Afinal, as cotas sociais e raciais, admitidas em processos seletivos são benéficas e são capazes de reduzir a desigualdade ou caminha para o sentido oposto? Para analisar esta questão, vários fatores devem ser levados em consideração.
As ações afirmativas foram criadas pelo governo federal brasileiro através de dispositivos de leis como os de nºs 12.711/2012 (cotas raciais e sociais para ingresso em universidades) e 12.990/2014 (cotas raciais em concursos públicos) no intuito de favorecer os prejudicados pela desigualdade social (estudantes de escolas públicas) e reparar índices históricos da desigualdade racial existente no Brasil (negros, pardos e indígenas), assegurando a estes grupos a reserva de parte de vagas ofertadas sob a justificativa de que assim há um procedimento mais isonômico nos processos seletivos.
Desde então, surgem discussões quanto à necessidade e a eficiência deste dispositivo. Muitas pessoas colocam em xeque esta questão, argumentando que o Estado visa com isso “tapar o sol com a peneira”, tendo em vista que a educação pública reconhecidamente inferior pela existência de cotas para os estudantes egressos desta, é oferecida pelo próprio Estado. Além disso, grande parte da população critica a necessidade das cotas raciais, entendendo que negros e pardos tem a mesma condição de acesso às escolas públicas quanto aos demais e que a desigualdade sofrida por eles anos atrás não mais retrata a realidade atual, na qual estes supostamente já se encontram completamente inseridos à sociedade com todos os seus direitos garantidos ainda que o preconceito subsista de outras formas em alguma parcela da população.
No âmbito jurídico, entende-se que as ações afirmativas apesar de ferir o princípio da isonomia expresso na Constituição Federal em seu art. 5º, caput, são consideradas “medidas de compensação”, dispositivo este, que visa a “igualdade material”, abordada pelo informe 663 do Supremo Tribunal Federal.
Art. 5º, caput: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
De acordo com o entendimento de Pedro Lenza (2014), essas medidas buscam uma igualdade mais real perante os bens da vida. Se valendo da histórica lição de Aristóteles de que é necessário “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades” busca-se concretizar uma igualdade entre a população alvo de ações afirmativas e as que não enfrentaram as mesmas espécies de restrições, sejam elas naturais, culturais, sociais, econômicos ou até acidentais.
Sendo assim, conclui-se que as ações afirmativas (cotas) ainda que objeto de discussões, são constitucionais e legítimas mas estão longe de serem ideais. As cotas garantem a alguns grupos, maiores chances nos processos seletivos que talvez originalmente não teriam, mas a iniciativa do governo neste sentido apenas reconhece a precariedade do ensino público que é oferecido aos brasileiros, e este sim, deve ser o foco das atenções. Uma educação pública qualificada dispensaria qualquer tipo de “ajuda” e acolheria tanto os brancos quanto negros, indígenas ou qualquer outro grupo. A tentativa de implantar este sistema de cotas tem sua valia a um curto prazo, devendo ser abandonado o mais rápido possível. Os benefícios dispostos a apenas alguns, nada contribui para a erradicação do preconceito, muito pelo contrário, evidencia ainda mais alguns estereótipos já existentes, além de criar certa diferenciação entre “cotistas” e “não cotistas” dentro da própria comunidade na qual a medida visa promover o acesso mais igual.