6.Súmula
Como visto, “verificada a paralisação do feito executivo por prazo superior aquele previsto em lei (cinco anos) para a pretensão executória, por inércia e desídia única do credor, tal circunstância leva à consumação da prescrição intercorrente.”[3].
Contudo, há mais de 5 décadas vem sido discutida a controvérsia acerca da prescrição intercorrente, por não estar em nenhum dispositivo legal, de tal forma que, em 1957, o Ministro Luiz Gallotti reconheceu a possibilidade de prescrição da pretensão executória pelo mesmo prazo da ação. Confira-se:
“PRESCRIÇÃO, DISSÍDIO JURSIPRUDENCIAL SOBRE SE A EXECUÇÃO PRESCREVE NO MESMO PRAZO DA AÇÃO. DECISAO EM SENTIDO AFIRMATIVO”.
(RE 34.944/DF, Relator Ministro Luiz Galotti, 1ª Truma, julgado em 18/09/1957)
Assim, tendo como precedente o julgado colacionado acima, em 1963, o Supremo Tribunal Federal (“STF”), até então competente para a uniformização da lei federal, editou a súmula 150/STF, superando a controvérsia quanto ao prazo a ser observado para a prescrição da dívida executória:
“Súmula 150/STF – Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação”.
Contudo, em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, foi criado o STJ, o qual foi designado para a uniformização e interpretação das leis federais (antes, trabalho designado ao STF), surgindo, novamente, controvérsia na hipótese de suspensão do processo por ausência de bens penhoráveis, prevalecendo a inaplicabilidade da Súmula 150/STF, nos termos:
“PROCESSUAL CIVIL - EXECUÇÃO COM BASE EM TITULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL - SUSPENSÃO POR FALTA DE BENS PENHORÁVEIS - PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - CASO EM QUE NÃO SE VERIFICA.
Pressupõe a prescrição diligencia que o credor, pessoalmente intimado, deve cumprir, mas não cumpre no prazo prescricional. Estando suspensa a execução a requerimento do credor, pela inexistência, em nome do devedor, de bens penhoráveis, não tem curso o prazo de prescrição. Inteligência dos arts. 266; 791, III e 793, do código de processo civil.
Recurso conhecido e provido.
(REsp 33.373/PR, Rel. p/ acórdão Ministro WALDEMAR ZVEITER, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/09/1993, DJ 21/02/1994)”
Ressalte-se que, apesar do entendimento já pacificado do STJ, que reconhece a prescrição intercorrente apenas no processo executivo se, após a intimação pessoal da parte exequente, para dar andamento ao feito, a mesma permanecer inerte, o Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, conforme ementa acima mencionada, confrontou o instituto consolidado, entendendo pela desnecessidade de prévia intimação do exequente para dar andamento ao feito, aplicando a prescrição intercorrente em processo de execução suspenso por prazo superior à prescrição da dívida, o que ensejou a revisão da Jurisprudência do STJ, para revigorar o entendimento na Súmula 150/STJ, consoante à disposição do NCPC.
7. Prescrição intercorrente na Execução Fiscal
No âmbito das relações jurídicas de direito público, nos casos de execução fiscal, a prescrição intercorrente é aplicada nos termos do artigo 40, §4º, da Lei de Execuções Fiscais (“LEF”), de tal forma que o magistrado poderá declará-la de ofício:
“Art. 40. O juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o dever ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.
[...]
§ 4º Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente, e decretá-la de imediato”.
Assim, o § 4º da LEF faculta ao magistrado a decretação de prescrição intercorrente. Portanto, atualmente, encontra-se resolvida essa questão no sentido da possibilidade de declaração da prescrição intercorrente, tendo ainda sido sumulado tal entendimento pelo STJ:
“Súmula 314/STJ – Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual inicia-se o prazo da prescrição quinquenal intercorrente”.
Por fim, para corroborar tal entendimento, o precedente julgado pela Ministra Eliana Calmon, que decidiu no sentido de que durante o prazo da suspensão o curso do prazo prescricional na execução fiscal fica igualmente suspenso, de modo que recomeça a fluir até completar cinco anos.
8. Conclusão
A questão da existência e da aplicabilidade da prescrição intercorrente é tema bastante polêmico no Direito brasileiro. Apesar da existência da Súmula 150 do STF no sentido de que a execução prescreve no mesmo prazo de prescrição da ação, a jurisprudência majoritária do STJ (órgão atualmente competente para uniformização da lei federal) não tem se mostrado de acordo com tal Súmula. Isso se dá pelo entendimento do STJ de que, caso a execução esteja suspensa, não há curso de prescrição, de modo que o processo de execução permanece suspenso por tempo indeterminado. É entendido que, para o reconhecimento da prescrição intercorrente, é necessária a comprovação da inércia do exequente após sua intimação pessoal, tendo em vista que o CPC não elenca nenhum artigo a respeito do tempo de suspensão do processo.
Com o fim da vacatio legis e a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil acredita-se que a polêmica quanto à existência da prescrição intercorrente chegará ao fim, tendo em vista que o novo Código prevê expressamente a existência de tal instituto.
A doutrina de Gilson Delgado Miranda acerca do NCPC bem aponta que, se na execução fiscal não são localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo de prescrição quinquenal intercorrente. Assim, não há lógica em distinguir a orientação adotada na execução fiscal e aquela prevista para se aplicar à execução civil.
Desta forma, tendo como objetivo maior a segurança jurídica e a duração razoável do processo é viável a defesa da prescrição intercorrente.
Bibliografia
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume I: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2014.
DE MIRANDA, Pontes. Tratado de Direito Privado, Parte Geral vol. 6, Bookseller, 1ª ed., 2000.
MIRANDA, Gilson Delgado. Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.
NOTAS
[1] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
[2] Tratado de Direito Privado, Parte Geral vol. 6, Bookseller, 1ª ed., 2000, p. 135
[3] Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito:
III - quando, por não promover os atos e diligências que Ihe competir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias;
[4] (TJ/MS Apelação Civel n 2009.009411-4, Relator Des. João Maria Lós, Primeira Turma Cível, Julgamento 24.08.2010)