A importância do boletim de ocorrência na atuação policial militar

13/06/2016 às 05:25
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Este artigo foi redigido com a finalidade de orientar profissionais atuantes na área de segurança pública sobre o fundamento legal do Boletim de Ocorrência Policial e sua importância no mundo jurídico.

O Boletim de Ocorrência Policial, mais conhecido como BOP ou simplesmente BO, é um ato administrativo lavrado por um servidor público que tem como foco o registro e detalhamento das circunstâncias que se deram um determinado fato, criminoso ou não, cujo qual tem alguma relevância para a segurança pública ou possa contribuir para a manutenção da ordem pública.

Têm previsão legal no artigo 5º, § 3º do Código de Processo Penal e é definido pela Polícia Militar de Minas Gerais e pelo Ministério Público, na Instrução Conjunta n° 01/2003, da seguinte forma: “é o registro ordenado e minucioso dos fatos ou atividades relacionados com a ocorrência, que exigirem a intervenção policial”.

Perceba que não há necessidade de que o fato registrado seja criminoso. Inclusive é praxe na maioria das Polícias Militares do Brasil que qualquer fato que envolva a atuação policial, por iniciativa própria ou não, deva ser registrado através deste documento. Trazendo para a realidade policial, que diga-se de passagem, é muitas vezes questionada quanto à legalidade, o BOP funciona como uma ferramenta de justificação da correta atuação dos policiais.

Por tratar-se de um documento lavrado por agentes públicos, tem presunção de veracidade até que se demonstre o contrário. Daí a importância de serem observados os requisitos do ato administrativo na lavratura do BOP, assim definidos pelo professor Celso Antônio Bandeira de Mello e em interpretação a contrario sensu do artigo 2º da Lei Federal nº 4.717/65, quais sejam: competência, finalidade, forma, motivo e objeto.

Com base no registro do BOP, a Autoridade Policial, aqui entendida como o Delegado de Polícia Civil, conforme o artigo 2º da Lei Federal nº 12.830/13, dará início aos procedimentos de investigação que lhe são próprios, bem como, os demais órgãos envolvidos na prevenção do crime poderão subsidiar suas atuações ou aperfeiçoá-las, como é o caso, da elaboração do mapa do crime realizada pela Polícia Militar. Tal ferramenta, o mapa do crime, utiliza como principal fonte a quantidade e qualidade dos delitos ocorridos em diversos pontos da cidade, identificando a concentração desses eventos para nortear a distribuição das modalidades de policiamento que serão mais eficazes nesses locais. Se os eventos delituosos não forem registrados através de BOP’s, restará inviabilizada a elaboração adequada do mapa do crime e, consequentemente, comprometerá a definição e a implementação das políticas públicas de segurança pública.

Além dessa funcionalidade, o BOP também é importante para que o cidadão, vítima de algum tipo de crime, registre o dano sofrido e relacione qual o prejuízo que teve para posteriormente acionar judicialmente os responsáveis pela sua restituição. Destarte que alguns autores (por todos, TOLEDO NETO, 2003) rechaçam tal finalidade do BOP por entenderem que não há previsão legal para tal. Tais estudiosos defendem que para esta finalidade existe o instituto da “queixa-crime”, no entanto, desconsideram o fato de que para o cidadão comum que é vítima de algum crime de ação privada ou de qualquer outro tipo de constrangimento, no calor da ocorrência e sem os poderes de polícia próprios das autoridades públicas, fica praticamente impossível identificar qualificadamente os culpados, as testemunhas ou outras circunstâncias que demonstrem a materialidade e autoria que determinam a justa causa para a deflagração da ação penal.

Diante de tal importância, e dos diversos endereçamentos que se podem dar ao BOP, os policiais responsáveis pela sua confecção devem dedicar especial atenção ao relatarem os fatos constatados no atendimento de ocorrências. A qualificação dos envolvidos deve ser a mais completa possível para se evitar que criminosos fiquem impunes ou até mesmo, que inocentes sejam responsabilizados pelo que não fizeram, como é o caso dos homônimos.

O endereçamento para autoridade diversa da competente para apreciar o BOP também pode gerar inúmeros transtornos para os envolvidos e para a adequada persecução penal, como a dilação de prazos ou até mesmo a ineficácia do documento. Da mesma forma, o relato completo e objetivo no histórico do BOP se mostra essencial para que a autoridade destinatária possa ter conhecimento preciso das circunstâncias que poderão fazer total diferença na tipificação de crimes ou até mesmo, na identificação de envolvidos que talvez nem tenham sido relacionados.

Muitas vezes, o imediatismo e a emoção inerentes às ocorrências policiais, podem gerar decisões equivocadas por parte dos agentes, como na determinação de vítimas, suspeitos e testemunhas. É através de um histórico bem redigido que a autoridade poderá fazer o seu juízo preliminar sobre os fatos e corrigir eventuais impropriedades que tenham passado despercebidas pelos que prestaram a primeira resposta à ocorrência.

Em face da objetividade inerente ao histórico, deve-se evitar um linguajar rebuscado, pois isso pode gerar dúvidas ao intérprete. Usar palavras bonitas e diferentes não é sinônimo de inteligência. O principal atributo de um texto bem redigido é a coesão de ideias, que por sinal, devem, na medida do possível, seguir uma ordem cronológica.

Como o trabalho do policial não se resume apenas ao atendimento de ocorrências, de forma geral, devem ficar claras para quem quer que leia o BOP as respostas para os seguintes questionamentos:

1 – Quem mandou?

2 – Mandou quem?

3 – Ir aonde, e como ir?

4 – Fazer o que?

5 – Se foi, o que constatou?

6 – Como resolveu?

Responder a estes questionamentos, os quais funcionam como uma espécie de fluxograma, de forma objetiva, informal e clara, certamente proporcionará que o destinatário do BOP extraia o máximo de informações sobre as circunstâncias em que se deram a ocorrência. Como se percebe, seguir essa ordem garantirá a cronologia dos fatos, mas em razão da imprevisibilidade do serviço policial, óbvio que nem sempre isso será viável.

Alguns vícios devem ser evitados na redação do histórico do BOP. Tal documento deve ser impessoal e, apesar de ser destinado para uma autoridade específica, integrará o bojo de eventual processo criminal, civil ou administrativo, e portanto, é prudente que se use de um vocabulário generalizado. Utilizar jargões ou gírias peculiares à determinada classe profissional poderá causar confusões ou até mesmo contradições.

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Pelo mesmo motivo, o endereçamento do BOP deve ser realizado em campo adequado para isso, e não no histórico. Iniciar o texto com expressões do tipo: “Senhor delegado...” ou “Excelentíssimo senhor Juiz...”, pode parecer sinal de respeito à autoridade destinatária, no entanto, não se mostra adequado, pois após o Delegado apreciar o feito, o BOP será utilizado pelo Promotor de Justiça, que o utilizará para subsidiar a denúncia, e posteriormente, será remetido ao Juiz, que também precisará ler o histórico para entender melhor os fatos. Sem dizer ainda de inúmeros outros agentes ou envolvidos que terão acesso a tal documento para as mais diversas finalidades.

Importante destacar ainda, que com o advento da Súmula Vinculante nº 11 do STF, a utilização de algemas por parte das forças policiais deve ser circunstanciadamente justificada, admitida somente em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito. Nada melhor do que o BOP para atender tal regramento. Destarte que a falta de tal justificação relatada no BOP pode incorrer em responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

Sendo assim, não há como se definir um padrão de redação do histórico de um BOP, mas se o redator procurar responder aos questionamentos supracitados de forma o mais cronológica possível, com impessoalidade, objetividade e clareza, atentando-se apenas aos fatos e às circunstâncias que os tenham causado, certamente logrará êxito em sua missão constitucional de preservação da ordem pública, atuando com excelência em sua função legal de agente da autoridade policial.

Referências

SERRANO, Carlos. O boletim de ocorrência policial militar no mundo jurídico. Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/36239/o-boletim-de-ocorrencia-policial-militar-no-mundo-juridico>. Acesso em: 11 jun. 2016.

TOLEDO NETO, Geraldo do Amaral. O delegado de polícia e seu juízo de valoração jurídica. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 8n. 82,23 set. 2003. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/4298>. Acesso em: 11 jun. 2016.

JURIATI, Felipe. Boletim de ocorrência de preservação de direito. Disponível em: < http://www.sinpolms.org.br/leitura_artigo.php?id=110>. Acesso em: 11 jun. 2016.

MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22a., São Paulo – SP, Editora Malheiros, 2007, p. 370

MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Defesa Social de Minas Gerais. Instrução Conjunta n° 01/2003: contém orientações para o preenchimento do boletim de ocorrência. Belo Horizonte, 2003.

BRASIL. Súmula Vinculante 11. STF. Sítio do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumario.asp?sumula=1220. Acesso em: 11 jun. 2016.

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Sobre o autor
Diego Carlini Junior

É bacharel em Direito pela Universidade de Vila Velha - ES. Aprovado no exame de ordem 2008-3. Pós-graduado em Docência do Ensino Superior e Gerenciamento de Projetos. Policial Militar atuante em serviço operacional desde 2004. Já trabalhou no Batalhão de Missões Especiais - BME. Atualmente é lotado no Batalhão de Polícia Militar Ambiental.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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