Há pouco mais de dez anos no Brasil, a coreana Samsung coleciona histórias de abusos cometidos contra seus empregados nas fábricas de Campinas e Manaus e no escritório de São Paulo. Dentre as denúncias está o excesso de trabalho: jornadas de mais de 10 horas seguidas em pé, ultrapassando 15h diárias e 60h semanais (contra as 44h permitidas por lei). Num dos casos apurados, um empregado trabalhou 27 dias diretos, sem folga.
O assédio moral também é frequente e não poupa nem os altos executivos da empresa. Constam casos de cobrança de metas abusivas, empregados deixados “de castigo”, gritos e xingamentos de funcionários coreanos feitos tanto em coreano quanto em português, utilizando adjetivos como “burro”, “incompetente”, “fraco” e “estúpido”. Há ainda terceirização irregular e investigações internas em que os funcionários são filmados e interrogados durante longos períodos, sob a insinuação de furto. A ouvidoria interna da empresa é acusada de omissão e os maus-tratos já resultaram em problemas de saúde como estresse, depressão e síndrome do pânico.
A fabricante de eletrônicos, que é patrocinadora da Seleção Brasileira de Futebol, jamais admitiu as violações, tendo afirmado em diversas oportunidades que cumpre a legislação brasileira, que trata seus funcionários com dignidade e que proporciona um ambiente de trabalho com os mais elevados padrões de saúde, segurança e bem-estar.
Decisões judiciais responsabilizando a Samsung por assédio moral não são novidade mas, no final do ano passado, a empresa sofreu uma penalidade um tanto inusitada. Em dezembro de 2014, após ter recebido uma série de denúncias e de levantar documentos e ouvir funcionários, o Ministério Público do Trabalho de São Paulo (MPT) conseguiu que a multinacional assinasse um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (de número 463/2014). Nesse documento, conhecido por TAC, a Samsung se obrigou a desenvolver diversas atividades, dentre as quais estão as seguintes:
- não permitir que seus funcionários sofram assédio moral e informar a cada um deles sobre as obrigações que assumiu perante o MPT;
- apresentar ao MPT, durante três anos, todas as denúncias recebidas pela ouvidoria da empresa, bem como as medidas adotadas em cada caso;
- pagar R$ 5 milhões em danos morais coletivos, destinados a pelo menos cinco instituições sociais idôneas, previamente aprovadas pelo MPT. A Samsung não poderá se utilizar da notícia de tal doação para promover sua marca;
- investir R$ 5 milhões em propaganda com o tema “assédio moral” e/ou “trabalho infantil”. Os anúncios, que trarão ao final o número do disque-denúncia do MPT, devem ser aprovados pelo órgão e não podem conter a promoção da marca de eletrônicos.
Caso o acordo não seja cumprido, além das obrigações ali assumidas incidirão multas que podem ultrapassar os R$ 6 milhões.
O acordo é bem detalhado e prevê exatamente os dias, horários e programas de TV e rádio em que deverão ser veiculados os anúncios, bem como as datas nas quais os cadernos dos jornais impressos conterão as propagandas. As emissoras de TV que veicularão os anúncios são Band, Globo, Record e SBT, e as de rádio são Band News FM, Nova Brasil FM e Alpha FM. Os jornais são Folha de S. Paulo, Estadão, Valor Econômico e Metro SP. A divulgação ocorrerá entre os meses de abril e maio de 2015.
O que chama a atenção, nesse caso, não são os valores envolvidos, insignificantes para uma multinacional do porte da Samsung (que em 2013, só no Brasil, obteve lucro de mais de 778 milhões de dólares), mas as ações de divulgação de mensagens contra as violações dos direitos dos trabalhadores.
Aos poucos o mercado consumidor começa a valorizar as empresas socialmente responsáveis, e a vinculação de uma marca a frequentes violações de direitos trabalhistas pode sair mais caro que o simples pagamento de indenizações. Ações de conscientização, como a adotada pelo MPT paulista nesse caso, se mostram de grande relevância social e devem servir de motivo de reflexão para executivos e empresários.