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O estupro de vulnerável frente ao Estatuto da Pessoa com Deficiência

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02/03/2018 às 15:00
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7 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O DIREITO PENAL

Pensar em Direito Penal, inegavelmente, é pensar em violência. Uma ideia não pode estar dissociada da outra. Durkheim[44] sustenta que o delito é um fenômeno social comum e, portanto, acontece em qualquer sociedade constituída pelo ser humano. Ainda segundo o autor, nessa perspectiva, o delito cumpriria outra função social: a de manter aberto o canal de transformações de que a sociedade precisa. 

No entanto, em que pese a afirmação de que o delito seria um estado de normalidade existente onde quer que haja uma sociedade, não se pode se conformar com essa tese a ponto de se tolerar lesões a bens jurídicos importantes e essenciais à convivência humana. Nessa perspectiva, surge o Direito Penal, como ramo do direito a se invocar em caso de insuficiência de outros ramos menos gravosos que ele na solução do conflito.

Bitencourt apresenta o Direito Penal como um conjunto de normas jurídicas que tem como objeto determinar infrações de natureza penal e suas respectivas sanções (penas ou medidas de segurança), bem como é possível compreendê-lo como um conjunto de valores e princípios que orientam a própria aplicação e interpretação das normas penais[45].

Estefam e Gonçalves, por sua vez, enxergam o Direito Penal como o ramo destinado a estudar os valores fundamentais à convivência e paz social, bem como os fatos que os violam e o conjunto de normas (princípios e regras) que objetivam assegurar a tutela desses valores, mediante a imposição de penas ou medidas de segurança[46].

Já o professor Sanches[47] analisa o Direito Penal por três perspectivas:

  1. Sob o aspecto formal (ou estático), é o conjunto de normas que etiqueta determinados comportamentos como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções;
  2. Sob os aspecto material, refere-se ao comportamento considerado altamente reprovável ou danoso à coletividade, afetando bens jurídicos indispensáveis à sua própria conservação e progresso;
  3. Sob o aspecto sociológico ou dinâmico, é mais um instrumento de controle social, visando, ao lado de outros ramos do direito, preservar a disciplina social, bem como a convivência harmônica em sociedade.

Dessa maneira, constata-se que o conceito de Direito Penal sofrerá algumas variações decorrentes da própria personalidade de cada autor, mas pode-se resumir como o conjunto de normas, encaradas como princípios e regras, destinadas a tutelar os bens jurídicos essenciais à convivência humana, mediante a aplicação de reprimenda (penas ou medidas de segurança) quando infringida a norma penal incriminadora.

Feitas essas considerações a respeito do conceito de Direito Penal, importante mencionar que ele é espécie, ao lado da Criminologia e da Política Criminal, do gênero Ciências Penais. Vale mencionar a diferença entre elas.

A Criminologia é uma ciência empírica (trabalha com métodos de observação) que estuda o crime, o criminoso, a vítima e o comportamento da sociedade, compreendida como uma ciência causal-explicativa, a qual não analisa as raízes do crime como ciência teleológica, mas trata do crime como fato, estudando suas razões de existência[48].

Já a Política Criminal tem por finalidade trabalhar estratégias e meios de controle social da criminalidade, tomando a posição de vanguarda em relação ao direito vigente, sugerindo reformas à legislação positivada[49].


8 PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL

Os princípios surgem como importantes instrumentos de controle do poder punitivo estatal, devendo ser encarados sob um duplo viés: de um lado, impõe-se ao Estado obedecer critérios para a aplicação do direito e, de outro, como consequência lógica, está a garantia do cidadão de que lhe serão assegurados os seus direitos fundamentais.

Nessa perspectiva, impõe-se a observação da força normativa dos princípios, haja vista que um sistema jurídico, no que tange às normas, compreende um conjunto de princípios (expressão dos valores fundamentais, incorporados por meio da Constituição, servindo como modelo almejado a se alinhar com o sentimento de justiça) e regras (correspondente à tarefa de apresentar certeza e segurança jurídica no cotidiano penal)[50].

A seguir, serão abordados alguns dos princípios que mais tenham importância e correlação com o objeto de estudo a que se propõe este trabalho.

8.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Dispõe o art. 5º, II, da Constituição Federal[51] que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Já no seu inciso XXXIX, prevê-se que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Exatamente assim é o que também anuncia o art. 1º do CP.

Um exame cuidadoso do inciso XXXIX, do art. 5º da CF permite concluir que o princípio da legalidade se desdobra em, basicamente, em três facetas: a) reserva legal, já que compete apenas à lei, em sentido estrito, elencar os comportamentos proibidos (daí se excluem outras fontes normativas, tais como medidas provisórias, resoluções etc.); b) anterioridade, visto que a lei penal deve preceder ao comportamento criminoso; c) taxatividade, vez que o tipo penal deve ser suficientemente claro para se evitar a sensação de insegurança jurídica na aplicação da lei.

Sob rubrica clássica de nullum crimen, nulla poena sine lege, tal princípio é fundamental para a existência de um Estado Democrático de Direito, tratando-se de real limitação ao poder estatal de interferir na esfera individual. Possui fundamentos: político, exigindo-se vinculação dos poderes Executivo e Judiciário às leis, impedindo o arbítrio punitivo; democrático, representando respeito à separação de poderes (haja vista competir ao legislativo a elaboração das leis); jurídico, já que a lei prévia e clara produz efeito intimidativo[52].

Para que o princípio da legalidade seja efetivamente cumprindo, necessário se faz estabelecer, claramente, quais são as condutas puníveis e as suas respectivas sanções, devendo o legislador evitar expressões vagas e imprecisas (essa faceta é conhecida como princípio da taxatividade).

No entanto, Bitencourt assevera admitir-se, pela própria essência da ciência jurídica, certo grau de indeterminação, visto que o legislador não pode abandonar completamente os conceitos valorativos, expostos como cláusulas gerais, não descrevendo efetivamente a conduta proibida. Porém, uma técnica legislativa adequada deve evitar os extremos, quais sejam, tanto a proibição total da utilização de conceitos normativos gerais como o exagerado uso dessas cláusulas gerais valorativas, que não descrevem com precisão as condutas proibidas[53].

8.2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

O princípio da dignidade da pessoa humana, o qual não é princípio exclusivamente de Direito Penal, dada a sua importância, foi elevado ao patamar de fundamento da República Federativa do Brasil, tal qual dispõe o art. 1º, III, da Constituição Federal.

Nas palavras de Alexandre de Moraes,

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos[54].

Nessa perspectiva, o princípio da dignidade da pessoa humana trabalha com uma dimensão antropocêntrica, considerando o ser humano como o fim último da atuação estatal e, dado o seu alto grau de abstração, não é fácil fixar seus reflexos no Direito Penal.

A doutrina tende a vislumbrar dois aspectos desse princípio no Direito Penal: a proibição de incriminação de condutas socialmente inofensivas (já que o Direito é que está a serviço da humanidade, e não o contrário) e a vedação ao tratamento degradante, cruel ou vexatório[55].

8.3 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA

Tendo em vista a necessidade de o Direito Penal se ocupar apenas com a tutela dos bens jurídicos mais importantes para a convivência em sociedade, só devendo ser invocado em caso de fracasso dos demais meios de controle menos danosos, nasce daí a ideia de intervenção mínima.

Nas palavras de Greco

O legislador, por meio de um critério político, que varia de acordo com o momento em que vive a sociedade, sempre que entender que os outros ramos do direito se revelem incapazes de proteger devidamente aqueles bens mais importantes para a sociedade, seleciona, escolhe as condutas, positivas ou negativas, que deverão merecer a atenção do Direito Penal[56].

Dessa maneira, percebe-se que o princípio da intervenção mínima possui duas facetas: o caráter subsidiário (só é chamado caso as demais esferas de controle se tornem insuficientes) e o caráter fragmentário (somente em caso de lesão ou perigo de lesão a bens juridicamente relevantes)[57].

A partir da faceta da subsidiariedade (ultima ratio), poderá ocorrer a descriminalização, haja vista a percepção de que bens jurídicos, outrora tutelados pelo Direito Penal como fundamentais para a convivência em sociedade, podem não mais merecer a tutela penal em razão da perda de sua importância.

Já o caráter fragmentário faz surgir o denominado princípio da insignificância, em que a conduta praticada pelo agente, no caso concreto, seja praticamente inofensiva, incapaz de atingir materialmente e de forma relevante o bem tutelado.

O princípio da insignificância deve ser analisado com base na estrutura analítica do crime, sob o aspecto da tipicidade.

A tipicidade, segundo orientação mais moderna, deve ser entendida como a junção entre a tipicidade formal e a tipicidade conglobante. A tipicidade formal é a subsunção da conduta praticada pelo agente à norma abstratamente prevista. Já a conglobante deve ser analisada sob duas vertentes: (a) se a conduta apresenta relevante lesão ou perigo de lesão a bem jurídico (tipicidade material) e (b) se a conduta é determinada ou fomentada pelo direito (antinormatividade)[58].

Dessa maneira, numa visão analítica do crime, teríamos o crime, segundo concepção majoritária, como um fato típico, ilícito e culpável. Quanto à faceta “fato típico”, teríamos a composição de: 1) conduta; 2) resultado; 3) nexo causal; 4) tipicidade. A tipicidade, por sua vez, seria composta por tipicidade formal e tipicidade material. Esta (tipicidade material) estaria afastada em caso de constatação de ausência de lesão ou perigo de lesão a bem jurídico, o que causaria atipicidade material e, por via reflexa, estaria excluída a tipicidade e, consequentemente, não haveria crime, restando por atípico o fato por atipicidade material.

Ainda sobre o aspecto da tipicidade material, imprescindível mencionar o princípio da insignificância. Seu reconhecimento não está previsto em lei, mas os Tribunais Superiores tendem a reconhecer a insignificância a partir de uma análise da conduta à luz do princípio da intervenção mínima, diante dos chamados vetores de aplicação da insignificância.

Nesse interim, vale mencionar a construção jurisprudencial a respeito dos vetores que norteiam o princípio da insignificância: 1) mínima ofensividade da conduta; 2) ausência de periculosidade social; 3) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e 4) inexpressividade da lesão jurídica causada[59].

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8.4 PRINCÍPIO DA OFENSIVIDADE OU LESIVIDADE

Segundo o princípio da ofensividade, não há crime sem lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado. Em verdade, é condicionar o reconhecimento do crime à existência do resultado jurídico.

A doutrina esclarece sobre a palavra “resultado”, que pode designar tanto a modificação no mundo exterior provocada pela conduta (é, portanto, perceptível, palpável) quanto pode significar a lesão ou perigo de lesão ao bem juridicamente tutelado (resultado imaterial, imperceptível sensorialmente, mas compreensível normativamente). Aquele é chamado de resultado material ou naturalístico, enquanto este pode ser denominado de resultado jurídico ou normativo (o resultado jurídico mais interessa ao exame do princípio da ofensividade)[60].

Atento à semelhança entre os princípios da ofensividade e da intervenção mínima, esclarece Greco que esses princípios

São como duas faces de uma mesma moeda. Se, de um lado, a intervenção mínima somente permite a interferência do Direito Penal quando estivermos diante de ataques a bens jurídicos importantes, o princípio da lesividade nos esclarecerá, limitando ainda mais o poder do legislador, quais são as condutas que poderão ser incriminadas pela lei penal. Na verdade, nos orientará no sentido de saber quais são as condutas que não poderão sofrer os rigores da lei penal[61].

Diante de tais premissas, parcela da doutrina entende haver inconstitucionalidade nos chamados crimes de perigo abstrato. Nesse sentido, o professor Bitencourt assevera que

Para que se tipifique algum crime, em sentido material, é indispensável que haja, pelo menos, um perigo concreto, real e efetivo de dano a um bem jurídico penalmente protegido. Somente se justifica a intervenção estatal em termos de repressão penal se houver efetivo e concreto arque a um interesse socialmente relevante, que represente, no mínimo, perigo concreto ao bem jurídico tutelado. Por essa razão, são inconstitucionais todos os chamados crimes de perigo abstrato [...][62].

Ousamos discordar do nobre autor. A finalidade do ordenamento jurídico é a proteção de bens indispensáveis à convivência humana, e não exclusivamente reprimir fatos que já tenham acontecido. Nessa perspectiva, punir condutas a título de crimes de perigo abstrato é uma forma de proteção do Estado de maneira a prevenir que o criminoso cometa crime mais grave, com vistas a uma valoração da periculosidade da conduta embrionária, a exemplo do que ocorre com o art. 306 do CTB: a simples condução de veículo automotor com a capacidade psicomotora alterada já é suficiente para a caracterização do crime – dessa maneira, estar-se-á prevenindo, mediante dissuasão normativa a título de crime de perigo abstrato, que o condutor embriagado venha a causar resultados mais danosos e, por vezes, irreversíveis, como um atropelamento que cause lesões corporais ou homicídio.

Além do mais, deve-se ter em mente que o Estado não pode oferecer proteção insuficiente (princípio da vedação à proibição deficiente), sob pena de inconstitucionalidade por omissão. Postergar a punição apenas para o momento do resultado mais danoso seria deixar de acautelar devidamente o bem jurídico.

Diga-se de passagem, é essa posição que prevalece diante dos Tribunais Superiores. Essa técnica legislativa, antes do argumento de desrespeito à Constituição, resguarda ela própria (a Carta Maior), haja vista que salvaguarda bens fundamentais, na medida em que coíbe ações potencialmente lesivas em seus estágios embrionários[63].

Cite-se o julgado do STJ que reconheceu a embriaguez ao volante (art. 306, Código de Trânsito Brasileiro) como crime de perigo abstrato e sua plena validade.

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DO PERIGO CONCRETO QUE TERIA DECORRIDO DA CONDUTA DO ACUSADO. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE DIREÇÃO ANORMAL OU PERIGOSA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO.

1. O crime de embriaguez ao volante é de perigo abstrato, dispensando-se a demonstração da efetiva potencialidade lesiva da conduta daquele que conduz veículo em via pública com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência Precedentes [...][64]

8.5 PRINCÍPIO DA EXTERIORIZAÇÃO OU MATERIALIZAÇÃO DO FATO

Tomando-se por base o axioma nullum crimen sine actio, o Estado só pode incriminar condutas humanas voluntárias, ou seja, fatos (e nunca condições internas). Daí, pode-se afirmar que o Brasil adota o denominado Direito Penal do fato, em detrimento do Direito Penal do autor (o qual pune a pessoa baseada nos seus estilos de vida, pensamentos etc.). Vale mencionar, porém, que o ordenamento pátrio adota o Direito Penal do autor para tomar em consideração circunstâncias relacionadas ao autor quando da análise da pena[65].

Essa premissa é encontrada no art. 2º do CP, o qual afirma que “ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime [...]”[66].

Dessa maneira, pouco importa, para o Direito Penal, sobre os desejos ou aspirações meramente internas da pessoa, desde que tais vontades estejam limitadas ao seu íntimo (não é ilícito desejar a morte de uma pessoa, por exemplo). No entanto, passa a ter relevância para o Direito a partir do momento em que essa pessoa resolve exteriorizar esses desejos (a exemplo da pessoa que, até então só desejava a morte de alguém, compra uma arma de fogo para realizar seu desejo).

8.6 PRINCÍPIO PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (OU NÃO CULPA)

O princípio da presunção de inocência (ou não culpa) possui assento no art. 5º, LVII da Constituição Federal, in verbis: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”[67].

O professor Sanches atenta para a distinção entre presunção de inocência e presunção de não culpa:

Na verdade, o princípio insculpido na referida norma garantia é o da presunção de não culpa (ou de não culpabilidade). Uma situação é a de presumir alguém inocente; outra, sensivelmente distinta, é a de impedir a incidência dos efeitos da condenação até o trânsito em julgado da sentença, que é justamente o que a Constituição brasileira garante a todos[68].

A doutrina elenca três significados para o princípio da presunção de inocência: a) tem a finalidade estabelecer garantias ao acusado em face do poder punitivo do Estado; b) visa proteger o acusado durante o processo penal, já que, presumindo-o inocente, não pode sofrer medidas restritivas no decorrer da instrução processual; c) trata-se de regra dirigida diretamente ao juízo, o qual analisará se a acusação provou os fatos imputados ao acusado, hipótese essa que, se não atendida, conduzirá à absolvição do acusado[69].

Assim como qualquer garantia ou princípio constitucional, o princípio da presunção de inocência não é absoluto, devendo ser sopesado no caso concreto, diante de eventual colisão com outros princípios constitucionais.

Não é por outra razão que a jurisprudência tem se firmado no sentido de reconhecer a licitude da execução provisória da pena em caso de condenação por tribunal (2ª instância), como já foi decidido pelo STF em sede de Recurso Extraordinário com Agravo (ARE 964246, Min. Teori Zavascki).

Também vale mencionar a recente decisão do Pretório Excelso reconhecendo legítima a execução imediata da sentença de condenação em sede de Tribunal do Júri, com vistas a garantir a soberania dos veredictos, bem como reconhecer que a condenação no júri abala fortemente a presunção de inocência (HC 118.770/SP, Min. Luiz Roberto Barroso).

8.7 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

De extrema importância no cenário jurídico, o princípio da proporcionalidade está implícito na Constituição Federal. Procura estabelecer uma proporção entre a pena a ser aplicada à gravidade da infração penal praticada pelo sujeito.

Segundo a doutrina, o princípio da proporcionalidade é um “desdobramento lógico do mandamento da individualização da pena. Para que a sanção penal cumpra a sua função, deve se ajustar à relevância do bem jurídico tutelado [...]”[70].

Para se atestar essa afirmação, uma análise superficial da Carta Política é suficiente para se vislumbrar traços do critério da proporcionalidade: se, de um lado, o Constituinte, ao tratar dos crimes hediondos (bem como os a eles equiparados), procurou puni-los com mais rigor, estabelecendo algumas restrições, tais como a inafiançabilidade e a proibição de concessão de graça ou anistia, de outro, previu as chamadas infrações de menor potencial ofensivo, permitindo a criação de juizados especiais, com funcionamento da persecutio criminis por rito sumaríssimo, bem como a transação penal.

Dessa maneira, Rogério Greco expõe que pode-se extrair duas vertentes do princípio da proporcionalidade, dirigidas tanto ao legislador quanto ao julgador, casuisticamente: a proibição do excesso e a proibição de proteção deficiente.

Para tanto, o autor expõe que a proibição ao excesso evita a punição desnecessária de comportamentos que não possuem a relevância exigida pelo Direito Penal. Nesse raciocínio, pertinente é a crítica à relação entre a lesão corporal culposa na direção de veículo automotor – art. 303, CTB, cuja pena é de 6 meses a 2 anos – (ex.: alguém que, descuidadamente, acaba atropelando, sem vontade, um pedestre) e a lesão corporal dolosamente leve – art. 129, CP, com pena de detenção de 3 meses a 1 ano – (ex.: o agente utiliza de um veículo, intencionalmente, para ferir seu desafeto). Ou seja, houve excesso na punição da lesão corporal culposa.

Quanto à proibição da proteção suficiente, o referido professor assevera que um direito fundamental não deve ser deficientemente protegido, seja mediante eliminação de figuras típicas, seja pela cominação de penas abaixo da relevância do bem[71].

Nesse ponto, importante trazer à baila os chamados mandamentos implícitos de criminalização, que são ligados primordialmente a valores de elevada magnitude no plexo de valores da CF, como a vida, saúde etc. Vale a transcrição de Estefam e Gonçalves:

Tome-se como exemplo o direito à vida, cuja tutela penal se dá, principalmente, por meio dos arts. 121 a 127 do CP (crimes dolosos contra a vida). Se o legislador, ad absurdum, revogasse o art. 121 do CP, descriminalizando o homicídio, incorreria em inegável inconstitucionalidade, por desrespeitar mandamento implícito de criminalização e, via de consequência, ofender o princípio da proporcionalidade, em sua perspectiva de proibição de proteção deficiente[72].

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Sobre o autor
Robert Menezes

Robert Menezes da Costa Santos, Policial Militar de Minas Gerais, Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce (FADIVALE) e pós-graduado em Direito Penal pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus. Aprovado em exame da OAB.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MENEZES, Robert. O estupro de vulnerável frente ao Estatuto da Pessoa com Deficiência. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5357, 2 mar. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/59422. Acesso em: 22 dez. 2024.

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