Desconsideração inversa da personalidade jurídica nas sociedades limitadas

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09/11/2017 às 20:56
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3 SOCIEDADE LIMITADA

3 1 Breves apontamentos históricos

Usando as singelas e breves palavras de Fábio Ulhoa Coelho (2008, p. 376), a história da sociedade limitada é “pequena e pobre”. Originária da Alemanha, as sociedades limitadas vieram para beneficiar uma parte da classe econômica que queria um lugar ao sol, por assim dizer. Relativamente estabelecida para as classes de empresas pequenas e médias,

No Brasil, são originárias de discussões parlamentares ocorridas por volta dos anos de 1919.

Rubens Requião (2007. p. 478) assim dispõe acerca de sua origem histórica:

O surgimento das sociedades por cotas de responsabilidade limitada está envolto em viva controvérsia. Uns consideram-nas de origem britânica e outros, alemã. Deve-se essa divergência ao uso que a legislação inglesa fez da expressão limited, secundada pela legislação francesa de 1863, que instituiu uma sociedade anônima impropriamente denominada de société à responsabilité limitée.

De qualquer forma, a criação da responsabilidade limitada é um fator que beneficia o empreendedorismo e incentiva o empreendedorismo.

3 2 Conceito

Devido às suas características, tomou gosto por ela grande parte dos brasileiros empresários ou não empresários. O que se pode perceber é que é o tipo de sociedade mais comum, devido a sua facilidade de criação e sua manutenção no mercado, tanto para pequenas, médias e grandes empresas. Soma-se ainda a responsabilidade limitada dos sócios pelas dívidas da sociedade.

Ela deve ser criada por duas ou mais pessoas, sejam físicas ou jurídicas, que respondem solidariamente pela integralização do capital social, nos termos do art. 1052 do Código Civil de 2002.

Fábio Ulhoa Coelho (2008, p. 368) faz uma relação referente à junção de pessoas para iniciar uma empresa: “Quando duas pessoas unem seus recursos e trabalho para desenvolverem juntas uma atividade econômica, possuem, sem qualquer dúvida, interesses convergentes, comuns”.

A responsabilidade dos sócios pelas dívidas sociais é limitada ao capital social subscrito e não pago.

José Maria Rocha Filho (2004, p. 269), diz que:

Sociedade limitada é “sociedade em que duas ou mais pessoas, físicas e/ou jurídicas, associam-se para fins empresariais, responsabilizando-se, todas pela total integralização do capital social, muito embora a responsabilidade de cada sócio seja restrita ao valor de suas quotas”.

3 3 Legislação aplicável

A legislação aplicável a uma sociedade limitada, assim como às demais sociedades, vem para que seja eficaz e essencial para o seu funcionamento, inclusive, a sua criação. Na legislação há que haver regras, permissões, proibições, etc., sejam de normas taxativas ou exemplificativas, a disciplinar o ente societário.

Quanto às limitadas, o primeiro manual de normas que viria a regulamentar as sociedades chamadas então de quotas de responsabilidade limitada foi o Decreto 3.708/1919, originariamente com apenas 18 artigos ativos.

A respeito, Rubens Requião (2008, p. 482) nos alertava para os artigos falhos dessa norma, omitindo também alguns pontos que seriam bastante relevantes para a sociedade empresarial, ensejou alterações.

Fran Martins (2008, p. 317) também elucida:

O Decreto nº 3.708, de 1919, foi muito recriminado pelas falhas e omissões que seu laconismo enseja. (...) Há apenas um conglomerado de dispositivos, muitos deles sem nenhum sentido lógico, dentro do nosso ordenamento jurídico. E, acima de tudo, há uma falta absurda de detalhes que torna cansativo qualquer trabalho no sentido de conceituar esse tipo social, tendo por base as características do instituto.

Devido às falhas e lacunas nesse decreto, muitas questões eram solucionadas pelos próprios sócios empresários, mediante contrato social. Isso não resultou em grandes prejuízos, já que na verdade os sócios ficaram bem a vontade para escolher a sua própria regulamentação. Claro que dentro dos limites que as regras gerais e superiores estabeleciam para a matéria societária.

Diante disso, Rubens Requião (2008, p. 483) relata:

Surgiu, então, dessas deficiências instrumentais, a apaixonante questão de se saber se a lei de sociedades anônimas constitui fonte subsidiária das sociedades limitadas. A controvérsia se desenvolveu em torno da interpretação do artigo 18 do Decreto nº 3708 de 1919, que reza: “Serão observadas quanto às sociedades por quotas de responsabilidade limitada, no que não for regulamentada no estatuto social, e na parte aplicável, a disposição das sociedades anônimas”.

Finalmente, o Código Civil de 2002 elucidou o problema da lei aplicável à sociedade limitada. Fábio Ulhoa Coelho (2008, p. 377) enfatiza que a “questão da legislação aplicável às sociedades limitadas perde a complexidade doutrinária.”

As sociedades limitadas passaram a ter tratamento legal claramente estabelecido no Código Civil de 2002, dos artigos 1052 a 1087, dispondo em um capítulo inteiro e próprio para a respectiva espécie societária.

Na omissão desses artigos, aplicar-se-á, subsidiariamente, as normas que regem as sociedades simples nesse Código. No entanto, pode-se aplicar também supletivamente a Lei das sociedade anônima (Lei 6.404/76), desde que haja permissão expressa no Contrato Social a respeito. É o que estabelece o art. 1053 do Código Civil de 2002.

3 4 Deliberação dos sócios

Deliberar é uma terminologia utilizada para expressar decisão tomada depois de uma reunião. No caso, é um ato que respalda a administração societária cabível aos gerentes que foram nomeados, seja em contrato, seja por votação dos sócios cotistas que definam dentro das ramificações organizacionais sobre determinado assunto tratado em pauta na reunião.

A deliberação dos sócios acerca de assuntos relevantes da sociedade é disciplinado em lei. A participação social dos sócios, em momentos mais impactantes e marcantes para a empresa, é democrático, de forma com que a estrutura da sociedade limitada se pareça com a sociedade anônima.

Nos termos do art. 1.072 do Código Civil, há duas formas de deliberação dos sócios. É a reunião ou assembleia.

Art. 1.072. As deliberações dos sócios, obedecido o disposto no art. 1.010, serão tomadas em reunião ou em assembleia, conforme previsto no contrato social, devendo ser convocadas pelos administradores nos casos previstos em lei ou no contrato.

§ 1º A deliberação em assembleia será obrigatória se o numero dos sócios for superior a dez.

§ 2º Dispensam-se as formalidades de convocação previstas no § 3º do art. 1.152, quando todos os sócios comparecerem ou se declararem, por escrito, cientes do local, data, hora e ordem do dia.

§ 3º A reunião ou assembleia tornam-se dispensáveis quando todos os sócios decidirem, por escrito, sobre a matéria que seria objeto delas.

§ 4º No caso do inciso VIII do artigo antecedente, os administradores, se houver urgência e com autorização de titulares de mais da metade do capital social, podem requerer concordata preventiva.

§ 5º As deliberações tomadas de conformidade com a lei e o contrato vinculam todos os sócios, que ausentes ou dissidentes.

§ 6º Aplica-se às reuniões dos sócios, nos casos omissos no contrato, o disposto na presente Seção sobre a assembleia.

Nas palavras de Sebastião José Roque (1997. p. 101), pode-se fazer uma distinção sobre assembleia e reunião:

A assembleia é uma reunião, mas reunião com características especiais. Em primeiro lugar, numa assembleia, as pessoas que dela participam devem ser da mesma categoria, com identidade de funções, interesses, de propósitos. [...] A reunião pode ser de pessoas heterogêneas, como credores e devedores. [...] Assim, uma assembleia deve ser convocada por edital de convocação assinado pelo presidente, contendo ordem do dia, publicada com certo prazo antes de sua realização e outras formalidades. A reunião é mais libre, mais informal; pode ser convocada por telefone, por exemplo.

3 5 Administração

Para que as pessoas jurídicas, ao serem criadas, no caso que estamos tratando das sociedades limitadas, é preciso que se tenha um determinado departamento para que a administre e tome decisões baseadas nas deliberações dos sócios.

Isso não é diferente com os demais tipos de sociedade. Esse departamento, muitas vezes, é tratado como sendo o departamento administrativo. Muitas vezes, é o sócio que toma a função de administrador, podendo ser uma ou mais pessoas, que esteja nomeada no contrato social da empresa, ou em até mesmo em ato separado, tal qual estabelece o art. 1.060 do Código Civil: “A sociedade limitada é administrada por uma ou mais pessoas designadas no contrato social ou em ato separado”.

O administrador pode ser ou não sócio.

A administração pode ser delegada até mesmo a um terceiro, (desde que por decisão unânime dos votos dos sócios cotistas) para que delegue o cargo administrativo. Pode a administração ser por tempo determinado ou não.

O art. 1.063 do Código Civil trata da saída do administrador: “o exercício do cargo de administrador cessa pela destituição, em qualquer tempo, do titular, ou pelo termino do prazo se, fixado no contrato ou em ato separado, não houver recondução”.

Isso pode ocorrer devido a diversos motivos, tais como vontade própria, por renúncia, ou até mesmo devido a uma deliberação dos sócios feito em conjunto, que por sua vez, pode ter cometido a má gestão, ou alguma outra disfunção do cargo ocupado. Uma vez ocorrido isso, a renúncia ou afastamento deverá então ser registrado na Junta Comercial, informando o caso. Após esse registro, seus efeitos e decisões como administrador, não terá mais validade.

3 6 Conselho Fiscal

Como o próprio nome diz, tem a intenção de verificar se está tudo correndo na mais perfeita ordem, seja na parte administrativa, seja, ela na parte laboral, até mesmo na estrutura da sociedade por meios de documentação, registros e livros contábeis.

Esse órgão é criado como um fiscal da administração empresarial. Deste modo, para Ricardo Negrão (2010, p. 405), dentre as “novidades previstas pelo novo Código Civil está a possibilidade de adoção de um conselho fiscal, composto com um mínimo de três membros, sócios ou não sócios, eleitos em assembleia ordinária.” Que tanto pode ser fiscalizado pelos sócios ou por próprio conselho. É um órgão independente, que não é subordinado diretamente aos sócios e nem mesmo à administração. Sua composição pode estar prevista no contrato social, sendo eles sócios ou não, residentes ou domiciliados no país da sociedade em questão.

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Ricardo Negrão (2010, p. 405) também ressalta as condições de quem pode ser um conselheiro fiscal: “qualquer pessoa capaz, idônea, no gozo da administração de seus bens, pode exercer as funções no conselho fiscal, não exigindo a lei nenhuma formação acadêmica especial”. Entretanto, por se tratar de um cargo sério e conceituado em uma empresa, há de se prezar pela boa conduta e experiência como pelo menos administrador.

O Código Civil traz uma seção toda especifica sobre o conselho fiscal, fazendo menção sobre sua criação, quadro de pessoas presentes no conselho, suas funções na empresa, remuneração, além de suas competências para dentro de uma sociedade.

3 7 Responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais

A responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais é limitada, mas todos os sócios respondem solidariamente pela integralização do capital social.

Sua responsabilidade é limitada ao valor do capital social, de acordo com o  art. 1.052 do Código Civil: “na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restritiva ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.”

Porém, se a sociedade é irregular ou de fato (em comum), a responsabilidade cabível é a ilimitada. Se, porventura, a sociedade não estiver dentro da conformidade legal será tratada como irregular, fazendo com que seja os sócios responsáveis. Posto isso, o art. 990 do Código Civil dispõe que: “todos os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais, excluído do benefício de ordem, previsto no art. 1.024, aquele que contratou pela sociedade.”

Ricardo Negrão (2010, p. 408) trata dos casos de isenção de responsabilidade pessoal dos sócios ou administradores:

Os sócios se vinculam às deliberações sociais em geral, quando em conformidade com a lei ou com o contrato social, mas às que vierem a infringi-los somente respondem os que as aprovarem, isentando os que se tornaram vencidos. A aprovação dos resultados – balanço patrimonial e de resultado econômico – aceitos sem reservas pelos sócios, salvo hipóteses de erro, dolo ou simulação, desoneram de responsabilidade os administradores, bem como os membros do conselho fiscal, se existente este órgão.

3 8 Responsabilidade Ilimitada

Conforme vimos anteriormente, os sócios respondem limitadamente, porem, possuem solidariedade pela integralização do capital social. Essa é a regra.

Porém, na ocorrência de atos fraudulentos por parte dos sócios, má conduta, abuso de autoridade, enfim, mau uso da personalidade jurídica, a regra da limitação da responsabilidade dos sócios pode cair por terra.

Também acarretam a responsabilidade ilimitada os atos que violem a lei ou contato social, conforme dispõe o art. 1.080 do Código Civil que reza que “as deliberações infringentes do contrato os da lei tornam ilimitada a responsabilidade dos que expressamente as aprovaram.”

Sérgio Campinho (2010, p. 203) avança em sua doutrina:

Assim não procedendo (dentro da legalidade), passarão a responder pessoal e ilimitadamente pelas dívidas sociais, decorrentes do ato ilícito para cuja prática concorreram, ou resultantes do abuso da personalidade jurídica da sociedade, o que, neste último caso, autorizaria a sua desconsideração.

Quanto às dívidas fiscais da sociedade, tem-se perquirido pela responsabilidade pessoal dos sócios. Rubens Requião (2008, p. 519), amparado pelo entendimento do Supremo Tribunal Federal, elucida:

após algumas vacilações, deixou claro que a responsabilidade do sócio somente se torna ilimitada quando resultar de ato infrator da lei ou do contrato. A sociedade que deixa de pagar tributos por irresponsabilidade econômico-financeira, pelo fato de sua insolvência, não acarreta a responsabilidade ilimitada dos sócios, de vez que não houve a ocorrência de fraude, violação da lei ou do contrato.

Marlon Tomazette (2014, p.385) dispõe sobre a responsabilidade ilimitada:

Apenas excepcionalmente se afasta essa limitação de responsabilidade, como nos casos de desconsideração da personalidade, distribuição fictícia de lucros com prejuízo do capital social (CC – art. 1.059), deliberação infringente do contrato social ou da lei (CC – art. 1.080), superavaliação de bens para formação do capital social (CC – art. 1.055, § 1º), limitada neste último caso a responsabilidade ao prazo de 5 anos.

Além disso, a jurisprudência tem entendido que a responsabilidade dos sócios pelas dívidas trabalhistas da sociedade também é ilimitada. Vista a sociedade limitada e a forma como os sócios respondem pelas obrigações sociais, trataremos a seguir a desconsiderçaão da personalidade jurídica.

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Sobre o autor
Tarley Sousa de Lima

Assistente Jurídico - Simiema e Lima Advogados. Bacharel em Direito pela Faculdade Católica de Uberlândia.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Direito da Faculdade Católica de Uberlândia, como requisito parcial para obtenção de título de Bacharel em Direito. Orientadora: Profa. Ma. Vilma aparecida Moreira Bartasson.

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