A audiência de custódia e seu real objetivo no sistema jurisdicional

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4 DA EFICÁCIA DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA

Com a implementação da audiência de custódia no ordenamento jurídico brasileiro, todos os tribunais que aplicam este instituto visam aos resguardos fundamentais aos direitos humanos, passando a cumprir a obrigação que o Brasil assumiu ao assinar tratados internacionais, aumentando o poder de polícia dos juízes, defensores e promotores de trabalharem com mais legalidade e eficiência.

De acordo com o ministro Lewandowski, as audiências de custódia poupam e pouparão não apenas recursos públicos, mas também trabalho aos magistrados e demais operadores do Sistema de Justiça. “Uma sessão como esta (de audiência de custódia) facilita o trabalho do juiz, do Ministério e da Defensoria Públicos, porque já têm contato com o preso inicialmente, examina o processo num primeiro momento. Tenho a convicção de que, muito mais que dificultar o trabalho dos juízes e dos operadores do Direito, isto adianta muito do que o juiz terá de fazer num futuro próximo”, disse o presidente, em entrevista coletiva após a audiência de sexta. (BRASIL, 2015).

Segundo o ministro Ricardo Lewandowski, quando do lançamento de tal instituto, assegurou ainda ser um passo muito importante para o Brasil, dizendo que:

Estamos dando um primeiro passo no sentido de apagar uma nódoa que mancha a história institucional do Brasil. O Brasil é o 4° País que mais encarcera pessoas no mundo. Temos hoje no Brasil cerca de 600 mil detentos no sistema prisional atual e o que é pior, 40% dos detentos são presos provisórios, equivalendo ao número de aproximadamente 240 mil encarcerados. Esta é uma nódoa, esta é uma mancha que neste momento, graças à compreensão do Desembargador Paulo Roberto Vasconcelos, Presidente desta egrégia Corte e de seus eminentes pares nós começamos a apagar definitivamente, aqui no Paraná, e a partir de agora nos demais Estados brasileiros. O Ministro disse ainda que “é grande a responsabilidade da Corte e dos Juízes paranaenses para que nós possamos dar esse salto qualitativo importante, no que diz respeito não só a concretização dos direitos fundamentais de cidadania, mas também para garantir dentro daquele papel que nos toca, a higidez do erário. (PARANÁ, 2015).

E, conforme dados estatísticos realizados pelo Portal CNJ (BRASIL, 2017), pode-se verificar que no ano de 2015 ao ano de 2017 ocorreu acerca de 23.558 audiências de custódias em todo Estado do Paraná, sendo gerados 57.75% em prisão preventiva. Isso resulta em uma porcentagem maior do que a liberdade provisória, tendo em vista que somente 42.25% resultaram em liberdade provisória. Talvez, isso se deve pelo fato de que esteja apenas sendo verificado, pela maior parte dos juízes dentre esses órgãos jurisdicionais do Estado do Paraná, acerca dos maus-tratos por parte policial, deixando de ser apreciada a real necessidade da manutenção dessa prisão e a legalidade dessa prisão, conforme demanda a Resolução no 213/2015 do CNJ. Porém, não se pode afirmar com precisão quanto a esta aplicabilidade em todo o Estado, mas pode-se ter uma presunção deste fato, tendo em vista que a audiência de custódia gerou mais em prisão preventiva do que em liberdade provisória, conforme se depreende do mapa abaixo:

 Figura 1- Audiência de custódia em números- Paraná.

            [1]

Ainda, para uma melhor análise e diferenciação da aplicação da audiência de custódia de um Estado para o outro, pode-se verificar os dados estatísticos do Estado do Mato Grosso (BRASIL, 2017) no qual se constata que, a porcentagem de liberdade provisória é de 56.28%, sendo bem maior do que a do Estado do Paraná que é de 42.25%, e que o número de audiência de custódias realizadas em todo o Estado do Mato Grosso é de 5.927, sendo um número bem menor que do Estado do Paraná que é de 23.558 audiências de custódia realizadas.

Os dados estatísticos coletados pelo Portal do Conselho Nacional de Justiça supramencionado:

Figura 2- Audiência de custódia em números- Mato Grosso.

       [2]

Assim, pode-se verificar que a aplicabilidade da audiência de custódia entre esses dois Estados é totalmente distinta. Presume-se que o Estado do Mato Grosso está aplicando de maneira correta a audiência de custódia, conforme demanda a Resolução no 213/2015, visto que está sendo atingido o seu real objetivo de diminuir a superlotação carcerária daquele estado.

O Estado de São Paulo foi o primeiro estado brasileiro a iniciar com o instituto de audiência de custódia. Houve várias discussões dentre os Estados quando à implementação deste instituto, havendo até Ação Direta de Inconstitucionalidade, conforme já mencionado nos tópicos anteriores, por conta da implementação da audiência no Estado de São Paulo.

Porém, verifica-se que, até a data dos dados coletados pelo Portal do CNJ (BRASIL, 2017), houve mais de 56 mil audiências de custódia realizadas até o ano de 2017 em todo o estado, sendo que 53.94% resultaram em prisão preventiva e 46.06% resultaram em liberdade provisória, ocorrendo a mesma situação que o Estado do Paraná. Porém, a periculosidade do Estado do São é bem maior que a do Estado do Paraná. Por conseguinte, talvez seja por este fato que a audiência de custódia resulta em mais prisão preventiva do em liberdade provisória, pois deve ser analisada uma série de requisitos conforme já demonstrados nos tópicos acima para que o juiz posso deixar o preso responder em liberdade.

Vejamos os dados estatísticos coletados pelo Portal CNJ:

Figura 3- Audiência de custódia em números- São Paulo.

            [3]

Já no Estado do Rio de Janeiro, até o ano de 2017 foram realizadas acerca de 8.559 audiências de custódia, conforme dados coletados pelo Portal do CNJ (BRASIL, 2017), sendo um número um pouco maior do que a do Estado do Mato Grosso. Porém, o percentual de prisão preventiva também foi maior, gerando acerca de 57.44%, e somente 42.56% decorreram de liberdade provisória. Sendo a mesma situação do Estado do Paraná e do Estado de São Paulo, e como já mencionado, não se pode atribuir certeza acerca da aplicabilidade desta audiência de custódia, apenas presumir que sua aplicabilidade não está sendo efetuada de maneira correta de acordo com a resolução. Abaixo apresentam-se os dados estatísticos coletados pelo Portal CNJ:

Figura 4- Audiência de custódia em números- Rio de Janeiro.

            [4]

Somente a análise dos dados supracitados não é possível generalizar sobre o fracasso ou o sucesso das audiências de custódias no país, tendo em vista que não existe uma homogeneidade entre a aplicação deste instituto dentre os órgãos jurisdicionais de cada estado, isso porque cada estado iniciou sua implementação em momentos distintos.

Porém, ainda assim, nota-se que com a inserção deste instituto de audiência de custódia buscou realmente uma defesa aos direitos humanos, pois conforme dados coletados pelo Conselho Nacional de Justiça existe uma diminuição significativa de abusos por parte das autoridades policiais. Destaca-se que de 1 a 14% apenas que evidenciou tais abusos. Logo, considera-se que 85% dos casos, os detidos tiveram sua integridade física preservada, isto é, sem considerar os casos de resistência pacífica que podem deixar lesões de natureza leve.

Se este instituto for aplicado de maneira correta de acordo com a Resolução no 213/2015 do CNJ em todos os órgãos jurisdicionais, existindo uma homogeneidade, pode-se observar uma redução, dentre os limites legais ao exercício de poder punitivo do Estado, podendo sim, futuramente, atingir seu objetivo principal: diminuir a superlotação carcerária brasileira.


5 CONCLUSÃO

A audiência de custódia encontrou amparo no Direito Internacional, a partir do qual houve a inserção no ordenamento jurídico pátrio, criando a Resolução no 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça que traz a regulamentação acerca desse instituto.

Desde a implementação da audiência de custódia no sistema processual penal, houve um avanço significativo em alguns Estados brasileiros, com a realização da audiência de custódia, pois, quando este instituto é executado corretamente impede o cumprimento da pena no ambiente prisional, facilitando a ressocialização do condenado ao prestar serviços à comunidade ou incorrer a qualquer outra medida alternativa que não seja a prisão.

Porém, em alguns lugares não se pode observar essa efetividade, pois as audiências de custódia resultam em mais decisões de prisão preventiva, que em liberdade provisória, segundo dados estatísticos coletados pelo Portal do Conselho Nacional de Justiça, sendo do Estado do Paraná, Mato Grosso, São Paulo e Estado do Rio de Janeiro.

E ainda, nota-se que não há homogeneidade na aplicabilidade da audiência de custódia dentre esses órgãos jurisdicionais, consequentemente, fugindo, dos objetivos principais deste recurso e descumprindo assim, os termos da Resolução no 213/2015 do CNJ, os quais deveriam, além de verificar se houve tortura policial, também apreciar, com mais cautela, as medidas alternativas à prisão, conforme o caso.

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Por fim, destaca-se que se as normas contidas na Resolução no 213/2015 do CNJ fossem corretamente executadas, poderia sim haver redução no índice de presos provisórios que ainda não foram julgados, podendo também reduzir o número de pessoas presas de forma injusta, consequentemente produziria mudanças futuras positivas sob o problema da superlotação nos presídios.


REFERÊNCIAS

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Notas

[1]Fonte: TJPR – Período: 31/07/2015 a 30/06/2017.  

[2] Fonte: TJMG -  Período: 24/07/2015 a 30/06/2017.

[3] Fonte: TJSP- Período: 24/05/2015 a 30/06/2017.

[4]  Fonte: TJRJ- Período: 18/09/2015 a 30/06/2017.

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Sobre os autores
Alessandro Dorigon

Mestre em direito pela UNIPAR. Especialista em direito e processo penal pela UEL. Especialista em docência e gestão do ensino superior pela UNIPAR. Especialista em direito militar pela Escola Mineira de Direito. Graduado em direito pela UNIPAR. Professor de direito e processo penal na UNIPAR. Advogado criminalista.

Roselane Sarlo

Discente do curso de direito - UNIPAR

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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