Parte I
Apesar de ter pouco espaço na mídia, Osasco-SP costuma ser um termômetro do Brasil. Em 1968 o operariado osasquence se levantou contra a ditadura. Este evento épico, que resultou em prisões e exílios, acarretou o renascimento do sindicalismo. Alguns anos mais tarde o movimento iniciado em Osasco reiniciaria no ABC sob o comando de Lula provocando o princípio do fim do regime ditatorial.
Este ano, as eleições municipais em Osasco foram marcadas por fenômenos interessantes. O primeiro e mais evidente foi o fracasso humilhante da candidatura do PSDB, cujo candidato nem mesmo pode disputar as eleições http://g1.globo.com/sao-paulo/eleicoes/2016/noticia/2016/09/tre-mantem-indeferida-candidatura-de-celso-giglio-prefeitura-de-osasco.html. O candidato do PT teve apenas 3,54% dos votos, um resultado igualmente frustrante já que o partido dele governou a cidade por quase três mandatos http://g1.globo.com/sp/sao-paulo/eleicoes/2016/apuracao/osasco.html.
A disputa no segundo turno ocorrerá entre Rogério Lins, do PTN, e Jorge Lapas do PDT. O primeiro é um novato cujo sucesso não pode ser explicado nem mesmo pela legenda a que ele pertence. O PTN é um partido nanico sem ideologia muito definida que nas últimas eleições presidenciais oscilou entre apoiar Dilma Rosseff (2010) e Aécio Neves (2014). O segundo foi eleito pelo PT e saiu do partido início de 2016 em razão de uma disputa interna no partido http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2016/03/jorge-lapas-prefeito-de-osasco-deixa-o-pt-apos-11-anos-de-filiacao.html. O resultado da eleição sugere que Lapas conseguiu atrair uma parcela dos eleitores do PT e ampliar a base política que ele mesmo já havia construído quando era petista.
Em Osasco, o partido de Michel Temer não disputou a eleição com candidato próprio. Seguindo sua tradição nacional de conseguir cargos e espaço na administração sem correr o risco de derrotas eleitorais, o PMDB osasquence preferiu participar da coligação que sustenta a candidatura de Jorge Lapas. O resultado do segundo turno é incerto. Todavia, creio que o novato Rogério Lins tem menos chances de ser eleito do que seu adversário.
Apesar de terem desempenhos pífios no primeiro turno, PT e PSDB podem ser os fieis da balança no segundo turno. Em razão dos fatos que precipitaram a saída de Lapas do PT é improvável que o partido de Lula o apóie no segundo turno. O PSDB, partido ao qual ele pertenceu no passado http://portalregiaooeste.com.br/lapas-um-tucano-em-ninho-petista/, certamente irá apoiá-lo em troca de mais espaço na prefeitura. A convivência entre PMDB e PSDB em nível nacional se reproduziria assim na cidade de Osasco.
O cenário político de Osasco pode ser considerado um termômetro nacional? Sim e não. Sim, porque o resultado do primeiro turno registrou a deterioração eleitoral de três grandes partidos (PT, PMDB e PSDB). Não porque o PDT e o PTN (partidos de Jorge Lapas e Rogério Lins) dificilmente estão em condições de eleger o presidente da república ou o governador do Estado de São Paulo nas eleições de 2018.
Parte II
Nesta parte me debruçarei apenas sobre a questão dos votos nulos e brancos.
Em Osasco-SP foram apurados 30.713 votos brancos e 135.771 votos nulos. Os candidatos que disputarão o segundo turno tiveram respectivamente 109.705 (Rogério Lins) e 107.232 (Jorge Lapas) votos.
O resultado desta eleição municipal repetiu da anterior. Em 2012, na cidade de Osasco, também ocorreu uma avalanche de votos brancos (30.071) e nulos (188.992) http://g1.globo.com/sp/sao-paulo/apuracao/osasco.html. A queda significativa do total de votos nulos em relação a 2012 (53.221), não é suficiente para alterar a conclusão de que Osasco poderia ter outro prefeito se um candidato conseguisse atrair para os votos nulos.
A realidade osasquence não difere da do resto do país. As eleições municipais de 2016 se caracterizaram pela rejeição dos partidos políticos. Alguns analistas afirmam que a democracia está em risco porque a rejeição da política criaria condições para o surgimento de um “salvador da pátria”. Eu discordo desta análise por três razões.
Primeiro porque é um erro criar subsumir a política aos partidos políticos. A política sempre transcendeu aos partidos. A prova disto tem sido dada ao longo da história por reformas e revoluções, pacíficas ou não, iniciadas sem a participação dos partidos políticos.
Segundo, porque os cidadãos tem liberdade de consciência. Eles não podem ser obrigados a votar nos candidatos que se apresentam para disputar a eleição. Os partidos é que devem motivar e organizar o eleitorado, algo que obviamente não está ocorrendo.
Terceiro, porque a intensa circulação de informação na internet impossibilita o monopólio do discurso e da cena política. A fabricação de um “salvador da pátria” como Fernando Collor dificilmente ocorreria na atualidade.
Nesse contexto, os votos brancos e nulos funcionam como uma espécie de poder moderador. Portanto, ao contrário do que alguns analistas afirmaram, eles podem estar contribuindo para o aperfeiçoamento da democracia brasileira.
Não é a democracia que está em risco. De fato, nosso regime político começou a ser destruído no momento em que a Câmara dos Deputados e o Senado, com ajuda do STF, derrubaram Dilma Rousseff através de um processo fraudulento. O que os votos brancos e nulos colocam em risco é a sobrevivência dos partidos e dos políticos que ainda não perceberam que uma parcela da população cansou de consumir propaganda eleitoral enganosa realizada com dinheiro desviado que poderia ter sido utilizado na saúde e na educação.