Resumo: Os passos iniciais na compra do seu imóvel fora do Brasil. Este artigo tem por finalidade trazer apenas informações básicas sobre aquilo que o brasileiro precisa saber para realizar a compra de imóveis no exterior e não tem por objetivo esgotar exaustivamente esse assunto.
Palavras-chaves: Comprar casa. Imóvel no exterior. Não-residente. Imposto de Renda.
O brasileiro ainda investe muito pouco no exterior. Abrir uma conta em um banco, ou em uma corretora de valores fora do país, ou comprar um imóvel no exterior ainda parece ser algo muito distante de ser alcançado para a grande maioria dos brasileiros. Agora que o Real está desvalorizado em frente ao Dólar americano. Apesar disso, durante a crise do subprime (subprime mortgage crisis), ocorrida em 2008, aproveitando os baixos preços dos imóveis nos EUA e o baixo valor do dólar em relação ao Real, os brasileiros foram às compras.
Enquanto os americanos sofriam severamente com a crise, perdendo empregos e atrasando o pagamento das suas hipotecas (mortgages), os brasileiros aproveitavam as oportunidades para comprar casas a preços muito baixos. “While some people cry, others sell tissues” (Enquanto uns choram, outros vendem lenços). É verdade que a crise de 2008 afetou o mundo inteiro, mas foram os Americanos os mais prejudicados. Aqueles que não sofreram tanto, como os brasileiros e os canadenses, aproveitaram o momento para investir nos EUA e dolarizar parte dos seus investimentos.
Por motivos óbvios, não podemos apresentar aqui tudo aquilo que você precisa saber para comprar um imóvel no exterior. Cada país tem suas leis e regras próprias e não seria possível trazer aqui as peculiaridades de cada um. Em países como Estados Unidos e Canada, por exemplo, as regras variam de Estado para Estado e até mesmo de banco para banco.
Desta forma, vamos nos ater apenas àquilo que o brasileiro precisa saber quanto às suas obrigações com o Brasil.
Para facilitar o entendimento precisamos estabelecer algumas premissas básicas. Primeiro devemos lembrar que residência civil é diferente de residência fiscal. Segundo, é preciso entender que há uma diferença entre o brasileiro que saiu do país e está regular com a Receita Federal, ou seja, fez a declaração de saída definitiva do país, e o brasileiro que saiu do País, mas não está regular com o Fisco, ou seja, não fez a DSDP. Por fim vamos dividi-los em quatro tipos.
1. Aquele que é residente no Brasil e quer comprar um imóvel em Orlando, Flórida.
2. Aquele que é residente fora do Brasil, já fez a saída definitiva e quer comprar um imóvel na Flórida.
3. Aquele que é residente fora do Brasil, mas ainda não fez a saída definitiva e quer comprar um imóvel na Flórida.
4. Aquele que é residente fora do Brasil, mas quer comprar um imóvel no Brasil.
Para ilustrar, vamos utilizar como exemplo um brasileiro que nasceu em Fortaleza, Ceará e quer comprar um imóvel em Orlando, na Flórida. Afinal de contas, dizem por aí que a Flórida é o mais brasileiro dos Estados Americanos.
Indo direto ao ponto que interessa, pergunta-se: o que o brasileiro precisa saber para comprar um imóvel no exterior?
1. Aquele que é residente no Brasil e quer comprar um imóvel em Orlando, Flórida.
Este talvez seja o mais comum dos casos, o Brasileiro que quer comprar um imóvel na Flórida com o objetivo de dolarizar seus investimentos e ter uma renda extra em uma moeda forte. Neste caso, precisamos saber que:
Você é obrigado a declarar este imóvel no seu imposto de renda se este tiver valor total superior a R$ 300 mil, nos termos do inciso V, art. 2º da Instrução Normativa 2.010, de 2021, ou se, por qualquer outro motivo, você já seja obrigado a fazer a Declaração de Ajuste Anual nos termos dos incisos I, II, III ou IV do mesmo art. 2º:
Art. 2º Está obrigada a apresentar a Declaração de Ajuste Anual referente ao exercício de 2021 a pessoa física residente no Brasil que, no ano-calendário de 2020:
I - recebeu rendimentos tributáveis, sujeitos ao ajuste na declaração, cuja soma foi superior a R$ 28.559,70 (vinte e oito mil, quinhentos e cinquenta e nove reais e setenta centavos);
II - recebeu rendimentos isentos, não tributáveis ou tributados exclusivamente na fonte, cuja soma foi superior a R$ 40.000,00 (quarenta mil reais);
III - obteve, em qualquer mês, ganho de capital na alienação de bens ou direitos sujeito à incidência do Imposto, ou realizou operações em bolsas de valores, de mercadorias, de futuros e assemelhadas;
IV - relativamente à atividade rural:
a) obteve receita bruta em valor superior a R$ 142.798,50 (cento e quarenta e dois mil, setecentos e noventa e oito reais e cinquenta centavos); ou
b) pretenda compensar, no ano-calendário de 2020 ou posteriores, prejuízos de anos-calendário anteriores ou do próprio ano-calendário de 2020;
V - teve, em 31 de dezembro, a posse ou a propriedade de bens ou direitos, inclusive terra nua, de valor total superior a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais);
Assim, entende-se que, mesmo que o imóvel tenha valor total inferior a R$ 300 mil, ainda assim você será obrigado a informar a existência deste imóvel na sua declaração de imposto de renda caso você já seja obrigado a declarar por qualquer dos outros motivos, como por exemplo, se você tem renda tributável acima do valor mínimo.
Criamos alguns exemplos para tentar esclarecer esse entendimento.
Exemplo 1: João da Silva, residente no Brasil, trabalha e tem renda de R$ 80 mil reais por ano e resolve então comprar um Flat na Flórida que tem valor de apenas R$ 100 mil reais. Neste caso, João terá que declarar? Sim. Pois muito embora o valor do imóvel, por si, seja inferior a R$ 300 mil e não o obrigue a fazer a declaração, a sua renda anual de R$ 80 mil o obriga. Desta forma João terá que fazer a declaração de ajuste anual por causa da sua renda de salário, deverá pagar os tributos devidos sobre a renda auferida, e nesta mesma declaração, informar à Receita Federal a existência desta propriedade em Orlando, na Flórida.
Exemplo 2: Carlos de Sousa, residente no Brasil, aposentado, não trabalha e não tem renda há mais de 5 anos. Contudo, ao longo da sua vida Carlos acumulou R$ 100 mil reais de poupança e comprou também um imóvel na Flórida, onde passa férias, cujo valor total é de R$ 250. Neste caso, Carlos terá que declarar o imóvel? Sim. Pois muito embora não precise declarar por não ter renda, Carlos precisará declarar por ter bens e valores acumulados que somados totalizam R$ 350 mil reais, portanto superior a R$ 300 mil reais.
Perceba que, em ambos os casos, tanto João quanto Carlos são obrigados a informar à Receita a existência do imóvel. A única diferença entre eles é o motivo que os obrigou a fazer a declaração.
Quando é então que a pessoa física não precisará declarar a compra de imóvel no exterior? Tão somente quando a pessoa for desobrigada de fazer a declaração e o imóvel adquirido tenha valor igual ou inferior a R$ 300 mil.
Exemplo: Maria das Graças, residente no Brasil, não trabalha, não tem renda, mas acumulou de mesada uma poupança de R$ 100 mil. Maria então resolve comprar aquele Flat em Orlando, onde pretende passar férias. Nesse caso, ela precisa declarar o imóvel? Não. Maria é desobrigada a declarar imposto pois não tem renda tampouco bens ou valores acima de R$ 300 mil. Neste caso não há fato gerador que a obrigue a fazer a declaração, sendo o imóvel de R$ 100 mil o valor total do seu patrimônio, estando portanto dentro do limite de isenção.
Por fim, é importante lembrar que fazer a Declaração Anual de Ajuste – DIRPF, ou seja, fazer a declaração de imposto sobre a renda não se confunde com pagar imposto sobre a renda. Noutras palavras, você pode estar obrigado a fazer a declaração, mas estar desobrigado a pagar o imposto. Estes são dois procedimentos diferentes: um trata de obrigação acessória (declarar, informar) o outro trata de obrigação principal (pagar / recolher).
Nos estendemos um pouco mais neste ponto por ser este o tópico mais recorrente. São os casos de brasileiros morando no Brasil e comprando imóveis no exterior que geram mais dúvidas e questionamentos. Espero que essa parte tenha ficado clara e didática o bastante para os leitores. Em caso de dúvidas, deixa sua pergunta nos comentários abaixo e farei o possível para ajudar.
Para explicar o tópico 2 e 3 precisamos primeiro entender o que é a declaração de saída definitiva do país e a diferença entre aquele que fez e que não fez a declaração.
2. Aquele que é residente fora do Brasil já fez a saída definitiva e quer comprar um imóvel na Flórida.
Neste caso, este brasileiro está em situação regular com a Receita Federal, pois, além de morar no exterior há mais de 12 meses consecutivos, também informou ao Leão sua saída definitiva e sua situação de não-residente fiscal. Aqui o brasileiro não terá muito com o que se preocupar. Uma vez feita a DSDP, a pessoa física fica desobrigada de fazer a declaração anual, pois a Declaração de Saída Definitiva do País – DSDP foi a sua última declaração no Brasil.
Assim, entendemos que não há a necessidade de declarar / informar à Receita Federal do Brasil a existência deste imóvel na Flórida. Tampouco terá necessidade de pagar qualquer tributo relativo ao imóvel no Brasil.
Mas, como fica a situação do brasileiro que reside no exterior há mais de 12 meses consecutivos, fez a declaração de saída definitiva, mas ainda tem imóveis e renda no Brasil. Ainda assim entendemos que a pessoa física não precisará informar à receita a existência deste imóvel, porquanto está desobrigada de fazer a declaração anual.
Contudo, é importante mencionar que este brasileiro terá sim que pagar tribunos relativos aos bens e rendimentos no Brasil. Esse pagamento se dará de forma diferenciada, sendo, na maioria dos casos, os valores retidos diretamente na fonte e taxados sob alíquota única, não sendo possível o parcelamento.
3. Aquele que é residente fora do Brasil, mas ainda não fez a saída definitiva e quer comprar um imóvel na Flórida.
Neste caso, o problema é que, muito embora o brasileiro esteja de fato morando no exterior, ele não fez a declaração de saída à Receita e portanto, ainda é considerado residente fiscal no Brasil. Aqui então começam a surgir os primeiros problemas, pois a Receita Federal exige a declaração universal de bens e proventos das pessoas físicas residentes no País. Isso quer dizer que, além de ser obrigado a declarar, você será também tributado como se residente fosse.
Destaca-se que, estando em situação irregular, o fato de já ter feito a declaração e o pagamento de impostos para a receita federal do país onde reside não o exime das suas responsabilidades com a Receita Federal do Brasil. Na melhor das hipóteses, você poderá deduzir parte do imposto pago se houver um acordo de não bitributação.
Desta forma, visualizamos apenas uma solução para este problema: regularizar a sua situação com o Fisco. Como? Fazendo a declaração de ajuste anual e/ou a declaração de saída definitiva de forma retroativa. Nessa declaração você terá que informar todos os seus bens e rendimentos no Brasil e no exterior, independentemente do valor da renda e do imóvel.
As consequências decorrentes de ficar em situação irregular com a Receita, não fazer a declaração devida e/ou omitir bens e rendimentos são várias, indo desde o cometimento de infrações administrativas, passando por ilícitos civis e chegando até, e inclusive, à tipificação de crimes. As penas são variadas e vão desde o pagamento de multa até a pena de reclusão.
Aqui precisamos fazer uma breve pausa para lembrar que é sempre muito importante consultar um profissional especializado para analisar o seu caso e lhe dar a orientação específica para solucionar o seu problema. Cada caso é um caso e a sua situação provavelmente não é a mesma do seu amigo. Talvez você até precise de mais de um profissional para o seu caso, como por exemplo um Advogado, um Contador e até um Corretor de Imóveis.
4. Aquele que é residente fora do Brasil e quer comprar um imóvel no Brasil.
Para a análise deste ponto vamos assumir que o brasileiro saiu do País e fez devidamente a declaração de saída definitiva. Ou seja, está desobrigado a declarar imposto de renda para a Receita Federal do Brasil.
Nesse caso, a pessoa física pode ir ao Brasil, comprar o imóvel, e voltar para Orlando sem se preocupar em informar essa compra para a Receita. Contudo, isso não quer dizer que você está livre de pagar tributos. A compra deve ocorrer nos termos da lei e o imóvel precisa ser registrado no respectivo cartório de registro de imóveis e pagar as taxas devidas.
Ademais, você estará sujeito à cobrança de Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana – IPTU, Imposto sobre Transmissão de Bens Intervivos – ITBI (no momento da transferência do domínio), e ainda outros eventuais impostos que sejam próprios da coisa (propter rem), ou seja, que incidem sobre o bem e são intrínsecos a este. Como por exemplo, poderíamos citar um eventual tributo sobre iluminação pública ou tributo sobre coleta pública de lixo e esgoto.
Ressaltamos que a sua desobrigação de prestar informações à Receita Federal do Brasil não o exime de cumprir eventuais obrigações que tenha com a receita federal do país onde vive. Outrossim, o fato de ter dupla cidadania, brasileira e americana, em regra não altera o que fora explicado acima.
Concluindo, é importante lembrar que, para questões referentes à compra e venda de imóveis sugiro buscar a ajuda de um Corretor de Imóveis; para questões quanto à declaração e ao pagamento de tributos aconselho os serviços profissionais de um Contador; e, para quaisquer eventuais problemas surgidos recomendo o acompanhamento jurídico de um Advogado especializado.
Fontes:
1.Site da Receita Federal do Brasil.
2. Instrução Normativa SRF nº 208, de 27 de setembro de 2002
3. Instrução Normativa RFB nº 2.010, de 24 de fevereiro de 2021.
4. Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990.
5. Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998.
6. Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988.
7. Decreto nº 9.580, de 2018
8. Solução de Consulta DISIT/SRRF 08 nº 262, de 30 de julho de 2009
9. Solução de Consulta COSIT nº 63, de 29 de março de 2021.
10. Perguntas e Respostas IRPF 2021.