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O ativismo tardio e a legitimidade democrática da defesa judicial das minorias e do processo democrático

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Resumo:


  • O Poder Judiciário brasileiro passou a criar direitos e normas que não encontram fundamento expresso na Constituição de 1988.

  • Decisões do STF, CNJ e TSE legalizaram a união civil entre pessoas do mesmo gênero, permitiram a interrupção da gravidez de fetos anencéfalos e criaram normas não escritas na Constituição.

  • O ativismo judicial tem dividido opiniões entre os juristas, sendo analisado à luz da legitimidade democrática e dos direitos das minorias, com embasamento teórico em John Hart Ely.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

4.O momento histórico do ativismo judicial no Brasil.

Paradoxalmente, no Brasil, o ativismo judicial em defesa das minorias e do processo democrático surge no Século XXI, após o retorno à democracia, em 1985, bem como após a Constituição de 1988 enumerar e garantir os direitos fundamentais de todos, inclusive das minorias.

Não houve ativismo judicial, em defesa do procedimento democrático e das minorias, durante a Ditadura do Estado Novo (1937-1945), quando o Parlamento foi fechado por tempo indeterminado e os dissidentes políticos foram presos e torturados.

Também não houve ativismo judicial durante a Ditadura Militar (1964-1985), quando o Parlamento foi fechado algumas vezes por tempo indeterminado[13] e os opositores políticos também foram presos e torturados.

Somente após a democracia estar consolidada e após ter se estabelecido a plena vigência dos direitos fundamentais, no Brasil, que o Poder Judiciário tornou-se ativista e criou normas jurisprudencialmente para proteger a democracia e os direitos fundamentais. Durante os períodos ditatoriais e durante os períodos em que o Congresso Nacional permaneceu fechado, o Poder Judiciário não foi ativista. Ao contrário, o Supremo Tribunal Federal permaneceu aberto e aplicou as normas dos ditadores, o que demonstra que o Poder Judiciário consolidou-se como guardião da democracia e das minorias após o reestabelecimento do regime democrático e dos direitos fundamentais. O ativismo judicial no Brasil, nesse sentido, é tardio.


Conclusão

No Século XXI, o Poder Judiciário brasileiro tornou-se ativista na defesa do procedimento democrático e dos direitos fundamentais. Para alguns autores, o ativismo judicial é antidemocrático. Contudo, com base no pensamento de John Hart Ely, é possível defender a legitimidade democrática das decisões do Poder Judiciário, em defesa do procedimento democrático e dos direitos das minorias, com base no princípio da isonomia, para garantir que os direitos que a maioria se concede também sejam garantidos a todas as minorias. A Constituição é a sua principal fonte de legitimidade.

Contudo, deve-se considerar que, quando de fato a democracia foi usurpada no Brasil, o Poder Judiciário respeitou as normas editadas pela Ditadura Vargas (1937-1945) e pela Ditadura Militar (1964-1985). Assim, atualmente, ainda que o Parlamento venha passando por uma crise de legitimidade representativa no Brasil, a atuação do Judiciário deve ser moderada a fim de respeitar as normas elaboradas pela votação majoritária dos representantes do povo brasileiro reunidos no Congresso Nacional, atuando de forma ativista somente em casos excepcionais.

Como a garantia das regras e princípios constitucionais, principalmente as normas que regulam o “jogo democrático” e protegem as minorias, com base no princípio da isonomia, são condicionantes e essenciais ao bom funcionamento da democracia, é legítima uma atuação mais ativa do Poder Judiciário. Assim, quando Poder Judiciário toma decisões mais fortes para proteger minorias (com base no princípio da isonomia) e o procedimento democrático, em tese, sua intervenção se dá a favor, e não contra a democracia.


Referências.

BARROSO, Luis Roberto. Judicialização, ativismo e legitimidade democrática. in: Atualidades Jurídicas nº 4. 2009. Disponível em: http://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235066670174218181901.pdf Acesso em 18 de junho de 2015.

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STRECK, Lênio Luiz; BARRETO, Vicente de Paulo. OLIVEIRA, Rafael Tomaz. Ulisses e o canto das sereias: sobre ativismos judiciais e os perigos da instauração de um “terceiro turno da constituinte”. in: Vários autores. Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêutica e Teoria do Direito. 2009.

WECHSLER. Hebert. Toward Neutral Principles in Constitutional Law. in: Vários autores. Harward Law Review nº 73, 1959


Notas

[3] Para Luis Roberto Barroso, “a ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. A postura ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: (i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas.” (Cf. BARROSO, Luis Roberto. Judicialização, ativismo e legitimidade democrática. in: Atualidades Jurídicas nº 4. 2009. Disponível em: http://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235066670174218181901.pdf Acesso em 18 de junho de 2015.)

[4] Como, por exemplo, em Griswold vs. Connecticut (1965), na qual a Suprema Corte declarou que a lei que bania o uso de contraceptivos, ao ser aplicada a casais casados, configurava uma inadmissível invasão da privacidade familiar (right to marital privacy), direito não enumerado na Constituição de 1787; como, por exemplo, em Loving vs.Virginia (1967), na qual a Suprema Corte decidiu que a Lei do Estado da Virgínia que proibia casamentos inter-raciais era inconstitucional, como, por exemplo, no caso Eisenstadt vs. Baird (1972), quando foi estendida aos casais não casados a decisão do caso Griswold vs. Connecticut e, finalmente, como no caso Roe vs. Wade na qual se estendeu esses precedentes para proteger o direito das mulheres quanto ao direito de realizar o aborto, com fundamento no direito não enumerado à privacidade.

[5] O § 1º do art. 4º da Resolução determinava que: “os partidos políticos que lançarem, isoladamente ou em coligação, candidato/a à eleição de presidente da República não poderão formar coligações para eleição de governador/a de Estado ou do Distrito Federal, senador/a, deputado/a federal e deputado/a estadual ou distrital com partido político que tenha, isoladamente ou em aliança diversa, lançado candidato/a à eleição presidencial.”

[6] O Acórdão da ADI 4.277-DF e da ADPF nº 132-RJ criou direitos não escritos na Constituição de 1988 com o seguinte argumento: “Reconhecimento do direito à preferência sexual como direta emanação do princípio da “dignidade da pessoa humana”: direito a auto-estima no mais elevado ponto da consciência do indivíduo. Direito à busca da felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autonomia da vontade das pessoas naturais. Empírico uso da sexualidade nos planos da intimidade e da privacidade constitucionalmente tuteladas. Autonomia da vontade. Cláusula pétrea.” O STF justificou a criação dos referidos direitos da seguinte maneira: “Aplicabilidade do §2º do art. 5º da Constituição Federal, a evidenciar que outros direitos e garantias, não expressamente listados na Constituição, emergem “do regime e dos princípios por ela adotados”, verbis: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=628635. Acesso em 18 de junho de 2015.

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[7] O Acórdão declarou que o art. 1.723 do Código Civil devia ser interpretado em conformidade com o disposto na Constituição de 1988, de maneira a excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família, apesar da própria do § 3º do art. 226 da Constituição da República afirmar que “é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar”.

[8] A origem da distinção entre interpretativismo e não-interpretativismo origina-se no artigo de GREY, Thomas C. Do we have un Unwriten Constitution? in: Vários autores. Stanford Law Review, n.º 27, 1975. pp. 703 e ss.

[9] Hebert Wechsler propos em 1959 que a Suprema Corte tomar suas decisões com fundamento em princípios que transcenderiam o caso em questão e que permitiriam tratar de igual maneira casos similares. (Cf. WECHSLER. Hebert. Toward Neutral Principles in Constitutional Law. in: Vários autores. Harward Law Review nº 73, 1959).

[10] Teoria segundo a qual, os juízes devem utilizar os valores do futuro para realizar o controle de constitucionalidade, predizendo o progresso dos valores. Nesse sentido, o poder judicial enunciaria princípios que parecem ir contra a vontade da maioria, mas que alcançariam no futuro o apoio da maioria. (Cf. ELY, John Hart. Democracy and Distrust. Cambridge and London: Harvard Universit Press, 1980. p. 69)

[11]No mesmo sentido, Robert H. Bork afirma que a Constituição possui áreas usuais de incerteza, mas com tolerável definição. (Cf. BORK, Robert H. Op. Cit. p. 7.)

[12] Após o fim da Segunda Guerra Mundial, com o caso Brown vs. Board of Education, a Suprema Corte dos Estados Unidos inaugurou um novo período de sua história, no qual se transformou a sociedade americana. Nesse período, sob o comando de Earl Warren, (presidente entre 1953 e 1969) e Warren Burguer (presidente entre 1969 e 1986), essa Corte, utilizando-se de métodos de interpretação construtivos, lançou mão, em larga escala, de princípios retirados da “moralidade política”. Assim, por meio de uma interpretação extensiva da XIV Emenda à Constituição norte-americana, estendeu a toda sociedade princípios jusfundamentais como os do due process e da equal protection clause. A Suprema Corte, assim, algumas vezes com fundamento em direitos que não estão no texto claro da Constituição (em Griswold vs. Connecticut, de 1965, a Suprema Corte criou o direito à privacidade), dessegregou as escolas (Brown vs. Board Education); baniu a oração das escolas públicas (Engel vs. Vitale); transformou todo o sistema de processo penal dos Estados membros, ao garantir os direitos dos acusados (Miranda vs. Arizona); redesenhou o mapa político ao fazer os Estados conformarem-se ao princípio do “um homem, um voto” (Baker vs. Carr); impôs aos Estados o respeito pela vida privada das pessoas e anulou todas as leis dos Estados que proibiam o aborto nas primeiras semanas da gravidez (Roe vs. Wade).

[13] O Congresso Nacional foi fechado por tempo indeterminado, pelas Forças Armadas, em 1889, 1930, 1937, 1968, pelo Ato Complementar nº 38, e em 1977, pelo Ato Complementar nº 102. Em 1966, o Ato Complementar nº 23, fechou o Congresso de 20 de outubro a 22 de novembro. Em 1823, o Parlamento foi fechado por Dom Pedro I.

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Sobre os autores
Tatiana Cardoso Teixeira Viana

Professora Adjunta do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal de Alfenas. Graduada em Direito pela UNIFENAS. Especialista em Direito Público pela FDSM. Mestre e doutoranda em Direito Constitucional pela PUC-SP. Bolsista da CAPES.

Pablo Viana

Doutorando em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), com bolsa da Capes, Pablo Viana Pacheco é Mestre em Direito do Estado e Especialista em Ciências Jurídico-Políticas pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Foi orientador de pesquisas da Pós-Graduação da Escola de Saúde Pública do Estado de Minas Gerais (ESP-MG). Atualmente, é professor de Direito da UNIFENAS e do IMES-FUMESC, sócio do Cardoso & Viana Advogados Associados, assessor jurídico da fundação de apoio à Universidade Federal de Alfenas, assessor jurídico da fundação de apoio ao IFSULDEMINAS, assessor jurídico da Bruker AXS, membro da Comissão de Direitos Humanos da 21º Subseção da OAB-MG e advogado.<br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIANA, Tatiana Cardoso Teixeira ; VIANA, Pablo. O ativismo tardio e a legitimidade democrática da defesa judicial das minorias e do processo democrático. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4433, 21 ago. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/41076. Acesso em: 22 dez. 2024.

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