ANÁLISE SOBRE A FIGURA DO ORÇAMENTO
Generalidades
O Orçamento possui relevante papel no que se refere à organização da economia do Estado (seja a União, Estados e DF ou Municípios). Portanto, o Estado não pode agir de qualquer forma quando o assunto é a organização e o destino dos recursos financeiros públicos, tendo em vista que estes devem atender à sociedade e, além disso, são arrecadados do povo.
Não se pode, contudo, conceituar tão-somente o Orçamento como sendo um documento de caráter contábil e administrativo, pois ele orienta a atuação estatal na medida que é um instrumento dinâmico deste, visando abarcar toda a sua vida econômica, sempre tendo em vista que deve atender às aspirações sociais, sem deixar de lado o seu caráter de instrumento representativo da vontade popular (HARADA, 2015, p. 66-67).[14]
Minghelli (2009, p. 18), referindo-se ao orçamento público, assevera
É, sem dúvida, uma decisão política fundamental para a administração estatal, sintetizando grande parte da normatização da cidadania, além de expressar como se efetiva grande parcela da produção da riqueza pública, da forma como é apropriado e redistribuído.
Entrando no plano normativo, o ordenamento jurídico pátrio destina especial atenção ao Orçamento. Prova disso é que a Constituição da República, no Capítulo II (Das Finanças Públicas), dedica espaço especial ao Orçamento (na Seção II).
Cumpre salientar que a elaboração do orçamento é dada ao Poder Executivo, sendo que, já elaborado, passa pela apreciação do Poder Legislativo (no âmbito da União, os projetos orçamentários são apreciados nas duas Casas do Congresso Nacional), que pode fazer emendas (vide o art. 166, §§ 2º, 3º e 4º CR/88). Além da Carta Maior, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei nº 4.320/64 também versam sobre o orçamento.
Prevê a Constituição Federal de 1988, no artigo 165, que é de iniciativa do Executivo estebelecer o PPA (Plano Plurianual), LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e LOA (Lei Orçamentária Anual).
A partir disso, a Magna Carta, em relação ao PPA, preconiza, em seu §1º, do artigo 165, que “A lei que instituir o plano plurianual estabelecerá, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada” (BRASIL 1988).
A LDO, por sua vez, conforme o §2º do aludido artigo (ibidem):
[...] compreenderá as metas e prioridades da administração pública federal, incluindo as despesas de capital para o exercício financeiro subsequente, orientará a elaboração da lei orçamentária anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento.
Por fim, tem-se que a LOA compreenderá, consoante o §5º do artigo 165, CR/88, “o orçamento fiscal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público” (inciso I), “o orçamento de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto” (inciso II) e, por último, “o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público” (inciso III).
Assim, ante todo o exposto, o leitor atento já deve ter notado que o orçamento possui uma dimensão política, pois ele é fruto de uma decisão política. Dessa forma, é visível a exteriorização dos planos e interesses do governo no poder, sendo que pode até mesmo refletir certo clientelismo[15]. Portanto, o orçamento vai em direção a um caminho tendencioso, no qual, por vezes, a vontade individual dos governantes pode se sobressair à da sociedade (politicagem ao invés de política).
Nesse sentido, os interesses em reeleição, por exemplo, podem condicionar o direcionamento dos recursos públicos (mais investimentos em determinado bairro, mais recursos para a saúde e menos para a educação, etc.). A solução para esse problema é vista sob a perspectiva democrática: a participação popular nas deliberações acerca do orçamento, ideia esta desenvolvida a seguir.
Fiscalização e controle dos Orçamentos
Nada mais justo que o dinheiro público seja investido de maneira a garantir os direitos positivados. O destino desses recursos deve pautar-se na diminuição da desigualdade e assegurar, ao menos, as mínimas condições de vida digna e mais humana para todos os cidadãos, inclusive porque grande parte dos recursos públicos são oriundos de impostos recolhidos dos indivíduos. Assim, é preciso uma fiscalização sobre o Estado, principalmente no que se refere ao dinheiro público.
Para Harada (op. cit., p. 104), “[...] ao direito de autorizar as receitas seguiu-se o direi- to de autorizar as despesas, dando nascimento ao orçamento como instrumento fiscalizador da atividade financeira do Estado, com o escopo de coibir os abusos dos governantes”.
O artigo 70 da CR/88 determina que a fiscalização, no âmbito da União, seja exercida pelo Congresso Nacional (controle externo) e pelo sistema de controle interno de cada Poder. Ademais, os Tribunais de Contas auxiliam o Legislativo (Congresso Nacional, Assembleia Legislativa ou Câmara Municipal) no controle das contas. O referido Tribunal tem suas competências definidas constitucionalmente (vide, principalmente, o artigo 71, CR/88).
Orçamento Participativo: características, barreiras e desafios
A questão fulcral do orçamento participativo é a inclusão dos cidadãos no processo decisório. Surgiu como uma alternativa ao velho modo de se pensar o orçamento, isto é, sem nenhuma deliberação popular. Ademais, foi um considerável avanço para a democracia participativa e a forma de ver o cidadão (não inerte e não preocupado com assuntos relativos aos recursos públicos), de tal maneira que Avritzer (2008, p. 61) chegou a considerar o OP de alta capacidade democratizante.
Nesse sentido, o OP é imprescindível à gestão democrática municipal, pois ele cria um laço entre o poder público e a população. Quer-se dizer que ele aproxima os cidadãos do Estado. E isso é importante porque é a população que convive, diariamente, com todos os problemas urbanos, na saúde, na educação, etc.[16]
O gestor público não consegue vislumbrar todos os problemas e necessidades dos cidadãos em todos os espaços da cidade. Por isso, a decisão do destino dos recursos públicos deve ser racional, provinda de deliberações e marcada pela ajuda mútua entre os cidadãos e administrador público, pois os primeiros sabem quais as necessidades mais importantes do momento e são diretamente atingidos pelas decisões orçamentárias, enquanto o segundo entende de todos os trâmites burocráticos para o dispêndio dos recursos e possui competência para isso. Por conseguinte, escutar a sociedade permite decidir de forma mais justa sobre o destino dos recursos financeiros.
Consoante Santos (2002, p. 467), o OP possui três princípios gerais, quais sejam:
- Todos os cidadãos têm o direito de participar, sendo que as organizações comunitárias não detêm, a este respeito, pelo menos formalmente, status ou prerrogativas especiais;
- A participação é dirigida por uma combinação de regras de democracia direta e de democracia representativa, e realiza-se através de instituições de funcionamento regular cujo regimento interno é determinado pelos participantes;
- Os recursos de investimento são distribuídos de acordo com um método objetivo baseado em uma combinação de “critérios gerais” – critérios substantivos, estabelecidos pelas instituições participativas com vista a definir prioridades – e de “critérios técnicos” – critérios de viabilidade técnica ou econômica, definidos pelo Executivo, e normas jurídicas federais, estaduais ou da própria cidade, cuja implementação cabe ao Executivo.
Em relação às normas jurídicas, o OP encontra base legal na Lei Complementar 101/2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu art. 48, parágrafo único, inciso I, o qual incentiva a participação popular através de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, leis de diretrizes orçamentárias e orçamentos. O inciso II, por sua vez, garante que a sociedade saiba de informações acerca da execução orçamentária e financeira, o que, segundo pode-se observar, está alinhado ao princípio da transparência e da publicidade orçamentária.
Ademais, foi com o Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257/01, que se deu uma grande revolução em relação ao orçamento. Essa lei coloca em relevância, no âmbito municipal, a gestão democrática da cidade. Tem-se, com ela, um marco importantíssimo para a democracia participativa. A gestão democrática participativa, por conseguinte, é colocada em relevo, pois o planejamento municipal deve se dar através de um orçamento que propicie a participação (art. 4º, III, f). Ademais, é definido, no art. 2º, II, que a política urbana tem como diretrizes gerais a participação popular na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano.
Nesse sentido, salienta Dias (2012, p. 66) que
Se analisarmos os dispositivos referentes ao Estatuto da Cidade que tratam da gestão democrática, será possível compreender que o poder público deve criar inúmeros canais para que a população e as associações representativas possam, juntamente com o poder público, deliberar sobre os espaços urbanos. Isso porque o Estatuto da Cidade optou por mitigar a democracia representativa, ao estabelecer formas de participação direta e semi-direta da população na gestão e na formulação de políticas públicas para as áreas urbanas.
Assim, esse diploma legal, em seu art. 44, é expresso ao exigir que haja realização de debates, consultas e audiências públicas sobre as propostas do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e do orçamento anual, como condição obrigatória para a aprovação pela Câmara Municipal. Harada (op. cit., p. 71) chama atenção para o fato de que a “familiarização da sociedade com os instrumentos orçamentários é de suma importância para o pleno exercício da cidadania, participando no sistema de direcionamento das despesas públicas, bem como fiscalizando a fiel execução do que foi aprovado [...]”.
No contexto participativo do orçamento, o cidadão deixa de ser tão-somente sujeito de direitos em uma situação estática e passa a atuar na construção e implementação desses direitos (MINGHELLI, 2005, p. 107)[17].
Nessa conjuntura, o “poder” é descentralizado, pois não está concentrado somente ao Executivo/Legislativo, mas percorre toda a sociedade participativa[18], o que faz com que o OP apareça como o remédio para o clientelismo na medida que leva em consideração os anseios populares, diminuindo a discricionariedade do gestor público. Para Dias (2010, p. 244)
[...] o orçamento participativo modifica a orientação da política pública e do processo decisório, que deixa de ser dirigido pelas elites políticas [...]. São os cidadãos que diretamente decidem os marcos e o direcionamento das políticas públicas que vão, por sua vez, determinar a forma da atuação dos técnicos e funcionários dos órgãos públicos municipais.
Contudo, o OP é complexo e apresenta alguns óbices (a propósito, cf. SOUZA, 2001, p. 89) que precisam ser levados em consideração, e que, em um primeiro momento, parecem barreiras à sua eficácia. Primeiramente, pode-se levantar a tese de que a população não é interessada em questões relativas ao Estado, ou seja, que o nível de participação político brasileiro, em caso de OP, seria baixo.
Porém, não é isso que a realidade mostra: em Porto Alegre, referência mundial[19], o OP prosperou de uma forma que existe desde 1989. Obviamente, essa previsão é genérica, pois cada município tem seu grau de participação política[20], impossibilitando prever com exatidão. A propósito, em relação ao OP, “são muitas variações, a depender do sistema político, do montante de recursos disponíveis, da cultura política, dos formatos institucionais” (LÜCHMANN, 2014, p. 174).
Ademais, o próprio desencantamento com a política é motivo suficiente para que o cidadão participe das deliberações, pois este vê a oportunidade de, além de opinar, fiscalizar e ver seus direitos serem efetivados. Em consonância com esse entendimento, afirma Cavalcante (2007, p. 25)
Quando determinado distrito optar por uma reforma na praça do bairro ou a construção de um hospital e, logo no exercício financeiro seguinte essas obras se iniciam, gera-se sentimento de credibilidade em relação à ação governamental. A anterior desconfiança quanto ao governo é dirimida na medida em que as demandas da sociedade são atendidas, as ações dos representantes são melhores controladas. Logo, as políticas públicas são mais transparentes e eficazes, culminando, assim, em um processo de legitimação do poder público no âmbito de um sistema político mais plural e inclusivo.
Além disso, não se pode negar que o orçamento participativo acabe com as práticas de clientelismo por completo, tendo em vista que as decisões orçamentárias derivadas das deliberações com a população não são “vinculantes”, isto é, seriam apenas opiniões dos cidadãos, cujo Estado não é obrigado a aceitar. Portanto, a “última palavra”, nesse caso, é do Gestor Público. Aliás, a própria falta de “imperatividade” aparece como um problema. Nessa perspectiva, necessário é que o poder público siga a opinião dos cidadãos que participaram da deliberação[21].
Relacionado a isso, deve-se destacar que a PEC nº 565/06 (Câmara do Deputados), em discussão no Senado (PEC nº 22ª/00), acrescentaria o art. 165-A da CR/88, propondo a adoção, no Brasil, do chamado orçamento impositivo, que, consoante as lições de Harada (2015, p. 96), “obriga o Executivo a esgotar as verbas das dotações orçamentárias como aprovadas originariamente, ressalvadas as hipóteses previstas na Constituição”, reduzindo, portanto, a discricionariedade do Administrador ao aplicar os recursos, vinculando-o ao estrito cumprimento do orçamento, sob pena de crime de responsabilidade (§5º, artigo 165-A). Afastar-se-ia, portanto, o caráter meramente autorizativo do orçamento, tornando-o impositivo.
Em contrapartida, a própria participação popular é um problema, na proporção que, além de muitas pessoas não conhecerem seu direito de participar da produção do orçamento, grande parte da população possui sequer noções básicas sobre ele, o que as torna vítimas fáceis da manipulação política. Portanto, para que se evite tal situação, imprescindível a interferência da educação. Segundo a visão de Assunção (2013), o orçamento deve ser transparente, no sentido de que o seu conteúdo possa ser entendido pelo cidadão comum, que não dispõe do conhecimento técnico em matéria orçamentária. Caso contrário, se de leitura inacessível, os cidadãos não poderiam controlar o Estado, o que acaba prejudicando a democracia, pois os indivíduos não conseguirão participar
A limitação de recursos também aparece como óbice ao OP, pois os interesses da sociedade (termo que melhor se encaixa ao contexto participativo, pois traduz a coletividade, e não a individualidade) não seriam efetivados. Quer-se dizer que, em razão da escassez de recursos, alguns projetos poderiam não ser executados.
Os benefícios do OP, em contrapartida, são visíveis. Souza (2001, p. 92) elencou diversas vantagens, dentre elas uma cidadania mais ativa, beneficiamento da maioria populacional (pobres), além do que já foi dito anteriormente, isto é, redução de clientelismo, democracia representativa mais aberta à participação da sociedade civil, afastamento do individualismo em prol do coletivismo, etc.[22]
Convém chamar atenção que a população não deve participar somente do orçamento anual, mas sim deliberar sobre o Plano Plurianual (inciso I, art. 165 CR/88) e Diretrizes Orçamentárias (inciso II, art. 165 CR/88). No entendimento de Dias (2012, p. 71):
Em nível municipal, por sua vez, todo o processo de planejamento urbano – que inclui a criação de planos diretores, de planos especiais, de planos, programas e projetos setoriais, de todo o processo de planejamento para o parcelamento, uso e ocupação do solo, assim como o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual – dependerá da existência de canais participativos democráticos como forma de legitimação do processo de planejamento municipal (art. 4º, inc. III, alínea “a”, lei 10.257/01).
O Orçamento no Município de Marabá, Pará
A Lei nº 17.213, de 09 de outubro de 2006, a qual institui o Plano Diretor Participativo do Município de Marabá, cita em alguns momentos o orçamento, mostrando a sua relevância para o planejamento urbano e para todo o funcionamento da máquina pública na busca pelos seus fins.
Logo no parágrafo único do art. 1º, determina que o PPA, LDO e LOA incorporem as diretrizes e as prioridades nele contidas. Ademais, na proposta orçamentária o Executivo poderá encaminhar anualmente à Câmara Municipal proposta de intervenção nas ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social) (art. 42, §8º). Ainda, a execução da política agropecuária municipal (art. 58) e da política Municipal de Saúde (art. 88) dar-se-ão através de ações do orçamento municipal e da cooperação com outros níveis governamentais.
Além disso, o PPA, a LDO e a LOA são considerados instrumentos de política urbana (art. 123, Lei nº 17.213/06), mais especificamente instrumentos de planejamento (inciso I), para, conforme o art. 123, “a promoção, planejamento, controle e gestão do desenvolvimento municipal [...]”. Ainda referente ao citado artigo, tem-se, no inciso VI, que o orçamento participativo é um instrumento de democratização da gestão urbana.
Mais especificamente no que se refere a leis orçamentárias, tem-se que o PPA do município de Marabá segue as determinações constitucionais anteriormente mencionadas (art. 165), conforme consta do PPA 2014-2017. Segundo o PPA (p. 4) do município:
Este plano contempla os avanços que o governo propõe para a população de aproximadamente 233 mil habitantes do município de Marabá, visando a promover o desenvolvimento humano, desenvolvimento sócio-econômico (sic), desenvolvimento urbano e rural, saúde e qualidade de vida, e segurança municipal, com inovação, sustentabilidade ambiental e foco em quem mais necessita dos serviços públicos, de modo a garantir mais qualidade de vida para todos.
Ainda, segundo o PPA marabaense, este expressaria o compromisso do Governo de realizar uma gestão participativa, por ser um instrumento de modernização da máquina pública, buscando eficiência e qualidade nos serviços públicos (PPA, p. 4). Nesse sentido, um dos objetivos do Plano Plurianual seria “definir com clareza as metas e prioridades da Administração Pública Municipal, conferindo transparência aos objetivos e ações do governo, em parceria com a sociedade civil organizada” (ibidem, p. 6, grifo nosso).
Nessa conjuntura, foram realizadas 5 (cinco) Audiências Públicas no período de 27 de agosto a 14 de setembro de 2013, buscando-se “recolher a mais ampla diversidade de ideias ou propostas, sejam de curto, médio ou longo prazo, sejam de fácil ou complexa implementação, de modo que fosse sistematizado todo o anseio da população marabaense” (ibidem, p. 10).
Ademais, essas ideias e proposições não irão, imediata e obrigatoriamente, entrar neste ciclo orçamentário, podendo constar em ciclos posteriores (ibidem, loc. cit.). Portanto, as ideias da população não possuem caráter vinculativo, obrigatório, imperativo, mas meramente indicativo.
Nesse PPA não se pode vislumbrar um processo deliberativo, tampouco uma aplicação das teorias e ideias de Habermas ou de Democracia Deliberativa. Inclusive, consta do PPA (p. 10) que “não se trata, portanto, de um processo deliberativo, mas de um suporte à priorização de parcos recursos públicos e à tomada de decisão, que será aprimorado e aprofundado ao longo do tempo, podendo balizar inclusive outros processos de planejamento setoriais”.
Percebe-se, portanto, que o Plano visou a participação popular, reconhecendo sua importância e alocando-a como um dos objetivos. Porém, compulsando o referido PPA e realizando interpretação sistêmica, vê-se que a efetiva participação popular, em que o indivíduo possa deliberar, opinar, falar não foi “levada a sério”. Desta feita, no que se refere às Audiências Públicas, “foram enviados convites para as audiências públicas às lideranças comunitárias, por ofício e por e-mail, além de convites entregues diretamente para segmentos mais representativos” (p. 11).
Isso é incoerente, pois, segundo o mesmo documento (p. 12), “o processo envolveu toda a população do município, mas principalmente a população mais carente que geralmente é mais organizada e mobilizada”. Portanto, conclui-se juntamente ao PPA marabaense que:
Não se tratou, portanto, de uma participação massiva, mas representativa, pois houve participação de lideranças comunitárias, geralmente presidentes de associações de moradores ou representantes de algum segmento da sociedade, setor produtivo, diretores de escolas, estudantes, trabalhadores de centros de saúde, pessoas vinculadas a algum movimento religioso, membros de conselhos de políticas públicas e/ou comissões regionais/locais (p. 12).
[...]
Espera-se também o fortalecimento das associações comunitárias e a ampliação dos canais de diálogo do cidadão com a prefeitura além da ampliação da disposição para participação cidadão na gestão e no planejamento municipal (p. 14).
Um elemento importante desse processo é a valorização do saber popular, O aprendizado da Prefeitura a partir do conhecimento da comunidade sobre os temas que interferem no cotidiano da população. O PPA participativo incentivou o fortalecimento da participação popular para que o planejamento das ações de governo seja, de fato, estimulador de transformações sociais (p. 14).
A Lei nº 17.596, de 12 de agosto de 2013, a qual define as diretrizes orçamentárias para o exercício financeiro de 2014, traz consigo, em seu artigo 1º, as diretrizes gerais para elaboração dos orçamentos do Município, compreendendo as prioridades e metas da administração pública municipal (I), as metas e riscos fiscais (II), as diretrizes gerais e o orçamento (III), as disposições sobre alterações na legislação tributária (IV);, as disposições relativas à dívida pública municipal (V) e as disposições finais (VI).
Extrai-se do site do Poder Legislativo de Marabá[23] que a referida LDO foi aprovada pela Câmara Municipal após ter sido deliberada em primeiro turno e debatida em audiência pública. Porém, não há nenhuma outra informação no sentido de explicar os procedimentos dessa Audiência Pública, ou seja, se contou com a participação ativa dos cidadãos ou somente dos representantes de associações e comunidades, se tal Audiência foi divulgada à população, etc. Certo é que não se dá a devida atenção à participação popular, a qual ainda encontra-se marginalizado no modelo orçamentário marabaense.
A Lei marabaense nº 17.648 de 20 de dezembro de 2014, ou seja, a LOA, estima as receitas e fixa as despesas, no município de Marabá-PA, para o exercício financeiro de 2015. Consta da referida Lei que é estimada a receita de R$ 744.444.073,87 (setecentos e quarenta e quatro milhões, quatrocentos e quarenta e quatro mil e setenta e três reais e oitenta e sete centavos). Em notícia publicada pelo Poder Legislativo de Marabá[24], não há informações de qualquer participação popular ou mesmo Audiências Públicas.