6. CONCLUSÕES
O Brasil vive uma situação jamais enfrentada anteriormente, o combate a um vírus mortal, de rápida e fácil proliferação, que tem ceifado muitas vidas.
Além de acentuar as deficiências do já combalido sistema de saúde pública brasileiro, o novo Coronavírus (COVID-19) ainda fez outra vítima: a economia do País. Se medidas de isolamento social e de restrição à abertura de comércios e desenvolvimento de atividades econômicas são adotadas pelo Poder Executivo visando eliminar ou, ao menos, diminuir a incidência do vírus na sociedade, de outro lado, a economia do Brasil entra em recessão (empresas fecham e pessoas perdem empregos).
Esta “escolha de Sofia” pode levar o Presidente da República, Governadores e Prefeitos a priorizarem a economia e omitirem-se nos cuidados com a saúde pública, levando ao alastramento do vírus e o adoecimento da população.
Neste sentido, a Constituição Federal, a Lei nº 1.079/1950, bem como o Código Penal preveem a possibilidade de responsabilização penal dos chefes dos Poder Executivo em cada âmbito da Federação por atos omissivos que atentem contra a saúde pública – direito social do cidadão (artigo 6º, da Constituição Federal) e causem a propagação do vírus do COVID-19.
Entretanto, como se viu, a legislação brasileira tende a punir mais facilmente o Presidente da República e os Governadores, em virtude da expressa previsão legal de crimes de responsabilidade para a hipótese.
Com relação aos Prefeitos, diante da lacuna legislativa (não há previsão para este tipo de omissão no Decreto-Lei nº 201/67), a punição deve ocorrer através do artigo 267 do Código Penal (epidemia), na forma omissiva imprópria, desde que atendidos a três critérios: (1) os meios utilizados para a propagação dos germes patogênicos; (2) se os meios utilizados eram realmente idôneos para causar a epidemia; e (3) a constatação de que a epidemia não decorre de mero evento natural, mas é resultado da ação humana e dos respectivos meios utilizados pelo agente para a propagação dos germes patogênicos (relação de causalidade e relação de risco), conforme doutrina Vicente de Paula Rodrigues Maggio.
A grande dificuldade na responsabilização penal do Prefeito Municipal pela omissão no enfrentamento do novo Coronavírus (COVID-19) seria constatar que a epidemia no município ocorreu justamente em razão do ato omissivo, pois, caso ela (epidemia) tivesse ocorrido de qualquer jeito, mesmo com a adoção de medidas pelo administrador, não poderá ele ser responsabilizado pelo tipo penal em debate.
Por uma questão de equidade, esses mesmos critérios devem ser seguidos na responsabilização do Presidente da República e dos Governadores por crime de responsabilidade. Em outras palavras, deve estar plenamente demonstrado nos autos: (1) os meios utilizados para a propagação dos germes patogênicos; (2) se os meios utilizados eram realmente idôneos para causar a epidemia; e (3) a constatação de que a epidemia não decorre de mero evento natural, mas é resultado da ação humana e dos respectivos meios utilizados pelo agente para a propagação dos germes patogênicos (relação de causalidade e relação de risco).
Referências
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL;
CÓDIGO PENAL BRASILEIRO;
DECRETO-LEI Nº 201/67;
LEI Nº 1.079/50;
LEI Nº 13.979/20;
CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal Parte Especial (arts. 121 ao 361). Salvador: Editora JusPodivm, 2020;
DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 2010;
DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. Rio de Janeiro: Renovar, 2007;
FERREIRA, Gecivaldo Vasconcelos. Princípio da proibição da proteção deficiente. A outra face do garantismo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2273, 21 set. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13542. Acesso em:10.05.2020, às 16h08min;
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MEIRELLES, Hely Lopes. Responsabilidades do Prefeito. Revista de Direito Administrativo. 128, p. 36/52, abr./jun. 1977. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/viewFile/42297/41014> acesso em 10.05.2020, às 12h33min;
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. Rio de Janeiro: Forense, 2019;
PEDROSO, Fernando de Almeida. Direito Penal – Parte Geral. São Paulo: Editora Método: 2008;
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https://canalcienciascriminais.jusbrasil.com.br/artigos/479445723/no-cargo-ou-fora-dele-crime-de-responsabilidade-dos-prefeitos> acesso em 10.05.2020, às 12h16min;
https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/02/27/qual-e-a-origem-do-novo-coronavirus.ghtml> acesso em 13.05.20, às 21h21min;
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https://coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-doenca#o-que-e-covid> acesso em 13.05.20, às 21h36min;
Notas
[1] PEDROSO, Fernando de Almeida. Direito Penal – Parte Geral. São Paulo: Editora Método: 2008, P. 127/128.
[2] CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal Parte Geral (arts. 1º ao 120). Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 286.
[3] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 165.
[4]Ob. cit., p. 288.
[5] CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal Parte Especial (arts. 121 ao 361). Salvador: Editora JusPodivm, 2020, P. 696.
[6] GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. Niterói: Editora Impetus, 2019, p. 1.034.
[7] Ob. cit., p. 1.034.
[8] Apud, CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal Parte Especial (arts. 121 ao 361). Salvador: Editora JusPodivm, 2020, P. 696.
[9] Apud, Ob. cit., 697.
[10] PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte especial, p. 699.
[11] NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 1.310.
[12] DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 680.
[13] MARTINS, Flávio. Curso de direito constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 1.458.
[14] AI 759.543 AgR, Rel. Min. Celso de Mello.
[15] MARTINS, Flávio. Ob. cit., p. 1.469.
[16]. DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 550/551.
[17] MEIRELLES, Hely Lopes. Responsabilidades do Prefeito. Revista de Direito Administrativo. 128, p. 36/52, abr./jun. 1977.
[18] FERREIRA, Gecivaldo Vasconcelos. Princípio da proibição da proteção deficiente. A outra face do garantismo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2273, 21 set. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13542. Acesso em:10 maio 2020.
[19] Ob. cit., p, 680.
[20] MAGGIO, Vicente de Paula Rodrigues. Curso de Direito Penal: parte especial (arts. 213 a 288-A). Salvador: Editora JusPodivm, 2015, P. 250.