Em 1989, foi lançado, nos Estados Unidos, um filme intitulado Sexo, Mentiras e Videotapes que, apesar de hollywoodiano, frequentou os circuitos alternativos do cinema, foi tema em rodas de intelectuais, e ganhou prêmios e glamour em festivais considerados fora do roteiro do cinema comercial da época. Roteirizado e dirigido por Steven Soderbergh, tendo em seu elenco atores como James Spader, Andie MacDowell, Peter Gallagher, Laura San Giacomo, Ron Vawter, entre outros, Sexo, Mentiras e Videotapes contava sobre a trama que envolvia uma mulher frígida, frequentadora de um psicanalista com o objetivo de resolver suas frustrações, casada com um advogado e amante da irmã de sua própria esposa, além de um amigo de infância do marido, voyeur por natureza, que gosta de gravar filmes (na época ainda nas antigas fitas VHS, de videotape ou videocassete) com mulheres falando sobre sexo.
O Filme Sexo, Mentiras e Videotapes foi a principal fonte inspiradora para o início deste artigo, especialmente pela riqueza de tratamentos semânticos, simbologias e significados que o filme aborda, bem como as variadas interpretações que permite. O filme é exemplo de elemento semiológico, de semiótica, assim como o Direito.
O Direito, enquanto ciência e na forma como conhecido atualmente, se observadas suas bases etimológicas e epistemológicas, tem origem em um conjunto de vocábulos do latim clássico, incluindo termos como directum e rectum (que significam “certo” e “reto”), mas também jus ou juris, jussum, jubere, justum (que significam “direito”, “mandar”, “ordenado”, “justo” ou “relativo à justiça”). Aliás, o Direito, enquanto ciência, se confunde em ciência do Direito, baseada em critérios sintático-semânticos, que se deslocou sucessivamente em uma perspectiva estrutural e ontológica para um arcabouço de saberes pragmáticos, alicerçada em proposições normativas que descrevem sistematicamente o objeto do Direito, distinguindo-se e embaralhando-se com a ciência Jurídica, de caráter muito mais filosófico e analítico (FERRAZ JUNIOR, 2013 / ROCHA, 2013).
É, portanto, o Direito, uma ciência estruturada sobre amplo conjunto de símbolos, signos, sinais, princípios e valores, pragmáticos e metafísicos, positivos e subjetivos, organizando-se em sistemas significantes e, consequentemente, em um objeto semiológico. O Direito é norma e norma é linguagem. A expressão jurisdicional é processo e comunicação processual, pura linguagem e interpretação. Como aponta Glauco Ramos (2013): “O Direito é pura linguagem”.
A semiologia, por sua vez, é exatamente a ciência que tem como objeto de estudo os signos na vida social, tendo a semiótica sua área mais específica e profunda, estudando os signos, processos e sistemas de significação nos fenômenos culturais e sociais. A semiótica tem por objeto todas as linguagens possíveis, o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno de produção de significação e de sentido. Nas palavras de Félix Gattari e Gilles Deleuze (1995):
“[...] não há uma articulação de conteúdo e uma articulação de expressão sem que a articulação de conteúdo seja dupla por sua própria conta e, ao mesmo tempo, constitua uma expressão relativa no conteúdo.” (DELEUZE; GUATTARI, 1995:76)
“Por conteúdo não se deve apenas entender a mão e as ferramentas, mas uma máquina social técnica que a elas preexiste e constitui estados de força ou formações de potência. Por expressão não se deve apenas entender a face e a linguagem, nem as línguas, mas uma máquina coletiva semiótica que a elas preexiste e constitui regimes de signos.” (DELEUZE; GUATTARI, 1995:101)
Nesta distinção embaralhante que separa e une a ciência Direito e a ciência Jurídica, a linguagem – como expressão do sujeito na tríade entre sujeito, Direito e processo jurídico dentre a tríade fundamental processual (juiz, autor, réu) – surge como a ferramenta não apenas da garantia da justiça, mas também como a possibilidade da garantia do ativismo, da garantia do exercício do “eu” nas relações processuais, do exercício do “eu-homem-juíz” na prática jurisdicional, gerando imparcialidade judicial e jurisdicional, desequilíbrio, fragilidade no estabelecimento da ampla defesa e de todo o modelo semântico de perfil garantista.
Ferramenta importante no estudo da linguagem em geral, e da jurídica em especial, a semiótica apresenta três planos fundamentais: a sintática, a semântica e a pragmática. Grosso modo, a sintática procura explicar o conceito do enunciado prescritivo; a semântica, por sua vez, explica os vários e possíveis conteúdos que pode assumir o enunciado prescritivo; a pragmática, por fim, procura explicar as relações havidas entre o conceito, seu(s) conteúdo(s) e a forma como se lhes aplicam seus utilizadores no mundo da vida. (RAMOS, 2013)
A semiologia é uma ferramenta de equilíbrio do Direito, de possibilidade de análise semântica da linguagem, sentimentos, signos e outros aspectos simbólicos que podem permear o processo, com atenção aos riscos do ativismo radical ou do garantismo cego e avesso, com possibilidade para uma completa investigação de todos os contingentes envolvidos no processo, bem como em toda a estrutura semântica que compreende o Direito e as ciências jurídicas, em suas bases etimológicas, em suas bases epistemológicas e em sua prática.
“Eu posso esmagar uma borboleta e torturá-la até a morte e isso não é ilegal. Mas se essa borboleta pertence a uma coleção de valor inestimável, eu posso ser preso. Não é o ato que é julgado. Todos os dias alguém esmaga uma borboleta e a lei não pode fazer nada sobre isso”. 1
Cinema, Literatura e Direito: de abril despedaçado até a favelização de aliens
O diálogo entre Direito e arte é antigo e comum, principalmente no universo das letras, com romances, dramas e ficções que se tornaram clássicos na história da literatura e nas telas do cinema com filmes famosos pelos debates com questões que envolvem aspectos do Direito Civil, Direito de Família, Direito Penal entre outros, ou que optam por apresentar casos reais da história jurisdicional mundial, ou ainda aqueles que elegem como tema tratar acerca de tribunais de júri e todos os aspectos envolvidos nele.
A ordem “Direito, literatura e cinema” ou “literatura, cinema e Direito” não é muito clara - e nem vem ao caso tentar entender quem se aproveita mais de quem. Mas a verdade é que nos cursos de Direito, simpósios, congressos e afins, não é raro surgirem debates intelectuais e teóricos a partir de livros como Crime e Castigo (Fiódor Dostoiévski) ou O Idiota (do mesmo autor), O Último Dia de um Condenado (Victor Hugo), As Bruxas de Salém (Arthur Miller), O Processo (entre outros, de Franz Kafka), Guerra e Paz (Liev Tolstoi), Incidente em Antares (Érico Veríssimo), Orgulho e Preconceito (Jane Austen), O último Jurado (John Grisham), A Divina Comédia (Dante Alighieri), Eles, os Juízes, Vistos por um Advogado (Piero Calamandrei), Morte e Vida Severina (João Cabral de Melo Neto), A Náusea (Jean-Paul Sartre), O Advogado (John Grisham), Memórias do Cárcere (Graciliano Ramos), Desobediência Civil (Henry D. Thoreau), O Mercador de Veneza (William Shakespeare), entre tantos outros.
O Cinema também é marcante nos debates entre profissionais, professores e estudantes de Direito, havendo uma ampla gama de títulos, temas e personagens pertinentes de nota, é uma leva de rótulos adotados como clichê necessário de debates, especialmente em títulos como Doze Homens e uma Sentença (EUA, 1957), O Caso dos Irmãos Naves (BRA, 1967), O nome da Rosa (FRA / ALE / ITA, 1986), Evelyn (IRL, 2002), ou o documentário Justiça (BRA, 2004) entre tantos outros títulos, além de dezenas, centenas, de produções comerciais ou independentes, conhecidas ou não, clichês ou inigualáveis, que também podem nos servir como fonte de inspiração para inflamados debates sobre temas de Direito (Penal, Civil, Constitucional, Ambiental, Familiar, etc.) com passagens na sociologia, psicologia ou antropologias jurídicas
No drama Abril Despedaçado, por exemplo, produção brasileira de 2001, dirigida por Walter Salles, com Rodrigo Santoro, Luiz Carlos Vasconcelos, Othon Bastos, José Dumont, Rita Assemany entre outros, em um cenário bucólico do interior do nordeste brasileiro, e abordando sobre a realidade comum daquela população acostumada com conflitos de de terras entre famílias que duram gerações, vem a tona não apenas a necessária denuncia à pobreza do sertão – e principalmente os vários níveis de exploração e domínio estabelecidos – como também são tomados, no decorrer do filme, sob a ótica da Sociologia, Psicologia e Sociologia, diversos debates sobre moral, violência, família, moradia, acesso a escola, trabalho infantil, religião, cidadania, meio ambiente, e tantos outros temas que poderiam gerar diversas disciplinas, congressos e simpósios para tratar sobre diferentes temas em Filosofia do Direito, Direito Constitucional Brasileiro, Direito Penal, Direito Civil, e/ou mesmo sobre o acesso a justiça para todos e os direitos humanos fundamentais, tão bem descritos e defendidos na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (proclamada na França em 1789 sob a égide dos ideários da Revolução Francesa e do tripé filosófico de “igualdade, liberdade e fraternidade”), na Declaração Universal dos Direitos Humanos (proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948), no Tratado Internacional da Convenção Americana de Direitos Humanos - CADH (mais conhecido como Pacto de San José da Costa Rica, definida em novembro de 1969 durante a Conferência Interamericana de Direitos Humanos realizada na cidade de San José, na Costa Rica, entrando definitivamente em vigor em 1978), e, por fim, prevista na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, especialmente no “Título II” que trata “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” onde, no art. 5º, incluindo seus Parágrafos, Incisos e Alíneas, dita que:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]
Aliás, a partir do filme Abril Despedaçado, surge uma grande reflexão para o Direito, especialmente para o Direito Penal em diálogo com a Filosofia do Direito: até que ponto Direito e Justiça são realmente aplicáveis quando observadas as questões sociais e culturais de determinado grupo social? Esse é um debate comumente realizado ao tratarmos sobre comunidades indígenas, isoladas da humanidade, ou quando falamos das leis de determinado país dito “civilizado” em comparação com algum país ou grupo social de áreas exíguas da África, por exemplo.
Fugindo do dogmatismo do Direito, como pensar uma relação entre Abril Despedaçado e o art. 345 do Código Penal? Diz o Código Penal em seu art. 345:
Art. 345 - Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único - Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.
Sem entrar no mérito dos casos onde a auto tutela é autorizada e legal (como por exemplo nos casos de legítima defesa e estado de necessidade previstos no art. 23, I e II, e arts. 24 e 25 do Código Penal), em caso de conflitos o Estado avoca para si mesmo todo poder do jus puniendi, sendo o Estado o detentor exclusivo do poder e da competência de administrar e aplicar justiça, não cabendo em hipótese alguma a justiça com as próprias mãos, princípio este que está expresso na Carta Magna, no art. 5º, Inciso XXXV da Constituição Federal de 1988, ao afirmar que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
A questão que fica, quando observados os aspectos demonstrados no filme Abril Despedaçado, é: pode o Estado assumir para si mesmo a competência penal de aplicar o art. 345 do Código Penal havendo a total ausência do Estado para dirimir todas as outras questões relativas a moral, violência, família, moradia, acesso a escola, trabalho infantil, religião, cidadania, meio ambiente, e tantos outros temas que poderiam gerar diversas disciplinas, congressos e simpósios para tratar sobre diferentes temas em Filosofia do Direito, Direito Constitucional Brasileiro, Direito Penal, Direito Civil, e/ou mesmo sobre o acesso a justiça para todos e os direitos humanos fundamentais?
Ao questionar estes aspectos levantados neste diálogo semiológico entre o filme Abril Despedaçado e o art. 345 do Código Penal, lembremos e choremos com o magnífico Luiz Gonzaga, especialmente pela sua bela canção intitulada A morte do Vaqueiro, escrita por Luiz Gonzaga com Nelson Barbalho como parceiro de autoria, gravada em ritmo de toada no ano de 1963 em LP compacto, com apenas duas músicas, Pedido a São João no lado “A” e A morte do Vaqueiro no lado “B” do LP compacto 78 rotações, e posteriormente inserida no mesmo ano de 1963 no LP com o título Pisa no Pilão (Festa do Milho), gravado pela RCA Victor, e relançada em 1981 no LP ao vivo Gonzagão e Gonzaguinha - Discanço em casa, Moro no Mundo, pela gravadora EMI/Odeon. Diz trecho da poesia da canção:
“Numa tarde bem tristonha
Gado muge sem parar
Lamentando seu vaqueiro
Que não vem mais aboiar
(...)
Bom vaqueiro nordestino
Morre sem deixar tostão
O seu nome é esquecido
Nas quebradas do sertão
Nunca mais ouvirão
Seu cantar, meu irmão
(...)
Sacudido numa cova
Desprezado do Senhor
(...)”2
Conta a lenda que esta toada A morte do Vaqueiro foi composta numa sentada só, por Gonzagão (Luiz Gonzaga), como uma homenagem ao seu primo, Jacó (Raimundo Jacó), homem humilde, valente, simples, popular e querido, barbaramente assassinado em 1954 no meio do agreste pernambucano enquanto descansava sob a sombra de uma árvore no sertão. Também diz a lenda que a morte de Jacó, primo de Luiz Gonzaga, foi a motivação para que iniciassem a Missa do Vaqueiro, festa realizada anualmente na cidade de Serrita, PE, idealizada pelo falecido padre João Câncio, passando a fazer parte do calendário turístico de Pernambuco. Por fim, também conta a lenda que o cachorro de Jacó acompanhou todo o enterro e ficou ao lado da cova, morrendo de sede e de fome esperando o dono voltar.
Em meio a tantas lendas, uma certeza: nunca foram punidos os assassinos de Raimundo Jacó, primo de Luiz Gonzaga, barbaramente e covardemente assassinado sob uma árvore do sertão de Pernambuco enquanto descansava. E Raimundo Jacó, que nasceu e cresceu pobre no sertão, morreu também pobre, desamparado, sem justiça, e sem presença do Estado. Segue a toada: “Bom vaqueiro nordestino / Morre sem deixar tostão / O seu nome é esquecido / Nas quebradas do sertão [...]”. O crime foi engavetado. Segue a toada: vaqueiro nordestino, seu nome é esquecido...
Ao abordarmos o filme Abril Despedaçado e a canção A morte do Vaqueiro para tentarmos promover diálogos entre literatura, cinema, a ausência do Estado na tutela dos direitos, e temas correlacionados com Direitos Humanos, o que dizer então do filme Distrito 9 e todos os debates semiológicos e interpretações hermenêuticas passíveis de percepção neste rico roteiro ficcional tão bem adaptado com a realidade de muitas favelas existentes neste nosso Brasil e mundo afora?
Com produção de Peter Jackson, coprodução americana, sul-africana, neozelandesa e canadense, direção de Neill Blomkamp, filmado no formato de documentário (para ser um filme que mistura ficção, drama e ação), o filme Distrito 9, de 2009, imagina um cenário onde uma nave espacial danificada e encalhada sobre Joanesburgo, na África do Sul, até que, depois de alguns meses, uma equipe entra na nave, descobre uma população de aliens[3] (extraterrestres artrópodes) aparentemente sem líder, refugiados, e terminam por receber o apelido depreciativo de “camarões”, sendo acolhidos em Joanesburgo onde ficaram confinados em um campo de refugiados do governo chamado Distrito 9, rapidamente se transformando em uma imensa favela com uma população de milhões de “camarões” (ou extraterrestres) que logo aprendem e apreendem todas as mazelas da violência humana, passando a traficar, assassinar, e afins.
Como observou Fellipe Borges Dias (2014),
“O filme trabalha a questão dos direitos humanos de forma muito interessante. Por meio da metáfora homem-alien (alienado) podemos perceber que o filme aborda diversas questões de direitos humanos. Ressalte alguns temas presentes nos artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH): o Artigo IV trata da escravidão e do tráfico de escravos; o Artigo V fala da tortura e de tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante; o Artigo IX fala sobre liberdade, principalmente ao mencionar a proibição arbitrária à prisão, detenção e exílio; o Artigo XIII trata da liberdade de locomoção; o Artigo XXVIII trata de uma ordem social e internacional que garanta os direitos e liberdades da própria declaração. Vemos que a comunidade de aliens instalada em Joanesburgo existe em condições muito precárias de vida. Além disso, há cenas que mostram o desprezo e a diferenciação entre humanos e homens, semelhante ao que ocorreu na própria África, durante o apartheid. Essas condições de vida ferem o princípio do artigo XXV4 da DUDH. Já a questão da diferença, aborda questões presentes, por exemplo, no artigo VI5 dessa Declaração.” (DIAS, 2014:1)
Nesta análise filmológica nada óbvia e clichê promovida por Dias (2014), além das contingências relacionadas aos Direitos Humanos passíveis de observação no filme Distrito 9, outras temáticas também são levantadas em relação aos conhecimentos do Direito como promoção de debates, incluindo tratativas relevantes sobre a Convenção dos Refugiados (criada em Convenção das Nações Unidas, em Genebra, em 1951), a Convenção Contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas e Degradantes (adotada em 1984 em Assembleia Geral das Nações Unidas [e recepcionada no Brasil apenas em 28 de setembro de 1989 quando ratificada em nossa constituição]), o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos - PIDCP (aprovado em Dezembro de 1966 pela Assembleia Geral das Nações Unidas, que, juntamente ao Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais - PIDESC e a Declaração Universal dos Direitos Humanos – DUDH, compõem a Carta Internacional dos Direitos Humanos), entre outras importantes legislações internacionais.
No final, conclui Dias (2014):
“Ao abordarmos essas questões tendo como base o filme, podemos refletir sobre algumas questões. A principal delas seria com relação ao papel do direito internacional com relação à proteção dos direitos humanos, mais ainda com relação àqueles que são alienados dos seus direitos. Como os aliens do filme, vemos muitas pessoas em vários locais do mundo que possuem seus direitos básicos alienados. São as pessoas marginalizadas, tratadas quase como não-humanos. É importante, nessa questão, que o direito internacional seja um agente inclusivo, no sentido de fazer dessas pessoas cidadãos universais, ou seja, garantir os direitos básicos para que ela possa ser uma pessoa.” (DIAS, 2014:3)
O fato é que, se em Abril Despedaçado e a canção A morte do Vaqueiro a ausência do Estado representaram a completa incapacidade do Direito fazer-se presente, em Distrito 9 ocorre exatamente o contrário, ou seja, a forte presença do Estado, através de políticas sociais e de uma interpretação ativista de justiça, utilizando-se da ferramenta da inclusão pela exclusão, método tão difundido – e igualmente tão criticado – pela Psicologia Social, criou-se a obra da discriminação social, a inicialização à violência, a favelização, e a impossibilidade de obtenção de qualquer direito básico com um indivíduo possa ter. A ausência do Estado fez, dos sujeitos, vaqueiros esquecidos, desprezados do senhor (como cantado por Luiz Gonzaga); a presença do Estado, na tentativa de garantir direitos fundamentais, criou discriminação, injustiça e exclusão, promovendo todos os sujeitos à condição de “camarões”, sujeitos a toda condição de injustiça, segregação e marginalização, desprezados do senhor. De um jeito ou de outro, na revelação da realidade de milhões de sujeitos pelo mundo afora, segregados em cadeias, ruelas, albergues, favelas e afins, não há, com olhar nos Direitos Humanos, qualquer garantia básica de humanidade. É a metáfora do garantismo.