Segue a novela da reforma tributária no Brasil, sem indicação clara de uma solução conclusiva.
O último movimento do Poder Executivo, com a apresentação de sua proposta de reforma, que consiste na substituição do PIS e da COFINS por um tributo denominado de Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) - projeto recepcionado no Congresso Nacional com toda pompa e certo deslumbramento, com discursos animados com uma demonstração de união dos Poderes (o que é fato positivo) - demonstra, na verdade, uma falta de sintonia dos atores responsáveis pela condução da reforma, visto que a proposta reformista federal não conversa com os projetos de reforma que já tramitam no Parlamento: a PEC nº 45/19, na Câmara dos Deputados, e a PEC nº 110/19. Ambas, textos que, para serem aprovados, precisam enfrentar um amplo debate e ajustes para que possam implantar uma reforma segura e responsável.
Neste artigo, não se pretende adentrar na análise técnica de nenhum destes projetos, seus pontos positivos e controversos, mas fazer apenas uma reflexão da dispersão de esforços dos autores envolvidos, sem uma unidade de objetivos, enfraquecendo a força impulsionadora na tramitação e aprovação de qualquer projeto. A dispersão ou divisão, em qualquer sistema, enfraquece e descentraliza o foco.
De fato, não se visualiza uma perfeita conciliação entre o projeto de iniciativa do governo federal com aqueles já em curso no Parlamento. Pelo contrário, o ministro Guedes pretende substituir dois tributos que já seriam substituídos pelos projetos de reforma em tramitação, dando a entender que desconsiderou estes projetos reformistas ao gestar a sua reforma específica.
Contrária a essa percepção lastreada numa análise mais técnica, Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, afirmou que a proposta de reforma apresentada pelo Executivo teria grandes convergências com os textos de reforma em tramitação no Congresso Nacional. Será mesmo?
O ministro Guedes também sinalizou o seu apoio aos projetos em tramitação, dizendo que a sua proposta não seria excludente, mas de complemento na reformulação do sistema. Não parece bem assim.
Segundo a imprensa noticia, os Estados e Municípios estariam pressionando para que o ICMS e ISS fossem também contemplados com a reforma, o que presume a comprovação simultânea do texto do Executivo Federal e um daqueles que já tramita no Congresso Nacional. Todos estes discursos parecem revelar um conhecimento superficial dos textos envolvidos. Se é difícil aprovar uma reforma, imaginem uma tramitação múltipla, de três textos simultaneamente.
Parece que a diversidade de textos de reforma apresentados, cada um com o seu propósito próprio, aponta para uma total falta de convergência das forças reformistas. Esta diversidade de texto é fruto de uma vaidade intelectual de autoria de grupo executor, de político ou de autoridade, cada um buscando o seu protagonismo sobre o movimento reformista. Não se visualiza um interesse aglutinador visando a construir um modelo único, seguro e factível que, efetivamente, atenda o maior objetivo de simplificação, ou pelo menos, de racionalidade do sistema tributário em vigor, libertando o empreendedor das amarras da insegurança jurídica causada pela excesso de regulamentação do sistema.
Mas o que revelaria este desalinhamento dos proponentes de reforma tributária, que nem todos percebem?
Ora, os dois projetos que tramitam no Parlamento, tanto a PEC nº 45/19 e PEC nº 110/19, da Câmara dos Deputados e do Senado, respectivamente, pretendem instituir o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), em substituição a diversos tributos, de competência federal, estadual e municipal, sendo que entre os tributos extintos estão o PIS e COFINS. Já o texto do Guedes quer manter este tributo, só que numa nova versão, mais simplificada e racional, na forma de CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Ou seja, há pontos nos projetos que são excludentes. O Executivo, ao elaborar o seu texto, enfocando unicamente a reformulação do PIS e da COFINS, não considerou que os projetos em tramitação já teriam uma solução para estes tributos, revelando a sua descrença na sua provação ou o desejo de protagonismo na reforma, querendo demonstrar serviço.
É possível antever uma enorme dificuldade na tramitação de três projetos de reforma tributária no Congresso Nacional, com os debates, ajustes e as acomodações políticas necessárias para a sua aprovação. Se até agora não vingou nenhum projeto, como acreditar na aprovação de três textos simultâneos? O êxito nesta reformulação tão ampla no sistema tributário, embora seja possível, é pouco provável.
Não se cogita em desconstruir o mérito dos projetos apresentados, nem mesmo desconsiderar a viabilidade de reforma fatiada, o que talvez seja uma solução mais factível. O que se pretende é chamar a atenção para a necessidade de um projeto nacional, único e viável, seja fatiada ou não, que fosse encabeçado pelo Executivo Federal, ou então por ele acolhido, texto construído com uma convergência de força e interesse nacionais, que se submeteria ao debate e aos ajustes necessários para a aprovação.