O direito da mudança de nome do transexual

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17/08/2018 às 14:47
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Investiga-se a mudança de nome nos casos que envolvem transexuais, já que o direito ao nome é um aspecto pessoal essencial ao indivíduo.

Este artigo investiga sobre o direito de mudança do nome do transexual. Apresenta o nome e o registro civil como o “âmago da personalidade individual”, condizendo com o estado pessoal e social do indivíduo, o que leva o nome do indivíduo a ser um tema importante no mundo jurídico. Trata-se de aspecto essencial da pessoa, portanto, encontra-se inserido no contexto dos direitos de personalidade. A partir de uma pesquisa bibliográfica em doutrina do Direito Civil, além de artigos encontrados na rede online e exemplos jurisprudenciais sobre o tema transexualidade, as principais conclusões do estudo são: nos casos concretos apresentados torna-se claro que garantir o acesso às condições de saúde, a possibilidade de alteração do registro civil com a adoção do nome e sexo e a garantia de outros direitos é sem dúvida um caminho jurídico para que a lei não se silencie ocasionando sofrimento desnecessário e/ou sustentando constrangimentos e discriminações nos transexuais.

Palavras-chaves: Direito Civil. Mudança do Nome. Registro Civil. Transexual.

ABSTRACT:This article investigates the right to change the name of the transsexual. It presents the name and the civil registry as the "core of the individual personality," attuned to the individual's personal and social state, which makes the individual's name an important subject in the legal world. It is an essential aspect of the person; therefore, it is inserted in the context of the rights of personality. Based on a bibliographical research in Civil Law doctrine, in addition to articles found in the online network and jurisprudential examples on the topic trans sexuality, the main conclusions of the study are: in the concrete cases presented it becomes clear that guaranteeing access to health conditions , The possibility of changing the civil registry with the adoption of name and sex and the guarantee of other rights is undoubtedly a legal way for the law not to be silenced causing unnecessary suffering and / or undergoing constraints and discriminations in transsexuals. It is believed that the general repercussion of transsexual rights in the courts demonstrates the urgency of a specific law because it deserves to be treated as a matter of social importance, since it involves recognizing the individuals who are part of that choice as human beings the right to a Life.

Keywords: Civil Law. Change of Name. Civil Registry. Transexual.


INTRODUÇÃO:

O ser humano é único, tem características diferenciadas, é dono de uma identidade que o individualiza e, portanto, merecedor de respeito à sua dignidade. A relevância do princípio da dignidade e da justiça para se entender as questões da liberdade de escolha em todas as ações, propósitos e experiências do indivíduo numa sociedade são imprescindíveis. O princípio da justiça, que se refere ao tratamento igualitário, acrescido ao conceito de equidade que nada mais é que dar a cada um o que lhe é devido de acordo com suas necessidades, considera que as pessoas são diferentes e que possuem diferentes necessidades.

A dignidade humana constitucionalmente consagrada no art. 1º, inc. III garante a todos o direito à felicidade. Ter “dignidade” é ter valor simplesmente por ser pessoa e, portanto, composta por elementos biológicos, psicológicos, moral e espiritual. A pessoa é uma totalidade, é a junção dessas dimensões que a constituem.

Todas as ações diante do ser humano devem ser conduzidas pelo respeito à dignidade e pelo princípio da autonomia que faz com que possa decidir sobre a própria vida.

A valorização da pessoa humana e a sua proteção acima de qualquer outro valor visa proteger o ser humano do próprio ser humano. Acrescente-se a isso que o princípio da igualdade veda discriminações arbitrárias e irracionais e o princípio da dignidade da pessoa humana estabelece que todos os seres humanos são merecedores da mesma dignidade pelo simples fato de serem pessoas humanas, independentemente de quaisquer características. A Constituição Federal de 1988 reconheceu os direitos da personalidade de forma expressa, conforme consta no artigo 5º, inciso X que assim dispõe: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

O foco deste estudo é o direito da mudança de nome do transexual.

Como direito da personalidade, o nome ou prenome são inerentes a toda pessoa humana, sendo o elemento essencial para a individualização da pessoa natural nas relações sociais, e todo brasileiro tem direito ao registro civil, conforme garantido pela Lei nº. 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente pode alterá-lo no prazo decadencial de um ano, entre os 18 e 19 anos e/ou posteriormente, ainda haverá a possibilidade de alteração, desde que muito bem fundamentada a justificativa da mudança (DUARTE, 2016).

No caso do transexual que não apresenta qualquer tipo de má formação, mas a incompatibilidade da parte física com a parte psicológica, fazendo com que um indivíduo se entenda como pertencente a gênero distinto da sua constituição orgânica. Portanto, o sexo humano não pode ser definido apenas na observação da genitália e sim, a pessoa como um ser social. Se o gênero escolhido não é doença e não necessita ser curado, a mudança tende a obter a adequação de uma situação de fato apoiada pelo mundo jurídico.

A não conformação da identidade com o sexo anatômico gera uma série de categorizações, que consideram essa diferença um desvio. Por essa razão, há normas médica e jurídica que “consolidam a naturalização de um sistema de sexo/gênero do tipo binário (mulher/feminino e homem/masculino), que não reconhece a existência de outros status sexuais” (VENTURA, 2010, p. 23).

Assim, a pergunta do estudo foi: Quais as possibilidades jurídicas sobre o direito de mudança do nome do transexual?

Dessa forma, o reconhecimento do direito à alteração da identidade civil ou legal do transexual está ligado à alteração do corpo através da cirurgia de redesignação sexual ou de transgenitalização. Nesse contexto “transexual de verdade” deve ter uma genitália compatível com o gênero que se expressa e deve desejar relacionar-se apenas com o gênero oposto. Qualquer desconformidade com essas normas de gênero, como o desejo de viver como mulher, mas com uma genitália masculina, ou relacionar-se sexualmente com uma mulher sendo transexual, não autoriza a pessoa transexual a realizar as transformações corporais e a alterar a identidade desejada. (VENTURA, 2010, p. 25).

Tanto profissionais da saúde quanto os do direito veem discutindo a transexualidade, o que, dessa forma, torna o tema relevante para a academia, visto que quanto mais estudos forem realizados, mais informações de forma qualitativa são acrescidas para o esclarecimento sobre investigar sobre o direito de mudança do nome no transexual, objetivo deste estudo.

Em termos metodológicos, para o alcance do objetivo, recorreu-se a uma pesquisa bibliográfica em doutrina do Direito Civil, além de artigos encontrados na rede online sobre o tema transexualidade, tendo este artigo, além desta introdução a apresentação do desenvolvimento com vistas à compreensão da condição do direito de igualdade do transexual como conceito e na esfera jurídica quanto ao novo nome.


1 DESENVOLVIMENTO

Primeira seção: Revisão da Literatura - Problema Investigado

O nome e o registro civil refletem o “âmago da personalidade individual”, condizendo com o estado pessoal e social do indivíduo (VIEIRA, 2008, p. 48). O nome do ser humano penetra no mundo jurídico. Trata-se de aspecto essencial da pessoa, portanto, encontra-se inserido no contexto dos direitos de personalidade.

Nesse sentido, ainda inclui o psiquismo, a honra, a imagem pessoal e social e não pode ser “ridículo ou vexatório” conforme Vieira (2008, p. 48).

O registro civil, de acordo com Lucarelli (1991, p. 220) “serve para fixar os principais fatos da vida humana”, sendo o nome o identificador essencial da pessoa, fato previsto no art. 16 do Código Civil (toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome).

A mudança do nome no Código Civil é proibida, não ser que seja provando um erro ou falsidade do registro (art. 1.604). Na busca da alteração, o art. 6º da Constituição Federal de 1988 assegura o direito à saúde como direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, que aliado ao conceito de saúde dado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como o completo estado de bem-estar físico, psíquico e social, a falta de identidade do transexual poderá provocar desajuste psicológico, sem bem-estar físico, psíquico ou social (OMS, 2017). Diante disso, o direito à adequação do registro é uma garantia à saúde tão somente relacionada aos direitos humanos intimamente ligados aos direitos de personalidade.

Venosa (2002, p. 167) assevera que o registro civil da pessoa natural:

[...] apresenta a utilidade para o próprio interessado em ter como provar sua existência, seu estado civil, bem como um interesse do Estado em saber quantos somos e qual a situação jurídica em que vivemos. O registro civil também interessa a terceiros que veem ali o estado de solteiro, casado, separado, etc. De quem contrata, para acautelar possíveis direitos. No Registro Civil encontram-se marcados os fatos mais importantes da vida do indivíduo: nascimento, casamento e suas alterações e morte (VENOSA, 2002, p. 167).

Assim se o nome identifica a pessoa, esse não pode expô-la ao ridículo, e no caso dos transexuais, que por meio de hormônios e intervenções cirúrgicas, para adaptar o sexo anatômico à identidade psicossocial, a documentação que o declara como pertencente ao sexo corporal em que foi registrado deveria mudar.

Outra opção para a adequação do transexual no que se trata de seu registro civil é a corrente doutrinária de Rosa Maria Nery apud Diniz (2002):

Os documentos têm de ser fiéis aos fatos da vida, logo, fazer a ressalva é uma ofensa à dignidade humana. Realmente, diante do direito à identidade sexual, como ficaria a pessoa se se colocasse no lugar de sexo “transexual”? (DINIZ, 2002, p. 98).

Dessa forma, a sugestão seria fazer uma averbação sigilosa no registro de nascimento para que o interessado, no momento do casamento, pudesse pedir, na justiça, uma certidão “de inteiro teor”, onde consta o sigilo.

Tal averbação sigilosa junto ao Cartório de Registros Públicos, constando o sexo biológico do que sofreu a operação de conversão de sexo, com o intuito de impedir que se enganem terceiros seria satisfatório, já que tal procedimento resguardaria o direito de privacidade e intimidade do transexual (RODRIGUES, 2003).

Para resolver a questão do gênero masculino ou feminino, a Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou ação direta de inconstitucionalidade (ADI n. 4275) 1 com o propósito de viabilizar o não reconhecimento do direito de transexuais à troca do prenome e da definição de sexo no registro civil estar relacionado aos temas da dignidade da pessoa humana, da vedação à discriminação, da igualdade, da liberdade e da privacidade.

Não existe na Lei de Registros Públicos artigo que autorize a mudança de nome e sexo em face de ter sido realizada a cirurgia de transgenitalização, o que, existe é apenas o que está descrito nos artigos 55, 56 e o 58 citados na Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973.

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Art. 55. Quando o declarante não indicar o nome completo, o oficial lançará adiante do prenome escolhido o nome do pai, e na falta, o da mãe, se forem conhecidos e não o impedir a condição de ilegitimidade, salvo reconhecimento no ato. (Renumerado do art. 56, pela Lei nº 6.216, de 1975).

Parágrafo único. Os oficiais do registro civil não registrarão prenomes suscetíveis de expor ao ridículo os seus portadores. Quando os pais não se conformarem com a recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso, independente da cobrança de quaisquer emolumentos, à decisão do Juiz competente.

Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa. (Renumerado do art. 57, pela Lei nº 6.216, de 1975). Ante determinação posterior, que levará em consideração a cessação da coação ou ameaça que deu causa à alteração. (Incluído pela Lei nº 9.807, de 1999) (BRASIL, 1973).

Há dois tipos de situações nas demandas judiciais sobre o tema no Brasil.: 1. A de pessoas que já se submeteram ao tratamento hormonal e cirúrgico para a “mudança de sexo” (os transexuais operados); 2. Pessoas que realizaram transformações parciais, mas não desejam realizar ou ainda não tiveram a oportunidade de fazer a cirurgia de genitália (transgenitalização) (CARVALHO, 2016).

Cardoso, Hogemann; Carvalho (2010) apresentam um exemplo de decisão judicial sobre a alteração de identidade civil.

A única decisão judicial identificada na pesquisa promovida ao longo da feitura do presente ensaio, que admitiu, em caráter excepcional, a alteração de identidade civil sem que a genitália estivesse adequada ao “novo sexo” requerido foi exarada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. O caso envolvia um pedido de pessoa nascida no sexo feminino e que vivenciava a identidade de gênero masculino. O argumento central do julgado é que se pode admitir a alteração do sexo legal antes da cirurgia de transgenitalização quando esta implicar risco para a integridade física do requerente (risco de agravamento do estado de saúde física). A decisão levou em conta, ainda, as dificuldades que envolvem as técnicas atualmente utilizadas para a construção de um pênis e a natureza irreversível das transformações já ocorridas na aparência geral e no comportamento sexual do requerente (CARDOSO, HOGEMANN; CARVALHO, 2010, p. 2).

Outro exemplo é o da Apelação Cível 1.0024.13.3955617/ 001 395561703.2013.8.13.0024 do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG):

EMENTA: APELAÇÃO TRANSEXUAL ALTERAÇÃO DE SEXO NO REGISTRO CIVIL DE NASCIMENTO CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO NÃO REALIZADA PREVALÊNCIA DA CONDIÇÃO REGISTRAL NATURAL ATÉ QUE HAJA MODIFICAÇÃO SEXUAL.

A só condição de transexual individual, conquanto imponha o respeito de todos pelo gênero de opção explicitado, permitindo inclusive a modificação do nome, e o dever de tratamento respeitoso da sociedade pela própria opção, não autoriza a modificação da condição registral do gênero sexual contida nos assentos de nascimento, que só é admissível àqueles que se submeterem ao procedimento de redesignação sexual, porque a excepcionalidade afasta o interesse público no conhecimento da condição de gênero sexual originalmente designado. Não provido.

Fica claro, portanto, que o indivíduo diagnosticado como transexual não tem auxílio jurídico específico que indique a forma e o procedimento para resolver tal solução, apenas agir conforme descrito no caput do art. 109, da Lei 6.015/73:

Art. 109. Quem pretender que se restaure, supra ou retifique assentamento no Registro Civil, requererá, em petição fundamentada e instruída com documentos ou com indicação de testemunhas, que o Juiz o ordene, ouvido o órgão do Ministério Público e os interessados, no prazo de cinco dias, que correrá em cartório BRASIL, 1973).

Existe projeto de lei no Congresso Nacional que aprova a alteração dos documentos dos transexuais. Chamado como Lei João W. Nery – Lei de Identidade de Gênero foi apresentada em 20/02/2013, aguarda a apreciação do Plenário.

Segunda seção: Discussão e análise dos resultados do problema investigado.

Diferentes teorias que buscam traduzir a natureza jurídica do nome constituíram a base de controvérsias sobre o tema no meio jurídico, conforme apresenta Araújo (2013).

a) Teoria do Nome como Propriedade – o nome seria uma forma de propriedade. Tendo como titular a família ou o seu portador. Esse entendimento não é acolhido por Monteiro (2005, p. 107) e Carlos Roberto Gonçalves (2007, p. 122-123) que tem o argumento de que a propriedade comum é alienável, prescritível, patrimonial e exclusiva, diferente do nome, portanto, não aceita em alguns doutrinadores (ARAUJO, 2013, p. 1).

b) Teoria do Nome como Propriedade sui generis – seria o nome uma propriedade “sui generis” por apresentar características diferentes da propriedade. Seria uma instituição de polícia civil necessária à identificação dos indivíduos, criticada pelo professor Gonçalves (2007, p. 123 apud Araújo,) por não acrescentar nenhuma explicação relevante (ARAUJO, 2013, p. 1).

c) Teoria do Estado – O nome não passaria de “um simples sinal distintivo e exterior do estado da pessoa e não um direito, onde toda questão relativa a ele é uma questão de estado e é protegido pelo ordenamento jurídico”, pensamento não adotado pelo sistema brasileiro, visto que “nome é sim um direito e não apenas uma questão de estado da pessoa”. O menor impúbere tem o direito de exigir o sobrenome daquele que é seu pai. Tal teoria é criticada por Orlando Gomes (apud GONÇALVES, 2007, p. 123) por ser artificial (ARAUJO, 2013, p. 1).

d) Teoria Negativista – O nome não apresenta características de um direito, por isso não merece proteção jurídica, teoria defendida por Savigny, Ihering e Clovis Beviláquia, o que é contestado em outros doutrinadores (Gonçalves (2007, p. 123), Orlando Gomes), já que o nome serve para designar a personalidade e é capaz de diferenciar as pessoas (direito “sui generis” e da personalidade) (ARAUJO, 2013, p. 1).

e) Teoria do Nome como sinal distintivo revelador da personalidade – o nome é o sinal distintivo e revelador, que serve para identificar o sujeito de direito, teoria filiada ao doutrinador Monteiro (2005, p. 107). (ARAUJO, 2013, p. 1).

f) Teoria do Nome como Direito da Personalidade – é a mais aceita na doutrina e presente no CC/2002.

Como elementos integrantes do nome a doutrina sugere nomenclaturas diversas, sistematizadas por Araújo (2013) da seguinte forma:

Prenome

É a designação do indivíduo que vem em primeiro lugar, antes do nome de família ou sobrenome. Em regra, é inalterável, porém existem exceções permitidas por lei que serão apresentadas mais adiante. É popularmente conhecido como nome de batismo, primeiro nome ou nome próprio ou simplesmente nome. A maior parte da doutrina classifica-o em:

a) prenome simples – quando formado por apenas um vocábulo. ]

b) prenome composto – quando formado por dois.

Os prenomes são determinados pelos pais ou pelos legitimados do rol do art. 52, da Lei de Registros Públicos. A ordem ali é sucessiva. A escolha do prenome é livre pelos pais, porém não é ilimitada e arbitrária, assim caso exponha o filho ao ridículo, de acordo com o parágrafo único do artigo 55, da Lei dos Registros Públicos, serão rejeitados pelo Oficial do Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais.

No caso de irmãos gêmeos, caso os pais queiram dar o mesmo prenome, é obrigatório o uso de prenome composto, com sobrenomes diversos ou de outro modo, pois é obrigatório o nome completo diverso, segundo o art. 63, parágrafo único da Lei de Registros Públicos.

Nome de família ou sobrenome ou patronímico

O segundo elemento fundamental é popularmente chamado de sobrenome. É conhecido também como apelido de família ou nome de família, patronímico, cognome. Posiciona-se após o prenome. O apelido de família adquire-se por ato jurídico (como a filiação, a adoção ou pelo casamento), por designação administrativa (Lei de Registros Públicos, art. 61), por ato do interessado (mediante requerimento ao magistrado) ou pelo uso (entendimento jurisprudencial).

Pode provir de sobrenome paterno, materno ou da fusão de ambos. A maioria dos doutrinadores também classifica o sobrenome em:

a) sobrenome simples – formado por um vocábulo. b) sobrenome composto - formado por dois ou mais vocábulos.

Fonte: Elaborado a partir de Almeida (2013).

O nome, dessa forma, sempre figurou como instituto de grande importância, conforme Maia (2017) desde a antiguidade, mas a autora afirma que “não é razoável a primazia do interesse social em detrimento da individualização pessoal no que tange ao nome”, visto que tal primazia se dá para “perpetuar o princípio da imutabilidade do prenome”, também visto em Gavião, 2009, Almeida (2012).

Para Gavião (2009)

A imutabilidade do nome civil é um princípio de ordem pública, em razão de que sua definitividade é de interesse de toda a sociedade, constituindo garantia segura e eficaz das relações de direitos e obrigações correlatas.

Procura-se evitar que a pessoa natural a todo instante mude de nome, seja por mero capricho, ou até mesmo má-fé, visando ocultar sua identidade, o que poderá se traduzir em prejuízo a terceiros (GAVIÃO, 2009, p. 1).

Se não há a possibilidade das pessoas alterarem o seu próprio nome como gostariam, já que a lei se tornou rígida na inalterabilidade desse, mesmo assim, julgamentos taxativos e retrógrados podem ser evitados, observando-se a dignidade da pessoa humana (GALVÃO, 2009).

Importante ainda observar que o princípio em comento não é absoluto, pois as situações especiais, conforme previsões expressas na Lei de Registros Públicos abre-se a possibilidade de uma proteção especial apenas ao nome de família, visto que o sobrenome caracteriza a pessoa como parte de um grupo familiar dentro do meio social em que vive, sendo que pelo grande significado na designação das famílias é considerado a parte mais importante do nome.

De acordo com Gomes (2017, p. 1), “o predomínio de uma concepção estritamente patrimonialista, em detrimento da efetiva proteção do ser humano era mais comum no direito civil”. Isso significa que com o passar do tempo a revalorização do ser humano reconhece e garante uma proteção de sua personalidade. Em suas palavras:

Não pode haver tema de maior relevância para o direito civil, pois, se a pessoa humana é sujeito de todas as relações jurídicas, imprescindível o seu entendimento. E não só a personalidade cresce em importância, como, cada vez mais, estão em evidência os direitos da personalidade. Se esses inicialmente eram protegidos de forma tímida, atualmente têm sua tutela codificada, e garantida constitucionalmente (GOMES, 2017, p. 1).

A personalidade, conceituada como um conjunto de características e atributos da pessoa humana é considerada como objeto de proteção por parte do ordenamento jurídico e dá a ideia clara que ela pode ser protegida com seu valor, e portanto, um direito diante dos “atributos inerentes e indispensáveis ao ser humano que irradiam da personalidade” (GOMES, 2017, p. 1).

Estabelecida a dignidade da pessoa como princípio fundamental, de toda a ordem jurídica, o reconhecimento da personalidade jurídica de todos os seres humanos, como tal protegidos pelo Estado, inclusive com a previsão de instrumentos jurídicos destinados a sua defesa, a Constituição Federal de 1988 reforça a proteção da intimidade e declara invioláveis a vida privada, a honra e a imagem, assegurando a reparação do dano moral (artigo 5º, X/CF).

É certo ainda que o artigo 40 da mesma Lei 6.015 /73, que diz que “fora da retificação feita no ato, qualquer outra só poderá ser efetuada em cumprimento de sentença, nos termos dos artigos 109 a 112", o prenome é imutável.

Art. 109. Quem pretender que se restaure, supra ou retifique assentamento no Registro Civil, requererá, em petição fundamentada e instruída com documentos ou com indicação de testemunhas, que o Juiz o ordene, ouvido o órgão do Ministério Público e os interessados, no prazo de cinco dias, que correrá em cartório. (Renumerado do art. 110 pela Lei nº 6.216, de 1975).

§ 1° Se qualquer interessado ou o órgão do Ministério Público impugnar o pedido, o Juiz determinará a produção da prova, dentro do prazo de dez dias e ouvidos, sucessivamente, em três dias, os interessados e o órgão do Ministério Público, decidirá em cinco dias.

§ 2° Se não houver impugnação ou necessidade de mais provas, o Juiz decidirá no prazo de cinco dias.

§ 3º Da decisão do Juiz, caberá o recurso de apelação com ambos os efeitos.

§ 4º Julgado procedente o pedido, o Juiz ordenará que se expeça mandado para que seja lavrado, restaurado e retificado o assentamento, indicando, com precisão, os fatos ou circunstâncias que devam ser retificados, e em que sentido, ou os que devam ser objeto do novo assentamento.

§ 5º Se houver de ser cumprido em jurisdição diversa, o mandado será remetido, por ofício, ao Juiz sob cuja jurisdição estiver o cartório do Registro Civil e, com o seu "cumpra-se", executar-se-á.

§ 6º As retificações serão feitas à margem do registro, com as indicações necessárias, ou, quando for o caso, com a trasladação do mandado, que ficará arquivado. Se não houver espaço, far-se-á o transporte do assento, com as remissões à margem do registro original.

Art. 110. Os erros que não exijam qualquer indagação para a constatação imediata de necessidade de sua correção poderão ser corrigidos de ofício pelo oficial de registro no próprio cartório onde se encontrar o assentamento, mediante petição assinada pelo interessado, representante legal ou procurador, independentemente de pagamento de selos e taxas, após manifestação conclusiva do Ministério Público.(Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).

§ 1o Recebido o requerimento instruído com os documentos que comprovem o erro, o oficial submetê-lo-á ao órgão do Ministério Público que o despachará em 5 (cinco) dias. (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).

§ 2o Quando a prova depender de dados existentes no próprio cartório, poderá o oficial certificá-lo nos autos. (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).

§ 3o Entendendo o órgão do Ministério Público que o pedido exige maior indagação, requererá ao juiz a distribuição dos autos a um dos cartórios da circunscrição, caso em que se processará a retificação, com assistência de advogado, observado o rito sumaríssimo. (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).

§ 4o Deferido o pedido, o oficial averbará a retificação à margem do registro, mencionando o número do protocolo e a data da sentença e seu trânsito em julgado, quando for o caso. (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).

Art. 111. Nenhuma justificação em matéria de registro civil, para retificação, restauração ou abertura de assento, será entregue à parte. (Renumerado do art. 112 pela Lei nº 6.216, de 1975).

Art. 112. Em qualquer tempo poderá ser apreciado o valor probante da justificação, em original ou por traslado, pela autoridade judiciária competente ao conhecer de ações que se relacionarem com os fatos justificados. (Renumerado do art. 113 pela Lei nº 6.216, de 1975).

Mas a legislação abre espaço para modificação do nome quando da existência de:

  • Erro gráfico evidente;

  • No primeiro ano após a maioridade;

  • Dos nomes vergonhosos e ridículos;

  • Do uso prolongado e constante de um nome diverso do registrado na certidão de nascimento;

  • Da inclusão de alcunha ou apelido; homonímia;

  • Tradução (nomes próprios de origem estrangeira, em que há uma prerrogativa da lei 6.815 /90, no artigo 43 , quando estiver o "nome" comprovadamente errado, o nome for com sentido pejorativo, expondo o indivíduo titular do mesmo ao ridículo, ou tiver pronunciação e compreensão difícil);

  • Vítimas e testemunhas sob ameaças (alteração estendida ao cônjuge, companheiro, ascendente, descendente, dependente que tenham convivência habitual com a vítima ou testemunha na Lei nº 9.807 /99, que trouxe o regramento para que o Estado oferecesse “uma efetiva proteção às vítimas e testemunhas de crime, auxiliando a persecução penal, seja na fase pré-processual (investigatória, em regra dirigida pelo Delegado de Polícia), seja na fase processual” (CESAR, 2016, p. 1) 2; e;

  • Mudança de sexo.

No direito da personalidade, o nome possui características conforme salienta Araújo (2013):

Absoluto – produz efeitos erga omnes, é oponível contra toda coletividade;

Obrigatório – a Lei de Registros Públicos (Lei nº. 6.015/73) dispõe no seu art. 50, a obrigatoriedade de registro civil de todas as pessoas nascidas, inclusive os natimortos;

Indisponível – o titular do nome não pode ceder (em regra), alienar, renunciar, além de outras formas de disposição;

Exclusivo - alguns doutrinadores, como Cristiano Chaves (CHAVES; ROSENVALD, 2007, p. 171) e Tereza Vieira (2008, p.62), discordam dessa característica, devido à possibilidade de homonímia, defendem que o nome da pessoa natural não é exclusivo por acreditarem na impossibilidade de não repetição de nomes e que tal característica só se aplica as pessoas jurídicas;

Imprescritível – a perda do nome da pessoa natural não se dá pelo não uso, pois está fora do comércio;

Inalienável – a pessoa natural não pode dar nem vender o seu nome, pois não pode dispor da própria identificação pessoal, não é um bem comercializável;

Incessível – o nome da pessoa natural não pode ser cedido, em regra, pois, quando o cônjuge autoriza o outro a utilizar o seu sobrenome, não o está vendendo, mas cedendo seu uso, sem perda da titularidade;

Inexpropriável – o nome da pessoa natural não pode ser desapropriado pelo Poder Público;

Irrenunciável – essa característica é relativa, pois se admite, em casos especiais, o despojamento de parte do nome;

Intransmissível – corolário da indisponibilidade, os herdeiros recebem por direito próprio o apelido de família, como membro da família e não por concessão do pai;

Imutabilidade – essa imutabilidade é relativa, será apresentada mais adiante neste capítulo que é permitida a mudança do nome em circunstâncias excepcionais, com justa motivação e desde que não prejudique a terceiros, segundo o art. 59 da Lei de Registros Públicos;

Matéria de ordem pública – todo nascimento deve ser registrado no Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais, conforme os arts. 54 e 55 da Lei de Registros Públicos (ARAUJO, 2013, p. 1).

E ainda:

Extrapatrimonial – o nome é insuscetível de valor monetário, não é negociável, segundo Tereza Vieira (2008, p. 63), o nome não tem valor econômico por si só, porém, é presunção relativa, tendo em vista que se houver uma lesão por parte de terceiro, apresenta repercussão no âmbito patrimonial, sendo passível de uma indenização por danos materiais e morais;

Geral – o nome é um direito de todo ser humano, alcança a todos. Exige apenas que o agente possua personalidade jurídica;

Vitalício – por ser imprescritível acaba tornando o nome também vitalício, quer dizer, permanente;

Impenhorável - o nome civil não pode ser dado como garantia. Não pode ser penhorado (ARAUJO, 2013, p. 1).

Como o foco deste estudo é a mudança de sexo, nota-se que o indivíduo pode requerer a alteração do nome a qualquer momento sem a alteração do sobrenome. O procedimento se inicia com a apresentação de uma petição na Vara da Família para que o juiz competente, por se tratar de ação de estado civil.

Maia (2007) registra também a Lei n° 12.100/2009 que alterou os arts 40, 57 e 110, da LRP, com a finalidade de permitir que a retificação de assentos de Registro Civil seja feita no Cartório, sem a necessidade de sentença proferida pela autoridade judicial competente, é a retificação extrajudicial e expõe outros exemplos de decisões jurisprudenciais.

[...] o Superior Tribunal de Justiça julgou que o transexual que tenha se submetido à cirurgia de mudança de sexo pode trocar nome e gênero em registro sem que conste anotação no documento. Em uma decisão inédita (STJ - REsp 1.008.398), em 15/10/2009, o STJ julgou o caso de um transexual em São Paulo, que realizou a cirurgia de redesignação sexual. Após não ter conseguido a mudança no registro junto à Justiça paulista, ele recorreu ao Tribunal Superior. A decisão da Terceira Turma do STJ é inédita porque garante que nova certidão civil seja feita sem que nela conste anotação sobre a decisão judicial. O registro de que a designação do sexo foi alterada judicialmente poderá figurar apenas nos livros cartorários. A ministra relatora do recurso, Nancy Andrighi, afirmou que a observação sobre alteração na certidão significaria a continuidade da exposição da pessoa a situações constrangedoras e discriminatórias. Anteriormente, em 2007, a Terceira Turma analisou caso semelhante (STJ - REsp 678.933) e concordou com a mudança desde que o registro de alteração de sexo constasse da certidão civil. Após, a recente decisão do STJ, não é mais raro encontrar outras decisões, posteriores, iguais, pois o objetivo principal é a harmonização do sexo biológico com o sexo psicológico e a inserção social e profissional do transexual (MAIA, 2007, p. 1).

Em uma reportagem de Wilson Silveira (2013) há diversos processos que ainda não são divulgados sobre o direito de mudança de nome do sexo em razão de segredo judicial.

Está em tramitação na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 5.002/2013, de autoria do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) e da deputada Erika Kokay (PT-DF), que trata da viabilização e desburocratização para o indivíduo ter assegurado, por lei, o direito de ser tratado conforme o gênero escolhido por ele. A proposta obriga o SUS e os planos de saúde a custearem tratamentos hormonais integrais e cirurgias de mudança de sexo a todos os interessados maiores de 18 anos, aos quais não será exigido nenhum tipo de diagnóstico, tratamento ou autorização judicial (SILVEIRA, 2013, p. 1).

Dessa forma, pode-se inferir que a concretização do estado constitucional de direito vem abrigando o pluralismo de estilos culturais, na diversidade de circunstancias e condições históricas também no tema em estudo.

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