Capa da publicação Concessão de indulto ao traficante de drogas por meio da jurisprudência
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O indulto judicial.

A inconstitucionalidade da concessão do indulto ao traficante de drogas por meio da jurisprudência

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CONCLUSÃO

O indulto, embora seja tributário do regime monárquico absolutista, encontra assento na Constituição Federal de 1988. Em vista disso, apesar de o indulto conservar a sua origem como sendo um ato de clemência, sua concessão está sujeita a todas as diretrizes constitucionais vigentes.

Os anseios político-criminais subjacentes à enumeração de hipóteses de cabimento do indulto não podem se sobrepor às limitações constitucionais em torno do instituto, tampouco contrariar os objetivos fixados pelo Constituinte.

Neste contexto, é defeso a quaisquer dos Poderes desfigurar a missão constitucionalmente atribuída ao indulto, outorgando a ele papel messiânico na esfera do sistema penitenciário nacional.

As base jurídicas sólidas contidas no texto constitucional vigente não podem sucumbir diante de promessas políticas desprovidas de base cientifica e sem qualquer amparo argumentativo válido.

É indubitavelmente ingênuo a crença de que o indulto será bem-sucedido na tarefa de enfrentar a problemática em torno da carcerização e do tráfico de drogas, especialmente se o cumprimento da missão delegada a ele estiver condicionado ao sacrifício de garantias fundamentais, a exemplo da tutela penal efetiva e do principio da proporcionalidade.

Portanto, é desaconselhável a qualquer Tribunal deste país superestimar sua habilidade jurídica no projeto de realização da Lei Fundamental brasileira, distorcendo a literalidade das normas constitucionais, sob pena de ofensa à autoridade do Constituinte e de deturpação do princípio da separação de poderes.

Dentro deste organograma de ideias é flagrantemente inconstitucional toda tentativa do aqui intitulado “indulto judicial”; revelando-se ilegítimas, pois, decisões judiciais pelas quais se concede a benesse em tela a sentenciados por tráfico privilegiado de drogas, com esteio nas hipóteses de cabimento existentes nos Decretos de indulto natalino anteriores a 2016, à mercê de qualquer previsão normativa específica, bem como ao arrepio da Lei fundamental em vigor. 


REFERÊNCIAS

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Notas

[1] Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

[2] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Processo e hermenêutica na tutela penal dos direitos fundamentais. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 35.

[3] Nas palavras de Inocêncio Martires Coelho: “Estreitamente vinculado ao principio da força normativa da Constituição, em relação ao qual configura um subprincípio, o cânone hermenêutico-constitucional da máxima efetividade orienta os aplicadores da Lei Maior para que interpretem as suas normas em ordem a otimizar-lhes a eficácia, sem alterar o seu conteúdo” (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 140).

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[4] Não se desconhece que grassa substancial cizânia doutrinária em torno da terminologia apropriada para designar o princípio da proporcionalidade, havendo quem o denomine como “postulado normativo aplicativo” (ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 8º ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 88) ou quem o identifique como simples regra (SILVA, Virgilio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 169). Porém, para os termos deste trabalho, será utilizado o vocábulo, devido a sua notável incorporação ao vocabulário jurídico e ausência de qualquer prejuízo dogmático.

[5]{C}{C}[5] FELDENS, Luciano. Direitos fundamentais e direito penal: a  Constituição Penal. 2ª ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p.166/171.

[6] rt. 33.  Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

§ 1o  Nas mesmas penas incorre quem:

I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas;

II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;

III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.

§ 2o  Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga:     (Vide ADI nº 4.274)

Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) dias-multa.

§ 3o  Oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos a consumirem:

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa, sem prejuízo das penas previstas no art. 28.

§ 4o  Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.     (Vide Resolução nº 5, de 2012)

[7] BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 1. ed. São Paulo: Pillares, 2013, p. 35.

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Sobre o autor
Carlos Eduardo Fernandes Neves Ribeiro

Graduado em Direito pela UFJF Pós-Graduado em Ciências Penais pela UFJF Ex-Técnico Superior Processual do MPRJ Ex-Analista Judiciário do TRE-RJ Ex-Procurador Federal Promotor de Justiça do Estado de Minas Gerais

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Carlos Eduardo Fernandes Neves. O indulto judicial.: A inconstitucionalidade da concessão do indulto ao traficante de drogas por meio da jurisprudência. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5164, 21 ago. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/59364. Acesso em: 25 abr. 2024.

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