CONCLUSÃO
Ao longo da presente monografia foi analisado o posicionamento dos princípios no âmbito do Direito Positivo e da Ciência Jurídica, sendo destacada, rigorosamente, a cisão entre uma realidade e outra, sendo que os princípios no plano normativo são pressupostos de interpretação e aplicação do Direito, enquanto que na Ciência Jurídica constituem enunciados que ensejam a condição de área autônoma do conhecimento.
Certamente este estudo encontra correspondência com a atividade cotidiana dos operadores do Direito, bem como com as formulações doutrinárias dos cultores deste ramo do saber. Entretanto, por mais que se argumente e se exponha exemplos a ilustrar tal asserção, muitas vezes parece que o tema está distante da realidade do jurista se comparados às regras. Isto ocorre devido à imprecisão terminológica que deixaram muitos flancos abertos e fatalmente propiciaram o uso inadequado deste instrumento normativo, de modo que ao invés de ser visto como norma, passa a constituir mero recurso retórico para sustentar as mais absurdas e possíveis formas de afronta e violação aos direitos (como costuma ocorrer nos Tribunais do Júri), quando na verdade, seu escopo é imprimir às regras maior substrato de justiça.
Por tudo o que foi analisado, é possível constatar que o tema não tem sido objeto de muitas construções doutrinárias autônomas. Por outro lado, doutrinas de vários ramos jurídicos usualmente dedicam um capítulo aos “princípios”, muito embora, esse tipo de abordagem tem sido parcial, segundo a visão correspondente ao ramo do direito estudado pelo jurisconsulto. Em virtude disso, as várias referências apontadas caracterizam basicamente a visão de cada doutrinador, as quais tendem a variar muito mais do que qualquer assunto menos abstrato, como por exemplo “relação obrigacional”. Além disso, devido à peculiar feição do tema, seu desenvolvimento demandou algumas inovações, como por exemplo a classificação de “critério legal propriamente dito” e “critério legal de equidade”. Também foram aproveitadas inovações de outros autores, como por exemplo, a classificação acerca dos princípios proposta pelo professor Maurício Godinho Delgado.
Em seguida, serão enumerados alguns dos principais pontos levantados no decorrer dos capítulos, de forma sucinta, dispostos de alguns breves comentários já aventados, seguido, após, de respostas e propostas à pergunta-problema.
No primeiro capítulo abordou-se o conceito de “princípios” e considerações gerais atinentes ao tema. O cerne da abordagem diz respeito às diversas concepções dos princípios na seara jurídica. Para tanto, foram analisadas formulações doutrinárias de diversos autores.
Adentrando na análise do capítulo I, constatou-se que a expressão “princípio” é equívoca e este vício persiste na conceituação dos mais renomados juristas, pois ora o tema pode ser compreendido como algo relacionado a uma espécie normativa, ora pode estar relacionado aos vetores que demandam delimitação de determinado fenômeno natural à condição de objeto de uma determinada área da ciência, pressupostos a partir da constatação da existência de princípios próprios que lhe arrimam, conferindo-lhe autonomia científica.
Já o segundo capítulo, dedicado à Ciência Jurídica, teve como idéia central o método científico e, neste contexto, estudou-se a Epistemologia Jurídica, pois, considerando que a Ciência Jurídica é a ciência que tem por objeto o estudo do Direito, imperioso se afigura seu estudo, na medida em que os resultados obtidos pela Ciência Jurídica exercem grande influência no Direito Positivo. Por conta disso, o jurista deve compreender o método da ciência que estuda o Direito.
Não obstante a relevância do estudo e da compreensão da Ciência Jurídica, sua abordagem só se fez pertinente nesta monografia, devido ao enfoque do tema, onde se procurou demonstrar a atuação axiológico-normativa dos princípios no Sistema de Direito Positivo e que a ciência responsável por desvelar o fenômeno jurídico também se caracteriza por um conjunto de princípios que, neste contexto, são cânones, verdadeiras leis ou diretrizes que orientam e informam a atividade cognoscitiva. Distinguem-se, deste modo, dos princípios próprios do Direito Positivo, que atuam, no mais das vezes como normas ou enunciados implícitos no sistema de normas.
Na teia da Epistemologia Jurídica foi estudada a correlação sujeito e objeto, o conceito e às características do saber científico. Além disso, foi demonstrado que o objeto da Ciência Jurídica é o Direito e, nesse ínterim, foram apresentados seus principais métodos de investigação, o Dogmático e o Zetético. Também foi digno de nota o problema da conceituação, muito freqüente na praxe jurídica, como também em legislações que a despeito de consistirem em vícios normativos, são toleráveis, pois não interferem no objeto do Direito Positivo. Tais inconsistências, no entanto, não podem ocorrer na esfera da Ciência do Direito, haja vista que a incompatibilidade lógica de um determinado sistema fatalmente o levará ao esboroamento de sua estrutura e comprometerá sua sistematicidade (mormente em matéria de ciência). Em seu último tópico, o foco da análise se volveu ao objeto da Ciência do Direito, isto é, o Direito Positivo.
O terceiro capítulo refere-se a uma das premissas postas no tema, qual seja, “sistema de Direito Positivo”. Neste ponto, não foi possível desenvolver o assunto sem uma breve alusão à ciência como sistema de conhecimento. Exatamente por isso, infere-se que “sistema” é um termo amplo que engloba, por conseguinte, muitos significados. Portanto, sua compreensão demandou uma análise semântica de sua expressão verbal, correlacionado com as características específicas do sistema a ser estudado, no presente caso, sejam eles “sistema de Direito Positivo” e “sistema de conhecimento”.
Deveras, verificou-se que o conjunto de normas válidas e vigentes de um determinado Estado, constitui um conjunto harmônico-unitário, onde cada parte que integra o conjunto possui função específica que não se confunde com a função do todo, muito embora esteja imanentemente conectada com o todo e atue em sintonia com ele. Logo, desta realidade intui-se a idéia de sistema, mais precisamente “sistema de Direito Positivo”.
Da mesma forma, quando se concebeu o estudo do Direito pela perspectiva de um sujeito cognoscente a desvelar o objeto de seu estudo, utilizando-se de critérios rigorosos, metódicos, empíricos e teóricos, aptos a transmitir informações verdadeiras, verificáveis ou demonstráveis, que visa a constatações ou até mesmo previsões de certos fenômenos, dado seu alto grau de racionalidade, cuja atividade se embasa em princípios que lhe servem de premissas à consecução dos seus fins, tem-se igualmente reconhecida à idéia de sistema, neste caso “sistema de conhecimento”.
Uma vez demonstrado que o Direito é um sistema, procurou-se em seguida adentrar em sua essência de onde se pode constatar que o sistema jurídico possui, basicamente dois modos de expressão, sendo que o primeiro delas é o “repertório”, isto é, o conjunto de elementos que integram o sistema e o segundo é denominado “estrutura”, que diz respeito às possíveis inter-relações dos elementos que integram o sistema, sendo possível que exista relações de subordinação e relações de coordenação.
No quarto e último capítulo estudou-se a atuação dos princípios no âmbito normativo brasileiro, onde se finalizou a discussão com a abordagem dos princípios na esfera do Direito Constitucional, o qual certamente representa o campo mais propício à atuação axiológica e normativa de normas abstratas da categoria dos princípios.
Entretanto, tendo-se em vista a melhor compreensão da realidade do Ordenamento Jurídico pátrio, foi preciso empregar a classificação proposta por Maurício Godinho Delgado.
Eis que a classificação proposta pelo autor mencionado se apresenta da seguinte maneira: “fase pré-jurídica ou política”, como sendo o momento que antecede a positivação da norma, e “fase jurídica”, quando a norma já se encontra positivada. Na fase jurídica o tema se subdivide em “princípios descritivos ou informativos”, os que representam o fundamento central, o núcleo do sistema, (mas cuja aplicação poderia se dar já na fase pré-jurídica, como entendemos, os “princípios normativos subsidiários”, forma supletiva de aplicação do direito, cujo cabimento se dá na hipótese de ausência de regra expressa e, por fim, os “princípios normativos concorrentes”, ou seja, os princípios de direito que concorrem em pé de igualdade com as regras jurídicas.
De posse desta classificação, realizou-se o estudo da atuação dos princípios no plano das normas infra-constitucionais, onde os princípios atuam tanto como “princípios normativos subsidiários” e como “princípios normativos concorrentes”. Em seguida, e arrematando o quarto e último capítulo, foi tratado da atuação dos princípios no plano das normas constitucionais, que representam o cerne desta monografia. Neste tópico, demonstrou-se que os princípios atuam principalmente como “princípios descritivos ou informativos”, mas também podem figurar como “princípios normativos concorrentes”.
Concluindo, ressalto que os princípios constituem elementos recorrentemente invocados pelos operadores do Direito. As próprias doutrinas, ao formularem certas definições, começam por afirmar que “este ramo do Direito constitui-se de um complexo de normas e princípios que disciplinam [...]”. Entretanto, o emprego do vocábulo nos manuais doutrinários designa a um só tempo formulações condizentes com a dinâmica do Ordenamento Jurídico e com a Ciência do Direito. Notadamente, isto resulta em atecnia e prejudica àqueles que lidam com essa categoria de norma ou aos que estudam o Direito do ponto-de-vista epistemológico, pois, dada à imprecisão conceitual da expressão (princípio), poderia incorrer em um erro primário de desenvolver pesquisa científica calcada em um pressuposto alcunhado de “princípio”, mas que não passa de um princípio da categoria de norma concorrente, pois estes não se confundem com os enunciados que norteiam a pesquisa científica jurídica.
Frise-se ainda que a doutrina frequentemente incorre no flagrante equívoco ao empregar a locução “normas e princípios” como se fossem coisas distintas. Ora, norma é gênero, regras e princípios são espécies. Portanto, entenda-se que no âmbito do sistema de direito positivo os princípios atuam como normas, já com relação à ciência jurídica sua atuação se dá como um vetor a orientar a pesquisa. Ou será o princípio uma realidade meta-jurídica, transcendental? Ou será na verdade algo estranho ao direito, infra ou extra-jurídico? Certamente que não.
Como já tantas vezes demonstrado os princípios inserem-se em uma realidade muito mais abrangente que são as normas de direito e como tal pertencem ao mundo jurídico como elemento do sistema normativo. Eis que sua atuação também está compreendida na estrutura do sistema.
Deveras, o tratamento a ser atribuído aos princípios no sistema de direito positivo é o de norma e, como tal, dotado de força imperativa, cogente e mandamental apta a disciplinar, sejam as relações intersubjetivas, seja o modo pelo qual o Estado atuará na busca da consecução de seus fins institucionais.
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