4. O “PLANTÃO REGIONALIZADO” E SUAS CONSEQUÊNCIAS NEGATIVAS
“Art. 8º A carga horária semanal de trabalho dos ocupantes dos cargos das carreiras de que trata esta Lei Complementar é de quarenta horas, vedado o cumprimento de jornada em regime de plantão superior a doze horas. (Artigo com redação dada pelo art. 1º da Lei Complementar nº 113, de 29/6/2010.)”
Com a implementação das quarenta horas semanais, que por consequência gerou a reorganização do plantão da Polícia Civil, com atendimento em apenas 67 unidades, em regra, nas sedes das Delegacias Regionais, houve a concentração de atendimento e, com isso, surgimento de inúmeros contratempos.
É de bom alvitre lembrar que Minas Gerais possui 853 municípios e perto de mil distritos.
O primeiro e principal ponto negativo, que nasceu desta implementação, é a necessidade de deslocamento para o encerramento de ocorrências. Isto porque, independente do local onde ocorra a prisão, o conduzido terá que ser levado para a unidade onde funciona o plantão.
Tal deslocamento gera outra consequência negativa. Frente ao pequeno efetivo de algumas localidades, quando ocorre a prisão e o deslocamento para a unidade de plantão, a cidade de origem da ocorrência fica desprovida de policiamento ou tem seu efetivo reduzido.
Tal consequência é mais sentida quando se observa pelo aspecto da sensação subjetiva de segurança pública.
Ademais, o deslocamento a qualquer hora do dia ou da noite, independente do horário, implica em riscos relativos à segurança tanto dos policiais quanto dos envolvidos na ocorrência que deve ser encerrada no plantão regionalizado.
Exemplos desse risco foi o acidente ocorrido no deslocamento de militares de São Pedro dos Ferros para Ponte Nova onde todos os ocupantes do veículo (dois militares, o conduzido e uma testemunha e a vítima) morreram após capotamento, além de um acidente envolvendo uma Delegada de Polícia que se deslocava de Araçuaí até o município de Pedra Azul, no Vale do Jequitinhonha, a fim de assumir o plantão policial.
É de fácil constatação que a obrigação legal de apresentação dos conduzidos e demais envolvidos na ocorrência, torna-se, em alguns casos, desproporcional em razão da distância a ser percorrida para tal apresentação, principalmente, quando a ocorrência envolve crimes de menor potencial ofensivo. Isso porque, nestes casos, o conduzido será liberado, independente do pagamento de fiança, bastando para tanto, assinar um termo se comprometendo a comparecer em juízo em dia previamente agendado.
5. PLANTÃO REGIONALIZADO NO ASPECTO ECONÔMICO
O aumento nos deslocamentos para encerramento das ocorrências também significa aumento nos gastos. Estes aumentos estão relacionados ao combustível consumido, desgastes de pneus, trocas de óleo e demais manutenções relativas ao desgaste do veículo. Também, não se pode desconsiderar que, além disso, o Estado deve arcar com diárias, dependendo da distância e duração do deslocamento.
6. ESTUDO DE DEMANDA
Visando conhecer melhor a demanda e a cadeia de atos dos procedimentos da esfera de atuação da Polícia Civil, foi feito um estudo onde houve o cruzamento de dados sobre a distância de cada local município até o local onde funciona a sede do plantão regionalizado. No entanto, as informações sobre a distância para deslocamento só seriam útil se houvesse a sua relação com a quantidade de deslocamentos que eram necessários durante o ano.
Após este estudo foi constatado que, durante o horário de plantão, as ocorrências que eram encerradas na delegacia de plantão poderiam ser divididas em dois grandes grupos para melhor análise e entendimento do processo.
O primeiro grupo, relativo as ocorrências que efetivamente geraram a prisão do conduzido (APFD/AAFAI) e o segundo e maior grupo, relativo aos demais registros que não geraram a prisão do suposto autor do crime. Neste segundo grupo, estão as demandas referentes a crimes de menor potencial ofensivo (TCO/BOC), fatos atípicos, fatos em que já não mais existe o estado flagrancial, sendo que, em todos, o conduzido não ficou preso. Porém, para facilitar a compreensão, foram considerados somente os dados referentes aos crimes de menor potencial ofensivo, cujo registro foi feito durante o horário de plantão.
Pode-se constatar da análise dos dados acima, que a maior demanda refere-se a crimes de menor potencial ofensivo, sendo em grande parte[2] superior a noventa por cento da demanda. Ou seja, houve um deslocamento significativo para a cidade onde funciona o plantão e o conduzido foi imediatamente liberado.
Assim, a implementação de um procedimento que evite o deslocamento nos casos de crimes de menor potencial ofensivo já reduziria significativamente os deslocamentos, gerando ganhos de diversas espécies, além de economia significativa.
Esta foi a grande percepção da equipe que trabalhou no projeto. A feitura dos casos em que há a segregação cautelar do suposto autor do crime tem sua forma expressamente ditada pelos artigos 302 e seguintes do Código de Processo Penal.
Em tais dispositivos encontramos comandos normativos que exigem requisitos formais como a assinatura dos envolvidos nas oitivas, assinatura do conduzido Nota de Culpa e etc. Assim, não há como, de forma mais célere e simplificada, mudar a forma da feitura do Auto de Prisão em Flagrante Delito sem a alteração do referido Código.
Portanto, o novo modelo está direcionado para o grupo de ocorrências em que não há o encarceramento do conduzido.
7. O NOVO MODELO PROPOSTO
7.1. O Despacho de ocorrências por meio virtual
Antes de mais nada é preciso esclarecer que, em Minas Gerais, o boletim de ocorrência é digital e a sua entrega na Delegacia também se dá por meio digital. É o chamado sistema REDS - Registro de Eventos de Defesa Social. Assim, por exemplo, quando um policial militar inicia o registro de qualquer fato criminoso o faz em um sistema informatizado que atribui um número de controle a este registro. É através deste número que a delegacia irá dar recibo neste boletim e continuar as diligências pertinentes para aquela demanda.
Diante de crimes de menor potencial ofensivo, há possibilidade de a Autoridade de Plantão tomar ciência e efetuar o seu despacho sem que, necessariamente, haja a condução de todos os envolvidos até a sua presença.
Para isso basta que haja comunicação digital entre a unidade plantonista e a fração policial do local onde ocorreram os fatos.
Assim, conjugando qualquer meio digital de comunicação com o sistema REDS é possível que haja segurança e rapidez no despacho, mantendo-se as competências de cada um dos atores da segurança pública, conforme atribuídas pela Constituição Federal.
Então, nos casos já previstos de atuação da presente proposta, ao encerrar o registro da ocorrência, o policial subscritor entra em contato com a Delegacia onde funciona o plantão informando sobre o número do REDS confeccionado.
Tal registro é levado ao conhecimento do Delegado Plantonista que após analisá-lo irá proferir seu despacho. Caso entenda que o registro não traz todos os elementos necessários para seu despacho o Delegado solicitará esclarecimentos do subscritor do boletim de ocorrência para que tenha convicção da decisão a ser tomada para o caso apresentado. Esta comunicação será feita, preferencialmente, pelo meio digital de comunicação.
Caso ocorra a solução de todos os pontos duvidosos, o Delegado profere seu despacho que é encaminhado, por meio digital ao policial da origem do REDS. Nesta oportunidade, o Delegado irá também encaminhar qualquer outra peça que entenda ser formalizada para que possa ocorrer o imediato despacho da referida ocorrência.
Após receber o despacho e as peças que foram encaminhadas, o responsável pelo registro dos fatos irá “reabrir” aquele REDS para edição e acrescentar, em seu histórico, os novos fatos relativos à comunicação com o Delegado de Plantão.
Assim, irá inserir o despacho da Autoridade “ipsis litteris” [3], bem como a informação relativa à efetiva formalização da(s) peça(s) que recebeu por meio digital.
Por último, o editor do boletim irá inserir a informação sobre o comprometimento em entregar os objetos vinculados aos fatos, as peças confeccionadas e o próprio registro na Delegacia da área no primeiro dia útil subsequente.
Após a constatação da efetiva modificação do histórico da ocorrência, a Delegacia de plantão irá efetuar o recebimento do respectivo boletim junto ao sistema REDS o que autoriza o editor do boletim a promover a liberação de todos os envolvidos.
Em ato contínuo, o Delegado Plantonista transfere a ocorrência, através do sistema PCNET, para a Delegacia com atribuições para prosseguimento das diligências necessárias para conclusão do expediente e encaminhamento ao fórum.
Então, no primeiro dia útil subsequente, os militares promovem a entrega da ocorrência, juntamente com todos os objetos e documentos a ela vinculados, na Delegacia da área, ocasião em que receberá o devido recibo da entrega.
7.2. O meio digital de comunicação
O meio digital de comunicação inserido no modelo de atuação proposto, conjugado com o sistema REDS, se mostra como meio adequado para que o Delegado de Polícia sane suas dúvidas, possibilitando assim o despacho da ocorrência.
Exatamente pela sua importância é que o referido meio de comunicação não pode ser compreendido como o simples telefonema. Isto porque, conforme já exposto, será através do meio digital de comunicação que a Autoridade irá encaminhar seu despacho para o responsável pelo registro do REDS para que este o insira no histórico do documento.
Além de ser o meio de envio do despacho do Delegado, o meio de comunicação deve agregar os avanços tecnológicos possibilitando a maior interação da Autoridade com os envolvidos e objetos vinculados na ocorrência.
Para isto, o proposto é que o meio seja capaz de proporcionar a realização de videoconferência entre a Delegacia de Plantão e a unidade responsável pelo registro dos fatos. Assim, havendo a necessidade de visualização dos objetos arrecadados na ação policial ou mesmo a necessidade do Delegado em entrevistar alguma das partes envolvidas na ocorrência tal diligência será feita com utilização de imagem e som em tempo real.
Vários programas com estas funcionalidades já são disponibilizados gratuitamente na internet. Neste grupo podemos citar o Skype, o Facebook, o próprio Gmail, entre outros.
Todos eles também são capazes de proporcionar o envio arquivos, sendo, então, o meio pelo qual o Delegado encaminhará as demais peças a serem formalizadas para a fração responsável pela lavratura do REDS.
7.3. A participação da Justiça Criminal
O modelo que foi proposto, além de todas as vantagens já apresentadas, não para por aqui. Tal proposta agrega mais ao incluir no modelo de atuação a comunicação, também digital, dos procedimentos que são feitos na Delegacia de Plantão para a Justiça Criminal, Ministério Público e Defensoria Pública, quando for o caso. Todos os atos de comunicação da Polícia Civil com esses Órgãos também são realizados por meio da tecnologia.
Para que não reste dúvida, o modelo envolvendo o meio digital de comunicação tem sua aplicação no grupo em que, em regra, o conduzido não é autuado em flagrante delito e é liberado.
No entanto, nesta etapa do modelo proposto, a comunicação com a justiça criminal se dá exatamente no outro grupo que é dos casos em que o conduzido é efetivamente preso. Ou seja, a Polícia Civil de Minas Gerais criou um novo modelo de agir para os crimes de menor potencial ofensivo e modernizou a comunicação entre a Polícia Civil, na função de Polícia Judiciária, para os casos em que efetivamente ocorreu a prisão do conduzido.
Assim, a importância da inclusão dos órgãos da Justiça Criminal ao novo modelo se justifica em razão de não raras vezes policiais civis terem que se deslocar para entregarem a cópia de documentos confeccionados na Delegacia para Juízes, Promotores e Defensores de Plantão.
A maior incidência ocorre em razão das comunicações das prisões ratificadas pela Autoridade Policial.
Assim, após ratificar a prisão, através do Auto de Prisão em Flagrante Delito (APFD) o Delegado tem que comunicar a prisão, em vinte e quatro horas, com cópia de todo o APFD para o Juiz, Promotor e Defensor Público (neste último caso, se o autuado não tiver informado o nome de seu advogado).
Porém, o problema maior surge quando qualquer destes plantonistas não está na mesma Comarca onde funciona a Unidade de Plantão da Polícia Civil, gerando enormes deslocamentos para os policiais que as vezes precisam se deslocar para três municípios diferentes.
Portanto, a implementação da comunicação digital entre a Unidade de Plantão da Polícia Judiciária e estes órgãos de justiça criminal, também gera agilidade, eficiência e redução de gastos. Também não haverá prejuízos para o regular andamento dos serviços na unidade de plantão porque não haverá redução no número de funcionários, em efetivo atendimento, para o deslocamento meramente formal.
Assim, essa nova ferramenta inserida na cadeia de atos praticados irá melhorar a comunicação entre o Sistema de Defesa Social e a Justiça Criminal.