.

Não se pode deixar de iniciar o aprofundamento do tema referindo à influência da teoria dos princípios de Ronald Dworkin sobre a co-existência de princípios e regras, como uma das teses de seu “ataque geral contra o positivismo”, na forma como apresentada por Herbert Hart[3]e definida como positivismo amparado exclusivamente em um modelo de regras válidas.

Tal teoria de Dworkin considera que, em muitos casos, as regras não são suficientes para definir a conseqüência jurídica devida ou correta no caso concreto, levando ao problema de uma atuação discricionária do julgador para buscar um princípio[4]fora do ordenamento, o que seria admitir uma atuação jurisdicional não vinculada ao ordenamento jurídico.

Diante disso, a proposta de Dworkin surge no sentido de que, se princípios servem de apoio a decisões quando regras não são suficientes, eles devem fazer parte do ordenamento jurídico; ao mesmo tempo, tal consideração garante o controle do julgador.

Nessa linha, esse autor apresenta como diferença de natureza lógica que regras são “aplicáveis à maneira do tudo-ou-nada” [5], pois diante de fatos que a regra estipula ela é válida, devendo a resposta apresentada ser considerada aceita. Por outra via, o princípio por si não é capaz de tornar a sua aplicação necessária, pois ele “enuncia uma razão que conduz o argumento em uma direção, mas ainda assim necessita de uma decisão particular”, como se fosse uma “razão que inclina numa ou noutra direção”[6], isto é, uma razão que pode ser aplicada para uma ou outra decisão, logo, que não impõe uma determinada e única decisão. Ainda, reforça como segunda diferença entre regras e princípios que somente estes possuem uma dimensão de peso ou importância, devendo-se sempre perguntar que peso ou o quão importante é um princípio[7], o que é possível verificar nos chamados casos de colisão de princípios.

Nesse sentido, Alexy desenvolve sua tese sobre direitos fundamentais e reflete a estrutura das normas de direitos fundamentais como composta por regras e princípios, dando destaque à aplicação correta destes, inclusive, em casos de colisão de princípios, nomeadamente, pela relevância de que muitos direitos fundamentais são caracterizados como princípios.

Dentre os critérios para apresentar a diferença entre regras e princípios, Alexy defende que se trata na verdade de uma diferença qualitativa (não somente de generalidade, maior nos princípios do que nas regras), que se define na idéia de que “princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida do possível das possibilidades jurídicas e fáticas existentes”[8], daí serem chamados de mandamentos de otimização. Tais mandamentos de otimização podem ser cumpridos em diferentes graus e possuem medida de cumprimento que não só depende das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas.

E, ao tratar da definição de intensidades para a aplicação de princípios, Alexy defende equiparação entre a norma-princípio e valor. Tal equiparação gerou objeções por quem não admite que a aplicação das normas jurídica, em que se incluem os princípios, defina-se como necessariamente realizadoras de valores, pois o Direito não pode estar subordinado à moral, plenamente expressada no modelo do jusnaturalismo. Nesse sentido, o que pode haver, no máximo, é uma relação de complementação recíproca entre direito e moral, apesar de que “a moral e o direito distinguem-se prima facie, porque a moral pós-tradicional representa apenas uma forma do saber cultural, ao passo que o direito adquire a obrigatoriedade também no nível institucional”. [9]

Essa crítica é ressaltada por Habermas a Alexy exatamente quando este define que princípios são mandamentos de otimização considerados sob maior ou menor intensidade de valores. A objeção também se dirige ao entendimento do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha que considera que a Lei Fundamental não constitui tanto um sistema de regras estruturado através de princípios, mas uma ordem concreta de valores.  Para Habermas[10], que absorve o princípio da ética universalista de Kant ao tratar da ética do discurso, “A validade deontológica de normas tem o sentido absoluto de uma obrigação incondicional e universal: o que deve ser pretende ser bom igualmente para todos”, enquanto “numa constelação de valores, típica para uma cultura ou de vida, é ´correto` o comportamento que, em sua totalidade e a longo prazo, é bom para nós”. Disso vem a discordância por Habermas em relação à consideração de Alexy de princípios como bens otimizáveis. Ainda, Habermas continua a ressaltar a existência de divergência com o pensamento de Dworkin, que considera direitos fundamentais como princípios deontológicos do direito, enquanto Alexy considera princípios como bens otimizáveis do direito.

A crítica à Alexy relativa à coincidência estrutural entre princípio e valor, também é traduzida por Paulo Ferreira da Cunha ao afirmar que tal modelo “peca por um problema de base: é que, se muitos valores jurídicos poderão também ser vistos com princípios, nem todos os princípios jurídicos têm a mesma dignidade de valores”.[11]

Sobre a possibilidade dessa equiparação entre norma-princípio e valor, vale registrar a defesa de Alexy, no sentido de melhor explicar a natureza dos princípios como mandamentos de otimização, que influenciará a compreensão da metodologia proposta na aplicação do Princípio da Proporcionalidade.

Assim, Alexy{C}[12]explica que princípios podem ser equiparados a valores e que tal concepção sobre valores (axiológica) traz uma referência no nível do dever ser (deontológico), no nível do que pode ou não ser considerado bem. Trata-se de uma equiparação, mas que preserva a diferença entre princípio e valor, na assertiva de que princípios podem ser equiparados a valores, mas que com estes não há relação de identidade, pois princípios apontam para o que se considera devido, enquanto valores apontam para o que se considera ser o melhor.

Concluindo a diferenciação entre regras e princípios, conceitua-se que os princípios não possuem mandamentos definitivos, mas apenas prima facie, já que um princípio pode valer em um caso concreto, o que não quer dizer que valerá para todos os demais casos de forma definitiva. Já no caso da exigência de apenas uma norma ou medida, está-se diante da aplicação de uma regra.

Apesar de sofrer a influência da teoria de Dworkin, Alexy{C}[13]propõe um modelo diferenciado ao modelo de Dworkin, pois o considera simples, e afirma que há possibilidade de cláusula de exceção à regra, que deixaria de ser aplicada de forma definitiva no caso concreto e que essa abertura poderia ser dada sob a base de um princípio. Note-se que nesse caso, é o princípio que determina a solução do caso, já que a relação entre regras e o princípio define-se pelo fato de que este apresenta as razões daquelas, observado sempre que a razão principiológica não é definitiva, mas orientada para uma possível aplicação no caso concreto.

Nesse contexto de atividades metodológicas relacionadas a princípios, cabe citar a lição de Castanheira Neves, relativa à solução iniciada pela interpretação conforme os princípios, na qual a interpretação passa da ratio legis à fundamentante ratio iuris, esta sim a determinar a “normatividade jurídica judicativa, pela convocação dos normativos fundamentos constitutivos do próprio sistema”.[14]

Para esse autor, essa interpretação conforme os princípios pode ocorrer por mera atividade de correção, que recupera a coerência normativa numa interpretação corretiva; outras vezes, quando a norma se apresenta contraditória a princípio fundamente da validade do sistema, deve ocorrer a preterição e superação dessa norma, dando prevalência ao princípio.

Ao tratar da chamada interpretação conforme a constituição, de utilidade para a aplicação das normas constitucionais, Castanheira Neves esclarece que se trata de interpretação análoga àquela tratada anteriormente (conforme os princípios), que tenta conservar a norma no quadro de constitucionalidade imputando a esta uma significação jurídica que se compatibilize com a Constituição, o que seria uma atividade de correção análoga à aplicação conforme os princípios. Tudo isso, como enfatiza, em um esquema metódico que postula uma racionalidade normativa de fundamentação e não uma racionalidade político-social de índole sequencial.[15]

Voltando à caracterização e diferenças entre regras e princípios, também se afirma que é nos casos de conflito de regras ou de colisão de princípios que a distinção da natureza dessas normas mais se ressalta.

Nos casos de colisão de princípios e no aprimoramento da sua teoria, Alexy{C}[16]deixa claro que princípios nunca são determináveis a priori, no caso de princípios em choque, sendo necessária a aplicação da lei de colisão, traduzida por meio de uma metodologia racional de aplicação de princípios. Ainda, dentre outras diferenciações de Alexy[17]em relação a Dworkin, está a de que este defende a tese da única resposta correta[18], bem como considera que princípios somente expressam direitos individuais, ao contrário de Alexy; diferenciações essa que, por demandarem a extensão do debate, não serão por ora tratadas.

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Para finalizar o modelo regras/princípios/procedimento de Alexy, tem-se a lição de Cristina Queiroz[19], que enfatiza que “para além desse estrato de regras e de princípios, o sistema deve compreender ainda os procedimentos de aplicação. Numa palavra, um modelo tripartido de regras, princípios e procedimentos.”

Na perspectiva desse modelo, buscam-se a aplicação racional do direito e a garantia da institucionalização de procedimentos judiciais nos moldes dos sistemas democráticos e constitucionais modernos. Assim, Alexy, aqui, mesma linha de Habermas, apóia-se na teoria jurídica do discurso racional, que enfatiza o aspecto procedimental, de modo que o respeito a regras e procedimentos é que determinam a correção e justeza do resultado do processo. [20]

Portanto, o nível de regras e o nível dos princípios necessitam ser completados por um terceiro nível que é o do procedimento orientado pela razão prática, que será tratada no último tópico, no contexto da aplicação racional da metodologia de ponderação exigida pelo Princípio da Proporcionalidade.

 Para Alexy, no modelo regras/princípios/procedimento do sistema jurídico o pressuposto é que “um procedimento assegurador da racionalidade é possível, que pode ser acrescentado ao plano das regras e dos princípios com o objetivo de fechar suas lacunas.” [21]

No Direito Constitucional, partindo-se desse modelo e da compreensão dos princípios, considera-se possível, na aplicação destes, o balanceamento de valores e interesses no caso concreto. No modelo de sistema jurídico regras, princípios e procedimento, é possível uma compreensão da Constituição como sistema integrado e aberto.

J.J. Canotilho{C}[22]define que essa perspectiva principialista “é de particular importância, não só porque fornece suportes rigorosos para solucionar certos problemas metódicos, mas também porque permite respirar, legitimar, enraizar e caminhar o próprio sistema”. Sobre essas possibilidades, esse autor em seguida esclarece que os princípios possuem uma textura aberta; obtém-se legitimidade na proposta de que princípios consagram valores e têm capacidade deontológica de justificação; há referência sociológica dos princípios a valores, programas, funções e pessoas; e, mantém-se a capacidade de caminhar por meio de instrumentos processuais e procedimentais adequados, com vistas à realização prática das normas constitucionais, nos âmbitos da política, administrativo e judicial.

Importa considerar no entendimento de Canotilho[23], dentro da tipologia de princípios, o destaque para a categoria dos princípios jurídicos fundamentais, que se definem como aqueles assimilados ao longo da história e que atualmente estão de forma expressa ou implícita nos textos das Constituições modernas. A relevância da funcionalidade dessa tipologia de princípios jurídicos fundamentais para esse autor dá-se na medida em que esses princípios são parte da ordem jurídica positiva e atuam com importante papel na interpretação, integração, conhecimento e aplicação do direito positivo como um todo. Ainda, os princípios exercem tanto uma função negativa, que auxilia, por exemplo, a reflexão sobre casos limites, como, por exemplo, Estado de Direito e de não Direito, Estado Democrático e Ditadura; e, afasta o perigo do excesso de poder; como também, os princípios exercem uma função positiva, informando os atos dos poderes públicos, como, por exemplo, o princípio da publicidade, o princípio de acesso ao direito e aos tribunais. Além disso, o princípio pode ter simultaneamente função negativa e positiva, como o da imparcialidade da administração, que proíbe tratamentos arbitrários ou desiguais dos cidadãos por parte dos agentes e impõe tratamento uniforme dos interesses cidadãos na ponderação de interesses públicos.

É nessa linha de compreensão da estrutura das normas, da natureza e do destaque à função dos princípios, que emerge a importância das lições metodológicas de aplicação de princípios de Alexy, nomeadamente, nos casos de colisão de princípios constitucionais fundamentais, que deve submeter-se à aplicação do Princípio da Proporcionalidade, consoante a seguir tratado.


3. COLISÃO DE PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE EM SEUS SUPRINCÍPIOS: IDONEIDADE (ADEQUAÇÃO), NECESSIDADE E PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO.

Para Alexy[24], em situações de colisão entre princípios fundamentais, exatamente por demandarem a realização de direitos fundamentais, duas caracterizações relevantes se apresentam: “todas as colisões podem somente então ser solucionadas se ou de lado ou de ambos, de alguma maneira, limitações são efetuadas ou sacrifícios são feitos. A questão é como isso deve ocorrer”. Além disso, “A questão mais importante para cada catálogo de direitos fundamentais e se nos direitos fundamentais trata-se de normas juridicamente relevantes ou não”. Na linha proposta por esse autor, considera-se que somente são vinculativas as normas de direitos fundamentais que, em procedimentos de conferência de vinculação por um tribunal se comprovam, isto é, são normas justiciáveis, o que reforça a relevância do Direito Constitucional e seus procedimentos, nomeadamente de controle de constitucionalidade, pois “onde não existe dever jurídico nada pode colidir juridicamente”.[25]

Assim, se no âmbito da ordem constitucional fundamental, a intervenção em um direito fundamental é justificada (sem prejuízo de ser justiciável e ser objeto de correção), a aplicação da solução no caso concreto deve ser mediante ponderação, que na proposta de Alexy é exigência do Princípio da Proporcionalidade, definido como meio de solução de colisão de direitos fundamentais.

Sobre qual o grau de categoria do Princípio da Proporcionalidade, se no plano constitucional ou não, cabe referência a lição de Canotilho[26], que aponta “que discutido é o seu fundamento constitucional, pois enquanto alguns autores pretendem derivá-lo do princípio do Estado de Direito, outros acentuam que está intimamente conexionado com os direitos fundamentais”.

Sobre a aplicação do Princípio da Proporcionalidade no ordenamento jurídico brasileiro, importante é a explicação de Willis Santiago Guerra Filho, ao considerar que, embora não seja um princípio explícito “é uma exigência inafastável da própria fórmula política adotada por nosso constituinte, a do ´Estado Democrático de Direito`, pois sem a sua utilização não se concebe como realizar o mandamento básico dessa fórmula, de respeito simultâneo dos interesses individuais, coletivos e públicos”[27]

De qualquer modo, reconhecendo-se sua relevância e exigibilidade da Proporcionalidade, e partindo para a operação de ponderação exigida pelo Princípio da Proporcionalidade, merece destaque que Alexy propõe que este é composto por três princípios parciais, também chamados subprincípios, quais sejam: da idoneidade (ou adequação), da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito. E todos esses subprincípios expressam a idéia de otimização, ao mesmo tempo em que funcionam de forma sucessiva e subsidiariamente.[28]

Nos subprincípios da idoneidade e da necessidade, tem-se otimização relativamente às possibilidades fáticas; a proporcionalidade em sentido estrito envolve a otimização relativamente às possibilidade jurídicas.

A citação expressa de Alexy bem esclarece sua proposta: “O princípio da idoneidade exclui o emprego de meios que prejudiquem a realização de, pelo menos, um princípio, sem, pelo menos, fomentar um dos princípios ou objetivos, cuja realização eles devem servir”.[29]

Como alerta Virgílio Afonso da Silva, o que se apresenta no Brasil do suprincípio da adequação como o que é apto a alcançar o resultado pretendido, na verdade, é uma compreensão equivocada decorrente de uma tradução imprecisa do termo alemão fördern como alcançar, em vez de fomentar, sendo este o termo mais correto. Esse autor explica: “adequado, então, não é somente o meio com cuja utilização um objetivo é alcançado, mas também o meio com cuja utilização a rejeição de um objetivo é fomentada, promovida, ainda que o objetivo não seja completamente realizado.” [30]

Passado o crivo da idoneidade ou adequação, o sentido de saber se a medida é apta para fomentar o objetivo visado, se ainda não for possível definir a solução (como no caso da indicação de várias medidas para um objetivo), passa-se ao subprincípio da necessidade, que visa comparar se, dentre os meios idôneos, algum destes limita ou não um direito fundamental e em que intensidade. Se na adequação faz-se exame absoluto do ato, na necessidade faz-se um exame comparativo.

Assim, Virgílio Afonso da Silva explica[31]: “um ato que limita um direito fundamental é somente necessário caso a realização do objetivo perseguido não possa ser promovida, com mesma intensidade, por meio de outro ato que limite, em menor medida, o direito fundamental atingido.”

Alexy{C}[32]afirma que “se existe um meio menos intensivamente interveniente e igualmente idôneo, então uma posição pode ser melhorada, sem que nasçam custos para a outra”, contudo, a despeito dessa idéia de otimidade-Pareto e da operação verificada, “se custos e benefícios não podem ser evitados, torna-se necessária uma ponderação”.

O último crivo é objeto do subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito, também chamado de máxima da proporcionalidade, que somente deve ser aplicado depois da verificação de que a medida é adequada e necessária.

Segundo Alexy,[33]esse subprincípio é idêntico como uma regra que se pode chamar de “lei de ponderação”, que diz “quanto mais alto é o grau do não cumprimento ou prejuízo de um princípio, tanto maior deve ser a importância do cumprimento do outro”, ao mesmo tempo em que a lei de ponderação deixa-se decompor-se em três passos. O primeiro passo é comprovar o grau de não cumprimento ou prejuízo de um princípio. Em seguida, no segundo passo, passa-se à comprovação da importância do cumprimento do princípio em sentido contrário. No terceiro passo, deve ser comprovada se a importância do cumprimento do princípio em sentido contrário é capaz de justificar o prejuízo pelo não cumprimento do outro.

Da forma como exposta acima por Alexy, tal lei de ponderação não se constitui operação tão simples como possa sugerir de forma textual. Dar maior entendimento a essa atividade, inclusive, de forma a permitir o controle do Princípio da Proporcionalidade, é a análise de Alexy que se apresenta no tópico a seguir.

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Sobre o autor
Gerlena Maria Santana de Siqueira

Procuradora Federal da Procuradoria-Geral Federal/Advocacia-Geral da União. Graduada pela Universidade Federal do Ceará. Mestre em Ciências Jurídico-Administrativas pela Universidade do Porto. Ex Coordenadora-Geral de Assuntos Jurídicos do Ministério do Meio Ambiente. Ex Presidente da Câmara Especial Recursal do Conselho Nacional do Meio Ambiente.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SIQUEIRA, Gerlena Maria Santana. Colisão de princípios jurídicos fundamentais e o princípio da proporcionalidade:: Metodologia de aplicação a partir das contribuições de Robert Alexy.. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4205, 5 jan. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/35256. Acesso em: 24 abr. 2024.

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