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A segurança pública e seus reflexos no sistema prisional

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05/05/2021 às 15:25
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CONCLUSÃO

Assim, diante de tais considerações apresentadas e dados expostos, a conclusão cinge-se a preceitos de ordem moral e legal, pois são necessárias mudanças tanto na sociedade, como também nos textos legais.

O Estado, como detentor da violência, deve exercê-la de maneira adequada, sem provocar no réu castigos que ultrapassem os seus delitos, posto que estaria regredindo ao estado de tortura e castigos cruéis. A atual constituição da República se funda em preceitos e princípios que estão intimamente ligados à dignidade da pessoa humana. Desta feita, ainda que a sociedade tenha ânsia em castigar aqueles que, de certa forma, a infligiram algum mal, esse processo não deve ser penoso e degradante, o que, ao invés de ressocializar, o faz tomar remorso, eis que a finalidade é justamente inversa, pois busca de certa forma reeducá-lo ao convívio social.

Desde os primórdios, a sociedade vem evoluindo, seja no âmbito jurídico ou sociológico, e, consequentemente, vem passando de um estágio do “eu contra eles”, para o estágio do “nós contra eles”. Essa premissa é a síntese da razão de excluirmos tudo aquilo que nos é estranho ou que vai contra nossas ideologias. Sabe-se que o sistema carcerário é tema espinhoso, posto que trata de seres humanos considerados perdidos, incapazes de expressar qualquer ato de humanidade, justamente por ter violado um contrato social por nós elaborado em benefício de todos.

Essa visão sociológica reflete de maneira significativa no direito, pois é de onde surgem as normas penais que darão o tratamento adequado aos seus destinatários. Saber lidar com a aplicação da pena após a condenação é fator decisivo para tornar o condenado alguém que irá ser o objeto final do direito penal, ou seja, irá com a pena imposta, cumpri-la e, posteriormente, voltar ao convívio social, ou será o objeto inicial e constante da máquina judiciária.

A polícia militar e a polícia civil possuem atribuições diferentes, mas em sua essência, exercem atividade considerada essencial ao bom funcionamento do Estado. Parte dessa função fica prejudicada justamente pela ausência de investimento em estrutura adequada a estes órgãos. Há projetos de Emenda à Constituição que pretendem unificá-las, visando melhor atendimento à população e à solução ágil dos crimes. Um desses projetos é a Proposta de Emenda à Constituição de nº 102/2011 e a PEC nº 51/2013, que buscavam a unificação destes organismos de Estado. Tais projetos foram discutidos na Câmara, mas arquivados em razão do final da legislatura dos deputados.

Em síntese, os projetos trazem ideias que visam a melhorar a percepção de nossa segurança pública em relação aos órgãos que a exercem, sem, contudo, adentrar ao tema do sistema prisional.

A grande barreira enfrentada a essa unificação é a perda de poder por aqueles que exercem a função de comando dentro das polícias. Assim, a sociedade fica refém da criminalidade e de uma segurança pública de qualidade, justamente por alguns que não simpatizam com a ideia ou veem certa cautela na unificação.

O modelo de segurança pública do Brasil não é único. Há países que adotam este modelo de polícia, porém, com distinção considerável da polícia militar brasileira. É, hoje, um modelo anacrônico de polícia que não avançou, ficando desatualizada e burocrática, que gera significativos custos ao Estado e mantém taxa nacional de apenas 8% (oito por cento) na resolução de crimes.

Esse quadro de descaso das forças policiais tem consequência nas prisões e nas taxas de resolução de crimes, que, por ausência de investimento, não conseguem prestar os seus serviços de maneira eficaz.

Assim, é urgente a mudança legislativa para alterar o sistema carcerário, de modo a focar em medidas que visam a desestimular a sociedade no cometimento de crimes, através de legislações eficazes e rígidas. Além disso, imperioso focar em penas alternativas para atos que não são dotados de violência, como é o tráfico de drogas, ainda que seja um caminho para outros delitos mais graves.

Porém, grande parte dos presos são agentes desprovidos de condições sociais e culturais que os permitam viver fora da criminalidade, seja porque o bairro em que moram é dominado por organizações criminosas, seja pela ineficiência do Estado em investigar e atuar de maneira efetiva a rastrear a fonte de dinheiro de tais organizações.

Por fim, sustenta-se que não basta mero ativismo judicial, mas sim, reforma estrutural do direito penal, sistema carcerário e sistema de segurança pública, para que se atinja a qualidade almejada por qualquer sociedade, que poderia ser sintetizada em pacificação social.


REFERÊNCIAS

BECCARIA, Cesare Bonsana. Dos delitos e das penas. 3. ed. São Paulo: RT, 2006.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

CALDEIRA, Felipe Machado. Evolução histórica, filosófica e teórica da pena. Revista da EMERJ - v. 12 n. 45 – 2009. ISSN 2236-8957. Disponível em: http://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista45/Revista45_255.pdf. Acesso em: 12 out. 2019.

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CÓDIGO de Hamurabi. Disponível em: http://www4.policiamilitar.sp.gov.br/unidades/dpcdh/Normas_Direitos_Humanos/CÓDIGO%20DE%20HAMURABI.pdf. Acesso em: 05 out. 2019.

CORTE CONSTITUCIONAL DA COLÔMBIA. Sentencia de Unificación (SU) nº 5591997. Disponível em: http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/1997/SU559-97.htm. Acesso em: 30 out. 2019.

DOSTOIÉVSKI, Fiódor Mikhailovitch. Crime e castigo. São Paulo: Editora Nova Cultural, 2002.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) nº 347/DF . Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10300665. Acesso em 30 out. 2019.


[1] O Código de Hamurabi é uma compilação de 282 artigos de lei sobre diversas áreas do direito, escrito por volta de 1.772 a.C. É considerado por muitos, como a legislação que deu origem ao direito. Escrito pela sociedade Babilônica, possuía divisões de classes e penas e castigos impostas a cada um deste grupo de indivíduos que transgredisse a lei à época.

[2] Sólon (Atenas, 638 a.C – 558 a.C), foi um estadista, legislador e poeta grego antigo. Foi considerado pelos gregos como um dos sete sábios da Grécia antiga. Foi um dos grandes reformadores da legislação grega e influenciou diretamente a democracia na época.

[3] Jean Mabillon, chamado também de Dom Mabillon, (Saint-Pierremont, 23 de novembro de 1632 — Saint-Germain-des-Prés, 27 de dezembro de 1707) foi um monge beneditino, erudito e historiador francês. Ele começou a viajar pela Europa na busca de manuscritos medievais e livros para a biblioteca real. Em uma destas viagens, escreveu a obra Reflexões sobre as prisões monásticas, em 1695, que fazia reflexões sobres as penas aplicadas na época aos comuns.

[4] The State of thePrisons in England and Wales with preliminary observations, and an account of some foreign prisons and hospitals.  Printed for: J.Johnson, C. Dilly and T. Cadell. 4ª Ed.(1777).

[5] Platão (Atenas,428/427 – Atenas, 348/347a.C.) foi um filósofo e matemático do período clássico da Grécia Antiga, autor de diversos diálogos filosóficos, sendo entre eles, a obra A República, em que se discutiu temas como a justiça, política e noções de Estado.

[6] Aristóteles (Estagira, 384 a.C. — Atenas, 322 a.C.) foi um filósofo grego durante o período clássico na Grécia antiga, e inclusive, aluno de Platão e professor de Alexandre o Grande. Suas obras ressaltavam os princípios de ética e moral de um cidadão, entendendo o Estado como um organismo da sociedade para a sociedade

[7] Extraído do site do Conselho Nacional de Justiça <http://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php> acesso em 25 de outubro de 2019.

[8] Extraído do site do DEPEN <http://depen.gov.br/DEPEN/depen/sisdepen/infopen/relatorios-sinteticos/infopen-jun-2017-rev-12072019-0721.pdf> acesso em 15 de outubro de 2019.

[9] Extraído do IBGE <https://www.ibge.gov.br/explica/pib.php> acesso em: 15 de outubro de 2019.

[10] Extraído do site do IPEA <https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/relatoriopesquisa/150611_relatorio_reincidencia_criminal.pdf> acesso em 16 de outubro de 2019.

[11] Site Portal EBC. <http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2018-06/ministro-diz-que-sistema-penitenciario-e-o-principal-no-da-seguranca> acesso em: 15 de outubro de 2019.

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JUNIOR, Helio Roberto Furman. A segurança pública e seus reflexos no sistema prisional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6517, 5 mai. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/90371. Acesso em: 24 abr. 2024.

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